Nas profundezas de uma vida (nada) normal - Capítulo 10

Nas profundezas de uma vida (nada) normal

Capítulo 10 - Uma entrada, uma saída

"Como se sai daqui?" me perguntei em voz alta. Eu sabia como voltar a porta de maçaneta com formato de estrela, mas não sabia como sair da casa. Andei até onde eu tinha certeza e então voltei ao corredor extenso e de sete metros de altura.

Voltar podia ter um significado simples para o dicionário, mas para mim era simplesmente complicado. Para onde ir? Tudo bem que eu consegui fechar a porta do escritório dos sonhos ou algo assim e ter andado em direção a porta inicial do corredor, onde antes havia uma orquestra fantasma e uma escuridão profunda. Porém, ao passar por ali, nada mais era o mesmo. Não se se é porque a casa decide mudar como bem entender, ou se alguém mais faz isso...

Havia uma parede azul marinho e uma poltrona vermelho sangue em frente a uma lareira acesa. A lareira era a única fonte de iluminação da sala estranha. Se era por lá, mesmo que não parecesse, que eu entrei, era por lá que eu deveria sair. Certo?

Alguma coisa me dizia que minha teoria estava errada.

Não havia porta nenhuma ao alcance da minha vista.

E então a luz do fogo se aumentou e pude ver com mais clareza as coisas ao meu redor. Minha perna tremia evitando com que eu desse um passo para frente, mas, ao mesmo tempo, minha mão se erguia na direção das pinturas de quadros com moldura dourado com panos em vermelho que as cobriam, como se fossem cortinas. Porém uma delas estava aberta. E era essa a qual meu corpo em parte chegara perto para observar.

Era a de um homem bonito, alto e jovem montado em um cavalo. O animal era bem negro com pelos bem bonitos e dava até a impressão de que se eu tocasse poderia sentir isso. Mas era óbvio que não. Mari, você não está ficando louca. Não está.

Se pensar bem. O homem até que se parecia um pouco com Erik. Cabelo castanho esvoaçante e os olhos azuis, só que sem manchinha. Isso sim era estranho.

Minha mão decidiu por si só tocar a pintura. Burrice.

De repente senti um frio na barriga e minha orelha começou a formigar. A "cortina" da tela se fechou bruscamente e o fogo da lareira começou a se mover como se alguém tentasse apagá-lo. A claridade foi ficando fraca e eu pude ver vultos. Agora meu corpo inteiro tremia seguindo os passos de tremedeira das minhas pernas. Eu sentia que meu cabelo estava para cima como se não houvesse gravidade. E meus ouvidos. Bom... Meus ouvidos escutaram um som bem alto de trovão do lado de fora da casa. A chuva começou a aumentar.

"Nunca te falaram que é feio bisbilhotar as coisas dos outros criança?" Ouvi uma voz grossa e que seguia o ritmo do trovão lá fora. talvez o frio na barriga fosse "só" um calafrio.

- Q-Q-Que?? - eu mal conseguia dizer.

"Isso que você ouviu. Bisbilhotar é feio..."

- Q-Q-Quem t-tá f-faland-do?

"Você olha pra mim e depois não sabe com quem tá falando? Ah por favor!" foi o que a voz disse, ainda fazendo meus ouvidos formigarem como se "ele" estivesse bem ali ao meu lado. Perto demais.

- E-eu não olhei pra você! Q-Quem é? - eu disse deixando meus olhos bem abertos e lacrimejando mesmo que eu queria era fechá-los no mesmo instante. A luz foi diminuindo, diminuindo...

"Bu!" Do nada uma cabeça ultrapassa a parede, a tela e a cortina, que acaba se mexendo, porém nenhuma das duas se rasga. Eu estava em tanto estado de choque que caí dura no chão achando que ia desmaiar, mas pra minha infelicidade eu nunca havia desmaiado, e meu corpo não estava dando sinais de que a primeira vez seria aquela hora.

"Viu? Você olhou pra mim"

Tive que piscar meus olhos para não esquecer que aquilo não era um pesadelo. Outro fantasma? Ah não! E o pior ele era idêntico ao homem da pintura que vi segundo atrás! Mesmo jeito! Como se ele tivesse morrido logo depois da pintura...

"Adivinhadora você, não é?" ele saiu completamente da parede e apareceu por inteiro na minha frente. Ah que droga, até fantasmas sem pés são mais altos que eu!

Quando ele saiu da parede a cortina se mexeu um pouco para o lado e deu para ver a data entalhada na moldura bem pequena. Cassion Delante. Sério que existe alguém que se chama assim? Observei a data de nascimento e morte. Morte. 1997. Em baixo o dia. Vinte sete de novembro. A data certinha do meu aniversário.

"Hum... Acha que isso é algum tipo de brincadeira não pobre menina?" Ele olhava direitamente para o meu rosto com aqueles olhos sem vida e ao que parece iria tentar levantar meu queixo pra cima para me fazer olhar para ele, mas sua mão ultrapassou minha pele na mesma hora e eu não tive outra escolha a não ser gritar. Mas gritar simplesmente par ao nada me ouvir.

"Eu não consigo acreditar o quão boazinha você é! E acredita em tudo que falam para você. E o que não falam... Bom você nem sabe porque nem procura saber... A curiosidade matou o gato, mas se ele não arriscasse nunca saberia antes de morrer o que tinha acontecido não é mesmo? Então de certo modo, valeu um pouco a pena."

- O que você quer? - eu tentei ficar firme e forte, mas minha voz saiu pior do que uma criancinha chorando de medo e com a cara toda inchada.

"Ora... Eu não quero nada demais... Só uma pequena coisinha. Primeiro preciso te informar de algumas coisas que talvez ninguém nunca tenha te contado. Sabia que para que alguém nasça, alguém precisa morrer? Essa é a triste história da minha pobre vida. Eu não tinha nem trinta anos completos ainda e a morte veio atrás de mim. Estranho não? Exatamente na mesma data que você nasceu?"

- O que você quer dizer? - ele se movia lentamente e me observava com intensidade a cada "passo".

"Que você devia me agradecer... Afinal eu que tive que nascer para você nascer! E além do mais... Não pense você que morri porque eu quis. 'Eles' me mataram...

- E-Eles?

"É minha doce querida... Foi tudo a força... E em parte, eu até poderia dizer que esse negócio de vidas passadas não existe, afinal, eu seria a sua vida passada. Mas sabe o que é interessante? Que você logo logo será a vida passada de alguém? Ouvi dizer alguém está prestes a nascer e roubas o seu posto. É a regra. Se uma nasce, outra tem que morrer."

- É claro que não, isso é besteira. Nada funciona assim! Você morreu porque tinha chegado a sua hora, é assim! - eu comecei a gritar ainda mais e os trovões tentavam me calar. O homem fantasma começou a rodar a minha volta com algo nas mãos. Um objeto, ao qual ele podia arrastar.

"Você acredita mesmo nas coisas que os humanos dizem? Tão imbecis. Assim como você também é não importando que seja parte sereia..."

- Como você sabe?

"Ai ai, Marina, tão inocente... Você confia demais nos outros. Ama demais os outros e quando percebem eles não te retribuem."

- O que diabos...?

"Sua tia? Sabe aquela mulher velha e retardada que vive com você? Foi ela quem me matou. Aliás, acho que a palavra certa é assassinou. "

- Não fala assim da minha tia! Ou eu...

"Ou você o que? Vai me matar? Que ironia! Eu JÁ estou morto, minha querida. E posso te comprovar, aqui a faca com o meu sangue." Então ele fez uma fumaça aparecer do nada e dentro dela havia uma imagem. Da minha tia. Da faca. Da morte dele. Não podia ser...

"Eu não disse?"

- Não!

"Sim... E pelo o que eu ouvi, ela quer fazer alguma coisa com você, minha doce querida, ou melhor salgada querida... Porque ela não me matou sozinha, estava com um grupo. Ao qual ela deve estar conversando nesse exato momento enquanto acha que você está curtindo a sua noite de Halloween.

- Minha tia não...

"Sua tia sim. E eu creio que sabe que Halloween é dia das bruxas, acho engraçado também. Uma ironia sua tia ter um dia próprio para ela. E eu só quero o seu bem querida. Ficar aqui comigo vai fazer com que ela não te encontre, e o bebê que está prestes a nascer morrerá. Porém se quiser continuar viva, não poderá sair dessa casa.

- Mas...

"Não nada de mas..." - ele pôs o dedo quase invisível na frente da minha boca. "Não é você quem escolhe o destino. São 'eles'..."

Bec
Enviado por Bec em 11/02/2013
Reeditado em 11/02/2013
Código do texto: T4134754
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