O Preço de uma Estrela (Capítulos 94 e 95)

CAPÍTULO 94: MERDA!

- Pessoal, já estão prontos?

- Sim.

Soltei uma afirmação tão baixa, que tenho certeza que ninguém ouviu em meio a empolgação do resto dos atores.

Hoje é o dia! Hoje é o grande dia! Apesar de estar triste com as coisas sobre minha vida amorosa, sinto um frio na barriga que começou quando coloquei as roupas da Catilde e passei minhas falas com a protagonista/namorada do Gabriel (eles assumiram perante o público).

- Vai dar tudo certo!

Sorri perante a otimização da protagonista e me olhei no espelho, enquanto o Gabriel entrava novamente no grande camarim e começava a chamar o pessoal para perto dele. Eu já sabia o que ele iria dizer, pois foi assim no final de semana passada, mesmo assim fui contra a minha vontade de ficar num canto sozinha, me concentrando na peça em si, e fui me juntar ao grupo.

- A casa está cheia. Estamos preparados para isso. Quero que subam lá e façam igual ou melhor do que ensaiamos. Vamos brilhar pessoal! Merda para todos!

- MERDA!

Esta era a parte legal: todos gritando MERDA, rsrsrs.

Rezamos e nos abraçamos: uma figurante, a protagonista, o ator que contracena comigo, o Gabriel.

- Liani, tu tá preparada?

Vacilei um pouco, lembrando da atuação da Simone.

- Si...Estou.

- É normal ficar nervosa, mas va...vai dar certo.

Sorri sem mostrar os dentes, duvidando da sua confiança em mim, pois ele mesmo vacilou em dizer as últimas palavras e eu me lembro do motivo dele ter me tirado do elenco principal: eu não era sádica como a Catilde deveria ser.

Ele me abraçou novamente me desejando merda, nos afastamos e eu já estava de saída quando ele me segurou pelo cotovelo.

- Ah, já estava me esquecendo, Marcos pediu para te dizer que ele está no camarote ansioso para te ver entrar no palco.

Perdi o fôlego por um segundo, quando eu encontrei o ar novamente, a raiva me tomou.

- O que ele faz aqui?

Gabriel me olhou com um olhar de desentendido.

- Ele veio te ver, por que mais seria? Tu não sabia que ele viria?

Abaixei a cabeça tentando me acalmar. Respirei fundo e olhei para o Gabriel afirmando com a cabeça, depois saí com o elenco para apresentarmos a peça.

CAPÍTULO 95: OS VAGABUNDOS

Antes de entrar no palco, eu consegui ver por uma fresta uma parte do público, o que fez a raiva sumir, minhas pernas tremeram e sentir um frio do Pólo Sul na barriga. A casa está CHEIA mesmo! Na semana passada não estava assim, estava cheia, mas hoje está LOTADA!

- Ai-Mi-nha-No-ssa!

- Calma Catilde.

Olhei para o lado e vi a atriz que vive a protagonista, que até hoje não sei o nome, por ser muito complicado, só sei que a personagem se chama Lucia, sorrindo para mim, tentando me acalmar. Ela é legal, apesar do modo ilícito como conseguiu a personagem, eu acho.

- A casa está REALMENTE cheia.

- Isso é bom, significa que o público gostou da peça na semana passada, tu não acha?

Sorri e ela respirou fundo e depois entrou em cena. Tudo bem, confesso que ela é boa mesmo e talvez não tenha conseguido totalmente o papel por um modo ilícito, ela tem talento. Agora o problema sou eu, daqui a pouco eu entro e encaro toda esta gente.

Será que ela tem razão? Será que a casa cheia significa que o pessoal gostou da peça na semana passada? Se for isso, eu preciso dar o meu melhor, pois semana passada não era eu, era a Simone que vivia a Catilde. Estou com medo!

Respirei fundo e lembrei "Não sou eu que vou entrar no palco, é a CA-TIL-DE!".

"[...]

- Pare, por favor pare!

- Tu estás casada comigo agora, florzinha. Tu deves me obedecer. Agora vá ao quarto e prepare nossa cama. Eu quero me satisfazer."

Saí de cena correndo, como a Catilde precisava sair: aproveitando a oportunidade para fugir do conde. Lágrimas corriam pelo meu rosto e eu sentia nojo de verdade. Estava satisfeita atrás do palco, pois senti que entrei na personagem e atuei bem.

A peça foi ocorrendo e tudo parecia estar indo bem, mas a cena que eu temia chegou, ou melhor AS CENAS: Catilde sendo sádica com os homens que a procuravam no bordel, humilhando-os e fazendo-os sofrer fisicamente. Claro que a violência em si não era feita, mas a insinuação sim, para que o resto ficasse na imaginação do espectador.

- Liani? Liani?

Olhei para o lado e vi o Gabriel. Estava tão concentrada na personagem e na próxima cena, que eu me esqueci que meu nome era Liani. Rsrs.

- Ah, oi.

- Eu não posso fazer isso, mas ele está insistindo muito e por ser meu amigo eu abri uma exceção à ele.

- Do que você está falando?

- Pegue.

Ele me deu um celular. Sem entender, peguei e coloquei no ouvido, dizendo "Alô?".

"Só para lembrar que eu estou aqui, te assistindo."

Fiquei olhando para o chão, com a mente vazia.

- Pronto!

Gabriel pegou o celular de mim e se afastou. Como se tivessem apertado "on" em mim, eu despertei do vazio, ou do choque, e olhei pela fresta em direção ao camarote. Ele estava lá, sério, olhando para o palco. Lembrei do beijo. Lembrei dos momentos que em que estávamos próximos. Lembrei dele dizendo "Eu estou me empenhando nisso POR NÓS". Balbuciei com raiva.

- Leandro e Marcos. Marcos e Leandro.

"[...]

- Catilde!"

Entrei no palco com sensualidade, séria, escondendo a raiva do Marcos dentro de mim. Não consegui separar personagem de atriz. Liani e Catilde entraram em cena.

"[...]

- Eu te amo!

- Eu sei.

- Tu não sentes o mesmo?

- E por que eu sentiria?"

Após a saída de cena do Ricardo, eu, perceptivamente ao público, enxuguei uma lágrima, que não estava no roteiro, e também saí do palco. O Teatro ficou em silêncio até a entrada final de Lúcia.