O Preço de uma Estrela (Capítulos 84)

CAPÍTULO 84: EXPLICAÇÃO

Acordei com um raio de sol entrando pela minha janela no meu quarto. Olhei para o lado e não vi ninguém. Estava sozinha. Me levantei, fui ao banheiro e aproveitei para tomar um banho. Estava com a roupa úmida e um cheiro terrível de suor. Voltei para o quarto, coloquei um vestidinho simples e fui até a cozinha. Meu corpo pedia água. Minha boca estava seca.

Mesmo tendo passado pela sala para ir à cozinha, por estar ainda sonolenta e meio desligada, não percebi o Marcos deitado no sofá. Apenas depois de beber um litro de água, eu acho, me virei e o reconheci ali, de olhos fechados. Sorri.

Mais tarde, umas dez e meia da manhã, ele apareceu no quarto.

- Oi.

Eu estava sentada na cama, encostada no travesseiro, tentando me lembrar de tudo o que acontecera.

- Oi.

- Está se sentindo melhor?

- Agora sim.

Silêncio. Então ele se aproximou e sentou perto de mim.

- Você me deu um susto ontem.

Sorri.

- O que aconteceu?

- Você quer saber desde o começo?

- É. Como você veio parar aqui? Você me deixou no Teatro e saiu. Como soube que eu estaria...mal.

- O Gabriel me ligou. Eu acho que ter pedido para ele te dar uma chance, ou estarmos "namorando", me faz ser seu agente ou babá, pois para tudo, relacionado à você, ele me liga.

- Então você já sabia que ele iria me "chutar"?

- Não, disso não. Eu sabia que você era ruim.

Olhei indignada para ele. Ruim? Eu? Nem precisei dizer nada, ele sorriu e se explicou.

- Não que você seja uma péssima atriz. Gabriel havia me falado sobre você não se sair bem nas cenas de humilhação. Você travava e mesmo ensaiando várias vezes, não tinha brilho, veracidade. Atua muito mal nestas cenas.

- É que eu não consigo agir friamente como a Catilde.

- Então por que você quer ser atriz?

Não consegui entender, mas a explicação veio logo.

- Ser atriz, ator, é ter a possibilidade de ser outra pessoa. Explorar novas personalidades. Fazer coisas que sendo nós mesmos não fazemos. Quando eu estou no palco, eu não sou o Marcos. Eu nem o conheço. Quando um ator está no palco, ele é o personagem e nada mais. Você não pode deixar os pensamentos da Liani interferir na vida da Catilde.

Eu vi um brilho em seus olhos. Falar sobre atuar é emocionante para ele.

- Eu compreendo o que você diz, mas....

- Mas nada Liani. Se você pensar no "mas", você não é Catilde.

Mirei o colchão e balbuciei, afirmando.

- Foi por isso que eu perdi a personagem.

- Infelizmente sim. Eu não sabia que ele iria te dispensar. Fiquei sabendo que a Simone estava dando duro, fazendo fisioterapia para melhorar rapidamente, ensaiando por conta própria, tudo para voltar mais rápido, mas achava que ela voltaria no final da temporada, ou iria revesar com você.

- Gabriel me disse que já estava ensaiando com ela quando me pedia para não ir passar as cenas.

- Ele não me contou isso. Ele me ligou desesperado ontem, uma hora depois que eu te deixei e me contou que você saiu desesperada de lá. Ele disse que estava preocupado, pois você estava muito nervosa e achou que você pudesse cometer uma loucura.

- Contar sobre o caso dele com a protagonista?

- Coisas que acontecem nos bastidores, ficam nos bastidores, Liani. Aprenda isso. A vida é dele, ele faz o que ele quiser e você não deve se meter.

- Isso vale para a vida real também.

- Apesar de as vezes a gente não seguir as regras, não é?

Entendi o que ele quis dizer, mas não bati de frente. Apenas desconversei.

- Eu voltei toda desesperada para casa. Nem peguei um táxi ou um ônibus. Vim a pé, transtornada, pensando que tudo só dá errado para mim.

- Por isso ficou doente.

- Doente?

- Você acordou no meio da noite, chorando, tremendo, febril. Eu fiquei um pouco desesperado. Pensei em te levar para o hospital, mas daí lembrei do William, que mora no andar debaixo. Há alguns anos, o Leandro se cortou aqui no apartamento, daí ele me ajudou, achando que o Leandro fosse meu primo e que estava passando um tempo no Rio. Então, ontem, eu perguntei dele para o porteiro e por sorte ele ainda mora aqui. Ele é médico e te atendeu, me dando até um remédio que ele tinha em casa.

- Ah, isso me faz lembrar de algo e talvez..., sei lá, acho que eu delirei, deve ter sido por causa da febre. E..., ele fez tudo de graça?

- E você acha que as pessoas saem de suas camas, duas horas da manhã, para atender alguém de graça?

Sorri e ele também.

- Desculpa.

- Não precisa. Mudando de assunto, você precisa continuar ensaiando e melhorar a parte de humilhação.

- Hã?

- Gabriel me falou que te deu dois dias de apresentação, para compensar você de ter trabalhado como atriz fixa ganhando salário de figurante.

- Eu não vou cons...

- Eu vou te ajudar.

Satisfação. Alegria. Gratidão. Tudo eu sentia. Até podia imaginar a cor voltando para o meu rosto.

- Obrigada.

- Não por isso.

- Então pelo quê? Você está me tratando tão bem. Tão gentil, carinhoso. Nem parece o Marcos que vivia implicando comigo.

Ele não respondeu. Ficamos nos olhando e por um momento eu pensei na ideia do clima se formando, pois nossas cabeças se aproximaram, deixando nossos rostos próximos. Pensei no beijo que iria acontecer. Só que tudo isso foi por um momento apenas, pois Marcos estragou tudo como sempre, falando com sua voz suave, doce e séria, num sussurro.

- Acontece que o Marcos não mudou. Não passou pela sua cabeça que eu só estou sendo gentil, carinhoso, por causa do plano? Por causa das fotos e da gravação?

Então ele se afastou e saiu do quarto. Mais uma vez a vontade de socá-lo me passou pela cabeça.

Por que ele é assim? Uma hora ele é um amor, o fofo nas novelas, o romântico dos filmes, o sedutor dos teatros. Na outra, ele é o carrasco que arranca meu fôlego e depois pisa em cima do meu coração.

Aaaaah! O que está dando em mim? Eu nem devia pensar em gostar deste cara. Isto não deve acontecer! É somente um plano. Nada é um conto de fadas ou um filme de Hollywood! Nada é...assim.