O Preço de uma Estrela (Capítulos 46, 47 e 48)

CAPÍTULO 46: O PRIMEIRO MOMENTO

- Quando eu tinha 8 anos, meu avô paterno morreu e deixou de herança a casa em que vivia para o meu pai, único filho dele. Como pagávamos aluguel na São Paulo capital e a situação financeira estava meio difícil, meus pais resolveram se mudar para a casa do meu falecido avô, na esperança de mudar de vida, pelo menos um pouco. A casa ficava no interior de São Paulo. Foi uma grande mudança para nós.

- Imagino.

Pude perceber que lembrar da mudança trouxe emoções no Leandro, mas ele respirou fundo e continuou.

- Quando criança, eu era o menor entre os meninos, tanto que me chamavam de tampinha, mas isso não me impedia de me divertir, brincar, jogar futebol, mesmo sendo o último a ser escolhido. Eu gostava e ainda gost...

- Peraí. Jogar futebol?

- Sim. Por quê?

- Ah, é que...esquece.

- Não, não precisa falar, eu até já sei. "Um homossexual jogando futebol?", besteira. Isso é preconceito, sabia?

- Desculpa.

- Não, tudo bem, eu já estou acostumado com isso. Mas saiba que não tem nada a ver. Eu sou homossexual e jogo futebol, amo tanto e sei jogar muito bem. Uma coisa não impede a outra e é imbecil quem pensa o contrário.

- Está bem. Desculpa.

- Tudo bem. Continuando: Eu adoro esportes. Um dia, nas primeiras semanas na cidade, meu pai me chamou para dar uma volta pelo bairro, para conhecer a vizinhança. Eu me lembro de tudo muito bem. Estava muito calor e eu sai de casa sem camisa. Eu e meu pai demos uma volta no quarteirão e depois fomos em uma pracinha que tinha lá perto. Muitas pessoas estavam lá. Então meu pai disse....

" - Filho, vai brincar com as outras crianças, porque o papai vai conhecer os adultos para fazer amizade, tá legal?

- Posso ir jogar bola, pai?

- Claro filho, vai lá.

Eles estão jogando ali, vou conversar com aquele menino parado na trave, enquanto eles estão concentrados do outro lado do campo.

- Ei, posso entrar?

- Agora não, espera ali com aqueles quatro, que eles estão de próximos.

Droga! Mas tudo bem eu entro depois. Será que vai demorar? Vou perguntar para os que estão de próximos.

- Ei, vai demorar muito para acabar esse jogo?

- Não, só falta esse time fazer um gol e acaba.

- Ah.

- Você quer entrar de próximo?

- Quero.

- Beleza."

- Quando o jogo acabou, o nosso time já estava pronto para entrar no lugar daqueles que perderam, só que um menino não quis sair. Daí ele quis me tirar, foi aí que o Marcos chegou.

- O Marcos Sandret?

- Claro! Por acaso estamos falando de mim com outro cara?

- Não! Rsrsrs. Eu quero saber como. Ele também estava jogando?

- Estava. Eu vi os últimos minutos do jogo antecessor ao que eu ia jogar, mas não tinha reparado nele. O Marcos estava no time que ganhou.

- Mas como aconteceu? O Marcos discutiu com o menino que quis te tirar?

- Foi. É que assim: eu e os outros quatro meninos entramos no campo, do lado do time que perdeu. Daí esse menino já veio para cima de mim, me mandando sair, porque o time já estava completo. Eu tentei responder, mas ele me empurrou e gritou um "SAI" para mim. Nisso o Marcos apareceu e....

" - Ei, não faz isso cara.

- Que foi, Marcos? Eu vou jogar de novo.

- Você perdeu. Deixa ele jogar.

- Ele é um novato e baixinho.

- E daí? A gente não tá jogando vôlei.

- Vai me tirar, Marcos?

- Vou. Você não sabe perder?

- Seu idiota! Vai defender esse cara que nem tá de blusa? Nem tem como ele jogar nos com camisa.

- Tudo bem."

- E daí o Marcos foi até o banco da pracinha e pegou a camiseta dele e me deu para colocar, para eu poder jogar no time.

- Sério? Mas por que ele fez isso? Ele já gostava de você?

- Não. Depois ele me contou, quando eu fui agradecê-lo por fazer aquilo. Parece que ele e esse menino, que eu esqueci o nome, já eram "inimigos", sabe? Esse menino era muito folgado e tinha roubado o sorvete do Marcos antes do jogo. O Marcos só aproveitou para se vingar.

- Nossa.

- É. Coisinha boba. Todo mundo riu do menino toda hora que Marcos tirava com ele. Ele foi humilhado.

- Achei que ele estava te defendendo.

- Não, mas foi muito legal. O Marcos já era popular quando criança e ter me defendido foi como um passe para eu entrar para sua turma e o achar muito legal.

- Mas e como você começaram a...a namorar?

- Então...

CAPÍTULO 47: INDO PARA O RIO

- ...depois que acabou o jogo, meu pai me chamou para ir embora. Quando eu me aproximei do meu pai, ele estava conversando com um homem que também estava chamando o filho dele. E quem era o filho do homem que acompanhava meu pai?

- O Marcos?

- Sim. Meu pai acabou virando amigo do pai do Marcos, que por coincidência era nosso vizinho.

- Bota coincidência nisso.

Leandro sorriu.

- Mas continua.

- Ah, então. Eu e o Marcos passamos a ser amigos inseparáveis, ele é filho único e eu também, então um fazia companhia para o outro o tempo todo. Estudávamos na mesma escola, não na mesma classe, pois o Marcos é um ano mais velho que eu, então estávamos em séries diferentes, mas mesm...

- Peraí, você tem 20 anos?

- Tenho. Por quê?

- Porque eu também tenho.

- Ah, que legal.

- Nada a ver, né?

- É. Rsrsrs.

Rimos muito.

- Então, continuando: No recreio eu ia para perto do Marcos e ficava com a turma dele, brincando, conversando, etc. Nossos pais combinaram de um levava para escola e o outro buscava. Em casa, a gente brincava na rua juntos, ele me ajudava, as vezes, em algumas matérias que eu tinha dificuldade. Principalmente matemática.

- Nossa, vocês eram inseparáveis mesmo.

- Éramos. Mas também, NOSSAS FAMÍLIAS ERAM, né? Nossos pais programavam de fazer churrasco, festa nas datas comemorativas, tudo junto. Era um ajudando o outro. Era muito legal.

- E você já gostava dele, ou ainda era somente amizade?

- Era somente amizade. Na verdade, essa união entre as nossas famílias durou uns dois anos, mais ou menos.

- Por quê?

- O pai do Marcos era militar e quando eu tinha 10 anos, o Marcos me contou que iria se mudar para o Rio, pois o pai dele foi transferido definitivamente, etc., coisas de militares.

- Que triste!

- Foi. Eu chorei quando a gente se despediu. Eu era uma criança, mas já sabia o sentimento de saudades. Eu e o Marcos eramos unha e carne e de uma hora para outra, ele precisou ir embora. Prometemos escrever, telefonar, mas eu sabia que tudo poderia mudar, já que não estaríamos presente na vida um do outro.

- Mas vocês voltaram a estar presentes um na vida do outro.

- Foi. É que....Bom, quando eu fiz 15 anos, meus pais resolveram se separar, pois minha mãe havia traído meu pai. Ele descobriu. Ela foi embora com o amante. Eu fiquei com meu pai. Ele sofreu muito, muito mesmo. Chorava toda hora. Foi aí que o pai do Marcos apareceu.

- Mas ele não estava no Rio?

- Estava, acontece que meu pai e ele conseguiram manter a amizade, assim como eu e o Marcos. A gente não se via, apenas se falava pelo telefone algumas vezes, ou mandava fotos por carta, mas conseguimos manter a amizade.

- O Marcos veio também? Junto com o pai?

- Não. Parece que tinha provas escolares. Alguma coisa assim, eu não me lembro muito bem. Mas, voltando: o pai do Marcos apareceu, meu pai se abriu com ele. O pai do Marcos disse que sabia como meu pai se sentia e nos deu a ideia de vender a casa e ir morar no Rio, pois assim seria melhor do que ficar ali se lembrando da minha mãe. Meu pai largou o emprego, vendeu a casa e nós nos mudamos. O pai do Marcos arrumou tudo, desde ajudar meu pai a achar uma casa que ele conseguisse pagar até em arrumar um emprego para meu pai.

- Que legal!

- É. Aí é que vem eu e o Marcos.

- Conta!

CAPÍTULO 48: PRIMEIRO BEIJO

- Eu tinha 15 anos e já tinha certeza sobre a minha preferência sexual, tinha até ficado com alguns caras, mas não tinha revelado para ninguém. Nem para minha família, nem para o Marcos. Quando nos mudamos, depois de arrumar tudo na nova casa, o pai do Marcos chamou meu pai e eu para irmos almoçar na casa dele, foi aí que eu o vi depois de cinco anos.

- O coração disparou?

- Não, mas foi uma sensação boa. Uma felicidade que eu não sei descrever. O Marcos estava bem diferente. Alto, forte, um voz grossa, mas macia. Ele nem parecia ter 16 anos.

- Amor a....hum, algumas vistas?

- Não sei, mas sei que eu fiquei muito feliz. Nos cumprimentamos. Depois do almoço, o pai do Marcos chamou meu pai para conversar e daí eu e o Marcos ficamos sozinhos para colocar o assunto em dia.

- Você contou para ele sobre sua opção sexual?

- Não. A gente só falou coisas de escola, esportes, etc.

- E depois disso tudo?

- Não era como quando tínhamos 8, 9 anos, mas ficamos amigos. Saíamos juntos, indo para barzinho, shopping, festas, etc. Comecei a estudar na mesma escola que ele. Bom, essas coisas, até que o pai dele morreu, após ter um infarto.

- Nossa. Bom, pelo que eu sei da vida dele, ele perdeu o pai com 17 anos, não é?

- É. Foi muito triste tudo, pois o pai dele era tudo para ele. Meu pai e eu também ficamos arrasados, não tanto quanto ele, mas o pai do Marcos era o nosso melhor amigo.

- Sei.

- No entanto, apesar disso ter sido triste, uma ponta de alegria surge em mim quando me lembro desse episódio, pois no meio disso tudo, foi quando eu e ele ficamos pela primeira vez.

- Você e o Marcos?

- Claro, cabecinha.

- Mas com foi?

- Ah, meu pai disse para o Marcos ficar em casa, para não ficar sozinho na casa dele, só que ele não quis, então meu pai disse para eu ir passar uma semana lá na casa do Marcos. Eu também achei que assim seria melhor, daí eu arrumei minha mochila e fui. Nessa semana, nós ficamos bem próximos, pois o Marcos tinha pesadelos a noite, por causa da morte do pai dele. Ele acordava assustado, dizendo que via seu pai no caixão e de repente tudo ficava preto e ele estava sozinho no mundo.

- Que horror!

- É, também acho.

- Mas peraí, vocês dormiam juntos?

- Não Liani! Dormíamos no mesmo quarto, mas em camas separadas. Acontece que ele acordava assustado e acendia a luz, então eu acabava acordando e ele me contava sobre o pesadelo.

- E o que você fazia?

- Não tinha muito o que fazer. Eu apenas o abraçava e dizia que estava com ele. Que ele não estava sozinho.

- Mas você disse que foi nesse momento que vocês ficaram juntos.

- Eu sei.

- Entãããão...?

- Teve um momento, em uma das noites que...Ai...Bom, teve um momento em que eu o abracei e estava com o rosto próximo do dele, então eu acabei....hum, o beijando.

- Sério?

- É.

- Mas e ele?

- Ele correspondeu e depois me afastou, me olhando confuso. Eu também estava, então sai do quarto e fui ao banheiro, quanto voltei ele não estava mais no quarto.

- Onde ele tinha ido?

- Para um outro quarto.

- Nossa.

- Eu fiquei sabendo disso somente depois. Acontece que no dia seguinte, eu juntei minhas coisas e fui embora sem vê-lo. Não o via na escola e ele nem atendia meus telefonas, quando eu comecei a ficar preocupado e quis me explicar.

- Caraca!

- Só que na semana seguinte, ele foi até minha casa, eu estava no meu quarto e meu pai disse para ele ir lá. Fiquei surpreso em vê-lo. Então....

" - Leandro?

- Marcos? Eu não te esperava.

- Seu pai me disse que você estava aqui e me deixou subir. Eu precisava te ver.

- Marcos, sobre aquela noite, eu te telefonei, eu tentei falar com você que tu...

- Para Leandro. Deixa eu falar primeiro, tudo bem?

- Es...Está bem.

- Eu perdi o meu pai, que era a pessoa mais importante da minha vida. Aquilo que aconteceu foi algo inesperado e no momento errado. Eu sei que você telefonou e eu acredito que você tenha me procurado na escola. Acontece que eu não quis te ver até agora pois eu precisava pensar. Eu precisava entender tudo isso que aconteceu e que está acontecendo comigo. Uma emoção atrás da outra.

- Eu gosto de você, Marcos.

- Eu também, Leandro.

- Não, você não entende. Eu não gosto de você como amigo. Meus sentimento são maiores que amizade.

- Certo. Essa foi uma das ideias que passaram pela minha cabeça e agora que você confirmou o que eu suspeitava e...

- E agora você vai se afastar de mim. Quer saber? Acho que é melhor, pois se você não vai me aceita como sou, eu não quero mais te ver. E mesmo que você me aceite mas não me corresponda, mesmo assim, eu não quero mais te ver, pois não será como antes, já qu...

- Leandro! Para! Para! Deixa eu falar!

- Humf! Está bem.

- Eu perdi meu pai e....e foi muito dolorido. Eu pensei muito em tudo e conclui que eu não quero, não posso e não vou suportar te perder também.

- O que você quer dizer com isso?

- Eu quero dizer que...a gente pode tentar esse lance, essa coisa entre a gente, esse...esse...

- Relacionamento?

- É. Você quer?

- Claro!...Ah, só que....Você se importa em ser escondido? Ninguém sabe sobre mim e....

- Tudo bem! O importante é ficarmos juntos.

- Certo."

- Que lindo!

- E assim começamos a ficar e a namorar.

- Então a ideia de ficar escondido, foi sua?

- Foi. Mas depois precisamos por causa da mãe do Marcos e a mídia.

- Peraí, dessa eu não sabia. Como assim a MÃE DO MARCOS?

- Outra longa história.

- Ainda temos tempo.

- Certo, mas agora vamos sair daqui, estou cansado de shopping.

- Beleza. Vamos para o apartamento, lá ficamos a vontade e longe do shopping.

- Tudo bem.