História de Arianne, em Atlântida, o 13º Capítulo de meu livro
Capítulo XIII – Fome no Tridente
Arianne Enjoy
O Reino Garried, era da voz de Maremon II Garried, o Rei Gordo, das mãos de Lady Mickaela Garried, a Rainha, e de Arianne Enjoy, a Conselheira Direita, e Jommy Samh Ilar, O Conselheiro Esquerdo. Mas não mais do que um reino a mais de um grande império, incrustado no imenso continente. E seu reizinho era um subordinado de um subordinado de um subordinado. E Arianne era subordinada dele, portanto, quem era Arianne? Ninguém.
Lord Garried era inglório e gordo e pouco sabia fazer senão causar em Ari-anne sensações que a desagradavam e que culminavam por ela imaginar ele sendo esmagado por sua enorme pança, ou engasgado pela quantidade de comida que ele consumia. Ela pouco podia fazer senão sentar-se ao lado dele e ouvir-lhe trovejando aos subordinados e servos palavras indizíveis, inveros-símeis e rudes, sendo que ninguém era capaz de desafiá-lo, inclusive Arianne. Ela jamais o confrontaria, pois sabia que uma maré turbulenta de cusparadas e um hálito insuportável haveria de desestabilizá-la. E ainda havia o fedor, subliminarmente escondido sob litros de perfume de Franch que haviam sido derramados sobre os panos reais.
Mas caramba! Nada mais previsível que uma reunião de emergência nas auras do meio-dia. Aquele era o momento em que a fome vinha e se instalava como um pesado manto de couro, sob o qual Arianne Enjoy, a Conselheira, sequer conseguia se locomover, de tão fraca e instável que suas pernas se apresentavam. Estava distante demais da refeição da manhã e, portanto, pró-ximo da sopa quente com legumes e pão que seria servido mais tarde. Próximo sim, mas a reunião poderia não ser tão curta quanto a previsão de Rainha Mic-kaela Garried. E como iria demorar, certamente... Naquele horário era como se cada segundo pesasse o pêndulo para que se mantivesse a lentas badaladas.
E a fome era uma amiga de Arianne. Comidas e bebidas eram servidas ao rei durante todo o dia, mas Arianne, à direita, e Jommy à esquerda, apenas poderiam se alimentar durante as refeições regulares. Segundo Maremon, Ari-anne a Jommy e ele próprio seriam capazes de comer toda a comida do reino caso comessem todo o tempo. Uma mentira, já que Maremon sozinho comeria toda a comida, não fossem as intervenções severas de Lady Garried para que a quantidade de comida fosse balanceada, para suprir a todos. Lord Garried jamais percebera que seus vinhos continham mais água e seus bolos mais farinha que o convencional. Era de se esperar. O maldito do Rei Gordo era invulnerável a detalhes tão tórridos.
E não haveria outro momento para a reunião senão naquele em que Arian-ne mais tinha esperança, aquele que ela agradecia aos Doze pela graça do alimento. O momento mais próximo da maravilhosa sopa de legumes e pão.
Sentada à direita do rei, o maravilhoso cheiro de comida enricava os pelos do nariz e causavam salivação bucal. Mas ela haveria de se manter passiva, apenas recebendo as pesadas mastigadas de Garried como uma forma para que seu estresse se expandisse.
Tomara que o envenenem. Daria tudo para ver Joseph erguendo-se no tro-no., ela pensava, lembrando-se do encantador príncipe Joseph Garried, dois anos mais jovem que ela. Joseph era o segundo filho de Lord Garried, mas o primeiro na linhagem de sucessão ao trono, uma vez que o primogênito Hioria Garried fora levado para Lemúria e sua localização jamais fora documentada, ou mesmo descoberta. O jovem príncipe sequer relatou em sua carta de des-pedida sua vontade de retorno ou não a Atlântida, e tudo assim se mantinha até o momento... Mas Joseph cumpria bem o papel de príncipe às margens do trono, ou não. Ele era galante e emanava para Arianne piscadelas desconcer-tantes justamente em momentos em que esta sussurrava conselhos a seu rei; ainda a persuadia a manter conversas com ele durante momento inoportunos, como os que o rei exigia palavras dos lábios de Arianne. Esta, sabia, estava à mercê das perspicácias de Joseph.
Lady Garried era uma mulher de 36 anos que tinha os cabelos negros como a noite e um corpanzil bem ondulado, porém jovial demais para mulheres de sua idade. Era doce com Arianne e palavras eram ditas com delicadeza, espe-cialmente as que “apenas mulheres dominavam”, ou mesmo coisas que “só Arianne dominava”, como ela dizia.
E ainda tinha Josefine Garried, a Princesa, uma donzela tão austera quanto astuta e que se dizia amiga de Arianne. Aos 14 anos, a menina conseguia cal-cular valores impossíveis e construir engenhocas, como a que martelava com potência uma folha de papel e traduzia, com o uso de tintas, mensagens enviadas por um senhor de Lemúria, a uma distância tão grande quanto Arianne jamais viajaria. E muito provavelmente, um ato comunicativo entre o homem e a máquina de Josefine, era o motivo da reunião às vésperas do almoço, como sempre. Que culpa tinha Arianne Enjoy das ambições e medos de um tal de Roger Ritchess?
Os cabelos de Arianne eram castanhos e ondulavam perfeitamente até a cintura e os olhos negros como as madeixas dos Garried. Suas curvas se deli-neavam bem dentro dos pesados vestidos os quais damas de seu escalão e-ram obrigadas a usar, e que sempre oscilavam de tons entre azul e verde, não mais que isso. E dona de uma beleza surreal, herdada de sua mãe e de uma estranha natureza para a administração, herdada do pai. Arianne tornou-se conselheira direita de Maremon II por ser filha do antigo aduaneiro, Joha Enjoy e por demonstrar domínio sobre decisões políticas extremas. A par de seu pri-mo distante, Jommy Ilar, tornou-se Conselheira Direita aos quinze anos, ele aos dezessete, e substituiu seus pais como conselheira, devido a morte deles havia três anos.
O reino pesava sobre Arianne como uma imensa manta de couro, impossí-vel de sair, pois as mais desnecessárias decisões eram cabíveis a ela, porém nunca lhe era solicitada uma palavra sobre qualquer assunto importante. E ao mesmo tempo, qualquer que fosse o problema, o primeiro nome a ser citado era o de Arianne. Rei Maremon II confiava nela, entretanto nunca lhe dirigia a palavra caso o assunto não fosse das “Coisas que só Arianne dominava”. Mas onde, pacas, inventaram que a moçoila apenas entendia sobre caca de animal e costureiras moribundas? Desta forma, por mais que o estômago de Arianne quase dissesse palavras indizíveis, ela deveria se manter ali, a par do assunto para que quando tudo viesse abaixo, ela no mínimo soubesse dizer por onde tudo havia começado.
E lá estavam. Na sala do Trono da Lula Vermelha, o estandarte Garriediano, onde os estandartes se derramavam do teto para baixo no desenrolar dos pa-nos e exibiam a imensa Lula Negra em fundo marinho, eles se reuniram para receber as informações do mensageiro: o Rei Gordo, Lady Garried, Jommy, Joseph, todos sempre à esquerda de Arianne. Josefine lá deveria estar, a única à direita de Arianne, no entanto não estava.
O mensageiro atravessou as portas duplas que davam acesso ao Trono e dois homens altos vieram em seu vento, tão negramente trajados quanto os olhos de Arianne, e expressavam rostos sombrios. Os sapatos de salto eram ocultos sob os pesados trajes, no entanto ressoaram por todo o salão. O men-sageiro trazia uma bandeja de prata, servida com uma correspondência. Bus-cava, a visível tendência, manter os passos elegantes, exigidos pela aquela sociedade cretina, onde o erro jamais seria visto com bons olhos.
— É honra minha, ser seu mensageiro, ó Grande Senhor Maremon II, o do-no do mar da Lula Negra. Sirvo-lhe com algo de sua veemência — o mensageiro e os homens o reverenciaram, trêmulos como senhores velhos.
O rei resfolegou e deixou cair o pedaço de pão que enchia seus lábios. O cheiro cortou o ar e certamente preencheu os narizes de todos, mas trouxe re-clamações do estômago de Arianne. Também encheu sua boca de água. O rei pegou a carta de sobre a bandeja, com uma dificuldade que causava irritação em Arianne e obrigou o mensageiro a recolher do chão o pão que caíra.
— Vão! Vão! — xingou os homens e os fez partir dali. Mas não o mensagei-ro. Aqueles eram Guardas do mensageiro, em nome a supostas tentativas de intervenção no caminho das correspondências.
Abriu a carta. A cada segundo, sua expressão ia de surpresa a desespero. E de desespero a premonição cataclísmica, senão apocalíptica. Culminou numa quase parada cardíaca. O pão, infelizmente, não entalou as ventas do rei, mas sim caíram ao estômago.
— O senhor Ritchess é de uma ambição grande demais. Mesmo para al-guém como ele isto é um exagero! E isto pode nos prejudicar demais, caso ele insista em não manter em acordo os nossos interesses em comum.
Arianne apenas vira algumas letras, e de relance, e nenhuma conclusão poderia tirar. Mas uma certeza havia: caso o reino viesse abaixo, Arianne seria duramente responsabilizada.
— Senhor, permita-me ler essa pauta, pois...
— Arianne! — rugiu o rei, com censura. — Estes assuntos estão acima do seu encargo, eles devem ser tratados com o Senhor do Tridente. — A carta estaria nas mãos de Joseph dentro de dez ou vinte minutos; mas não nas dela. — Esta pautação envolve muitos riscos.
— Mylorde, eu preciso avaliá-la, como sua mão Direita, em nome de meu posto, eu... — o rei a entrecortou.
— Isto não está entre “Coisas que só Arianne domina”, está além de sua compreensão.
A carta passou pelas mãos de Lady Garried; e de Jommy; e de Joseph. Mas o rei impedia Arianne de ler a maldita da carta. Eis que então, Arianne se le-vantou para ter com Joseph a verdade no interior daquelas letras todas. Mas o rei interveio:
— Senhorita Arianne, não pode abandonar sua posição desta maneira! Ain-da sou um rei que necessita de seus conselhos.
Arianne somente não chorou, pois sabia que o almoço seria servido dentro de uma hora.
A conversa do rei para com o mensageiro se pendurou durante longos mi-nutos, onde o rei mudava o tom de voz a todo instante, e sua barriga gorda também conversava. A de Arianne também dava palpites, porém discretamen-te. Por fim o rei ordenou que fosse redigida uma carta em resposta ao Sr. Rit-chess, e ditou as palavras ao escrivão, que teve de escrever alguns rascunhos, ao desespero. Quando a opinião de Arianne foi solicitada quanto a resposta, Arianne, desnorteada, que não tinha o controle sobre as informações acerca da correspondência de Ritchess, optou por palavras neutras.
O mensageiro saiu, o que destacou os dez minutos restantes para o almoço. A sopa certamente já aguardava os lábios de Arianne, e uma agitação cresceu dentro dela. A felicidade desta moçoila se veio, porém durou pouco tempo demais: senhorita Josefine Garried, a princesa, adentrou o recinto, vinda do interior do castelo. Trazia sua pequena Gandra, o corvo de estimação. O símbolo de sua casa era a Lula Negra, mas a menina optava pelo corvo negro dos Sully, do País do Ferro. Arianne ainda se pergunta onde diabos a menina conseguira aquilo como um animal de estimação.
— Senhor papai — Josefa reverenciou o rei pomposamente e exibiu Gan-dra, presa a uma gaiola. — Gandra e Dutt — o corvo macho — estão comendo algo que lhes fazem mal. Eles estão defecando o triplo do comum.
A fúria de Arianne se elevou quando todos a fitaram sem titubear. Srta Enjoy nunca dera de comer a passarinhos, e, no entanto, eles ainda a definiam como responsável a respeito de assuntos de fezes animais.
— Srta. Arianne Enjoy, essa pauta lhe diz respeito — informou Lady Garri-ed, esquecendo-se que a posição de Arianne arcava mais prestígio que a da rainha.
Eles vão me impedir de ler a maldita da carta e diabos, vão me colocar pra tratar de cocô de passarinho?, o interior de Arianne borbulhava em fúria.
— Sim senhora, o farei — ela se redimiu. — Entretanto, após a minha refei-ção. Estou faminta! — uma risada contida lhe atravessou os lábios.
Todos do salão sorriram com satisfação, mas o rei gargalhou.
A risada de Arianne se esfacelou e sua pele queimou ao ver a carta em po-der de Josefa, senão de Gandra, quando a moçoila a ofereceu, mas a pássara a rejeitou com um bico negro grasnador.
A comida estava de um sabor delicioso, ainda que numa quantidade bem abaixo do suficiente para suprir as necessidades de Arianne. O rei comera quase toda a comida e incluiu nisto os pães e frutas, mas para sua sorte, Lady Garried não comera muito. Caso contrário, Arianne passaria fome durante a tarde novamente.
Após a refeição Arianne se empenhou em descobrir quais alimentos eram dados aos pássaros cagões de Josefa. Obviamente, o resto do resto do resto. O rei comia o melhor e o resto era dado a Arianne e os demais membros da corte. O que sobrava era o resto para os serviçais e demais trabalhadores. O resto, intragável, era o alimento das aves. Neste caso Arianne pouco podia fazer, já que jamais conseguiria controlar as bocadas nervosas do rei para que o “resto”, fosse menos “resto”.
Mas este assunto estava longe de ser o maior enclave de Arianne. A carta do Sr. Ritchess o era e roubou sua paciência e quietude. Necessitava demais de ler o que a carta dizia. E então correu atrás de Josefa, sabendo que pouco arrancaria da princesa.
— Senhorita, tenho assuntos a tratar consigo — sua barriga ronronou. — É sobre a carta do senhor Ritchess. Necessito saber do conteúdo.
Josefa olhou-a com alguma incerteza. A menina metidamente elevou o na-riz, fechou os olhos e desembrenhou a andar. Apesar de inteligente, era esno-be, um reflexo da sociedade.
— Assuntos que no qual não me recordo com exatidão — sentou-se no tou-cador e levou o pente aos cabelos negros. Olhou-a pelo reflexo. — Política, política e política, coisas de homens. Não iria se interessar.
Vou, quando tudo desmoronar sobre mim, Arianne protestou. Seu estômago também, novamente com fome. Saiu dos aposentos de Josefine após se des-pedir, tendo em mente a falta de sensatez da princesa.
Seu príncipe Joseph, o galante, fora o alvo seguinte. O moço haveria de saber o que dizia a diaba da correspondência. Ela adentrou a porta de madeira e invadiu a privacidade de Joseph. Ali estava o belo rapaz, branco como um pedaço de pano imaculado, com grandes concentrações negras em determina-das partes do corpo: no topo da cabeça e no púbis. Um mediano bastão de carne havia aninhado por entre os pelos do púbis e balançava sem pestanejar. Ele estava nu.
Ambos coraram e ela se ausentou rapidamente, sem sequer dizer palavra. Não havia uma que pudesse dizer. Estava demasiado envergonhada.
Fugiu pelos tortuosos corredores usando ambas as mãos para que ergues-sem a pesada saia de sete sedas e revestida com algodão que compunham seu vestido. Quase tropeçou por entre as anáguas, porém se salvou a tempo.
Alcançou a cozinha, uma espécie de ilha mágica, que cheirava a caldos e carnes e decepou as visões horrendas de Arianne. Mas só poderia cheirar. Por mais que o estômago de Arianne clamasse por algo para preenchê-lo conforta-velmente, teria de esperar até o chá. Jamais teria acesso a todos os cozidos e sopas quentes que o rei devoraria dentro de algumas horas, mesmo sendo a Conselheira Direita.
E Jommy ali estava. O maldito que deveria de ser seu companheiro tentava persuadir uma das cozinheiras a ceder-lhe um único prato de sopa de legumes com linguiça de carne de bode. Mas elas eram incessantes e não aceitavam as palavras dele.
— Jommy, você é horrível! — ela gritou e puxou-o pelos braços. — Deveria me ajudar, mas se manter aqui, fazendo coisas inúteis.
— Comer não é inútil, Aria — e riu. — Caso fosse, você não estaria aqui.
— Cale-se! — ela exigiu. — Tenho assuntos a tratar. Vamos abandonar esta bagunça. Há seriedade no que quero te dizer.
Lá fora ela se espevitou e olhou-o nos olhos, que eram verdes e cobertos por cílios longínquos. Jommy tinha o cabelo quase ruivo, mas ainda castanho e algumas sardas bem escassas no rosto. Ele não era tão belo quanto o príncipe Gennir, de Sparta, ou Casmurro, de Sonsão, mas tinha seu charme.
— Jommy, onde está tentando chegar? Sabe que preciso das informações daquela correspondência! Ajude-me a encontrar a carta ou, no mínimo, me esclareça suas palavras.
Jommy fez uma expressão de ousadia que a deixou irritadiça.
— Você é a Conselheira Direita de nosso rei e não leu a carta? Que espécie de Conselheira é você?
— Uma injustiçada de uma conselheira — ela retribuiu, mas com desânimo. Segurou três lágrimas de choro. — Quando tudo ruir eu serei a grande culpada, a Senhora da Discórdia.
— Aria — Jommy tocou-lhe os cabelos ondulados e enfiou ali os dedos que cheiravam a menta. — Lembre-se que você está à direita do rei e que você tem mais capacidade que qualquer outro membro do Conselho Interno ou mesmo deste Reino, quer incluam as casas vassalas ou os nobres. Deveria usar sua voz e fazê-lo reconhecer de sua capacidade, ou exigir que os primeiros passos sejam dados por você.
Jommy se aproximou tanto que forçou seus lábios contra os dela, e Arianne sentiu o sabor macio e úmido da boca dele.
— Jommy, não... — ela hesitava, mas não conteve o beijo.
E ela ergueu parcialmente o vestido, sentindo-o a envolvendo, então elevou a perna direita. Em seguida ele aninhou suas pernas quentes por entre as dela. Enquanto ele a mordia com força no pescoço e subia, o hálito quente chegava à orelha e lhe arrepiava cada pelo. Ela sentiu-se encostando contra a parede, e Jommy se forçava para dentro, mas ela o requeria. Também trouxe palavras.
— Faça aquele rei idiota fazer o que você deseja. Você é a segunda voz mais influente deste reino e deve usar suas palavras. Quanto à carta...
A rainha não se conteve...
— Pelos cinco infernos, onde acreditam que estão?
Arianne abandonou, sem que quisesse, o corpo quente de Jommy e tam-bém seus beijos. Levou alguns segundos para se recompor. Lady Garried os fitava com flamejantes olhos negros e remexia-se toda.
— Senhora, eu... — as palavras abandonaram sua boca. Elas foram parar nas de Jommy, ou não!
— É disto que eu estou falando. Você é mais poderosa que a Rainha, po-rém se redime tão facilmente a ela! — Ele a estava excitando com seu hálito, mas ainda estava falando para Arianne, não para a Rainha.
— Menina, você não deveria permitir que um homem a beijasse dessa ma-neira, num horário destes, e ainda num dos corredores públicos do castelo — A rainha também a censura. Todos, sempre, a censuravam.
A rainha apanhou-a de próximo de Jommy.
— E você — falou para ele —, não ouse usá-la, especialmente desta forma. Seu tarado!
Arianne sentiu-se novamente uma menininha frágil demais. Inocente, inde-cente e sem autonomia, jamais seria uma mulher poderosa, como era Lady Garried. E ainda era como se toda sua astúcia houvesse ido embora em seus gemidos com Jommy.
— Me acompanhe Arianne, preciso conversar com a senhorita.
A rainha tomou-a pelo braço e a levou em direção dos aposentos reais. A passos largos afastou Arianne de um Jommy que esta conselheira jamais havia visto. Guiou-a pelos corredores de Lula Negra, repletos de esculturas de mármore, muitas representando os deuses, mas especialmente Pôseidon, O Deus do Tridente, do mar, polo de Atlântida.
Arianne adentrou o quarto da rainha e viu-se encantada, acolhida pela luz divina do sol que se punha, alaranjada. Mas ali tudo era mais mágico, mais reluzente: todos os ouros que adornavam cada detalhe metálico do requintado ambiente refletiam os raios dourados e iluminava o quarto, era todo ouro. Algo tão lindo de ser ver que a aflição de Arianne, e sua fome se esvaíram aos pou-cos. A cama era imensa, repleta de panos longos e pesados, véus e lençois, que também caíam da tenda superior, de cores Garried como azul e negro, mas também vermelho. Os estofados eram ricos, os toucadores reluzentes com espelhos belamente desenhados, e as janelas imensas.
— Mylady, sua aposenta é bela demais! Nunca antes vi tal riqueza — Arian-ne disse, encantada.
— Senhorita, isto não me é algo inédito de saber. Você jamais esteve aqui, pois seu Maremon II comeria você se o fizesse. Ele come tudo, mesmo! — Ari-anne entendeu a dualidade da afirmação e não conteve uma risada.
— Não tem motivo para rir! — a rainha interveio, de uma seriedade inuma-na. — Seu Maremon II não sabe lidar com a política que este reino exige e quase tudo nos vêm à tona. Quando tudo desmorona, recai sobre mim e sobre você. — Ela finalmente disse as palavras que Arianne tanto sonhou em dizer. Lady se aproximou e tomou as mãos de Arianne. — Minha querida, nós duas teremos de trabalhar juntas, pois seu rei e Jommy são incapazes. Deve saber que as ordens partem de mim, mas seu rei que berra e grita, apenas isto. Você poderia forjá-lo a seu critério, porém assim como todos, teme a fúria do gordo e não ousa desafiá-lo. Arianne, além de mais inteligente é a pessoa mais pode-rosa deste reino, se me entende. E por este motivo que eu a escolhi para esta horda.
A rainha se afastou e mexeu na gaveta do toucador, próximo à cama.
— Senhora, estou em acordo com o que disse, mas estou desentendida.
Voltou-se para Arianne e trouxe consigo um envelope.
— Esta é a carta do senhor Ritchess, de Lemúria.
— Mas eu a vi sendo destruída pela senhorita Josefa e por Gandra.
— Não, você não viu. Ninguém a viu, não a carta original. Aquela carta fora redigida pelo meu melhor escrivão e caligrafista. Ele imitou com perfeita com-plexidade palavras que poderiam ser usadas por Ritchess e postou ali, as mensagens que eu gostaria que todos entendessem.
— Mas, eu... — Arianne não tinha palavras.
— Lembre-se, querida, tenho o controle de todos os serviços executados em nosso reino, inclusive o de correspondências. Jamais que uma carta de suma importância seria creditada a seu rei com tanta facilidade. Minhas palavras foram tão banais que Maremon sequer precisou consultá-la, ou mesmo acreditou que não precisava, apesar de aparente medo quanto ao assunto que ele mostrou.
Arianne sorriu. Encontrou-se frágil diante dos cuidados e da astúcia de Mic-kaela Garried. Seu sorriso se alargou mais, até que a gargalhada visse.
— Quanta destreza, senhora. Estou honrada em ser sua companheira!
— Arianne — ela a censurou e manteve-se cética. — Disse que não tem motivo para rir. Quando ler o enunciado, verá o motivo do meu medo. Sente-se e analise cada palavra, vai querer chorar. Arianne — a rainha olhou-a firme-mente nos olhos —, prepare-se, pois, uma terrível tsunami de fato está por vir. O mal será desencadeado.