[LIVRO] Perfeito para mim. Cap 1
Eu ainda não conseguia acreditar no que o âncora do jornal da noite acabava de dizer com tanta displicência, como se fosse normal... O que de certa forma era, já que coisas deste tipo aconteciam todos os dias nas Grandes cidades, principalmente a nossa terra da garoa. Será que ninguém via o quão grave era aquilo? Presos haviam fugido da cadeia, quer dizer, como deixaram que isso acontecesse? Era totalmente revoltante. Levantei-me daquele sofá e fui diretamente para meu quarto.
Como era possível que depois de tudo quanto ele fez a mim e a minha mãe ele ainda conseguisse fugir? Bateram na porta. Era Rafaela.
Sem pedir licença e sem , ela se jogou na minha cama me abraçando. É, a Rafa era assim mesmo:
- Como você está amiga?
- Eu estou bem, aquele cara não vai ferrar com a minha vida, fica sossegada...
- Ei amiga, aquele cara é seu pai, e você não é tão durona quanto acha que é – ela fazia questão de me lembrar disso a todo momento.
De modo efusivo dei um pulo da cama, chega daquele papo sem pé nem cabeça, chega de pai, chega de tristeza, chega de tudo. Era hora de balançar as coisas.
- E então, o que vamos fazer para aproveitar o dia hoje?!
Era um sábado, o penúltimo antes das férias, as provas finais começariam na próxima semana, o que quer dizer que ainda tínhamos um tempinho antes de começar a esquentar a cabeça com revisões e blá blá blás...
Rafaela sorriu.
- A escolha é sua.
Pensei durantes uns minutos. Helena iria demorar hoje, trabalhava numa escola um pouco longe como secretária, chegava em casa depois das nove da noite todo dia secretária e como estavam prestes a chegar as férias ela ainda tinha muito o que fazer, na certa iria se demorar mais que o normal.
-Festa?
- Pode apostar! – ela tirou o celular do bolso e começou a acessar sua rede social, afinal quem perdia uma festa? Uma boca livre dada por ninguém mais, ninguém menos que a menina que botara uma bomba na escola no semestre passado e havia saído impune?
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Meus pés estavam cansados, havia dançando dez músicas seguidas, e aquilo realmente era cansativo. Sai da pista de dança (o centro da sala) e fui procurar Rafaela, uma missão meio impossível no meio de tantas pessoas, pessoas que aliás eu nem conhecia. Até uma menina do clube de matemática estava por lá, e eu que pensei que ela era promissora!
Fui abrindo passagem no meio das pessoas, que como loucas dançavam, já meio bêbadas, ou então se esfregando uns nos outros pela casa, que não era nada grande pra variar. Fui encontrar a Rafa jogada em um dos sofás, se atacando com um menino do ultimo ano, ou do primeiro? Não sabia ao certo, sei que puxei ela pelo braço interrompendo o beijo.
- O que deu em você?! – sim, ela estava bêbada – Tá doooida?
- Sim, estou... Completamente. E essa festa tá um saco.
- A ideia foi sua – ela já não estava mais brava por eu ter interrompido seu beijo, estava dando em cima de outro. – nem olhe pra mim, isso está o maior barato.
- Claro, você tomou todas.
- Então toma também!
- Quem sabe... – Eu estava angustiada, estava travada, estava triste – Cara, eu preciso mesmo extravasar...
- Quem te impede?! – Um cara estava trocando olhares com ela, mas ele estava acompanhado da namorada.
Eu a encarei furiosa com aquilo, nosso lema era: “ Não faça com os outros o que você não quer para você.” Traduzindo: Não mexa com o namorado das outras.
- Ele tem namorada Rafa!
- Iiih! Você tá uma chata hoje sabia!
- E você uma estupida bebum! – E aquilo nem era xingamento!
Larguei ela ali mesmo na festa, que se dane ela, também já não me importava. O que eu queria mesmo era aprontar todas, era esquecer meu pai e esquecer quem eu era, esquecer minha história. Largar minha vida.
Em frente a minha casa, na outra calçada de modo mais preciso, estavam uns motoqueiros parados conversando, como a observar algo. Eles fumavam sem se importar com nada, e pareciam de maior, aparentavam de vinte a uns vinte e sete anos. Um deles me encarava de forma direta, como se me indagasse, como seu fosse um ser anormal de outro mundo. Senti-me constrangida na hora, quem estava os encarando era eu na verdade. Aos poucos um a um foi roncando seu motor e saindo dali. Sim, eu tinha os espantados. Não acreditava naquilo, no entanto, aquele mesmo continuava a me observar. Eu iria acabar com aquilo agora mesmo.
- O que está procurando? – Disse ao me aproximar, tentei
impor algo de corajoso na minha voz, mas com meu tamanho todo de 1,67, acabou soando meio patético da minha parte, mesmo assim continuei firme.
Ele sorriu de modo surpreso, como se não acreditasse que eu tinha mesmo feito aquilo.
- Bela festa a sua...
- Não é minha. – respondi de pronto. Notei que ele não tinha respondido a minha pergunta.
- Hum, o maior festão e você é a única que não está “alta”... Interessante.
- Nem todos são obrigados a beber... Não é mesmo?
- Talvez... – ele montou em sua moto e ligou o motor, estava com um capacete na mão, mas tinha um na capota de acompanhante.
- Ei! E minha pergunta?
Ele deu de ombros.
- Estava de passagem apenas, algum problema com isso?
- Claro que não. Deveria ter?
-Claro que não.
Colocou o capacete e abriu a janelinha para continuar aquele papo sem fundamento.
- E minha pergunta?
- Você não fez nenhuma... – engasguei – que eu não tenha respondido.
- Okay... E o que você está procurando?!
Eu o encarei, ele tinha a barba por fazer, mas com certeza dava para notar como sua beleza era sensacional, talvez isso tivesse chamado minha atenção. Era negro, com dentes bem feitos, um ótimo físico, seu cabelo era do tipo cortado bem baixinho e seus olhos escuros eram indagadores, pareciam dois buracos negros. Estava de xadrez com calças jeans surradas, e um tênis de cano alto. Seu sorriso era tão sedutor quanto sua covinha.
O que eu estava procurando mesmo? Ah! Eu queria extravasar e era isso mesmo que eu tencionava fazer.
- Uma carona. Quem sabe você não poderia fazer isso por mim.
Ele se inclinou para o lado como para me mostrar o capacete que estava sobrando. Entendi o recado, peguei e encaixei na minha cabeça desmanchando meu rabo de cavalo.
- Vou pedir uma coisa apenas, você pode fazer isso por mim? – disse num tom elevado para que eu ouvisse lá trás.
- Talvez... – Um friozinho na barriga.
- Se agarre com força... – sorriu.
Mas o que ele não sabia era que eu adorava perigo, sempre adorei.