SUNSET: Breaking Down / Capítulo 4 - A Escolha de Nahuel
- 4 – A escolha de Nahuel
Bella's perspective
“Monstro.” eu pensei em voz alta, e antes que desse por mim, todos me encaravam.
Dr. Joham me olhou com olhos insanos – mas antes que ele pudesse me alcançar, Mônica já havia desferido um tapa certeiro em minha face. Ajoelhou-se num milésimo de segundo, me agarrando pelos cabelos e gritando. “Ele é o Pai, o Senhor Criador de todas nós! Se ousardes falar novamente com ele nesse tom, arranco-te a língua!”
Mônica olhou firme nos meus olhos. Fiquei muito confusa com as suas atitudes. O tapa era forte, mas nem de longe o suficiente para me machucar. As palavras eram de fúria, mas meus olhos suplicavam o meu silêncio.
“Eu imploro, perdão, meu senhor.” Jasper já havia se curvado novamente. “Essa vampira é uma recém-nascida, ela age por impulso e não sabe se portar. Eu mesmo me responsabilizarei por discipliná-la depois.”
Parecia que agora eu enxergava tudo em vermelho. Raiva, ódio, veneno. Alice apertou minha mão. Argh! Queria poder fazer alguma coisa, mas Jasper deveria ter uma boa explicação para esse tipo de comportamento. Rebaixando-se assim, falando nesses termos.
“Um verdadeiro líder cuida dos seus com mãos de ferro! Senão os outros o verão como um fraco.” ele sorriu maliciosamente, me puxou pelos cabelos e me levou até a pira, quase enfiando minha cara no fogo.
Eu precisava me controlar! Eu tinha muito mais força que ele, poderia arrancar-lhe o braço, mas isso colocaria toda a missão em risco. A voz de Edward me veio à mente, vívida, nesse momento. “não importa o que aconteça, perder não é mais uma opção.”
“Perdoe-me, senhor. Eu sou tola e indisciplinada, tenho muito o que aprender.” eu supliquei humildemente, encenando arrependimento e culpa.
Dr. Joham riu, puxou o meu queixo, me analisando. Parou por um instante e me levou pelo braço até Nahuel. Sou péssima atriz, mas fui convincente o suficiente para poupar uma chamuscada na face. Vi diversas correntes ao lado dele, onde o demente me aprisionou para fazer companhia a seu filho. Vi que Nahuel continuou de cabeça baixa, ignorando a minha presença.
“Pai, vamos ouvir o que Carlisle tem a dizer.” Mônica falou, chamando a atenção para os outros novamente.
“Sejam breves, não tenho tempo a perder.” Ele respondeu, caminhando com firmeza até eles, e acenando para que todos se levantassem.
“Eu temo pelo seu povo, meu senhor.” Jasper disse, se passando por Carlisle. “Soubemos através de informantes que muitos outros vampiros da guarda dos Volturi estão a caminho. Eles tem grande interesse pela sua pesquisa e pelo seu filho.”
“São todos iguais. Gananciosos e imbecis.” Dr. Joham riu. “Por que acham que eu construí tudo isso ao longo dos séculos em silêncio, no meio da floresta? Eu estou a espera deles há muito tempo.”
Jasper balançou a cabeça e respondeu “Seu reino é vasto, senhor, e sua força, incomensurável. A sua guarda lhe é inteiramente fiel, mas fazes frente a um povo que desconhece a palavra misericórdia. O que tens, eles querem. Aquilo que não puderem levar consigo, eles destruirão. Assim que encontrarem a vila, não restará pedra sobre pedra!”
“Não vamos fugir, não foi para isso que treinei minhas filhas. Elas são guerreiras e vão lutar até o fim para defender o nosso reino. E mesmo que tudo seja destruído, e me levem até minha última criatura, eu recomeçarei de novo e de novo e tantas vezes quantas forem necessárias.” Joham respondeu de pronto.
“Se eles o pegarem, vão executá-lo. Não haverá o que reconstruir, porque aquilo que o senhor fez, e que só senhor sabe fazer, é perigoso demais. Eles vão tentar de todas as formas obtê-lo, e vão destruir o senhor por saber demais” Carlisle tentou intervir junto a Jasper, que já estava cansando de argumentar com ele.
“Assim que todos souberem o que aconteceu aqui, que criaste um exército de filhas guerreiras, os outros vampiros vão fazer o mesmo.” Jasper balançou a cabeça novamente. Ele parecia realmente atordoado.
“Ha! Mas isso não será possível! Eu demorei séculos para aprimorar as minhas pesquisas! Depois de tantos experimentos falidos é que aperfeiçoei a técnica. Somente eu sei como conseguir êxito. Somente eu posso construir um exército de damphyres. Por isso eu sou o Pai, o Criador. E elas obedecem e servem somente a mim.”
De repente, tudo fez sentido. Jasper tinha tanto medo de que suas suspeitas fossem reais, que até o momento havia guardado tudo para si. Por isso também Alice tivera uma crise intensa de dor de cabeça, não importa o quanto ela se esforçasse, não havia como prever o que estava por vir.
“Não sou ingênuo. Antes que qualquer um coloque as mãos sobre as minhas pesquisas, eu destruirei a tudo e a todos... e se eu perecer, vou levar todos comigo.”
“Então deixe que levemos Nahuel conosco.” eu disse por fim, tentando em vão proteger o jovem que um dia salvou minha filha.
Uma fúria azul brilhou dos olhos do doutor. Ele ergueu os braços novamente, reunindo aos poucos as suas filhas no centro da praça.
“Não tenho mais tempo a perder com bobagens. Mônica, abasteça os nossos convidados e os acompanhe até o fim da trilha. Nosso assunto está encerrado.”
Ele entrou numa das barracas de camping. Mônica entrou logo em seguida. Duas jovenzinhas de pouco mais de dez anos trouxeram pequenos roedores e aves em gaiolas e nos ofereceram. Zafrina, que estava muito machucada, pela primeira vez se mexeu, e atacou com voracidade as presas. Ela começou a se regenerar um pouco mais rápido.
Cruzei um oceano, um rio e uma floresta para poder chegar aqui e voltar de mãos vazias. Aquilo era revoltante. E pensar que Nahuel nem mesmo tinha escolha – acorrentado daquele jeito ao pé de um poço fedorento, ele mais parecia um animal do que o guerreiro selvagem que veio nos resgatar.
Queria poder fazer algo por nós, mas a verdade é que eu temia que, se agisse como uma heroína, acabasse metendo os pés pelas mãos. Como a mocinha dos filmes de terror que houve um barulho do lado de fora da casa, e sai com o bastão de basebol nas mãos, só pra ser inutilmente perseguida e estraçalhada pelo assassino do filme.
Cercada assim por mais de cinquenta guerreiras amazonas, minhas forças não poderiam sobrepujar as do seu exército, e se nem os argumentos de Jasper e Carlisle poderiam trazer alguma razão a esse monstro demente, as minhas palavras é que não ajudariam. Eu precisava usar a minha inteligência – ficar atenta e perceber a hora certa de agir.
Cutuquei Nahuel, que sentava prostrado num pedaço de árvore. Ele pegou minhas mãos com gentileza e, suplicando perdão com o olhar, disse muito baixinho para que só eu pudesse ouvir “Desculpe-me Bella. Essa guerra não é sua. Eu coloquei vocês em perigo.”
“Acho que eu entendo, Nahuel. Afinal, eles são a sua família.”
“Você e Edward foram muito mais meu pai e minha mãe em dois meses do que ele foi para mim por trezentos séculos. Eu deveria ter ouvido Edward e jamais ter saído em busca desse lugar.”
Alice urrou de dor, agarrando sua cabeça e se contorcendo nos braços de Jasper, que a segurava aflito.
“Eles estão chegando!” Alice gritou.
A tensão tomou conta de todos. Jasper não conseguia se controlar. Carlisle tentou acalmá-lo em vão. O doutor saiu da cabana como um raio e de pronto já estava no meio da vila.
“Senhor, minha serva teve uma visão.” Jasper gruniu.
“Os guardas... capas pretas... dezenas... por todos os lados. Fogo. Eles querem a cabeça do doutor.”
“Essa é a vidente?” Dr. Joham falou pela primeira vez com Nahuel. Ele apenas confirmou com a cabeça.
“Vamos à luta, minhas filhas! Os anos de espera acabaram! Hoje a Glória da Vitória será nossa!” ele gritou para as jovens que o esperavam com armas em mãos. Eu me perguntei que mal isso poderia fazer a um vampiro. Elas mergulharam rapidamente suas armas no poço fedorento, e uma a uma foram sumindo na mata.
“Mônica, guarde a vila com as mais jovens.” e apontando o dedo para mim e Nahuel, ele continuou “...e livre-se do resto.”
A vila ficou praticamente vazia, com apenas as meninas menores para trás. Antes de sumir na mata, o Dr. Joham disse para Jasper “Assim que voltarmos com os restos deles, vamos fazer uma fogueira maior ainda, para mostrar a você do que minhas pequenas guerreiras são capazes. Assistam ao espetáculo e mandem a minha mensagem para o mundo: que o Joham é o senhor desta terra, e que aqueles que atravessarem o meu caminho serão devorados pelas minhas criaturas. Eu fui expulso do Velho Mundo, agora eu criei um novo reino no Novo Mundo.”
Ele desapareceu num instante mata adentro.
É assustador como um vampiro pode se referir a suas filhas como experimentos, soldados de um exército. Tal o estado de demência deste monstro, para quem nada mais importava senão o poder. Nada de bom resultaria desta viagem – estávamos cercados de damphyres de um lado e de soldados de Volterra do outro. Porque Nahuel nos ajudou em nossa batalha no passado, viemos em seu auxílio desta vez, apenas para sermos pegos desprevenidos em meio a uma guerra que não era nossa.
Eu não ia ficar sentada esperando os capangas de Aro nos pegarem, nem ia deixar essa Mônica dar um fim ao resto. Ela vai sentir a fúria de uma mãe quando eu despedaçar as suas entranhas. Verifiquei meu escudo, ele estava mais forte e vivo do que nunca. Eu podia sentir exatamente tudo o que estava fora e dentro do meu elástico.
“Morda-me.” Mônica disse para Zafrina, que ainda estava caída no chão.
“Obrigada.” Zafrina se apoderou do pulso da jovem.
Pisquei várias vezes. Os meus olhos me pregavam uma peça. Era mesmo real.
“Desculpem-me pelos meus atos. Meu pai é insano, mas o poder dele é muito forte sobre minhas irmãs. Parece que todos vivem em um completo estado de cegueira.”
“O veneno dela não lhe faz mal?” Carlisle não resistiu em perguntar.
“Somos muito mais resistentes ao vosso veneno e ao vosso poder.” Ela desacorrentou os pés de Nahuel, e os meus logo em seguida. A jovem pegou o meu queixo de leve e alisou o meu rosto.
“Perdoe-me se te ofendi, Bella. É um sacrilégio machucar um rosto tão bonito.”
Mônica me olhou no fundo dos olhos e sorriu, me soltando. Ela fora sincera pela primeira vez. Como uma boneca de pano que volta à vida, assim que seu pai foi embora, ela pode agir como ela mesma.
“Vou ligar para o guia vir nos buscar. Mônica, precisamos de uma rota de fuga.”
“Vamos nos preparar para sair. Eu conheço essa floresta como a palma da minha mão.” Ela respondeu.
Nahuel a abraçou, e ela o ajudou a se levantar. Ele parecia muito fraco.
“O que você tem, Nahuel?” Eu precisava perguntar.
“Meu pai queria que eu acasalasse com minhas irmãs, e eu não gostei da ideia. Digamos que ele não gosta de ser contrariado quando dá uma ordem e eu tive de ser disciplinado.” Ele riu.
“Você não reconhece esse cheiro?” Mônica perguntou confusa, como se a resposta fosse mais do que óbvia.
“Quer dizer, o cheiro fétido do poço?” Sinceramente, não sabia o que ela queria me dizer.
“É o cheiro da Morte, Bella. As adagas que usamos contem veneno de sapo e sangue morto. Uma arma não pode ferir um vampiro, mas sangue extraído de um morto pode fazer um belo estrago, e misturado ao veneno ele queima um bocado por dentro.”
“Eu nunca tinha ouvido falar sobre isso” respondi um pouco desconcertada.
Virando-se para os outros, ela continuou. “Se vocês não a treinarem nem para o básico, como esperam que ela sobreviva por conta própria?” Mônica alimentou Nahuel com o seu sangue também.
Pela primeira vez, eu percebi o quanto era cega e despreparada. Achava que quando me transformasse, seria imortal e inquebrável, mas a verdade é que esse mundo escondia muito mais mistérios e perigos que eu imaginava.
Carlisle franziu o cenho, Jasper e Alice se entreolharam. Eles estavam me escondendo alguma coisa esse tempo todo. Talvez por isso eles tenham me mandado aqui, acharam que eu estaria mais segura com eles do que com Edward ou os Denali. Mas como o feitiço vira contra com o feiticeiro, eles não previram que as coisas poderiam se complicar dessa maneira. Eu senti muita raiva de todos.
“O que está acontecendo?” perguntei ainda incerta.
“Não está acontecendo nada.” Jasper respondeu. “Estamos no meio da floresta e temos de voltar de algum jeito. É só. Não há nada o que temer Bella, nós protegeremos você.”
Me proteger? Se eles nem ao menos sabiam como nós sairíamos dali vivos, e Jasper preocupado em me proteger? Aquilo soou muito absurdo. Eu não sou mais uma menininha indefesa! Eu sou uma Cullen!
“Me digam logo de uma vez! Vocês acham que eu não percebi que tudo isso é muito estranho? Separando o grupo, mandando Edward só com Esme para Volterra e nós cinco para buscar uma única pessoa no meio da floresta? Ou vocês erraram muito no cálculo, ou vocês tinham outro plano em mente.”
“Bella, não é bem assim...” Alice tentou me acalmar em vão. Senti o sangue ferver em meu corpo como a muito não sentia.
“Tente entender, Bella. Edward pediu que...”
Carlisle não teve tempo para terminar a frase, eu já tinha arrancado uma árvore do chão e partido ao meio.
“Então é isso? Vocês usaram essa viagem como desculpa para me esconder na floresta? Na verdade vocês não faziam a menor ideia do que se passava aqui até chegarmos a esse ponto! Porque Alice jamais poderia prever o que se passava aqui!”
Jasper me encarava concentrado, mas o seu poder não atravessava o meu escudo. Eu já conhecia esse truque.
“OK. Você quer a verdade?” Jasper perdeu a compostura. “Então lá vai a verdade! Aro quer você em Volterra. Ele quer o seu escudo. O Conselho considerou que a criação de Renesmee, mesmo que acidental, é uma quebra das leis e dos códigos de conduta dos vampiros. Que assim como não é permitido crianças serem mordidas, não é permitido procriar com humanos. E que no caso, quando um vampiro quebra essa lei, tanto criador quanto criatura são condenados à morte.”
“Então Edward foi para Volterra para proteger Renesmee e eu?” As peças desse quebra-cabeça começavam a se encaixar.
“Edward quer fazer um acordo com o Conselho em troca da sua existência e a de Renesmee. Talvez um ou dois século de servidão aos Volturi possam acertar esse débito.”
“Dois séculos? Em Volterra? Edward ao lado de Aro? Mas ele o odeia...” Essa ideia era absurda, eu jamais poderia concordar com isso.
“Edward te ama tanto que poderia servi-los por toda a eternidade se preciso, desde que vocês duas pudessem continuar existindo.”
“Bella, eu vi a decisão do conselho. Aro articulou os seus apoiadores, eles queriam trazer você e Renesmee em custódia para um julgamento. Porque o seu escudo é perigoso demais, eles a querem morta. Renesmee também, porque eles não sabem do que ela será capaz. Aro quer que todos nós sejamos parte da guarda dele, mas Marcus e Caius queriam sentenciá-las à morte porque eles não acreditam que nós iremos escolher juntar-se a eles. Porque somos uma família e nossos laços não podem ser quebrados.” Alice finalmente explicou tudo o tinha visto.
“Edward jamais poderia viver com isso. Aro também quer Nahuel, para poder localizar o seu criador e responsabilizá-lo por ter começado tudo isso. Nós viemos ao Brasil para poder esconder você e Nahuel na Ilha Esme.” Carlisle respondeu.
“Mas eu tive uma visão. Aro agora quer que o doutor entregue as suas pesquisas. Ele não vai tomar nenhuma decisão até que os guardas que ele enviou lhe digam se conseguiram por as mãos em seus experimentos. Talvez, se Aro conseguir o que veio buscar aqui, nós seremos descartáveis.”
O que Alice me contou finalmente esclareceu as coisas. Então todo esse tempo, a única razão para eles virem até aqui era se certificarem que eu permaneceria escondida, mesmo contra a minha vontade. Porque eu jamais aceitaria esse tipo de acordo.
Senti minhas forças se esvaírem, como se toda a minha alma tivesse sido sugada para fora do meu ser. Essa sentença seria muito dolorosa, para todos nós. Eu achava que quando me tornasse vampira, todos os nossos problemas acabariam, porque eu não seria mais “quebrável”, e viveríamos felizes para sempre. Mas eu era tola demais em acreditar que tal coisa existisse.
Seria uma afronta aos anjos e aos céus pensar que uma pessoa pudesse ser tão infinitamente feliz, perdidos num chalé ao pé da montanha, passando os seus dias calmamente, vivendo em perfeita harmonia e amando plenamente os seus preciosos tesouros, marido, mulher, filha.. e cachorro. Era felicidade demais para uma pessoa só, e portanto um pecado. Sim, acho que era isso que Edward tanto temia – estávamos ficando gananciosos demais, achando que seríamos merecedores de tamanha felicidade.
Deitei no chão e fechei meus olhos. O tempo pareceu se dissolver.
Senti o delicioso gosto de ferro na minha boca – o sangue era fresco e quente, descia meu esôfago e se espalhava por cada célula do meu corpo de pedra. Eu me senti viva e forte outra vez. Quis me levantar, mas eu estava acorrentada. Algo mordeu o meu pulso e bebeu o meu sangue, mas eu não podia ver porque estava vendada. Apurei minha vista e tentei enxergar através da trama do tecido que me cegava. Estava escuro, eu não estava no meu quarto, havia cheiro de terra molhada, mofo. Pude ouvir pequenas criaturas rastejando na parede, era tudo muito estranho.
A criatura largou o meu pulso, depois de beber por bastante tempo. Eu pude sentir a sua presença, o seu coração batendo. Agora as coisas estavam ficando mais claras – eu já conheci esta menina, seu sorriso e seus olhos eram familiares.
“Bella”. Eu murmurei, com o punhado de forças que juntei.
“Durma.” sussurrou a criatura novamente em meu ouvido. Fui lançada novamente à prisão em minha mente, atordoada, acorrentada e à deriva. Como uma pessoa numa queda infinita, eu queria me apegar a alguma coisa novamente para não me perder dentro de mim outra vez. Lembrei-me da imensa raiva que senti a pouco, e o sentimento de desolação e medo. Eu já sabia muito antes de acontecer: eu perderia Edward.
“O que deu nela?” Mônica perguntou, dando tapinhas no meu rosto.
Permaneci de olhos fechados. Eu estava novamente na floresta. O som à minha volta, as vozes, eu estava ali, mas eu sentia como se já não pertencesse ao meu próprio corpo. Não entendia o que acontecia à minha volta.
“Bella, foco! Mônica recebeu um sinal. Algo se aproxima da vila.”
Eu me sentei, apenas observando o que acontecia ao meu redor. Nada daquilo parecia real.
Zafrina e Nahuel espalhavam diesel por toda a vila. As crianças menores da vila preparavam as suas armas no poço fedorento, elas pareciam muito amedrontadas. Carlisle falava no telefone via satélite. Jasper manuseava alguns livros e mapas na cabana do Dr. Joham, enquanto ouvia instruções de Mônica, que falava como uma metralhadora. Explicava processos de produção de damphyres. Mostrava gráficos no notebook em cima de uma mesinha de tubos de alumínio. Alice ajoelhou ao meu lado, repetindo sempre as mesmas palavras “Aquele é o livro que te falei, Bella. Ele é importante.”
“Kanauã já está a caminho. Mudei o ponto de encontro para o local indicado, Mônica.”
“É melhor partimos agora.” Alice completou.
“As meninas menores vão na frente com a Mônica, enquanto Zafrina e Bela vão atrás conosco, despistando qualquer ameaça.” Nahuel completou.
“Vamos queimar a vila. Isso vai criar uma boa confusão.” disse Jasper, já organizando as poucas meninas que restavam na vila.
Eu senti um tremor no chão, seguido de muitos outros. Levantei-me depressa e me pus em guarda. Todos fizeram silêncio. Alguma coisa se aproximava muito rápido de nós.
“Eu e Carlisle vamos checar o perímetro.” Jasper disse antes de desaparecer entre as árvores.
“Bella, me dê o seu sangue!” Mônica disse, colocando as presas de fora e puxando de leve o meu braço.
“Como assim?” Perguntei sem saber como reagir.
Ela queria me morder? Como assim? Aquilo não fazia sentido.
“Vamos Bella, deixe que ela a morda.” Zafrina se intrometeu. “Um damphyre pode compartilhar do poder de um vampiro enquanto o sangue deste correr em suas veias.”
Continuei sem entender, olhando para Mônica esperando alguma coisa.
“Quer dizer que se eu beber o seu sangue, eu vou poder usar o escudo.” A jovem explicou, fincando seus dentes no meu pulso.
Mônica cravou os dentes sem dó, e sugou de mim tudo o que queria. A ferida se fechou logo em seguida. Aos poucos, eu pude sentir a presença de Mônica mais forte, como se a existência dela fosse mais significante do que os outros. Senti também que ela manipulava um escudo de proteção, ainda que sem muito jeito, mas uma bolha elástica de proteção a circundava.
“Como eu uso isso?” Ela perguntou, recolhendo as mochilas do chão.
“Sinta o elástico que te envolve agora. Eu posso vê-lo em você.”
Mônica fechou os olhos e tentou se concentrar.
“Agora, como uma borracha elástica que estica, você pode cobrir a mente das pessoas que desejar.” Eu continuei.
“Nossa! Como você faz isso? Ele parece tão pesado... Dá pra andar enquanto se faz isso?” ela indagou.
“Claro!” eu ri. Nunca tinha ouvido a percepção de outra pessoa sobre os meus poderes. “Bem, fica muito mais fácil quando se está com raiva ou medo.”
Mônica se concentrou com mais força, sem querer ela conseguiu remover os escudos dos outros. Pedi que ela tivesse mais cuidado. Zafrina também estendeu-lhe o pulso e a permitiu que sugasse o seu sangue. Explicou seus poderes de forma muito breve, mas logo fomos interrompidas. Jasper e Carlisle voltaram muito agitados.
“A hora de correr é agora!” gritou Jasper.
O grupo estava pronto para partir, Carlisle começou a guiar. As meninas foram até a beira da mata, mas voltaram para o centro da vila.
“Não podemos deixar a vila sem o comando do mestre.” Mônica disse, olhando para Nahuel.
“Nossa, que história é essa agora?” perguntei irritada. Não tínhamos tempo para isso.
“O nosso criador mandou que protegêssemos a vila com nossas próprias vidas se preciso. Estamos atreladas ao poder do pai. Nós só podemos nos libertar do poder do pai quando achamos um parceiro.” Mônica explicou.
“Vocês são livres. Agora fujam!” Nahuel gritou.
As crianças permaneceram no lugar, preparadas para lutar pela vila.
“Vamos, fujam!” Ele insistiu.
Realmente não havia o que fazer por elas, porque as crianças não iriam contra a vontade que as prendia ao criador. Essa relação criador e criatura era muito mais forte do que a vontade própria delas, assim como marionetes, atadas por laços invisíveis sob o controle de Joham.
“Vão na frente, nós distrairemos s guardas. Sigam até o rio a oito quilômetros a oeste.” Mônica disse.
“Eu não vou deixar você.” Nahuel falou, tomando-a pela mão. “Mônica, eu ordeno que você fuja da vila e salve a sua vida, custe o que custar.”
A jovem acenou com a cabeça, e olhando para trás com uma pontada de dor, despediu-se das meninas. Mônica e Nahuel se puseram a correr pela mata, Jasper com Alice em seguida, e então começamos a fugir pela floresta.
“Mas e o resto das meninas?” Eu gritei.
“Você não tem poderes sobre elas, Bella. Não há nada que nós possamos fazer. Elas vão guardar a vila com a própria vida.” Zafrina me disse, me puxando para si.
Eu a empurrei com toda a força e me livrei dela, fazendo meia-volta - porque era recém-nascida, ela não podia me segurar. Corri com tudo o que eu podia, decidida a levar as meninas comigo. Voltei na vila e tentei carregar a primeira que vi, mas ela se debateu e outras duas vieram ajudá-las. Achei que seria atacada, mas logo algo muito pior aconteceu – de forma tão rápida que fiquei sem reação.
As meninas se viraram e correram na direção oposta. Da mata surgiu Dr. Joham, faltando-lhe um ante-braço. Ele mordeu uma das meninas menores, na esperança de se fortalecer. Isso não foi o suficiente, porque o homem de capuz preto que surgiu por trás lhe cravou as garras nas costas, fazendo barulho de metal arranhado. Logo uma multidão de capuzes e túnicas brancas manchadas de sangue começaram a dançar pela vila, como num balé sincronizado de golpes e evasivas. Haviam pedaços de corpos voando por todos os lados. Uma mão cobriu minha boca e me puxou para trás de uma árvore. Era Zafrina. Estávamos cercadas.
“Você é muito idiota de voltar aqui, Bella.” ela sussurrou. “Quem vai proteger os demais?”
“Eu achei...” Eu não tinha como justificar o que eu fiz. Agi como uma “heroína” e coloquei todos em risco.
Os homens da guarda de Volterra estavam ganhando, eles imobilizaram o doutor, arrancando-lhe as pernas.
“Se vocês não quiserem vê-lo perder a cabeça também, rendam-se.” Gritou um deles.
Reconheci Dimitri. Se ele estava aqui, certamente poderia localizar qualquer um de nós. Eu precisava voltar e proteger os outros. Dr. Joham falou algo num idioma diferente e as meninas se aquietaram.
“O Conselho de Volterra condena Joham Ansgar Holzknecht por traição à Ordem. Por conspirar contra o antigo Rei, por participar ativamente de seu assassinato, por quebrar um antigo tabu e criar um exército de dhampíres, você está sendo sentenciado à pena de morte. Você tem algo a dizer em sua defesa?”
“Então Aro continua brincando de Rei no velho mundo?” Dr. Joham retrucou, levando um murro na cara de um dos capangas que o seguravam.
“Você está valente demais para um vampiro que já perdeu as duas pernas.” Dimitri sorriu.
“Eu estou sendo acusado de traição ao Rei? Por ter participado do seu assassinato? Será que Caius e Marcus se esqueceram que fora o próprio Aro a arquitetar o plano e mexer os peões? Será que eles não se lembram de como chegaram ao trono?” Joham estava testando a paciência deles.
Dimitri acenou para um dos capangas, que o levantou pela cabeça, cravando a sua cara no chão.
“Bem, eu acho que tantos séculos escondido aqui na floresta fizeram mal à sua cabeça.”
“E eu acho que tantos séculos sentado no trono só pioraram as hemorroidas do vosso Rei.” Joham tentou se levantar com dificuldade.
“Tudo bem. Se você insiste em fazer as coisas do jeito difícil, então vamos fazer do seu jeito.”
Com requintes de crueldade, Dimitri arrancou-lhe as presas. Ficar parada ali não ajudaria em nada. Lembrei dos galões de diesel que ficavam ao lado do gerador na cabana do doutor. Como uma lebre, me esgueirei até à barraca, entrando pelo lado de trás. Procurei algo que me ajudasse a iniciar o fogo. Nada nas gavetas, nem nas caixas. Na escrivaninha só haviam o livro de couro marrom do doutor, o notebook e uma bolsa batida de lona. Vasculhei o interior e encontrei um isqueiro.
“Você sabe muito bem o que queremos.” Dimitri voltou a dizer.
“Eu não faço ideia do que isso seja.” Joham riu.
“Talvez você precise de um incentivo melhor.”
Comecei a ouvir o barulho de guinchos sufocados e metal rasgando. Era horrível. As meninas começaram a chorar. Eu queria sair de lá, mas algo me dizia que faltava alguma coisa. Eu havia voltado por um bom motivo: o livro. Ele estava lá, e no meio da confusão, ninguém daria por sua falta. Peguei a bolsa de lona, o notebook e o livro, joguei-a no meu ombro e os levei comigo.
“Você é quem escolhe. Podemos terminar de desmembrar cada uma delas, e depois entregar a sua cabeça numa bandeja de prata ao Conselho, ou então você nos entrega as suas pesquisas.”
Quando pus o pé do lado de fora, vi o terror nos olhos de Zafrina. Algumas damphyres haviam sido desmembradas. Aqueles monstros precisavam ser detidos. Peguei um dos galões do lado do gerador e encharquei a barraca, criando um rastro de diesel pelo chão até Zafrina, atrás das árvores.
“Pois mande a Aro o meu aviso: eu nunca vou me entregar. Eles já me tiraram tudo o que me era precioso, eu não vou dar mais nada a eles. E que ele fique com a minha cabeça como troféu, que eu vou arrancar-lhe os olhos com a boca. Marque bem as minhas palavras.”
Em questão de milésimos de segundos, ateei fogo ao rastro de diesel e puxei Zafrina em direção à rota de fuga. Achei que um dos guardas tinham me visto, mas já era tarde demais. A barraca explodiu em questão de segundos, e nós já estávamos longe dali.
Corremos através das árvores, pulando os troncos caídos à máxima velocidade. Se eles tivessem dado por nossa falta, não estariam muito longe dali. Pude ouvir o barulho de algo muito veloz vindo atrás de nós, como um predador atrás de suas presas. Zafrina falou, enquanto corríamos.
“Vamos cuidar desse para evitar que outros nos sigam.”
Paramos de correr. Zafrina subiu para a copa de uma árvore, eu me agachei e me preparei para o ataque. O guarda abriu um sorriso quando me viu, se posicionou para um pulo certeiro, mas Zafrina foi mais rápida, pegando-o no ar. Eu nunca havia matado ninguém, não sabia como fazê-lo. Imobilizei o guarda por trás, mas gritou bem alto “Bella está aqui”. Zafrina, com muito esforço, arrancou-lhe a cabeça antes que ele pudesse fazer mais estragos.
Nos colocamos a correr novamente, desta vez mais alertas. Nunca havia participado tão de perto de um confronto. Senti vontade de vomitar, mas isso não era mais possível. Temi perder minha humanidade, ou minha alma por isso. Queria chorar ou desmaiar a princípio, mas quando inicial passou, senti-me poderosa, capaz de me defender – de defender minhas família e todos aqueles que eu amo. Mônica tinha razão: eu estava completamente despreparada para poder sobreviver sozinha. Eu precisava me fortalecer mais, me preparar para o imprevisível. Eu tentei me focar na presença de Mônica. Sabia que se conseguisse senti-la, encontraria o caminho até eles.
Encontramos o primeiro guarda caído pelo caminho, sinais de troncos quebrados ao meio e árvores no chão. Fiquei com medo de que eles tivessem sido emboscados pelos Volturis e não tivessem conseguido fugir. Senti o pulso de Mônica mais próximo. Acenei para Zafrina e mudamos de direção. Logo encontramos mais dois guardas pelo caminho, sem cabeça. Estávamos perto.
Zafrina avisou “Temos companhia, Bella.”
“Eu sei que estou no caminho certo. Eu sinto a Mônica.”
Assim que atravessamos uma clareira devastada, com mais cinco guardas mortos, logo cruzamos a margem de um pequeno riacho. Já estávamos correndo há mais de quinze minutos, mas ainda não havíamos alcançado eles. Provavelmente Mônica também sentia a minha presença.
Ouvi o barulho do motor de um avião ao longe. Em meio à floresta, esse é o tipo de barulho que se destaca. Fiquei com medo de que atraísse a atenção errada. “Precisamos acelerar.” eu disse à Zafrina.
Na nossa frente, ouvi um barulho, um vulto se aproximando. Nos preparamos para o ataque: era Nahuel.
“Que susto!” Zafrina gritou.
“Tivemos alguns contratempos, não percebemos tão cedo a vossa falta, mas Mônica disse que vocês estavam a caminho.” Nahuel disse.
“Eu acho que ouvi o avião.” comentei.
“Sim, acabamos nos atrasando demais por causa de alguns guardas no caminho, ainda faltam mais uns dez minutos de corrida, então vamos logo.” ele terminou por dizer.
Nós seguimos correndo atentos, sabíamos que haviam vampiros atrás de nós, portanto todo segundo importava. Jasper, Alice e Mônica estavam correndo em nossa direção, fiquei feliz em vê-los.
“O avião pousou, mas é preciso tempo para levantar vôo.” Alice disse.
“Vocês sabem quantos estão atrás de nós?” Jasper perguntou.
“Meia dúzia, talvez mais.” Zafrina disse. “Mas o guarda que encontramos teve tempo de avisar que Bella estava aqui antes de arrancarmos a sua cabeça.”
“Precisamos de uma distração...” Jasper planejava alguma coisa.
“Vão. E por favor, levem Mônica consigo. Eu vou ficar e criar a distração que vocês precisam.”
“Não, Nahuel! Nós viemos aqui só para buscar você!” Eu gritei. Jamais poderíamos deixá-lo para trás. “Eu não atravessei um continente inteiro para voltar de mãos vazias!”
“Você e Edward foram os pais que eu nunca tive, e Nessie, a irmãzinha que gostaria de ter. Eu jamais permitiria que vocês se machucassem por minha culpa, ou pela loucura de meu pai.” ele respondeu.
“Nós podemos ficar e enfrentar a todos.” Eu sugeri.
“Não, Bella. Os Volturis vieram até aqui para levar Nahuel até Volterra, para que ele recebesse o devido julgamento.” Jasper explicou.
Chegamos à margem do grande Rio Amazonas, a poucos quilômetros, o avião flutuava sobre o rio.
“Não temos tempo Bella.” Alice disse, segurando minha mão.
“Não vá bancar a heroína novamente!” Zafrina me repreendeu.
“Vocês são loucos!” eu gritei. Será que eles não percebiam a grande besteira que estavam falando? “Quando nós precisamos, Nahuel veio até nós e nos salvou da batalha em Forks. E agora? Vamos abandoná-lo no meio da floresta e deixá-lo ser destruído pelos Volturi? Não! O que nós somos afinal? Precisamos lutar unidos!”
Nahuel começou a desacelerar, mas eu segurei firme a sua mão. Jamais o deixaria para trás assim.
“Obrigado por tudo, Bella, mas esta é a minha decisão. Assim como você veio aqui por mim, deixe que eu me vá por você.”
“Não...” eu supliquei.
“Vocês me ensinaram que nessa eternidade vazia, a família e o amor são as coisas mais importantes. Só assim, nós monstros conseguimos manter a nossa humanidade. Proteja a sua família, Bella. Por mim, para que eu possa viver e morrer com honra e com a minha humanidade.”
Eu sabia o que ele queria dizer. Depois de quase trezentos anos vagando pelas florestas apenas com sua tia, o que o mantivera humano fora o laço com Huilen. Essa era a sua sabedoria. Ele apertou minha mão com força, depois se soltou. Olhei para trás por um instante, ele já havia ficado para trás.
Mônica desceu do avião, vindo em direção a nós. Não consegui olhar nos seus olhos, mas ela me deu um abraço leve e rápido, antes de continuar. Pude ouvir Nahuel gritar logo atrás de nós.
“Mônica, volte para o avião.”
“Esse é o meu reino. Aqui é o meu lugar.” Mônica respondeu.
Subimos no avião, que já estava em movimento. Ele andou pelas águas até pegar velocidade, sobrevoou baixinho o rio até pegar altitude. Pude ver pela janelinha de trás Os dois guerreiros lutando com todas as forças contra os invasores de suas terras. De repente, saíram do rio diversos jacarés-meio-homens, que atacaram os encapuzados. Os guardiões da floresta chegaram a tempo de interceder pelos dois. Parecia uma luta sem fim, mas estávamos longe demais, e eu já não podia acompanhar pela janela o final desta história.
Lembro apenas de Alice me abraçando, e eu fechando os olhos, com uma imensa vontade de chorar.
** CONFIRA OS PRÓXIMOS CAPÍTULOS EM "TEXTOS" ABAIXO **
N.A.: Consegui um local para postar que permite a formatação original do texto. Se for do seu interesse, continue lendo em:
https://www.fanfiction.com.br/historia/206822/Sunset_Breaking_Down