Vivendo em um engano

Alguma hora da noite, em algum lugar de Minhas Gerais.

Minha vida não era MARAVILHOSA, mas eu conseguia levar. Agora, ai meu Deus, agora eu não sei mais o que fazer. Não acredito que tudo isso está acontecendo, é impossível.

- IMPOSSÍVEL!

Não importa se eu gritar ou pensar que é impossível, eu não vou acordar na minha cama amanhã, preciso admitir que é a mais pura realidade, eles cometeram um engano e agora eu estou vivendo em um engano. Quando será que tudo isso vai acabar? Daqui 12 anos, foi o que me disseram. "Que bom, passa rapidinho, melhor do que 20 anos", aquele cara imbecil, como ele pôde me dizer isso? Claro que ele pôde, não é ele que vai perder a vida trancado.

Precisava ter bom comportamento, mas agora?! Aaaaaaaaaaaah! EU ODEIO ISSO TUDO QUE ESTÁ ACONTECENDO!

- EU ODEIO!!!!!

Tinha tantos problemas, então isto aconteceu, minha vida está de cabeça para baixo, o Sol cada vez mais quadrado, agora nem tanto, afinal estou em um lugar qualquer de Minas, em alguma hora da noite, logo não há Sol, nem quadrado e nem redondo. Ai, só me resta rezar para que nada de ruim aconteça, afinal estou perdida.

CAPÍTULO 1

Minhas Gerais! Como é bom estar longe de São Paulo. Como é bom estar longe daquelas pessoas que dizem ser minha família. Eu não devia ter ido para lá, mas aquela mulher que diz ser minha mãe me ligou, sua voz tinha um tom de raiva.

- Seu pai está doente, você não vem para São Paulo, não?

- Ele está doente?

- Não foi o que acabei de dizer? Olha aqui Amélia, ou você vem para cá ver seu pai, ou você esquece que tem família.

Preferia a segunda opção, afinal eu não tenho mesmo, eles me tratavam como uma empregada quando eu morava com lá. Mesmo com todos os problemas que eles me davam, eu fui até São Paulo, precisava ver aquele homem, afinal ele me criou, era o máximo que eu podia fazer, ir vê-lo no hospital.

Uma semana, foi o máximo que eu fiquei com a família Melo, eles são terríveis, me chamaram lá porque o senhor Melo sofreu um derrame, então descobriram que ele tinha uma doença e precisa fazer transfusão de sangue, assim fui chamada para doar o meu, quem manda ser doadora universal e contar para a família? Na época que eu contei, achava que eles gostavam de mim, hoje vejo que me adotaram para ter uma empregada gratuita em casa.

Meu nome é Amélia de Melo, tenho 23 anos, não sou formada em nada, pois quando conheci o mundo da faculdade, quando fiquei sabendo que ela existia, eu cometi a burrada de contar para minha suposta família, a minha suposta mãe passou a mão no meu cabelo, olhou em meus olhos e disse ironicamente:

- Ah querida, faculdade não é para pessoas que são largadas para adoção, sua mãe já te deixou na Casa das Meninas para você nem saber que essa coisa existe. Você teve sorte desta família te encontrar e te dar o que comer, te dar escola até o ensino médio, entre outras coisa que pessoas normais têm. Se acostume, você nasceu para trabalhar como faxineira, empregada, no máximo coletora de lixo na rua, para não dizer que você não tem um opção de carteira assinada. Agora vá, e agradeça à Deus por você ter a gente, senão sua única opção seria ser prostituta, o que não é legal, não é mesmo?

Eu tinha 17 anos, ter ouvido aquilo poderia me tornar em uma pessoa amargurada, mas não, eu simplesmente dei uma sorriso irônico para o conselho irônico dela e comecei a planejar o meu plano de vida, percebi que sabia cozinhar muito bem, então assim que o ensino médio acabou eu arrumei um emprego em um restaurante. Neste trabalho eu permaneci até fazer 22 anos, consegui juntar um pouco de dinheiro mentindo o quanto ganhava para a minha suposta família, pois eles pegavam tudo que eu recebia, diziam que eu precisava contribuir dentro de casa. Enfim, eu consegui juntar um boa quantia e vim para Minas Gerais.

Bairro pacato, calmo, bonito, ar um pouco puro, pelo menos é melhor do que o de São Paulo, assim é onde eu moro em Minas Gerais, é um bairro de Belo Horizonte, um dos poucos bairros com muito verde que existe. Vinte minutos do meu apartamento está o meu emprego, trabalho de confeiteira, amo doces, foi uma indicação do dono do restaurante que eu trabalhava em SP. Moro sozinha, meu prédio é o único do bairro, fico sozinha em casa, mas não tenho problemas com isso.

Amigos eu tenho poucos, na verdade somente um, o dono do restaurante que trabalhava, o nome é Eduardo Brandão, um homem muito legal, sempre me ajudando, ele sabe de tudo da minha vida. Um dia cheguei chorando no emprego, ele viu e começou a conversar comigo, eu nem sabia que ele era o dono, então ficamos amigos, descobrir que ele era o meu patrão não destruiu a nossa amizade. Ele é bem mais velho do que eu, diz que eu me pareço com a filha dele, que faleceu, um bom homem, meu anjo da guarda, é assim que o vejo.

- Onde eu coloquei o meu remédio?

Tenho déficit de atenção, mais um problema que fez minha suposta família me desprezar, no começo nem queriam me pagar terapia, diziam que eu fazia de propósito, que resolveria com bons tapas. Acontece que muita gente não entende isso, precisava de terapias e remédios e só fui ter isso, quando comecei a trabalhar e a me tratar escondido deles.

Sei que tenho muitos problemas, tenho motivos para viver de mal com a vida, para ficar brava, nervosa, carrancuda, etc., mas eu não sou assim, acho até que ter déficit de atenção é bom, porque eu não ficava prestando atenção nas bobeiras que a senhora Melo me dizia. Vivo muito feliz, simples, calma, aproveitando tudo que a vida me dá de oportunidades.

CAPÍTULO 2

- Oi Mel!

- Ah, senhor Brandão, como é bom te vê-lo.

- Já lhe disse para me chamar de Eduardo, Amélia, somos amigos a tanto tempo, não existe formalidade entre a gente.

- Tudo bem senhor...Desculpe, Eduardo. Estou no trabalho, preciso manter respeito com o amigo do dono da confeitaria.

- Então a partir de hoje, você pode me tratar como amigo, mesmo eu sendo o DONO da confeitaria.

- Dono?

- Isso! Eu acabei de assinar os papéis, comprei a confeitaria.

- Nossa senhor Brandão, quer dizer, Eduardo, isto é muito grandioso, maravilhoso, bom! Estou muito feliz por você.

- Obrigado! Sabe Amélia, eu estou cada vez mais crescendo, eu não te contei, mas eu também comprei um restaurante em São Paulo também, na Liberdade. Agora tenho dois restaurantes em São Paulo e uma confeitaria em Minas Gerais.

- Que maravilha! O senhor está mesmo muito feliz, vejo pelos seus olhos.

- É Amélia, eu só queria que a minha família pudesse ver isso. Minha mulher morreu no parto e minha filha, ah, você sabe, ela morreu muito jovem. Estou tendo cada vez mais dinheiro, mas não tenho com quem repartir. Tudo é tão triste as vezes.

- Oh! Não fique assim, o senhor tem a minha amizade, eu sei que não é muito, mas eu serei seu ombro amigo quando o senhor precisar, sempre que o senhor quiser.

- Você é tão boa querida, não sei como você consegue. Por tudo que você passou, se eu estivesse no seu lugar eu já teria estourado.

- Não tenho porque ficar brava, sei aproveitar as maravilhas da vida, como a sua de hoje, temos que comemorar. Já sei!

Fui até a geladeira peguei um pirulito de chocolate e dei para o Eduardo.

- Toma, depois eu coloco o dinheiro no caixa.

- O quê?

- Pega, é meu presente, nossa comemoração. Parabéns!

- Eu aceito, mas como seu patrão novamente, eu te digo para não pagar por isto E a comemoração será na minha casa aqui em Minas Gerais.

- Sua....sua....Me desculpe senhor, mas eu.....Eu não posso aceitar ir até sua casa.

- Ah Amélia, que isso? Você vai sim, você é uma pessoa muito especial, preciso da minha filha ao meu lado. Será uma festa formal, mas pequena, lhe mandarei um vestido e te esperarei as oito, o meu motorista irá te pegar na tua casa.

- Eu não quero incomodar. Amanhã eu preciso trabalhar, acho melhor eu não ir, acho melhor eu....

- Nem mais uma palavra, preciso da minha filha, preciso de você.

Não tinha como eu arranjar desculpas, o senhor Eduardo era muito insistente, enquanto não conseguia o que queria ele não desistia, precisava ir à festa, afinal meu melhor amigo havia dado um passo muito grande em sua vida.

CAPÍTULO 3

Sete e cinquenta o interfone tocou.

- Oi!

- Amélia tem um senhor aqui dizendo que veio te pegar para uma festa.

- Ah, é verdade, já estou terminando de me arrumar, daqui a pouco eu desço.

Estava com a roupa que o senhor Eduardo me dera, era um vestido roxo, trançado atrás e longo, com um bordado de flor da coxa até o pé, muito lindo, elegante e provavelmente caro.

Cheguei até uma casa muito bela e grande, parecia coisa de cinema. Eu nunca tinha ido até a casa do Eduardo em Minas Gerais, nem em São Paulo, será que era do mesmo jeito? Não sei, mas as vezes esse luxo todo que ele apresenta, que ele fala, que ele veste, tudo isso me assusta um pouco.

- Oi Amélia! Estava te esperando, esta festa é chata sem você. Como você está linda, tinha certeza que por trás daquele avental, havia uma bela mulher.

- Obrigada, mas eu estou tão envergonhada, nunca me vesti assim, tão luxuosa.

- Pois se acostume, pois hoje você irá ouvir muito esta frase "você está muito linda".

- Rsrs. Espero que não.

- Venha irei te apresentar a todos.

Conheci muita gente, mas ninguém disse que eu estava muito linda, na verdade não me disseram nada, a não ser um "prazer em conhecê-la" e um olhar dos meus pés a minha cabeça dizendo "você é bem jovem, né?". Pelo que deu a entender de tudo, parece que eles estavam pensando que eu e o Eduardo tínhamos algo, ridículo! Ele é somente meu amigo, não temos nada, as pessoas parecem não acreditar ser possível a amizade entre um homem e uma mulher.

Fui ao banheiro depois de ouvir uma mulher comentando com outra que eu estava de olho no dinheiro do Eduardo. Que horrível, eu não sou desse jeito, esse lugar não é para mim, as pessoas me lembram muito a minha suposta família, todas são más, falsas.

Sai do banheiro e fui procurar o Eduardo. Quero ir embora e preciso de carona, não sei nem onde pego o ônibus. Que bairro será este?

Andei pelo salão inteiro e não encontrei meu amigo, resolvi procurá-lo do lado de fora do salão. Sai para o jardim, chamei pelo senhor Brandão, mas ele não aparecia, fui caminhando, estava muito escuro, mas havia um pouco de luz que vinha de uma luminária um pouco distante do local que eu estava, foi aí eu vi algo que me deixou assustada.

Perto de um chafariz havia um homem e nos pés dele estava um outro indivíduo, caído.

- O que você fez?

O homem não disse nada e saiu correndo. Por impulso, corri em direção ao indivíduo caído no chão e percebi que o desastre era pior do que eu imaginava, o homem no chão era o meu querido amigo Eduardo e ele estava com uma faca enterrada no peito.

- Eduardo! Edu por favor fala comigo, Edu não me deixe! Eduardo por favor, Eduardo! Eu vou te ajudar, você vai ficar bem, por favor fala comigo! Eduardo, Eduardo!

Eu retirei a faca do peito dele, sangue espirrou em mim, talvez fosse uma artéria, não sei, só sei que eu estava perdendo meu amigo.

CAPÍTULO 4

- PARADA, FIQUE PARADA!

- Hã? Ajuda por favor! O Eduardo........Ajudem, por favor!

- Solta a faca!

Não entendi o que estava acontecendo, eu estava ali em cima do Eduardo, abraçando-o, chorando, sofrendo, quando de repente os policiais apareceram, apontavam armas para mim, me mandavam soltar a faca e me afastar.

Joguei a faca no chão, estava assustada, em choque, não conseguia pensar em nada a não ser no corpo do Eduardo na minha frente, todo ensanguentado.

- Qual o seu nome? Responda! Garota me responda: Qual o seu nome?

- Hã?

- Qual o seu nome?

- Amélia, Amélia de Melo.

- Você irá nos acompanhar.

- Mas e o Eduardo?

- Ele está morto, irá ser levado até o hospital.

- Morto?! Não! Eu preciso ir com ele!

- Não, você vem com a gente.

Fui até a delegacia, dei meu depoimento, falei do cara perto dele, da hora que cheguei no local, o que estava fazendo antes de encontrá-lo, etc. Foram muitas perguntas, recolhimento de digitais e nem sei mais o que, acho que fiquei horas na delegacia, pelo menos meu corpo ficou, pois minha mente estava no Eduardo.

No dia seguinte, eu procurei saber do Eduardo, mas não havia notícias, eu fui até a casa dele, tentei achá-la na verdade, pois não lembrava do caminho feito na noite anterior, até que de tanto perguntar consegui alcançar meu objetivo. Contudo, chegar até a casa foi em vão, não tive respostas às minhas perguntas, as pessoas que lá se encontravam me insultaram, disseram que eu era uma caçadora de dinheiro, que minhas lágrimas só significavam fingimento para eles.

Quatro dias depois do ocorrido, o amigo do Eduardo, meu ex-chefe, me ligou, disse que a confeitaria iria continuar fechada, que era melhor eu começar a procurar outro emprego, perguntei sobre o Eduardo, ele disse que a família dele, a irmã por parte da mãe dele, havia feito um velório simples e que ele já tinha sido enterrado.

- Eu não pude me despedir dele, não pude lhe dar um último abraço. Ai, eu conheci a irmã dele na festa, o Eduardo já tinha me falado dele, ela é a única parente viva dele, ela é grotesca e só o procurava para pedir dinheiro, coitado, agora ela irá ficar com tudo dele, provavelmente, irá acabar com a memória do meu falecido amigo.

Uma semana depois, eu estava em casa assistindo a novela da tarde, não tinha nada para fazer, só esperava o retorno dos lugares onde eu entreguei os currículo para poder começar a trabalhar, mas até agora, nada de respostas positivas.

Dindon.

Achei meio estranho, a campainha tocando sem o interfone tocar antes para eu autorizar a subida. Quem será? Olhei no olho mágico, eram policiais, podia ser notícias sobre a morte do Eduardo, será que pegaram o assassino?

- Olá!

- Amélia de Melo?

- Sim, em que posso ajudá-los?

- A senhorita está presa! Queira nos acompanhar.

- Hã? Eu....O quê? Como assim estou presa?

- A senhorita tem o direito de ficar calada, caso decida falar, tudo o que disser poderá ser usado contra você.

- Mas.....Não! Eu não quero ficar calada! Eu não irei com vocês, vocês estão cometendo um engano, eu não posso ser presa, eu não fiz nada!

Entrei em desespero, como assim estava presa, eles não podiam me prender, eu sou inocente independente do crime que estão me acusando. Preciso de ajuda!

Os policias me encostaram na parede, prenderam minhas mãos para trás com algemas e me levaram até a delegacia.

Eles estão cometendo um engano, eu não fiz nada. Eu.....Eu....Ai meu Deus, o que está acontecendo?