Sapos de Papel ( capítulo 3)
(Um pedaço do passado de Olívia que precisamos saber antes de retomarmos a história.)
Olívia sempre se sentiu fazendo parte de um mundo diferente.Por isso, quando era novinha tinha mania de procurar por lugares em que pudesse fugir de seu próprio mundo.
Quando tinha 12 anos recebeu uma permissão dos seus pais, podia sair da escola sozinha e ir a pé para sua aula de dança, que ficava a poucas quadras dali.
Olívia ficou animadíssima. Apesar de já ter 12 anos, era a primeira vez que poderia "sair" para ir à algum lugar sozinha. E o melhor podia fazer isso duas vezes por semana, todas as semanas! Parece uma coisa muito boba, mas para Olívia era uma vitória, uma conquista, era sentir que estava começando a se tornar adolescente!
É claro que nos primeiros dias, fazendo o tão sonhado 'caminho-para-a-aula-de-dança', ela sentia um certo friozinho na barriga, um medinho assim de que algo saísse do planejado, e por isso não ousava desviar um centímetro sequer do caminho ensinado pela mãe.
Mas logo começou a peder o medo e fascinada pela primeira oportunidade de liberdade que tinha, começou a, dígamos, desviar um pouquinho do rumo.
A verdade é que o tempo entre o término da aula da escola e o ínicio da aula de dança, durava duas horas e meia. O caminho durava apenas 20 minutos para ser percorrido, porém antes de sair pra aula de dança a menina almoçava num restaurante bem perto da escola. A mãe ingênua acreditava que a menina demorasse mesmo ás 2 horas restantes para almoçar e conseguia chegar na dança dez minutos antes do horário, para poder se trocar. Mas como já disse era ingenuidade, a menina demorava na verdade menos de uma hora almoçando. Isso porque almoçava sozinha. Em casa sim tinha o costume de demorar quase duas horas almoçando, pois tinha mania de falar mais e comer menos, sempre era ultima a sair da mesa. Só que sozinha não havia com quem conversar , então a comida acabava mais rápido.
Assim depois de passar o medo ela começou a usar sua hora vaga para fazer atalhos longos pelo caminho-da-aula-de-dança.
Começou apenas passeando pelo centro da sua cidade que era pequena, logo passou a conhecer de uma perspectiva livre os lugares que a fazia se sentir longe do seu próprio mundo. Museus, praças, cantinhos esquecidos e a sua preferida a biblioteca pública. Explorar esses lugares no seu "tempo livre" durante o caminho-da-aula-de-dança se tornou um hábito e foi assim que encontrou finalmente 'o seu' lugar.
Ninguém parecia perceber, mas nos fundos da biblioteca existia uma videoteca, que por viver deserta se tornava ainda mais interessante. A videoteca era uma sala cheia de prateleiras de fitas cassetes e um pequeno museu do cinema. Continha peças de máquinas antigas, fotos e várias plaquinhas explicativas. Lá existia também uma mesinha com uma cadeira e uma pequena estante de livros sobre cinema, onde a menina acostumou-se a sentar, só. Sentia-se segura, gostava do silêncio e visitar o local tornou-se um vício.
Entretanto num desses dias ela entrou na videoteca e se deparou com a sua mesinha, que já tinha se tornado sua, ocupada por um menino. Ela arregalou os olhos e soltou um suspiro um pouco chocada. Um pensamento ocorreu na sua cabeça.
''Quem ousa invadir o meu lugar?!''
Na verdade, caiu na realidade de que aquele não era e nunca fora seu lugar e que o garoto tinha todo o direito de estar ali. Mas, quem era ele? Ela não quis saber. A sua única reação foi sair dali imediatamente.
Saiu da biblioteca um pouco atordoada, precisava sentar em algum lugar seguro onde pudesse pensar. Voltou para a rua e no meio do caminho alguém lhe entregou um folheto. Ficou um pouco irritada. Mesmo assim o pegou e finalmente encontrou um lugar para sentar. Uma lanchonete na esquina.
Uma vez sentada na mesa, começou a recaptular a cena da invasão da videoteca e apesar de ela saber que era algo perfeitamente possível e normal se sentiu chateada. Era como se perdesse a posse do seu lugar ideal, era como se alguém tivesse invadido a sí mesma. Mas ao mesmo tempo significava que alguém talvez possuísse os ideais iguais aos dela. O fato é que ela não podia fazer nada só precisava esquecer aqueles sentimentos, foi aí que olhou para o folheto.
Desesperada, confusa, chocada fez sem pensar muito a primeira coisa que lhe passou pela cabeça: transformou aquele simples folheto em um valioso sapo de papel.
Os sentimentos viraram sapo e uma mania nasceu.