Na sua pele. Cap. 27.

N/A: Me desculpem mesmo a demora! Esse capítulo não está o que eu chamaria de bom, mas mesmo assim... Foi o melhor que consegui! Beijos e boa leitura.

POV Daniel

A parede branca de concreto, a um metro da porta da classe em que Belle ainda estudava, estava sustentando o peso das minhas costas. Eu estava apoiado contra ela, de uma forma, que poderia se dizer despojada. E da forma, que eu fazia todos os dias, alguns minutos antes da aula começar. Era onde eu e Belle ficávamos para conversar (e dar uns beijos, óbvio) antes da aula. Não era como se as professoras e as funcionárias gostassem disso, mas como não era proibido, ninguém podia nos impedir. É claro que muitas vezes erámos alvos de olhares curiosos, eu tinha de admitir que, eu e ela erámos o que eu chamaria de populares, mas eu preferia fingir apenas que eles estavam encarando a parede que eu estava encostado, e não nós.

Naquele momento, eu, como sempre, envolvia a cintura da minha Belle, de uma forma fraternal. Ela ainda tinha aquele brilho triste nos olhos extremamente azuis, e isso conseguia me deixar completamente aflito. Estava começando a concluir que ela era a pessoa que eu mais me importava, mesmo no dia anterior eu ter sofrido de um colapso de atraso mental, e ela ter ficado um tantinho mais rebelde. Demorou para eu concluir (pois não era como se a humilde visitinha da ex-amiga dela tivesse ajudado), que isso era provocante e ela continuava sendo a minha Belle, linda, sensível e simpática, a pessoa que eu me apaixonara há alguns meses, que já pareciam ser séculos. Ela repousava delicadamente a cabeça recoberta de longos fios de cabelo loiro, no meu ombro direito. E eu passava, com muita precaução, meus dedos pelo seu cabelo, e descobrindo que por alguma razão, ela usava um novo shampoo. Talvez de chocolate. Gostava mais do outro, mas eu não seria tão insensível ao ponto de comentar isso em voz alta. Gostava de tudo que ela era, e tudo o que ela fazia, independente do que fosse.

E foi enquanto as minhas mãos executavam o processo de alisar o cabelo dela, que eu acabei por desviar, pelo que eu achava ser um único instante, a minha cabeça para o lado esquerdo, apenas para me ajeitar.

O que aconteceu, foi que logo após eu ter feito isso, foi tarde demais.

Eu já não consegui mais desviar a cabeça para o outro lado, e muito menos os olhos. E não, pelo micro segundo que meus olhos se voltaram para o redor, eu definitivamente não era o único que não conseguia desfocar.

Não era exatamente surpreendente.

Não, eu estou mentindo. Foi completamente surpreendente e arrebatador. Mesmo há algumas horas, eu tendo fitado aquele rosto que já me parecia ser algo familiar, vê-lo, novamente, ainda era uma surpresa. E cara, como era. Era impossível associar aquela imagem que eu estava tendo, à uma lembrança interior, do dia em que conheci uma menina atrapalhada, nerd, e apagada, que saiu correndo em desespero, por alguma razão. Simplesmente impossível. O que meus olhos fixavam, era um corpo feminino, de estatura média, parcialmente descoberto, o que, acreditem, para um cara da minha idade já era tentador e mais algumas coisas que não me sinto pervertido o suficiente para descrever em um pensamento. Longos cabelos negros, de alguma forma, já reconhecíveis, deslizavam e balançavam com suavidade contra o corpo da garota. Eram lisos e emanavam um brilho próprio, como se tivessem vida. E seguindo a trilha dos cabelos, era possível chegar ao rosto, onde o maxilar fazia uma combinação perfeita com o queixo e a testa, e as maças rosadas, tornando aqueles traços sutis e belos. Grandes cílios se destacavam, após os delicados supercílios, e finalizavam a beleza de duas pálpebras abertas que deixavam abertas a entrada para um feixe de luz ofuscante, que era os olhos da garota, que eu já nem conseguia arranjar formas de chamar de pirada. Ela estava radiante, mesmo sendo o que vestia, apenas o uniforme básico do colégio e um all star preto. E cada passo seu era totalmente diferente daqueles tropeços que ela deu quando Belle nos apresentou ao que parecia ser tanto tempo. Ela colocava um pé atrás do outro, como uma top model, cheia de confiança.

E ela realmente tinha motivos para ter aquela confiança. Qualquer idiota não perceberia isso. Débora Richelli era capaz de provocar suspiros. Pois é.

Mas ao mesmo tempo que estava estonteado com a visão completamente transformada e linda, do que ela era, imediatamente as conexões do meu cérebro me levaram a memória recente, de Belle com aquele brilho triste nos olhos. O brilho que ela disse ter sido provocado por aquela garota. Uma verdadeira serpente. Sabia que por trás daquele corpo, daquelas camadas graciosas de pele, havia alguém completamente perverso e invejoso. Ops. Mordi o lábio, ao lembrar, com certa aflição, que quando Belle se referira à palavra inveja, ela havia sido acompanhada do meu nome. Lembrei de ela me falando que AQUELA menina me queria para ela.

Isso me deixou louco, confesso.

Só que não poderia ser.

Conforme eu analisava a garota, notei um mínimo detalhe básico em toda aquela produção. Sua pequena mão, estava entrelaçada com uma outra, um pouco maior. E imediatamente, isso me compeliu a analisar o dono da outra mão. Era um garoto. De pele muito branca e cabelos loiro claro, que eu sabia chamar Lucas. E segundos depois de eu analisa-lo, eu o vi beijar delicadamente a testa da Débora, de uma forma, que eu jamais poderia julgar inocente. E ela fechou os olhos quando fez isso, como um sinal de que havia gostado de receber o toque.

Então, se ela realmente gostava de mim porque namoraria outro cara?

Confesso que fiquei um pouco desapontado em pensar que a minha Belle tinha ficado um pouco insana quando disse que aquela garota faria qualquer coisa por mim. Mas, também não importava. Eu jamais corresponderia. Muito pelo contrário. Vê-la me fez lembrar de que precisava trocar umas palavrinhas, nada boas, com ela.

E então, o sinal tocou nos alarmando do início da primeira aula. Resmunguei, internamente. Aquele era o momento que eu me despedia da minha Belle, para irmos assistir aquelas drogas. Ok, eu jamais fui fã de aulas, e tão pouco achava que isso mudaria tão cedo. Tanto que, pelo sinal ter tocado, Belle desencostou a cabeça dos meus ombros, e girou para o outro lado, onde Débora estava, caminhando, aparentemente com inocência, até a porta da classe, que por alguma merda de razão, ficava a um metro de onde nós estavámos.

Definitivamente, isso foi o que eu chamaria de momento de tensão.

E cara, foi tão tenso que Belle imediatamente se desenlaçou de mim, e por um momento eu achei que ela havia parado de respirar. Os olhos dela se encontraram com o de Débora, e ela ficou estática, como se tivesse recebido uma carga elelétrica de alto nível ou como se o ar ao redor dela a tivesse congelado. Olhei para ela, aflito.

-Belle, tudo bem? – Questionei, assim que notei suas reações físicas acentuadas.

Mas não houve resposta. Ela parecia estupefata, bestializada, paralisada diante daquela visão. Devia ser realmente surpreendente encontrar a ex-amiga tão mudada, mas Belle parecia prestes a desmaiar.

Enquanto isso, Débora, caminhava naturalmente, em nossa direção, como se não percebesse os efeitos que tinha causado em nós.

E quando ela se aproximou, Belle ainda desencorajada e tonta para falar alguma coisa, seu nome, involuntariamente escapou dos meus lábios.

-Débora. – Falei. O que soou perfeitamente, como um chamado. Ela parecia que ia continuar, mas então seu olhar brilhante e cinza se recaiu em mim, e eu soube que se naquele momento eu não a tivesse chamado ela simplesmente prosseguiria e entraria na classe.

Mas de alguma, pensamentos impróprios e absurdos, ideias loucas, invadiam minha mente, e me impulsionavam.

Aproximei meus lábios perto do ouvido da minha paralisada Belle, que não desviava os olhos de Débora, com os próprios lábios separados um do outro de espanto, de modo que só ela fosse escutar o que eu fosse dizer.

-Entre na classe. Eu e a sua ex-amiga, temos que conversar. Dar um jeito, lembra? –Eu não soube o que se passou na cabeça dela, e tão pouco achava que ela iria reagir aos meus múrmurios, mas ela fez exatamente o inesperado, e começou a se movimentar até a porta, se afastando cada vez mais alguns centímetros de mim.

Houve um instante, em que ela e Débora ficaram a mínimos centímetros, um instante que foi mais demorado do que eu esperava, e então, ela irrompeu pela porta, ainda sem tirar os olhos da outra. E quando ela fez isso, ainda movido pelas minhas ideias insanas, eu me aproximei da garota, e sem pedir licença, e segurei seu braço.

E como todas as coisas que eu faço aquilo foi uma má ideia. A pele dela era quente, e a minha reagiu ao toque, formigando. Uma batida do meu coração descompassou, danificando todo o resto. Ela ficou incrédula, com meus atos, mas não teve coragem de se manifestar.

Pela segunda vez, tive a impressão de que conhecia perfeitamente bem os olhos dela, como se os tivesse admirado por longas horas no passado.

Bobagem, como sempre.

Dei de ombros.

O corredor estava se esvaziando.

Perfeito.

-Pode falar comigo um instante? – Perguntei, para a garota. Apesar de ter vontade de começar a andar, segurando-a, ainda havia educação em mim.

Ela tinha o direito de querer ficar para assistir a aula. E tive certeza que ela considerou isso por alguns minutos, mas então, somente assentiu para mim.

Eu me compeli a soltar seu braço, embora uma parte de mim não quisesse fazer isso.

-Então me siga. –Afirmei para ela, com um ar instigante, e dei minhas costas, começando a seguir pelo corredor, sem olhar para trás para verificar o estado que Belle se encontrava, ou ver se ela estava realmente me seguindo.

Mas eu conseguia ouvir, em meio a conversa dos alunos, os passos dela acompanhando os meus,

Fui rápido, porque não queria ser interrompido por nenhuma inspetora. Quase corri, para ser mais preciso. Dei graças quando cheguei até a escada, que nos levaria ao segundo andar. Sim, ela ainda continuava atrás de mim. E não sabia porque, mas eu queria mesmo ir até o segundo andar.

Ali era o lugar onde ficavam alguns laboratórios e nossa extensa biblioteca. Eu e Léo já havíamos cabulado a primeira aula uma vez, nos escondendo ali, feito dois idiotas. Tinha sido à algum tempo, mas ainda assim, eu queria ter a esperança de que o segundo andar ainda ficava vazio nos primeiros minutos de aula.

Depois de avançar sobre as escadas, que estavam desertas, sem nenhum aluno ou inspetor, finalmente alcancei o segundo andar. Tão veloz, que achei por um momento que havia deixado Débora, o principal motivo de eu estar indo para lá, para trás.

Mas eu me enganava, porque depois de dois segundos consegui escutar seus passos acelerados.

A enorme porta de mogno da biblioteca reluzia, e parecia ter sido recentemente lustrada. Felizmente, a biblioteca só abriria às 9 horas, o que era bom, considerando eu prezava o ato de ficar sozinho com Débora.

E eu queria me convencer de que não haviam segundas intenções.

Enquanto havia me solidificado, admirando os micro detalhes da porta, pude senti-la me observando.

-Dani? – Ela me perguntou, com sua voz que tilintava de forma melodial.

Quase dei risada. Era como se fossemos íntimos para ela me chamar pelo apelido. É claro que ninguém naquela escola me chamava de Daniel além dos professores, e tinha algumas vezes que eles também me chamavam de Dani.

Mas mesmo assim, ela não era nada de mim.

-Daniel. –Corrigi, controlado por aquele ímpeto idiota.

-Como quiser. –Notei uma nota de desapontamento no tom. Ainda não olhava para ela para averiguar se era isso mesmo. –O que quer comigo? Achei que ontem tivesse deixado bem claro para mim que não queria mais conversas.

E era verdade. Ainda me recordava de como ficara evidentemente surpreso ao vê-la, assim tão linda e misteriosa no meu próprio condomínio. Mas também me recordava o quanto ficara furioso e confuso por ela achar que realmente eu iria confiar nela e acabar com a minha Belle, apenas porque ela dizia que isso era o certo. Chegava a ser patético. Não sabia por que ela dissera aquelas coisas ontem, mas tudo ainda me levava a tosca teoria de Belle sobre ela gostar de mim. Mas não. Não poderia ser.

Além disso, aquela garota merecia uma lição. Independente de quem ela era e de como estava, fora ela, que segundo Belle estava nos difamando e fazendo a minha querida ficar magoada.

-Bem, mudei de opinião. – Pontuei, um tanto ríspido.

Olhei para ela, que parecia um tanto instigada, e então, aproximei-me com velocidade, voltando a pegar em seu braço, e tocá-lo. Arrastei-a então, talvez até violentamente, para a porta da biblioteca. Segurei com minha outra mão o outro braço descoberto dela também, e senti a pele ferver e o sangue esquentar pelo mínimo contato. Uma sensação inusitada.

Mesmo assim, continuei violento e encostei-a contra a porta de mogno, possivelmente machucando-a, porque os detalhes de madeira esculpida poderiam ser dolorosos. Só que ela não pareceu se importar, quando, assim que fiz isso, ela mordeu o lábio inferior. E isso me fez reparar em seus lábios, infelizmente. Eles estavam molhados de saliva e gloss. Pareciam ser perfeitamente desenhados e estavam assim...irresístiveis, naquele instante.

Idiota. Eu era mesmo idiota. Como eu poderia pensar isso de lábios que não eram os da minha namorada?...

Só que seria bobagem me auto-enganar, porque ela os abriu lentamente, e notei que seus dentes eram brancos e bem cuidados, alinhados, e por ali, ela soltou um suspiro. Foi torturante sentir o hálito de framboesa contra o meu rosto. A bolinha preta de seus olhos cinzas se movia, de um lado para o outro, aparentando curiosidade enquanto me observava. E espanto, por eu ter a prensado contra a porta da biblioteca, daquela forma tão ameaçadora. Porém, eu não devia parecer nada ameaçador enquanto analisava os mínimos fragmentos do rosto dela. O que me fez lembrar, que eu estava perdendo o foco.

Ofegamos ao mesmo tempo, e notei, com um certo pânico, que nossos corpos e rostos estavam muito mais próximos do que quando me imaginei tendo aquela conversa com ela. Então, por aquele breve segundo, senti que Belle possivelmente estava certa.

Ela estava louca por mim.

Afastei-me então, um pouco lentamente, mas ainda sem soltar os braços dela, pressionando-os contra a porta para que ela não fugisse (embora eu pouco achasse que ela estava disposta a fugir).

Ela piscou uma vez, e seus olhos TÃO familiares me fizeram afastar ainda mais por receio, apesar de mantê-la encurralada.

Concentrei-me para fazer minha voz sair mais grossa, ameaçadora, e indiferente possível.

-Quem você está achando que é? –Questionei, e felizmente, a voz saiu ríspida, como se eu ignorasse a nossa proximidade estranha a alguns segundos atrás.

Ela ficou sem fala por alguns segundos.

-Er...Débora. –Ela estava nervosa. Muito nervosa.

Uma brisa que circulava pelos corredores bateu em nós, e fez com que o cabelo dela voasse no rosto. Senti os braços dela se moverem para afastar o cabelo, involuntariamente. Mas eles estavam presos por mim. Respirei fundo, mas por alguma razão, senti, e obedeci ao ímpeto que tive, e então desprendi um braço dela, e levei a minha própria mão até o rosto dela. Nunca me senti tão estúpido quanto naquele momento, mas valeu a pena, cara. Valeu a pena sentir a pele do rosto dela, e expulsar, por alguns segundos, os cabelos de lá.

Sabia que não erámos nem um pouco íntimos, e que estava me forçando a ser grosso, ameaçador e ríspido, mas foi como se fossemos quando eu coloquei os cabelos atrás de sua orelha.

Eles tinham um cheiro tão bom. Só que eu não conseguia saber do que. Só tinha a noção de que era tão maravilhoso. Familiar... Era inebriante, e me fazia ficar com vontade de fechar os olhos e enterrar a cabeça em seu pescoço para sentir ainda mais perto esse cheiro que vinha de seus cabelos.

Balancei a cabeça de um lado para o outro. O que estava acontecendo comigo?

Quis me distanciar ainda mais, e conclui que para isso eu tinha de soltá-la. E foi o que eu fiz.

Sabia que ela não fugiria, e então rompi todos os contatos corporais que tínhamos naquele instante.

Fixei-me nela, tentando produzir um olhar mortal.

-A pergunta certa, que eu quis fazer, era: Quem você acha que é para fazer a minha Belle ficar triste? –O pior é que foi sacrificante fazer aquela pergunta. A pergunta que já deveria ter sido feita, destemidamente, há muito tempo.

-Annabelle? Triste? –Ela pareceu-me surpresa.

Falsa.

-Olha aqui, garota. Escuta bem o que eu vou te dizer. É só um aviso. Mas da próxima vez que eu pegar a Belle triste por SUA CAUSA, ou que encontrar você dentro do meu condomínio, eu vou ser forçado a tomar...Medidas mais drásticas do que simplesmente usar palavras. Está me entendendo?

-Não, espera, temos que esclarecer alguns pontos aqui. Por que supostamente, a garota que você chama de Annabelle ficaria triste por MINHA CAUSA?

-Bem... –Eu corei um pouco, pois lembrei exatamente do motivo. Eu. Belle havia me dito que Débora tinha a ameaçado para me largar, porque faria qualquer coisa para me ter para ela. O que me fez ficar decidido a, se isso fosse verdade, jamais consentir com essa ambição. Não que tivesse motivos para consentir... ok, na verdade, ela ficara tentadora há alguns segundos atrás, mas isso era porque eu ainda era um garoto, e ela uma garota atraente. Tinha sido difícil largar a minha antiga mania de ficar com garotas, como ela, por simples diversão. Mas eu não sentia nada por ela. Não era ela que eu amava. Bem, pelo menos era isso que eu achava. -Foi o que ela me disse hoje mais cedo.

Ela revirou os olhos com o que eu disse.

-Eu sei que não adianta eu lhe dizer, mas ainda não sei porque insisto em me cansar. –Franzi o cenho, e ela respirou fundo antes de continuar. -Ela mudou. –Um feixe de luz pareceu iluminá-la enquanto essas duas palavras escaparam de seus lábios. -Não é como se fosse certo confiar em tudo que ela te diz, Daniel.

Quase a mandei me chamar de Dani, porque de certa forma era estranho ser chamado de Daniel, mas então me lembrei que havia sido eu mesmo que pedira para ela me chamar daquela forma.

Aquele vai e vem estava me cansando.

-E por quê eu não confiaria? Por que ela supostamente mudou?! – Inquiri frustrado, embora tivesse a percepção de que ela resposta não viria tão cedo. Não que eu realmente estivesse acreditando nos delírios daquela garota.

-Bem... Eu não posso explicar. –Ela hesitou, encostando-se um pouco mais na porta, e balançando a cabeça, sutilmente, com os olhos recheados de indecisão.

-E eu não posso ficar sem uma explicação. –Contra-ataquei.

Ela deu de ombros.

-Você fala como se fosse o único. Ainda não me disse o possível motivo, para eu tê-la deixado triste. –Ela me rebateu com sagacidade.

Fiquei quase tão estático quanto Annabelle quando vira Débora, com aquele revide. Ok, era uma troca justa ela me explicar o que hipoteticamente havia acontecido e em lugar disso eu contar o que Bells havia me dito a respeito da ex-amiga.

Mas é que, de certa forma, era constrangedor chegar e dizer tudo aquilo, como se eu realmente tivesse acreditado, sem nem desconfiar por um segundo. Contudo, eu estava tão curioso para saber de uma vez porque diabos ela vinha me perseguindo com aquelas afirmações sem sentido, que estava disposto a me sujeitar.

Além disso, eu nunca tivera medo ou vergonha de confrontar uma garota.

-Você sente alguma coisa por mim? –Perguntei, assim na cara dura.

Por alguma razão, todas as palavras que possivelmente ela mantinha guardadas dentro da garganta, ela engoliu de volta. Eu a havia deixado sem fala. Os olhos e os lábios bem abertos de incredulidade. Os punhos se comprimiram, quando ela fechou os dedos na palma da mão e desviou os olhos de mim, embora a minha expressão forçasse-a a me encarar.

-Eu... –Ela parecia derrotada. Confusa. -Eu... –Sem dúvidas, eu havia arrancado-lhe aquelas palavras. E então, não pude evitar. Um sorriso cínico apareceu nos meus lábios. Como era mesmo aquele ditado popular? Ah sim. Quem cala, consente. E apesar de ser tosco, ele sem dúvidas se encaixava muito bem naquela ocasião. Confesso que meu ego subiu uns 1000 metros com aqueles vacilos. -Eu poderia sentir, se não soubesse que você é capaz de ameaçar alguém contra uma porta. –Finalizou, parecendo satisfeita com a resposta. E tinha sido mesmo uma boa resposta para rebater contra mim, mas já não adiantava mais. Ela praticamente havia assumido o que Belle havia me dito ser real, hesitando tanto assim em responder. Se não sentisse nada, responderia logo de cara que não. Aquele “poderia sentir”, também soara demasiado suspeito. E se aquilo realmente era verdade, então comprovava que o que Belle havia dito, sobre as ameaças de Débora para estragar o meu namoro eram autenticas.

Ou seja, ela era culpada. E embora isso enchesse o meu ego, era ridículo e eu tinha que dar um basta.

-Pois é. Ameaço quem eu acho que merece uma ameaça.

Ela tremeu.

-E por acaso merecer, no seu ponto de vista, é por acreditar em todas as baboseiras que uma...-Ela pareceu indecisa sobre encontrar um adjetivo, que indubitavelmente viria a descrever Belle sobre seu ponto de vista. -...Patricinha metida, te diz?

-Ela não é uma patricinha metida! –Irritei-me profundamente com aquelas acusações. Ela realmente achava que tinha moral para falar da minha Belle?! Não, sem dúvidas, não. E Annabelle poderia ser tudo, menos metida. Com exceção de alguns minutos de ontem, ela jamais exibira por aí o quanto era bonita e rica. Ela sempre fora muito humilde, e eu não deixaria ninguém difamar assim a pessoa que eu amava. -Você que é uma vadia, falsa e mentirosa! – Disparei, sem pensar duas vezes.

Ok, tinha soado ofensivo demais, mas era os meus pensamentos em relação à ela naquele momento. Eu era MUITOOOOOOO impulsivo, e nem sequer pensei que poderia deixa-la mal, se ela bem...Realmente sentisse algo por mim.

E quase como se confirmando isso, me senti um pouco culpado quando vi os olhos dela ficarem muito molhados do que antes, apesar de ela não se focar mais em mim.

-E você não está se provando ser quem eu achava que você era! –Ela exclamou como se me condenasse.

Desdenhei a possível incriminação.

-Você fala como se nós nos conhecêssemos a séculos.

-Não. –Ela negou, passando a mão nos olhos antes de olhar novamente para mim. Foi um contato visual muito intenso, assim por dizer. Apesar de ter dito aquelas verdades sobre ela e sentir um pouco de culpa, não conseguia me arrepender, já que ela fizera por merecer aquilo. Mesmo o rímel dela tendo ficado um pouco borrado. -Não era você que eu conhecia. –Ela afirmou, de forma misteriosa. -Me dê licença. –Ela fez o pedido, mas parecia mais uma ordem.

Afastei meu corpo para o lado, liberando a passagem, vencido. Ela avançou, sem pensar duas vezes, mas antes que ela pudesse dar mais de dois passos, eu me manifestei.

-Já está avisada. –Ela paralisou, apenas por um instante, quando ouviu a minha voz. Suas costas enfeitadas pelos cabelos negros era tudo que eu podia enxergar dela. - Da próxima vez em que ousar fazer alguma coisa contra a Belle... Vai ter troco. –Disse, tentando soar ainda mais ameaçador do que antes.

Juro que pude ouvir um soluço quando ela avançou ainda mais rápido, como se um jato de adrenalina tivesse sido lançado por seu corpo, e ela começou a descer as escadas.

Mas talvez eu estivesse ficando louco.

Tudo isso era louco demais!

Respirei fundo. Pelo menos, eu deveria ter falado o suficiente para que ela não fizesse mais nada contra Belle. Se é que ela fazia.

Bem, não haveria nenhum motivo para minha Belle mentir.

Era confuso demais!

Eu me sentia realmente perdido, entre aquela reviravolta de emoções e revelações. Confuso com as palavras e os vacilos dela. Por ela me falar, como se nos conhecêssemos a um bom tempo, fossemos íntimos. Confuso com as atitudes novas da Belle. Confuso com os meus sentimentos. Confuso por eu ainda estar me sentindo culpado por ter xingando Débora. Confuso com aqueles instantes em que eu e aquela garota havíamos ficado tão completamente próximos.

E então, como uma luz, algo em meu interior, finalmente diagnosticou que cheiro era aquele, que sentia tão forte emanando dos cabelos de Débora.

Por alguma razão, agora não me restavam dúvidas, aquele cheiro delicioso que incidira sobre as minhas narinas, tão familiar e inebriante, era o perfume que eu tanto gostava, do antigo shampoo de Annabelle.

Lívia Rodrigues Black
Enviado por Lívia Rodrigues Black em 27/08/2011
Código do texto: T3185197
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