O dia que eu conhecer meu vizinho. Parte 6 - Final.

– Como se faz para convencer alguém que o ama quando nem ao menos sabe sua cor favorita? Seria engraçado se não fosse trágico! – pensava Pan, expressando um risinho desanimado.

A garota voltou para casa arrasada naquela tarde em que não assistiu a nenhuma aula, preferiu matar para não demonstrar o quanto não concordava com nenhum ponto da sua vida naquele momento. Mas as coisas mudaram mais rápido do que ela poderia esperar, para ser mais exato naquela mesma noite quando Alan recebeu em casa um chamado urgente Greg.

– Pai você não pode continuar ajudando o Greg, ele é louco quer dominar as pessoas dessa cidade. Você não vê como elas são esquisitas? Ainda há como impedir que elas fiquem assim pra sempre!

– A única louca aqui é você! O Greg é meu amigo, um cara legal. Você não o conhece, não sabe como esse homem sofreu e se privou de coisas em nome da amizade. Eu vou ajudá-lo a realizar o sonho dele assim como ele ajudou a realizar o meu.

– Ah! Viva o Santo Greg!

– Viva mesmo, porque se não fosse ele a Lílian nunca teria me olhado e você não teria nascido!

– Eu te odeio! Você não sabe de nada realmente, vai destruir nossas vidas! – gritou irritada.

– Quem destrói vidas aqui é você, a minha, a sua e de todos nós! – disse saindo sem querer saber mais nada.

Pan o seguiu pelo gramado e o viu entrar pela porta principal da mansão aberta vorazmente por Greg que a fechou do mesmo modo em seguida. A garota no escuro percorreu as extremidades da casa até que achou na soleira dos fundos a chave para entrar pela cozinha.

Entrou e devagarinho foi se encaminhando para os ruídos que vinham do escritório, eram Greg e Alan confabulando sobre a finalização da fórmula e sua aplicação imediata que aconteceria no dia seguinte assim que o sol nascesse. Pan ficou desesperada, pois sabia que Dylan e Tom nem desconfiavam que os planos de Greg estivessem tão avançados assim. Provavelmente uma precaução contra as intromissões que ele desconfiava que houvesse.

– Eu preciso avisá-lo, preciso falar com Dylan agora mesmo! – sussurrou.

Olhou as escadas que davam para o andar de cima, quando de repente a porta do escritório começou a ranger tornando o barulho que vinha do interior mais forte e um feixe de luz cresceu intensamente vindo de lá. Porém quando os eternos amigos saíram do cômodo não encontraram nem sinal da menina que já estava no andar de cima abrindo a porta que ela achava ser a do quarto de Dylan. Acertou, o garoto estava na cama dormindo o sono dos justos.

Pan finalmente estava a um passo de realizar seu sonho dos últimos meses, chegando lentamente na cabeceira da cama e observando o ser que dormia totalmente coberto, sentindo sua respiração vibrar por entre o edredom. Ia retirando-o com a ponta dos dedos para dar-lhe um beijo relâmpago ao qual não resistiria quando Dylan começou a se mexer.

Não foram necessários mais que alguns segundos para que Pan se jogasse frustrada em baixo da cama. O garoto se levantou e acendeu a luz. Para a surpresa dela pôde ver como era o quarto daquele que ela não conhecia, mas que sonhava com todas as forças conhecer. Ele começou a perambular pelo quarto, colocou no som sua banda favorita, pensando em tudo que estava acontecendo, Pan queria acreditar que em parte Dylan pensava nela também, porém mais uma vez não foi possível ver o seu rosto, cortado na altura que o espelho estava para a cama. Ficou assim por um bom tempo até que barulhos vieram do corredor.

– Dylan é tarde! Pessoas que prestam costumam dormir essa hora, não queremos que os vizinhos saibam a verdade sobre você, não é rapaz? – disse Greg irritando o filho mais uma vez.

– Até porque se saberem você dá um jeito de ser a sua verdade! – respondeu aceitando a provocação.

– Boa noite, Dylan! – disse Greg vitorioso por conseguir o que queria.

Dylan finalmente dormiu e Pan foi se esfregando pelo chão até conseguir sair do quarto, achou arriscado concluir seu desejo original. Mas não demoraria tanto tempo mais para realizá-lo. Voltou para casa, mas a porta estava trancada, posou na varanda de Dylan numa rede onde se fechou.

Os primeiros raios de sol vieram e Pan acordou com eles, já era tarde, Greg e Alan já haviam saído. Ela estava se arrumando meio desnorteada na frente da varanda quando deu de cara com Dylan saindo de casa.

– Acho que eu mandei você ajudar de longe! – disse sonolento num certo tom de deboche.

– Eu sei que disse isso, mas você precisa saber de uma coisa que o Greg está tramando e...

– Não pira garota, você não sabe da missa a metade o Greg é inteligente sim, mas eu e o Tom podemos mais! Nem me conhece!

– Aí homens, sempre se gabando! – pensou Pan revirando os olhos que retornaram para a face escondida de Dylan e reagiram. – Você se acha o sabe tudo, não é? O rei da cocada preta de pura esperança e salvação? Pois eu tenho uma novidade, Greg está muito a frente de vocês. Ele e meu pai pretendem terminar e aplicar a fórmula esta manhã, devem estar fazendo isso agora mesmo enquanto perdemos tempo aqui com as suas convicções de senhor macheza. E quanto a não te conhecer? Sei que você é de sagitário, se pudesse seria um leopardo veloz, sua cor favorita é o azul, adora a arte inovadora de Baskiat, escuta Radio Head e rocks clássicos como The Cure e The Smiths quando quer relaxar e se for realmente igual a Lílian possui lindos cabelos pretos encaracolados nas pontas e olhos de mel tão doces que precisam ser escondidos pra manter a pose de durão sem coração. – terminou Pan quebrando a rudeza de Dylan ao lhe tirar o boné e os óculos enormes.

O momento certo havia chegado, era agora ou nunca, a presa estava abatida depois de tanta luta. Pan foi se aproximando dos olhos vivos de Dylan que cresciam conforme ela os encontrava, a respiração falhando em meio à confusão prestes a acontecer insensata. Lábios nos lábios, hesitação vencida pela confiança que pairou no que deve ter sido a melhor cena de suas vidas marcada pra sempre na varanda da casa de Dylan tingida com os primeiros raios de sol.

Música – Just Like Heaven – The Cure – Tradução.

Me mostre, me mostre, me mostre

Como você faz aquele truque

"O único que me faz gritar", ela disse

"O único que me faz rir", ela disse

E jogou seus braços em volta do meu pescoço

Me mostre como você faz isso

E eu prometo a você, prometo que

Eu fugiria com você

Eu fugiria com você

Você... suave e única

Você... perdida e sozinha

Você... como o paraíso.

Depois disso só houve espaço pra uma palavra.

– Vamos!

Correram para o colégio onde Tom esperava por Dylan todas as manhãs, desceram apressados as escadas do porão temendo não haver mais tempo para impedir Greg. O grandalhão o esperava num canto escuro como fazia sempre até que pulou para luz furioso e surpreso com a presença de Pan.

– Olá Winston, como vai? – perguntou tranquila ao homem desfigurado.

– Winston? Esse morreu há muito tempo, era um fraco ingênuo que implorava por atenção e se deu muito mal por isso. Eu sou o Tom! – respondeu resmungando palavras soltas.

Dylan contou a Tom sobre as descobertas de Pan que foram questionadas depois de pensar um pouco, já que ela omitiu algumas partes vexatórias da noite anterior. Preferiram deixar quieto.

Logo estavam perto do laboratório de Greg e pensavam numa maneira de entrar quando do nada Marylin Mae apareceu disposta a acertar as contas com Pan.

– Vejo que Greg se preparou para o caso de eu querer invadir seu humilde esconderijo! O que ele lhe falou querida? – perguntou Pan a Marylin Mae.

– Nada que eu já não soubesse sobre ser a época de caça as galinhas caipiras. – respondeu a outra comprando a briga.

Dylan e Tom queriam intervir, porém Pan os brecou com um gesto de pare dizendo.

– Eu posso dar conta, vão em frente alguém tem que receber uma lição aqui!

– Têm certeza? – perguntou Dylan.

– Mais seria impossível! Vão logo, Greg está esperando!

Ambos correram para dentro do laboratório enquanto Pan acertava suas contas com Marylin Mae. Lá dentro eles se depararam com a pior visão possível, uma enorme bomba com uma tubulação que levaria água e fumaça para toda a cidade e os afetados ficariam suscetíveis aos mandos e desmandos do criador da invenção quase que de imediato e sem reversão. Ainda puderam ouvir Alan duvidar do feito.

– Greg será que realmente devemos fazer isso? Tá certo, é um suplemento alimentar, porém tem aquela contraindicação de ordenação!

– Não se preocupe ninguém saberá disso jamais! E é pro bem de tantas pessoas que poderão crescer e quem sabe se tornar uma solução para a fome, pra certas doenças e sabe-se mais o quê! Compartilhe comigo esse sonho, por favor, não me abandone de novo cara! – disse Greg colocando as mãos do amigo sob a alavanca que iniciaria o processo.

Nesse momento Dylan apareceu bem no meio do laboratório disposto a tudo para impedi-los.

– Nossa Greg, você nunca para, não é? – indagou segurando uma arma.

– Olá Dylan, chegou bem na hora de presenciar a história sendo feita. Vejo que trouxe um amigo e bem esquisito como você!

– Amigo esse que você conhece muito bem, até antes de eu o conhecer. Mas comigo ele pode ter certeza que é amizade verdadeira, que não será usado como estepe por um tempo até que o titular retorne. Sem ofensas Alan. – ironizou Dylan.

– Do que ele está falando? Quem é esse cara todo retalhado Greg?

– Ninguém que mereça ser citado, só uma das figuras bizarras com quem meu filho costuma andar.

– Chega de rodeios! Eu já estou cansado disso! – gritou Tom com toda a fúria. – Esse respeitoso senhor que você venera Alan não passa de um sujeitinho manipulador ladrão da inteligência alheia que se aproveita das fraquezas dos outros pra conseguir o que quer. Foi assim por você ficar com Lílian quando roubou a fórmula que foi sua criação e deu origem a esse império, dando os créditos ao pobre e carente de companhia Winston.

– Winston? É você? O que aconteceu contigo? – desabou Alan reconhecendo-o.

– Realmente encantador! Vamos todos desabar nossas mágoas, contar as frustrações! Que lindo! Sabe Alan, ele está certo eu tinha um caso com Lílian e ficaria com ela se você não tivesse se intrometido no meio fura olho! Nada mais justo dinheiro por amor, não se pode ter os dois então eu escolhi por você! E quanto a você Dylan, vamos atire, atire no seu pai porque você na verdade não passa de uma criação de genes que eu combinei pra homenagear o amor da minha vida. Eu te entendo se você atirar! – terminou abrindo o jogo e vendo-os se afastar com Dylan tremendo ao segurar o revólver.

– Não consegue, não é? Fraco, eu bem que tentei de todas as formas que pude, mas como a Lílian, no final você não passou de uma decepção!

Tom, Dylan e Alan queriam pegá-lo, porém nessa hora seguranças armados apareceram por entre as portas e os renderam. Greg sentiu-se vitorioso absoluto, comemorando debochado o puxar da alavanca.

– Vocês tentaram, mas só eu venço no final.

Porém, uma voz contrabateu a de Greg nessa resolução.

– Correção, vencia quando não combatia com alguém leigo demais para entender como os loucos funcionam, mas eu sou louca, não é Greg? – era Pan toda desgrenhada aparecendo numa portinhola acima do laboratório com feição de desiquilíbrio.

Ela caiu em cima de Greg que não conseguiu conter a alavanca e colocou nela força total. A máquina não aguentando a pressão iria explodir em minutos, uma luta começou e os seguranças foram rapidamente vencidos, porém as portas foram travadas e nada poderia ser feito, quando Tom teve uma ideia. Jogou Alan, Pan e Dylan pela portinhola ficando apenas com Greg.

– Vamos Greg, vamos ganhar mais um prêmio no inferno! – gritou agarrando Greg que se debateu, mas não conseguiu fugir quando a explosão seguida de chamas destruiu o laboratório por completo.

Depois disso, não houve mais Tom, nem Greg só Alan e Pan que voltaram para River Falls e levaram consigo um novo morador, Dylan. Esse se acostumou à vida no interior facilmente e às vezes observando uma fogueira ele toca sem querer nos dedos de Pan, lhe olha profundamente com olhos de confiança, pois ele tem certeza que a conhece e que ela também o conhece, não só agora, mas também no futuro. Está escrito nas cartas que uma estranha cigana tira na floresta, mas que parece estar tão perto quanto do outro lado das chamas.

Final.

Obrigado por lerem e comentarem essa mini série!! Em breve a substituta de "Ela veste..." totalmente renovada e com muito mais emoção vem aí "Quando o amor chega à noite sem convidar." Sobre o que vocês acham que é? Bjus!!! Fui!!!!