Clara - A Vez de André - VI

Capitulo VI

A VEZ DE ANDRÉ

Enquanto não terminou de ler todo o livro não se aquietou Clara, o livro tratava de um romance mais evoluído, com problemas pessoais e necessidade de busca pela a maturidade para resolver cada um deles, o rapaz havia acertado em cheio na escolha do livro, se encaixava perfeitamente em Clara e a fez ser mais reflexiva, obter mais serenidade e prudência nas decisões que devia tomar em qualquer área da sua vida.

Uma das coisas que Clara teria que fazer de urgente quando chegasse em sua cidade natal era ir ao encontro de Ulisses para comentar sobre o livro tão apetitoso aos olhos da menina, o rapaz esperto e sagaz sabia que essa euforia iria ocorrer e que trataria de ajudar Clara a esquecer a conversa chata que ocorreu as margens do Rare no ano passado. Em contra partida outro fato ocorreu logo após o clima gélido e sem graça de Clara e Ulisses, Anderson surge e discute com Clara, conversa essa que fez a menina pensar, suspirar e ofegar lembrando-se de cada palavra, de cada tom, de cada olhar, do gesto com os lábios, da forma inexpressiva e silenciosa de emitir palavras, era como se passasse uma retrospectiva todo dia na mente de Clara ao se deitar.

Sua consciência acusava constantemente de ter viajado e deixado Anderson e Ulisses para trás. Lembrava-se de muitas vezes quando comentava com o Ulisses sobre o livro, admirava o vocabulário e a beleza que possuía e de como foi bom ter vivido e aprendido com ele, imaginava-se que isso tudo poderia voltar a acontecer, pois, tinha outro livro inteiro para comentar.

Clara tinha certeza que tinha feito a coisa certa mesmo lhe causando dor e arrependimento e pensava às vezes consigo, “tratei o Anderson muito mal, talvez ele nem goste mais de mim, como fui boba” e até chorava, mas de imediato se lembrava da ultima coisa que Anderson tinha falado, “...eu tenho toda a vida pra te esperar como sempre te esperei” e voltava a chorar de novo, mas agora de felicidade, pensar nessa frase era o suficiente para transformar o dia de Clara. Ela sabia que não poderia ter as duas coisas, Ulisses e Anderson não se davam bem, não poderia continuar nessa amizade intima com Ulisses sabendo que ele tem outras intenções e sabendo que Anderson não fosse gostar, e se ficasse com Anderson perderia uma grande amizade e no final das contas colocava a culpa toda em cima de si.

A paciência e tranquilidade reinavam sobre o caráter de Anderson, esperava calmamente a volta de sua amada, pois sentira nas palavras dela algo muito mais que firmeza, muito mais que sinceridade, sentiu de leve uma reciprocidade que havia sido trancada por muitos anos e sabia que aquilo ali não acabaria nunca. Era a sua única força que possuía para suportar os insultos e violências do seu tio. André sempre foi seu amigo, mas Anderson não dava espaço para conversar desses assuntos, o amigo sabia que ele precisava de ajuda então resolveu contar para Carlinha e Jackson sobre o que Anderson passava em casa, obviamente ficaram chocados e a partir daí começaram a entender muitas coisas que até então não faziam sentido.

Os três passaram a dar uma atenção diferenciada a Anderson, inventavam mais passeios, mais festas não sabendo eles que isso só piorava a relação dele com o tio.

Já haviam se passado quatro meses que Clara tinha viajado, era uma noite fria de quinta feira, havia chovido o dia todo, o inverno esse ano não dava folga pra ninguém, mas logo depois da aula dos meninos a chuva tinha passado e combinaram todos de irem a casa da Carlinha tomar um café e ver um filme. Na saída, Carlinha se dirige a Vanessa.

- E ai Vanessa, tudo bom?

- Tudo bem, só esse frio que tá incomodando.

- Então, eu combinei com o pessoal da gente ir lá pra casa tomar alguma coisa quente e ver um filme, ah e o André vai também, agora que são nove e meia, dá tempo, e ai ?

- Hum, não tenho motivos pra recusar, eu vou sim – Respondeu Vanessa com um sorriso enorme no rosto.

- Pois vamos, o Jackson já deve ta lá fora esperando, ele vai levar todos.

Até a casa de Carlinha, André não parava de falar em nenhum momento, todo mundo se acabava de rir de suas piadas, Anderson que é um pouco calado e Vanessa que era nova na turma perderam totalmente a timidez e sorriam mais alto que todo mundo.

Ao chegar em casa, André disse:

- Carlinha mas você não mora aqui, mora?

- Moro sim, me mudei pra cá semana passada, vivo agora com o Jackson e nós queríamos fazer uma surpresa pra vocês.

- Agora só falta o casamento – Disse Vanessa.

- Isso ai será outra surpresa – Respondeu Jackson.

Era uma casa não muito grande, cor azul celeste, garagem e um jardim. A sala era enorme, uma televisão de quarenta e duas polegadas, jogo de sofá na extremidade da sala e um chão repleto de almofadas que todos se deitaram e sentaram a pedido de Jackson.

- Está perto de nos casarmos – Disse Jackson.

- E vamos convidar todos vocês. Vanessa me ajuda na cozinha a fazer o café e um chocolate para comermos com um bolo e uns salgados que fiz hoje à tarde?

- Sim, Claro.

E ficaram os três homens sozinhos na sala conversando sobre Naruto, carros, tecnologia e futebol. Em um momento, Jackson baixou a voz e disse:

- Mudando de assunto, devo confessar, a Vanessa é muito linda, se eu não tivesse com a Carlinha investiria nela com certeza.

- O danado do Anderson já ficou com ela – Disse André.

- Não me adiantou de nada – completou Anderson.

- Também não exagera cara.

- Ela ta sozinha não é? Vou ver o que posso fazer por mim – Disse André com uma cara maliciosa.

- Hahahahha – Gargalhou Jackson numa altura espantosa.

- Meu amor, isso foi você? – Falou alto Carlinha lá da cozinha.

- Foi – Continuou Jackson sorrindo.

- Ta tudo bem com o Jackson, fique tranquila – Falou Anderson.

- O que deu em você cara, pra rir desse jeito?

- Eu e a Carlinha estávamos planejando de unir tu e a Vanessa hoje aqui em casa e você não espera nem o nosso plano entrar em ação, eu tiro meu chapéu pra você André, é isso ai – Disse Jackson com o rosto resplandecendo de orgulho.

- Agora entendi aquelas piadas excessivas no carro – resmungou Anderson.

- Ta aqui pessoal, café e bolo, quem quiser chocolate quente pega lá dentro com a Vanessa – Falou Carlinha entrando na sala.

- Opa, eu quero chocolate quente – respondeu prontamente André.

- Esse André não tem jeito mesmo – falou Anderson balançando a cabeça negativamente.

Para André a ida até a cozinha foi enorme, apesar de serem somente uns onze passos até chegar à cozinha. Começou a sentir um nervosismo e passou a pensar em todas as suas piadas, qual cairia melhor para iniciar um papo com a fabulosa Vanessa. Enquanto estava pensando e pensando ao entrar na cozinha esbarrou de frente com Vanessa que ia trazendo consigo uma bandeja com o chocolate.

- Porque não olha por onde anda rapaz? – falou Vanessa indignada.

- Ei que barulho foi esse? Eu ainda não terminei de pagar essa louça! – Gritou Carlinha lá da sala, mas depois começou a sorrir imaginando o que poderia ter acontecido o que de fato aconteceu.

- Desculpe Vanessa, mas é que quando nós temos um objetivo fazemos de tudo para alcançá-lo e às vezes nem nos importamos com o caminho que trilhamos.

- Não me venha com poesia barata uma hora dessas, rapaz – Disse Vanessa sorrindo.

- Pense pelo o lado bom, você agora tem um ajudante para preparar o outro chocolate.

- Mas se esse ajudante não tivesse vindo pra cá eu não teria de fazer outro chocolate. Você está todo sujo de chocolate, me deixa ver essa camisa, não te queimou?

- Quando nós alcançamos nossos objetivos não nos lembramos de nada de ruim que aconteceu – Disse André olhando para os olhos de Vanessa, que sorriu e pegou uma toalha pra tentar limpar André.

- Essa falação toda por causa de um chocolate?

- Eu sei que você sabe do que eu estou falando e mais chocolate é doce, gostoso e alguns até dizem que é afrodisíaco – Continuou André com o sorriso malicioso.

- Dá é trabalho pra limpar, isso sim – Falou Vanessa esfregando a toalha no colarinho da camisa de André.

- Se sabe que dá trabalho, sabe que essa sujeira não vai sair com uma simples toalha, porque continua esfregando? – respondeu André agora com seriedade nos olhos.

- Pra tirar o excesso e facilitar na hora que sua mãe for lavar – Respondeu Vanessa sorrindo e olhando desfocadamente para o queixo de André. Ergueu mais os olhos e viu as sobrancelhas espessas, os olhos pretos, os cabeços penteados pra cima, mas que deixava cair umas mechas sobre os olhos e logo depois voltou e olhar para o queixo com furo coberto por uma fina barba. André ficou em silencio por alguns segundos e depois disse:

- O que é que eu to fazendo? Eu vim aqui só pegar um chocolate...

- Você veio aqui me infernizar isso sim – falou Vanessa agora olhando fixamente para os olhos de André, que se desequilibrou e acabou caindo contra o peito de André que o mesmo só não caiu de costas por conta da pia.

- Desculpe... quer dizer, culpa sua, se não tivesse se sujado...

- Mas o que foi que você fez de errado?

- Para de brincar comigo André – Vanessa encruzou os braços e baixou a cabeça.

- A Carlinha me paga, ela fez tudo isso aqui de propósito, eu já tinha falado pra ela que eu tava... Ai você vem e fica fazendo isso comigo, brincando com a minha cara.

- Desculpe se eu to te magoando ou deixando pra baixo, mas é que eu percebi uma coisa que me deixou de boca aberta – Falou Andre olhando para o decote de Vanessa.

- Para de me olhar desse jeito

- To falando sério Vanessa – Agora André foca profundamente os olhos da Vanessa – Eu vim pra cá pra fazer outra coisa e me dei conta que preciso fazer outra.

- Eu não sou boba André, essa foi a armação da Carlinha de deixar agente aqui a sós e você veio pegar um chocolate... Ela queria pra gente ficar aqui.

- Não Vanessa. Não estou falando disso, estou falando de outra coisa.

- Então fala o que é?

- Eu vim aqui pra ficar com você, agente se beijar, se abraçar, mas eu to vendo que eu num quero isso – Disse André sério e ao mesmo tempo com cara de bobo.

- Tudo bem André, eu acho que eu te entendendo.

- Não, não Vanessa, eu to percebendo que eu estou completamente apaixonado por você, não isso não é coisa de momento, eu cai na real.

Nesse momento caiu uma lágrima dos olhos de Vanessa, que falou em voz trêmula:

- Pela a primeira vez eu vi você falando sem brincar.

O rapaz deu um passo lento para chegar mais perto da garota e vagarosamente se inclinou para beijá-la, essa lentidão causou de inicio em Vanessa uma frustração, mas quando os lábios se tocaram ela deu um leve gemido, dando a certeza que aquilo ali que eles estavam vivendo não era somente uma coisa de momento.

E se beijaram tanto que perderam a noção do tempo, só pararam quando ouviram a voz de Carlinha lá na sala:

- André! Vanessa! O filme já acabou!

- Culpa sua perdemos o filme – Disse André sorrindo.

- Foi nada – sorriu Vanessa – Vamos que já deve ta tarde.

Chegaram à sala de mãos dadas.

- Pelo o visto vocês estão bem né, os dois melados de chocolate e um sorriso desses na boca – Disse Jackson.

- Carlinha eu devo confessar, tu é de mais – Comentou André.

- O que eu posso fazer? Eu percebi que você tava afim dela e ela tava afim de ti, o que me restava era ajudar.

- Só você mesmo Carlinha, perdemos o filme, mas ganhamos algo muito melhor – disse Vanessa com os olhos brilhando olhando para Andre.

- Só faltou a Clara aqui né Anderson?

- Talvez se ela estivesse aqui, teríamos assistido ao filme todo. Eu não faço nada.

- Do que você ta falando?

- Eu não tenho a atitude do André, deve haver algo de errado em mim.

- A Clara te ama Anderson, ela deve gostar de você exatamente assim como você é – Disse Vanessa consolando.

- Então gente, ta tarde e vocês precisam ir – Disse Carlinha sorrindo.

- Missão cumprida né meu bem? – Disse Jackson.

- Totalmente cumprida – Falou André interrompendo a resposta de Carlinha olhando para Vanessa e beijando-a.

- Ta explicada a garglhada do Jackson quando percebeu que o plano todo ia sair melhor que o combinado – Disse Anderson

A casa do casal ficava perto pra todos, então foram para suas casas caminhando mesmo, André levou Vanessa pra casa e Anderson foi sozinho, obviamente com Clara no pensamento. Por sorte quando ele chegou em casa seu tio já estava dormindo e foi uma noite tranquila.

Foi um episódio e tanto, Carlinha não via a hora de ligar pra Clara e contar todos os detalhes, mas cogitou ao fazer isso porque Vanessa teria entrado no grupo e mesmo estando com André seria complicado ao se relacionar com Clara, acharam, portanto melhor ninguém comentar nada pra ela.

No dia seguinte, de manhã cedo, caia uma chuva fortíssima sobre a cidade, o inverno tinha chegado com tudo esse ano, para Anderson isso não era motivo de ficar na cama até mais tarde. Levantou-se, preparou o café e arrumou a casa, Seu tio ainda não havia acordado e foi a alegria de Anderson, o telefone toca:

- Oi... Sim é ele... Assim que a chuva passar eu vou... Claro... Muito obrigado. – Disse Anderson ao telefone. Foi diretamente para o quarto se arrumar e esperar a chuva passar, pois, começaria o emprego na secretaria da escola ainda no mesmo dia. O rapaz estava sorrindo com as paredes, assoviava, cantava e batia no peito fazendo um ritmo, só de alegria.

A chuva enfim passou e lá foi o rapaz para o seu primeiro dia de trabalho. Foi fácil para ele, já conhecia praticamente todos os funcionários da escola e o trabalho era bem leve, resumia-se em arquivar e protocolar documentos. Passou o dia todo fazendo isso e pela a janela via que o céu estava branco, foi um dia muito nublado qualquer pessoa ficaria o dia todo deitado.

Como estava no inicio das aulas, havia muito trabalho para fazer e em seu primeiro dia de trabalho chegou tarde em casa, só deu tempo de tomar banho e ir para o cursinho, seu tio não estava por ali, pensou o rapaz consigo, “deve ter ido beber de novo” e foi pegar o ônibus às pressas.

No cursinho não dava outro assunto, o primeiro emprego de Anderson, que o mesmo já estava fazendo planos e mais planos com o seu primeiro salário. Carlinha chegou a perguntar:

- Anderson, mas você não tinha pedido um emprego para o Jackson?

- Sim, mas ele não me deu garantia, na escola era algo mais certo.

- E se você for chamado?

- Não sei.

Anderson tinha plena certeza que não seria chamado para trabalhar na Metalvorada e estava muito feliz em seu novo emprego. Sexta feira fria não dava para fazer nada de legal, então marcaram de ser ver todos no domingo, numa lanchonete que havia sido inaugurada recentemente. Anderson foi direto pra casa, seu tio já estava dormindo, fez um lanche rápido na cozinha e foi para o seu quarto.

No sábado, como de costume Anderson acordou cedo para a faxina geral na casa, começou pelo o seu quarto e futuramente para o segundo piso da casa onde tinha apenas o quarto do seu tio, um banheiro e uma varanda, provavelmente deveria estar dormindo, mas pior do que não arrumar o seu quarto era receber uma surra dele por ter arrumado fora do dia de faxina, enfim, pegou os materiais de limpeza e subiu as escadas. Todo o segundo andar da casa exalava um cheiro horrível de bebida, de sujeira e de comida estragada e ao abrir a porta do quarto tomou um susto que o fez arregalar os olhos abrir a boca e logo em seguida tapar a boca e o nariz com a mão. Seu tio estava rígido na cama com a pele azulada, a boca e o nariz coberto por uma espuma amarelada e nos olhos e ouvidos tinha baratas e outros insetos. Anderson agiu com muita coragem, foi em direção ao seu tio com passos desesperados e com o lençol da cama limpou a boca e o nariz, sacudiu e viu que estava completamente duro e saiu correndo de horror e também por não suportar o cheiro que estava ali no ambiente.

Anderson não quis ligar para nenhum dos seus amigos, sabia que o corpo de bombeiros ou emergência não poderiam fazer nada a não ser encaminhar para uma funerária. Ligou imediatamente para a funerária que a qual seu tio pagava. Rapidamente chegaram, fizeram os procedimentos necessários ali mesmo no quarto e fizeram de acordo com o que o tio de Anderson havia pedido, para não velarem, não procurasse ninguém da família, foi diretamente levado para o necrotério, nem vizinhos, nem amigos e colegas de trabalho não souberam, para eles Sr Tito havia simplesmente sumido.

Enquanto os funcionários da funerária trabalhavam na profilaxia do corpo, Anderson ficava ali parado ao pé da escada, paralisado e reflexivo. Pensava ele que tinha agido muito mal em ter deixado seu tio morto por dois dias, que foi bruto e sem coração de nem ao menos ter subido para saber se ele precisava de alguma coisa. A consciência do rapaz pesou mais ainda quando se lembrou de que havia entrado em uma academia de ginástica para ganhar condicionamento físico a fim de enfrentar seu tio e se vingar de tudo que ele já tinha feito.

Aquele momento não foi nada fácil para Anderson, ele se sentiu um pouco culpado pela a morte de seu tio, e agora estava sentindo solidão, pois, era seu único parente que conhecia. Não havia sentido para o rapaz ficar ali dentro daquela casa que agora parecia enorme e sombria, foi para fora da casa e se sentou ali na calçada e passou a chorar, sem soluços ou gemidos, apenas lágrimas escorriam de seus olhos. Depois de alguns minutos por sorte aparece André.

- E ai André – cumprimentou Anderson.

- Porque você ta chorando cara?

- Meu tio morreu e eu não fiz nada.

- Morreu como rapaz? Conta essa historia direito

- Ele morreu em uma crise de cirrose, assim o pessoal da funerária disse. Cara ele tava morto a dois dias e eu não fiz nada! Eu sou um inútil.

- Anderson! Não fale desse jeito, essas coisas acontecem.

- Acontecem sempre na hora errada e do jeito pior possível.

- Eu não sei o que dizer.

- Não precisa dizer nada não, era pra acontecer né? Fazer o que?

Ficaram alguns minutos ainda ali sem silencio total até que André decide chamar Anderson para dormir em sua casa.

- Você vai dormir lá em casa.

- Não cara, eu não quero incomodar.

- Pare de timidez Anderson, quantas vezes você já dormiu aqui em casa? Dorme e depois agente ver o que podemos fazer.

Já era um pouco tarde os pais de André já estava dormindo, se livraram do interrogatório a respeito do tio de Anderson. Apesar de ter se encostado a uma boa cama, o rapaz não conseguiu dormir aquela noite, pensava em seu tio, mesmo ele tendo aquele jeito, era o único da família que Anderson conhecia, não fazia ideia de onde começar a procurar seus outros tios, ou avos e até mãe.

De manha cedo, Anderson parecia um zumbi, já estava com o rosto abatido e os olhos fundos de tanto chorar, completou com olheiras. Os pais de André não fizeram nenhum questionário, afinal, Anderson dormia na casa deles regularmente.

À tarde, Carlinha ligou para Anderson pedindo que ele fosse até a casa dela, chegando lá:

- Anderson você vai ter que aceitar.

- Do que você está falando?

- O André já me contou tudo e ele me falou que você é meio cabeça dura, você está sendo obrigado a morar comigo e o Jackson a partir de hoje, trate logo de pegar as suas coisas e venha para cá.

- Eu não quero incomodar Carlinha, eu já estou trabalhando, posso alugar um quartinho e começar a viver minha vida.

- E seu salário vai ser somente para sua sobrevivência? E os estudos? Não se preocupe. Aqui você terá tudo, casa, cama, roupa lavada e nem reclame, chega de discutir e vá embora pegar suas coisas.

- Ai, ai, ai, vocês hein?

Na realidade não teria opção melhor para Anderson, a casa de Carlinha era ótima e ele não tinha mais ninguém que pudesse lhe oferecer um lugar pra morar. O rapaz se sentiu um pouco confuso, tudo estava acontecendo rápido de mais, ele iria mudar de casa e sem parente algum.

A primeira noite sem o seu tio foi estranha, mesmo ele batendo e humilhando tanto o sobrinho, Anderson sentia uma angustia uma dor, afinal perder um parente nunca foi fácil ainda mais quando é o único. O clima não aliviou, um silencio chato envolvia os moradores da casa, Carlinha e Jackson não quiseram dizer nada, pois, julgaram que Anderson precisava ficar sozinho. Foi um dia longo para o rapaz, ele se lembrava do seu tio constantemente, das surras, dos insultos e ofensas, mas lembrava com amor e isso ele não conseguia interpretar direito e acabava dizendo que a morte do seu tio o havia deixado confuso.

Na segunda feira chuvosa Anderson parecia melhor, decidiu que precisava trabalhar e foi rumo a escola, não quis contar a ninguém sobre a perda do seu tio e fez de tudo para não transparecer a tristeza. Ao meio dia em horário de almoço o rapaz decidiu ir a sua antiga casa pegar algumas coisas que precisava, chegando lá já havia algumas pessoas que seguravam pranchetas nas mãos como se estivessem avaliando a casa.

- Quem são vocês e o que estão fazendo aqui? – perguntou Anderson.

- Seu tio tem muita dívida, talvez a casa e os móveis não deem para quitar elas.

- Mas que tipo de dividas?

- Eu só estou fazendo meu trabalho rapaz, acho bom você pegar o resto de suas coisas e procurar outro lugar pra dormir porque essa casa aqui não pertence mais a família de vocês.

Anderson acabou aceitando, seu tio alem de ser alcoólatra era também viciado em jogos e acabou achando que havia perdido a casa em jogo.

Juntou tudo que era seu dali e deixou na casa do vizinho, mais tarde passaria com Jackson de carro e pegaria.

No celular, à tarde, Anderson recebe uma ligação que mudaria sua vida para sempre:

- Senhor Anderson, por favor, compareça ao departamento de Relações Humanas da Metalvorada às quinze horas e fale com Srta Valdelice para uma entrevista de emprego.

- Sim claro, obrigado, tchau – finalizou Anderson a ligação.

Laercio Miranda
Enviado por Laercio Miranda em 16/05/2011
Código do texto: T2974027
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