Um amor maior que a vida (Cap. 2)

O MENINO DE FORA

A família Bragança e Andrade chegou á cidade de Andorinhas em 1980, pai, mãe e o filho, César, que com um rosto que parecia esculpido por anjos, carisma, inteligência e uma persuasão rara até em adultos conquistou o coração de Beatriz, que tinha apenas cinco anos de idade.

A cidade não era muito grande, e maior parte dos moradores tinha uma excelente condição financeira, Patrício fora um dos poucos que não nascera em berço de ouro, começou abrindo uma pequena venda, que cresceu e se transformou em uma rede nacional de supermercados

Logo todos ficaram íntimos dos Lacarra, Mafalda e Elizabeth se tornaram amigas e Martin se tornou sócio de Patrício, o que fez os negócios das duas famílias crescerem, aumentando suas riquezas e estreitando os laços entre elas.

Eles viajavam juntos nas férias escolares, as duas mães discutiam durante todo o ano sobre a festa de natal, que sempre acontecia na casa dos Bragança,

-Simples, dizia Mafalda em tom irônico, a festa será em minha casa porque ela é maior, mais bonita e tem mais enfeites do que a sua! Eram como uma só família.

Beatriz adorava as festas na casa de César, sempre que podia corria para seu quarto, via os prêmios que o amado conquistara nas artes marciais, os livros que ele gostava de ler, sentia o cheiro de suas roupas e assim tinha certeza de conhecê-lo como ninguém.

César era quatro anos mais velho que ela, alto, tinha os olhos verdes como esmeraldas, o rosto quadrado, lábios perfeitos, quando vi-o pela primeira vez pensou ser um sonho, pois era maravilhoso demais para ser real.

Era véspera de natal, mais uma vez passaria quase toda a noite na casa dele, Beatriz completara 12 anos em setembro.

-Não vejo a hora de crescer, dizia para si mesma, César nunca vai me olhar enquanto pensar que sou criança!

E assim a menina viveu desde seus cinco anos, desejando ser notada, nutrindo um amor platônico que para ela era tão palpável como seus cabelos, que embelezava cirurgicamente todos os dias depois do dia em que César elogiara, agora ela estava crescendo, se tornando uma jovem tão linda que não passaria desapercebida nem por ele que parecia viver em um mundo á parte.

Ás vezes Beatriz pensava que ele seria a encarnação de Narciso, ele parecia distante de tudo, tão distante quanto as ninfas do coração de Narciso. Por mais irritantemente exemplar que o jovem fosse, havia um mistério que ninguém além de Beatriz parecia notar.

Sempre fora um garoto gentil, andava em boas companhias, praticava esportes, tocava violino, tirava as notas mais alta da escola, era querido por todos e respeitava, sem questionar, da placa “não pise na grama” ás pessoas que batiam á porta domingo de manhã tentando convencê-lo a se converter, uma conduta impecável.

Tratava-a como uma princesa, elogiava, presenteava, acompanhava-a em passeios pelo campo, ensinava um pouco de violino e deixava que a menina lhe ensinasse a tocar piano, mas sempre a vira como a uma irmã mais nova.

Aos 16 anos bebia ás vezes com seus amigos, mas sem exageros, até aquela véspera de natal.

Beatriz aproveitando-se da ausência de César foi até seu quarto, que dentro de pouco tempo ficaria sem vida, pois ele iria estudar no Canadá durante o ano seguinte, tentando absorver sua energia ao máximo , deitou-se na cama, abraçando o travesseiro e se debulhando em lágrimas, há algum tempo sabia da viagem, mas preferiu ignorar até o último momento, adormeceu sem querer e teve um pesadelo horrível, algo pegava fogo e uma mulher gritava desesperada. De repente acordou assustada pelo sonho e surpreendeu-se ao ver o rapaz ajoelhado no chão acariciando seus cabelos.

-César! Falou enquanto se levantava rapidamente e tentava se recompor. -Sinto muito, me desculpe, me senti um pouco indisposta e vim repousar por um instante, sabia que você não estava, por isso vim mas adormeci e, e, e... me desculpe, por favor.

-Bia, acalme-se, meu amor. Não me incomoda, agora dormirei muito melhor pois uma adorável brisa esteve aqui. O que houve, estava chorando, alguém te fez mal, por que está tremendo, se sente bem?

Disse pegando a mão da garota, e ajudando-a a se sentar, mas havia algo estranho nele, uma alteração, uma excitação.

-Tive um sonho ruim, só isso. Mas a explicação que dera não convencera nem a si própria.

-Essas lágrimas estão aí há mais tempo, diga-me, o que há? Sabe que conta comigo.

-É que.. Eu gosto muito de você, me sentirei muito sozinha esse ano, e se gostar de lá e não quiser mais voltar? Disse lutando contra as lágrimas que venciam-na facilmente.

-Eu volto, te prometo! Está bem? Agora vamos limpar esse rosto que já está quase na hora da ceia, te comprei uma boneca há algumas semanas, mas já não é mais uma menina, gostaria de te dar algo mais adequado, mas não há uma loja aberta hoje.

-Não se preocupe, sua amizade e companhia são meu maior presente, e nem precisa de uma data especial para que me dê. Os melhores presentes não se vendem, nem se compram, são os sorrisos, as palavras, o silêncio, os olhares e o afeto de quem amamos.

-Você é um anjo, sabia? Falou enquanto se dirigia á escrivaninha, pegou um livro e entregou para Beatriz. -Tome, disse com ternura, são sonetos de Camões, acredito que te agradarão.

A emoção de receber um presente dele, ler as mesmas páginas, as mesmas palavras e sentir o mesmo cheiro em cada folha foi tão grande que ela deixou o livro de lado e abraçou-o com mais força do que fizera com o travesseiro.

-Obrigada, obrigada! É o melhor presente que ganhei em toda minha vida.

-Oras, é só um livro, disse César com seu sorriso perfeito estampado em sua melhor performance, mas é dado com todo meu carinho.

-Um livro nunca é apenas um livro. Disse timidamente enquanto soltava seu amado.

No momento em que seus olhos se encontraram o mundo parou, não haviam mais quatro paredes, tempo ou espaço só dois corações que batiam acelerados. César segurou as mãos de Beatriz, que desviou o olhar, ele então encostou delicadamente em seu queixo, deixando o nariz da jovem praticamente colado ao seu, os dois fitaram-se por segundos que pareceram eternos até que ela sentiu os braços de César envolverem sua cintura aproximando seus corpos ainda mais, antes que assimilasse o que acontecia sentiu os lábios dele tocarem os seus, nem em sues sonhos mais ousados seria capaz de estar assim com ele, sentia o chão sumir, as pernas tremerem, o corpo todo gelar, mecanicamente passou seus braços pelo pescoço de César e se deixou levar pelo momento, que apesar de durar alguns minutos pareceu mais breve que qualquer outra coisa.

-Me desculpe, disse ele se afastando um pouco, bebi um pouco essa noite, estou um pouco alterado, não queria te fazer isso, juro que não houve má intenção. Disse um pouco sem graça, mas sem se arrepender do que fizera.

-Me enganei sobre o livro, esse é o melhor presente que alguém já me deu, mesmo que tenha sido por engano. Disse sem poder esconder sua satisfação em realizar seu sonho.

-não te ofendi?

-Claro que não, sempre quis, César, sempre quis que você sentisse por mim um pouco do que sinto por você. Mas agora, não importa o que aconteça, esse beijo será meu para sempre.

César abraçou-a novamente, dando-lhe outro beijo.

-Você tem idade para ser minha irmã mais nova, eu sei que cresceu, mas ninguém entenderia, disse em meio a alguns beijos.

-Ah claro, quatro anos de diferença, temos quase a mesma idade, isso não me importa, não me importa o que pensem ou digam, só me importo com você e sou capaz de te esperar por toda minha vida.

Uma voz quebrou a magia daquele momento

-Crianças, gritava Mafalda, vamos nos sentar á mesa, já está na hora.

César estendeu o braço para Beatriz

-Vamos, conversamos depois, tudo bem? Disse beijando sua testa.

A ceia transcorreu maravilhosamente bem, presentes foram trocados e os jovens enamorados não desgrudavam o olhar um do outro, mas ninguém parecia notar.

-Tio, tia, papai, mamãe, estou muito cansada, importam-se se eu for para casa?

-Claro que não querida, durma com os anjos, feliz natal. Filho, acompanhe-a, sugeriu Martin.

Quase chegando a casa, que ficava há uns 30 passos de distância, eles voltaram a se beijar.

-Eu voltarei, um ano passa rápido.

-Te espero por toda a vida, se quiser.

Ele se ajoelhou, beijou sua mão e lhe desejou boa noite, Beatriz teria que se beliscar por toda a noite para acreditar em tudo que vivera.

[continua]

Aimée Legendre
Enviado por Aimée Legendre em 05/05/2011
Reeditado em 05/05/2011
Código do texto: T2950097
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