O colecionador de estrelas #3

E eu me afundava no seu barco e nem mesmo percebia.

Mas, o “concreto” sentido do sentimento que o consumia era o que realmente importava sentimento esse, “amor”, que o destruía quando se exigia perfeito para alguém ou as únicas vezes que quase se presenteava com uma lágrima, sim, quase. Não era justo. Não era conveniente transparecer a dor.

Tal sentimento o feria pelo simples fato de ser cogitado.

Porém por ser metido em si, não se demonstrava. Ninguém conhecia a sua intensidade, era o que o fazia parecer alguém apático. O garoto estava me deixando interessado nos meus próprios escritos. Eu pude notar como as palavras emergiam do infinito daquele quarto, para as pautas quase que apagadas, era irônico alguns minutos atrás, a folha estava “branca”.

E continuavam cada vez mais reais cada letra, cada palavra...

O que o impedia de errar, de cometer o mínimo pecado? Talvez o falso sorriso externo que mantinha, provavelmente, requisito para a sua incontrolável vontade de ver o que julgavam real se tornar lembrança. Mas, para isso, orava com tanta veemência, ajoelhado ao lado de sua cama decrépita que prometera ser substituída há alguns anos atrás.

Pedro realmente acreditava que suas preces eram ouvidas, e que algum dia seria atendido. Assim fingia ser feliz.

Comum não era, muito longe de ser, ele podia ser tudo, menos comum, mas não porque não quisesse ser, ele só não era rotulado como tal.

Mas, quem tem o direito de decidir o que é certo ou errado? Quem deu o privilégio a alguém para determinar que o azul seja o mais perfeito dos olhos? Se soubessem, quanto és belo o sentimento que nos remetem, sua cor já não teria relevância. Seriamos todos daltônicos perante suas sutilezas.

Por toda sua vida, o garoto não havia experimentado o doce da saliva alheia. Mas isso não se devia as suas formas visíveis, sua beleza era notória aos olhos, mas principalmente ao coração. Talvez fosse por conhecer suas próprias virtudes e mais do que qualquer um viria conhecer um dia. Ainda assim ansiava por alguém, para dar o que há muito tempo estava reservado em seu coração. Era romântico, por que acreditava no amor. Não se encaixava no papel principal.

Mal sabia Pedro no que acreditava, mal sabia ele que era um sentimento que possuía a incerteza da reciprocidade, nesse mundo de apagados seres.

Mas, e elas? Elas continuavam lá... Brilhando quase que sem querer. Enquanto na terra o martírio prosseguia.

E as horas passavam e seus olhos arranhavam pesados e cansados, era o aviso, hora de dormir.

Piegas que era tinha a convicção de que cada dia era literalmente único, logo, por isso, especial. Era a certeza que possuía diariamente, ao se desligar dos sonhos perfeitos de alguns minutos atrás. Calçava um par de chinelos velhos que sempre estavam na beirada de sua cama, ia até o banheiro e se observava no espelho por alguns segundos, dava um sorriso que ia de orelha a orelha, ritual de todas as suas monótonas manhãs.

Pela mesma janela sórdida de sempre, pude notar um avião que distante passava, longe da terra e tão próximo das minhas inspirações e eu me peguei pensando, quem poderia estar lá? Quais eram seus sonhos, suas perspectivas para o futuro? O que se passava em sua cabeça, o que fazia seu coração bater? Dispersava-me de Pedro sem notar, enquanto ele gritava por ajuda.

Atendi o seu pedido, e mergulhei de volta no seu mundo, à final éramos apenas marujos em uma nau à deriva