Conversa de bar
Cheio de dúvidas, cheio de medo, de mágoas... Cheio de amor, amor sem destino. Estava assim, vagando pela rua, pensando e conversando comigo mesmo. Criei palavras, idéias, soluções, e depois joguei tudo fora.
Cansado de ser quem eu era, e me sentindo mal por não conseguir me transformar em quem eu queria ser, entrei num bar. Ora, qual o melhor amigo de um homem nessas horas, se não o álcool?
Comecei a beber biritas baratas, pois até o dinheiro havia me abandonado. E naqueles copos, preenchidos de um veneno vermelho, eu misturei ao álcool minhas lágrimas. Porém, antes que eu atingisse meu objetivo de ficar bêbado, um senhor me interrompeu:
-Com licença, amigo, mas posso lhe perguntar o que faz um rapaz tão novo, se entregando à tristeza do álcool e à derrota das lágrimas?
Eu, no estado em que estava, não me surpreenderia se tocasse o velho dali, sem nenhuma educação, mas me surpreendi. Encontrei nos cabelos brancos daquele homem, o meu medo: o tempo. Encontrei em sua pele calejada a minha virtude: a experiência. E encontrei em seus olhos, algo que fazia tempo que eu não desfrutava: o conforto.
-O senhor parece conhecer bem a vida, então creio que pode me entender. Eu estou passando por um momento de falência. Tudo tem dado errado, decidi desistir...
Antes que eu completasse, o senhor, já sentado à minha mesa, começou a falar:
-Sabe rapaz, eu sei exatamente do que está falando, e você vai me perdoar a grosseria, mas deixe de ser tolo! Não seja como eu!
Virei meu copo garganta adentro, e não disse nada, apenas olhei o velho, esperando mais palavras que fizessem algum sentido.
-Ah... Como era bom o tempo em que eu era jovem. Sim rapaz, apesar de meu cansaço esconder isso, eu já fui jovem! Como eu tinha força! Como eu tinha alternativas! Queria mudar o mundo, queria que as pessoas olhassem para mim quando eu às ajudava, e me escondia quando precisava de ajuda. Porém o tempo me tirou essa força. Amei muito, namorei muito, talvez eu tenha sido amado também, mas de que importa? Se o tempo também levou de mim a paixão?
“Sabe amigo, meus olhos viram coisas terríveis nessa vida! Eu não desejaria que essas imagens estivessem na memória nem dos meus piores inimigos.”
“Vi os homens perecerem à solidão, e o pior, por opção! Vi as pessoas negarem seus sentimentos, cuspirem em seu amor... Rapaz, deveria ser um crime esconder um amor! Eu vi a liberdade converter os lutadores, transformá-los em acomodados. Eu não posso criticar, eu mesmo me acomodei, abandonei a revolta que sentia quando via tudo isso, e como se diz mesmo? Ah, desisti!”
“Eu vi meus amigos me abandonarem, falando que eu enlouqueci! Ora essa, é preciso mesmo ser louco para querer mudar o mundo? Ou será que o louco é quem abandona seus sonhos? Bom, independente de qual seja o caso, acho que enlouqueci mesmo, seja por ter sonhado em mudar o mundo, ou por ter abandonado esse sonho.”
“Mas a minha vida não foi só tristeza não amigo! Aprendi muitas coisas também. Aprendi que o mundo sempre pode ser pior do que você pensa, ou pode ser melhor, isso só vai depender de como você vive nele. Aprendi que os homens não estão preparados para serem inteligentes, e que sua tecnologia se desenvolveu muito mais rápido que sua responsabilidade.”
“Aprendi também, garoto, que um olhar apaixonado jamais enxergará uma amizade em certas pessoas, mas que apesar disso, não devemos julgar o amor dos outros, por ele não ser da forma como desejamos.”
“Aprendi que podemos ficar tristes, sem motivos aparentes, e podemos chorar sem estarmos tristes, apenas por estarmos sufocados.”
“Mas o mais importante, é que eu aprendi que nunca vou aprender tudo, nenhuma vida é longa o suficiente para isso, mas apesar disso, vale a pena viver.”
Fiquei impressionado com tudo aquilo, mas uma dúvida ainda estava sem resposta:
-Desculpe-me senhor, mas como pode saber de tudo isso e estar perdido num bar? O senhor viveu tanta coisa, como é que teve esse fim?
-Tudo começou, quando achei que estava tudo dando errado em minha vida, achei que eu estava entrando em falência... Tudo que eu queria, era envenenar um copo de bebida com as minhas lágrimas, e depois consumir o veneno, e foi o que eu fiz. Infelizmente, naquele dia ninguém me impediu. Ninguém me interrompeu quando eu disse que desistiria.
Eu fiquei perplexo, é como se a história daquele homem fosse a minha história, como se ele fosse uma cópia minha vinda do futuro, para não me deixar cometer os mesmo erros que ele cometeu. Mas então parei, pensei melhor, e conclui que talvez eu já estivesse ficando bêbado. Foi quando o velho se despediu de mim:
-Bom, rapaz, é isso... Já está ficando tarde, e eu vou indo, boa sorte! – deu um tapinha no meu ombro, e quando estava saindo, me chamou mais uma vez, emocionado: - Dê um abraço no papai e na mamãe, eles me fazem muita falta!