Destiny: Caminhos cruzados. [Prólogo]
PRÓLOGO
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça...
(trecho de Tabacaria- Álavaro de Campo)
- Fuja - dizia minha vó - fuja pra bem longe, fuja pra onde ele nunca vai conseguir te achar.
- Vovó, eu sou uma guerreira, não baixo a guarda tão rápido assim - estava ofegante.
- Fuja Anne, é a unica coisa que eu te peço, fuja antes que ele te encontre.
Minha vó foi até a gaveta de sua escrivaninha e pegou um papel, me entregou:
- Vá até esse endereço, sua tia Raquel irá te ajudar.
Eu olhei confusa para minha vó enquanto bombas explodiam diante da nossa janela:
- Eu nem nunca ouvi falar dessa mulher, não vou passar meus dias com uma estranha... muito menos te deixar vó.
Ela me pegou pelo braço e me balançou:
- Ou é isso... ou você viverá o resto de sua vida condenada a esse crápula!
- Tem que ter um jeito, um único jeito vovó, sempre tem!
- Não! Ela te vendeu, não a nada que possa ser feito a não ser fugir!
- Mas vó!
Ela retirou do seu pescoço um cordão e, colocou sobre mim.
- Isso agora é seu.
- Eu sou a... - não conseguia terminar a frase, receber aquele cordão era emoção demais, mesmo numa situação como aquela.
- Agora vai Anne, e não se esqueça de que o povo está com você.
Eu a abracei deixando que as lágrimas me banhassem. Tirei o pedaço de madeira do chão que cobria a passagem secreta e escorreguei pelo túnel.
Corri o mais rápido que meus pés eram capazes, essa passagem dava no esgoto principal da cidade. A cidade estava sendo invadida mesmo, mas pelo menos eu estaria tentando. Cheguei na saída e abri a tampa do esgoto e, como eu previa, a cidade toda já estava tomada. Mesmo assim, resolvi seguir. Sai de lá, com uma touca, isso talvez fizesse com que os soldados não me reconhecessem e eu poderia chegar até a fronteira daquela cidade.
Conhecia minha cidade como ninguém.
Continuei correndo como se nada tivesse fim, e eu, lá no fundo do meu coração, sentia que nunca ia ter fim.