Lucian: VOL 1 part 4

Capitulo 4

Descarga emocional

(Adrian)

Margareth me ligou apavorada quando eu já estava voltando pra casa à noite, ela falava tão rápido que eu não podia entender. De tudo que foi dito eu só entendi que era com Lucian. Eu fui imediatamente, por sorte eu já estava a poucos metros de casa.

Quando cheguei havia uma ambulância colocando alguém na maca e minha mãe desesperada chorando histérica do lado.

- O que houve? (tive que sacudi-la)

- Luc... Lucian... Ele. Foi minha culpa. (chorou mais alto que o normal)

Eu olhei pra dentro e ele estava deitado na maca com um aparelho pra respirar.

- O que houve? (perguntei pra um enfermeiro que passou pra fechar a porta)

- Provavelmente uma descarga emocional. (explicou)

- Eu vou junto. (me joguei dentro da maca antes que eles não concordassem)

A ambulância o mais rápido que ela pôde e eu fui desesperado segurando a mão do meu irmão. Essa surra que ele levou tinha mexido muito com ele e eu nem estava perto pra ajudá-lo.

Eu não entendia como o fato levou a isso, mas eu só sabia que foi por causa de Margareth, eu nunca vi ela histérica por alguém da família antes.

Então era sério. Chegamos ao hospital e ele foi levado pra um quarto enquanto eu entrava com a papelada e eu nem sabia o que ele tinha.

Fiquei na espera por uma hora inteira até o medico voltar e me noticiar.

- O que você é do Lucian Belline? (perguntou o velho médico)

- Irmão, como ele está? (desespero)

- Agora bem, ele teve uma descarga emocional. Uma queda de pressão por uma discussão e desmaiou. Ele bateu a cabeça na calçada, mas não foi nada grave. Ele já está acordado e mais calmo. Você pode vê-lo. (explicou)

- Doutor como ele está? (gritou Margareth)

O doutor lhe explicou tudo de novo, enquanto eu entrei no quarto e não permiti que ela entrasse agora.

- Luc. (tudo que consegui dizer)

Ele estava confuso, me olhou com incerteza e disse.

- A luz... (repetiu várias vezes)

Repetiu por alguns minutos e depois dormiu.

O doutor entrou e explicou que ele ainda estava lerdo por causa dos remédios que lhe deram e que em menos de uma hora ele estaria normal.

- Ele vai poder ir à escola? (perguntei)

- Amanhã eu não acho recomendável, mas na quinta-feira ele já estará 100%. (disse-me na cafeteria)

- Ok. O que foi isso? (exigi)

- Uma descarga emocional, como o nome já explica, uma onda de emoções fortes passou por sua cabeça e ela não agüentou, poderia também ter causado um AVC, mas graças aos céus isso não ocorreu. Vocês não podem colocá-lo em emoções fortes por algum tempo. (tagarelou)

- Ok. Estes últimos dias exigiram muito dele. Meu pai lhe deu uma surra e isso mexeu com todos nós. (eu expliquei)

O médico estava sendo como um confidente.

- É eu vi no jornal de domingo. (disse o médico)

- Meu pai é um velho porco. (resmunguei)

- Não deixe que isso te atinja também. Agora tenho que ir. (saiu da mesa e foi trabalhar)

Eu fiquei com Luc a noite toda e de manhã eu não podia perder a aula e James havia vindo me ajudar, então fui pra casa na madrugada e James chegou e ficou com Luc.

Eu encontrei Margareth em casa e comecei logo a discutir com ela. E perguntei o que houve. Ela explicou e eu fiquei furioso. Não me deixei levar pra não acabar no hospital também. Fui pra escola tentei me concentrar nos estudos inutilmente.

(Lucian) Acordei cedo e quem estava do meu lado era James. Era incrível que James estivesse comigo e não Wade. Eu não podia exigir isso dele, ele faltou a escola dois dias pra tomar conta de mim.

- Se sente melhor Luc? (perguntou-me)

- Um pouco fraco, mas bem. (disse)

Eu me sentia exausto, mas eu sabia que dessa vez tinha me livrado eu não me lembrava de muita coisa.

- Eu quero ir pra casa. (pedi)

- Você vai ainda hoje. Vou chamar o médico pra te examinar. (saiu)

O médico me examinou e disse que eu estava bem. Pelo meio-dia eu estava em casa. James pôde ir pra Vancouver e voltar à rotina. Margareth não tentou forçar nada e eu me recusava a pensar nisso.

Dormi o resto da tarde até que ao cair da noite eu tinha visitas. De novo estavam chegando Lee, Ash, Adrian e agora Jason e Kelvin também.

Eles bateram na porta e eu mandei entrar.

- Olha só pra você. Você precisa se exercitar Luc. Está pela segunda vez de cama em quatro dias. (disse Ashton em desaprovação)

- Como você se sente? (perguntou Jason)

- Bem. Eu estou melhor agora. (convenci)

- Estamos seriamente preocupados com você. (disse Lee)

- Eu já estou bem. Amanhã irei pro colégio e tudo mais. (tentei com êxito)

- OK. Mas não vá exagerar. Vá com calma. (disse Kelvin)

- Gente eu já voltei ao normal, a surra mexeu com meu psicológico, mas eu já me sinto melhor agora. Essa descarga de emoção serviu pra alguma coisa. (expliquei)

- Nós já vamos. Estamos todos em um carro só e temos coisas pra fazer. (disse Lee)

- Veremos você amanhã. (disseram)

- Com certeza. (concordei)

Eles se foram e depois Adrian, até agora calado, veio falar comigo.

- Como se sente? (perguntou-me)

- Bem. Já descarreguei todo ódio. (disse-lhe)

- Margareth falou com você? (insistiu)

- Não. Mas tudo bem se ela vir, eu não vou adiar isso. Resolvi tirar o velho porco da prisão pra evitar aborrecimentos. (confessei)

- Você não precisa fazer isso. (garantiu)

- Preciso. Isso vai descomplicar as coisas. Margareth vai se acalmar e não vai pegar mais no meu pé. (continuei)

- Ok. Eu vou tomar banho, precisa de algo? (sempre prestativo)

- Não. Eu me sinto muito bem. Vou tomar banho também, se eu precisar eu chamarei. (afirmei)

- Ok. Relaxe pra amanhã você está bem pra ir pra escola. E ligue pro Wade que quase voltou quando soube. (mandou)

Ele saiu e eu corri pra pegar meu celular.

- Alô? (perguntou)

- Sou eu. (pausei pra ouvir sua reação)

- Oh, como é bom te ouvir. Eu tava tão preocupado. Você tá bem? (começou a ladainha)

- Perfeito. Minhas costelas estão perfeitas e amanhã eu volto pra escola. Os planos ainda estão de pé. (avisei)

- Ok. Que bom, eu não conseguiria ficar aqui no fim-de-semana se você não viesse aqui. (confessou)

- Eu estou indo tomar banho depois eu entro online. Ok? (perguntei)

- Já estou esperando. (desligou)

O banho estava ótimo, gelado, a noite estava quente então não havia necessidade de vestir uma camisa. Liguei meu computador e entrei no Messenger.

“Oi de novo.” (saudou-me)

“Olá. Como você está?”

“Bem. Melhor agora”

“Nós somos tão ligados agora” (houve um tempo enquanto ele digitava)

“sinto-me tão ligado á você. É como se fossemos inseparáveis. Eu te... eu não consigo não pensar em você.”

Parei um pouco pra pensar no significado do que foi digitado. Era o mesmo comigo, ele estava na minha mente diariamente, ele era sem dúvida meu melhor amigo, mas não era só isso. Era difícil concordar comigo mesmo, mas não era só isso. Era algo mais, só que eu estava com isso guardado.

“é exatamente assim comigo” digitei

“eu vou jantar, desculpa.”

“tudo bem. Nos falamos outra hora.”

“posso te ligar ainda hoje?”

“a hora que quiser.”

“fui”

Ele ficou off-line e eu também saí. Decidi descer e jantar.

A empregada estava na cozinha, eu ainda não me acostumei com alguém pra fazer as coisas pra mim, eu não estava mais exausto. Era só um cansaço comum.

- O que tem hoje? (perguntei)

- Temos lasanha de bacalhau e macarrão. (disse-me)

- Pode, por favor, me trazer um pedaço de lasanha? (perguntei)

Ela trouxe e saiu. Comi com vontade depois subi, escovei os dentes e sentei na janela com o celular na mão.

A rua estava bem vazia, da janela eu via uma parte da cidade, luzes estavam começando a apagar. Eram onze d noite quando o celular tocou.

- Oi Wade. (nem olhei o numero)

- Oi Luc, você viu a lua hoje? (perguntou)

- Estou vendo agora. (disse)

- Me lembro de você quando a vejo. (que patético)

- Por quê? (disse sem delongas)

- A cor pálida dela é como se fosse sua pele. (pasmei)

- Obrigado, eu acho. (gaguejei)

Ele percebeu minha reação e maneirou.

- Você ainda vem sábado certo? (perguntou o que já tínhamos combinado)

- É claro. Nós já deixamos certo. (completei)

- Você vai querer visitar a fazenda dessa vez ou só caminhar e tomar banho de lago? (me deu as opções)

- Acho bom caminhar. Como passou o dia hoje? (perguntei)

- Foi bom, de manhã fui pro colégio à tarde visitei tio Jeremy na fazenda. Nada muito radical. (zombou)

Eu ri com a zombaria.

- Eu vou alugar um filme pra nós. (disse-lhe)

- Eu gostaria de ver a história de Christine Collins. O filme se chama a troca, ouvi falar que é uma linda história. (recomendou)

- Levarei esse então. (concordei)

- Ok. Agora tenho que dormir se não se manhã nem um carro passando por cima de mim fará com que eu me acorde.

- Um enorme abraço Wade. (desejei)

- Outro maior ainda. (desejou-me)

Ele desligou.

Na quinta-feira o dia amanheceu bem iluminado pelo sol. Eu estava morto de preguiça, mas o meu atestado alegava que eu não precisaria de mais que quatro dias. Eu voltaria então para o transtorno. Eram duas horas antes do horário da escola. Eu pensei em dormir mais uma hora, só que como Wade se eu dormisse seria difícil de me acordar. Tomei um banho gelado pra despertar os sentidos e o que senti foi fome. Vesti o maldito uniforme do colégio particular e desci pra encarar aquelas empregadas irritantes na cozinha. Topei com Margareth na sala.

- Acho que precisamos conversar. (disse ela hesitando)

Ela nunca tinha dito isso, ela estava estranha, preocupada, hesitante. Coisa que ela nunca foi.

- Margareth nós podemos não estragar o meu dia agora? Quando eu voltar da escola, se você não tiver no restaurante como sempre, agente conversa. (disparei)

- Eu estou disposta a mudar. (deixei-a falando com as paredes e fui á cozinha)

- O que tem pra hoje robô? (ironizei)

- É comigo que o senhor está falando? (perguntou formalmente)

- Olha a minha idade sua tola, você acha que eu devo ser chamado de senhor? (acordei a todo vapor)

- Não senhor... É desculpe.

- Qual seu nome? (perguntei desinteressado)

- Jessica Parker. (admitiu)

- Você estuda Jess? (olha a intimidade)

- É claro. Mas porque a pergunta? (curiosa)

- Fazendo amizades. (expliquei)

- ok. (se envergonhou)

- Eu não gosto dessa coisa formal. (disse-lhe)

- Nem eu Lucian. (se soltou)

Ela era engraçada, não era feia nem bonita. Era desengonçada. Conversar com ela era uma forma de me distrair dos problemas. Margareth deu umas ordens a ela e saiu sem insistir no assunto.

- Sua mãe está diferente. (notou)

- Deve ser prejuízo no trabalho. (sempre era)

- Acho que não. Estou aqui há pouco tempo, mas conheço bem ela. É preocupação. (surpreendeu-me)

- Eu nem me importo mais. Agente dá valor uma vida toda alguém e quando agente tá na cama de hospital morrendo é que esse alguém nota você. (me referi somente a Margareth)

- Você é cruel. (afirmou)

- Ela é cruel. Como você foi criada? (perguntei)

- Muito bem, eu tenho três irmãs jovens como eu. Minha mãe sempre foi uma guerreira, ela nos criou sozinha sem ajuda de ninguém. Eu me orgulho dela. (tagarelou mais algumas coisas)

- Tá vendo? Todo mundo tem orgulho de seus pais. Oh estou me atrasando tenho que ir. (o tempo passou rápido enquanto tomei café conversando com a empregada)

Peguei uma carona Lee que morava nas redondezas e chegamos juntos na escola. Adrian havia saído ainda mais cedo que eu. Ele estava saindo com uns DJs e preparando muitas coisas pro seu primeiro dia no emprego. Ele não era mais o mesmo. Nem eu era.

Ele estava tão ligado ao trabalho quanto eu a Wade.

Eu não sabia a realidade sobre meus sentimentos, eu sentia uma amizade enorme por Wade antes, mas agora era algo mais, havia um brilho nos olhos deles e nos meus também. Uma sensação indescritível.

Fui bem recepcionado pela minha turma, muitos colegas e até o professor Stanford me saudaram com palavras de apoio e moral.

No refeitório muita animação, zumbidos de vozes de todos os lados, na minha mesa estava Ash, Lee, Jason, Kelvin, Clark e eu. Os alunos nos chamavam de “Os reservados”. Nós éramos amigos só de nós mesmos, não nos misturávamos muito com outras pessoas.

- E as costelas como vão? (perguntou Jason me tirando do transe)

- Ah vão muito bem obrigado. O que estão planejando pro fim-de-semana? (tentei me manter na conversa)

- Vou assistir alguns filmes em minha casa. Eu já chamei Ash, venham todos. (disse Jason)

- é claro. Eu irei. (os outros também concordaram)

- E você não vai Luc? (perguntou Lee)

- Não, não. Estarei fora amanhã mesmo quando voltar do colégio. (me olharam estranho)

- Seattle. Devo uma visita a Wade. (expliquei)

- Ah. Entendo. (disse Kelvin sem entusiasmo)

Conversamos mais, sobre os conteúdos da escola entre outras coisas. Ninguém tocou no assunto família. Eu resolvi esclarecer, pois foram eles que deram queixa na policia.

- Eu vou retirar a queixa. (eles me olharam assustados)

- Mas Luc... (começou Lee interrompido por Kelvin)

- Faça o que achar melhor Luc. (sempre compreensível)

- É. (os outros concordaram)

- Me desculpem, mas talvez esse seja o jeito de manter a paz lá em casa. (expliquei)

- Ou trazer de volta a guerra. Luc eu não quero que seu pai bata em você de novo. (disse Clark realmente apavorado)

- Obrigado. Eu não tinha pensado nisso. (realmente)

O sinal tocou tempo depois, no corredor a caminho da sala topei com Drake o “reizinho” do colégio.

- Olha só. O surrado. (zombou)

- Olha se não é a princesinha do colégio. (revidei)

- Manda um recadinho pro seu papai boneca. Diz a ele que quando ele for te bater de novo me convide. (eu dei as costas e entrei na sala)

- Por que você enfrentou Drake? (perguntou Ash assustado)

- Eu não vou me render a um idiota que se acha o tal. Eu o odeio. (informei)

- Podíamos nos juntar e dar uma corsa nele. (sugeriu Clark)

- Isso seria bom, mas com certeza ele nos mataria um a um logo depois. (brinquei)

A professora Beth pediu silencio e começou a tagarelar coisas sobra literatura.

- Eu peguei meu celular por baixo da banca e mandei uma mensagem pra Wade.

“Estou indo contra as regras. A aula está uma chatice sem você pra jogar papeizinhos na professora.”

Antes que a professora me pegasse eu desliguei o telefone e o coloquei no bolso.

Ela perguntou algo a Ash, que é expert, sobre literatura e nos mandou responder o exercício da apostila.

Ash me ajudou. Depois foi a aula de historia com o Sr. Norrys que foi chata também. Depois de deixar o dever de casa fomos liberados.

- Lee você me leva de volta? (perguntei)

- Acho que não. (ele virou o rosto pra me mostrar algo)

Era Margareth me esperando no estacionamento.

- Droga. Vou ver o que ela quer.

Ela estava num carro lindo, provavelmente ela havia comprado há pouco tempo e nem havia mencionado.

- Está vendo essa linda Ferrari Scuderia? (é claro que eu estava)

- Você não podia ter comprado algo menos chamativo? (perguntei)

- É seu. (disse segurando as chaves)

- E porque você me daria uma Ferrari? (nem acreditei na mentira)

Provavelmente ela queria me testar.

- Seu bobo. Você está em que mundo. É um pedido de desculpas e um presente de aniversário. (explicou)

Eu estava realmente em outro mundo.

- Hoje não é meu aniversario. (pelo menos disso eu sabia)

- Hoje não. Domingo é seu aniversário. (explicou)

- 18 de abril é domingo? (ainda estava duvidando)

- Sim. Você vai pra Seattle sozinho amanhã. Tem GPS e tudo mais. (ela estava sorridente)

- Realmente eu vou. (concordei)

Era impossível não se render diante de um presente desses. Eu adiei a falação, mas não esqueci.

Ela me deixou dirigir e eu disparei, acenei pros amigos e disparei pra casa. O carro era ótimo, leve, silencioso e rápido.

Cheguei em casa em sete minutos.

- Não vamos adiar isto ok. (eu disse)

- Ok. Vamos pelo menos entrar em casa. (saímos do carro e entramos)

- Eu não quero mais que você tire a queixa. (minha boca se abriu)

Eu fechei a porta e entrei.

- O que te fez mudar? (perguntei desacreditado)

- Você. Quando eu te vi cair ali meu filho, e pensar que por culpa minha. Eu quase enlouqueci, eu jurei que se você morresse, eu me mataria. Nós podemos viver muito bem sem seu pai. Eu já não vivia bem com ele nem com vocês. Se ele não está aqui será mais fácil.

- Mamãe isso é impossível. (ela parou um minuto)

A idéia de ter Margareth como mãe era uma blasfêmia.

- Margareth a decisão de tirá-lo de lá ou não cabe somente a mim. E eu não vou tirá-lo de lá. Ele vai pagar pelo que fez pra que não se repita. Eu não levo muita fé em você, mas podemos tentar. (desembuchei)

- Obrigada. Pra começar você sugere alguma mudança aqui? (perguntou)

- Demita uma empregada. Deixe só a Jessica e pague o dobro a ela. Só isso por enquanto. (pedi)

- Ok. Quando você vier jantar ela nem vai tá aqui mais. (garantiu)

Eu subi e fui tomar banho.

O sumido Adrian bateu na minha porta depois do jantar, pra minha surpresa. Ele tava tão distante na sua vidinha de DJ que nem começou.

- Oi. (ele disse)

- Oi DJ. (brinquei)

Ele entrou.

- Você vai pra Seattle amanhã? (perguntou)

- Pretendo ir direto depois da escola. (afirmei)

- Ok. Parabéns pelo carro. (disse sem assunto)

- Obrigado. (friamente)

Ele saiu e disse boa noite.

Nossa relação havia mudado de um jeito terrível, o irmão super-protetor sumiu por um mero trabalho de sonoplastia. Eu não tava dando à mínima. Eu só queria estar com Wade.

Lembrei-me dele e liguei o computador, ele não estava no Messenger, resolvi ligar.

- Hey Luc. Tudo bem?

- Melhor agora. Estou indo amanhã tudo bem? (perguntei)

- Quanto antes melhor. (concordou)

- Obrigado, você não sabe o que Margareth me deu. (brinquei)

- Uma Ferrari. (então ele sabia)

- Como sabe? (ele riu)

- Sua mãe me ligou e perguntou se eu sabia algo que você queria. Eu disse uma Ferrari Scuderia. Acertei?

- É claro que você acertou. Obrigado. Da próxima vez diz que eu quero uma casa de paia. (zombei)

- Ok. Eu tenho que ir lavar a louça. (disse enraivecido)

- Tem viva voz? (perguntei)

Eu não queria que ele desligasse agora.

- É claro. Não vou desligar. (informou-me)

- Eu não gosto de ficar longe de você. (confessei)

- Nem eu. Acontece algo estranho quando estou com você. (ele disse)

- Como assim? (perguntei)

- Ah eu não vou falar.

- Porque não? (insisti)

- É constrangedor. (afirmou)

- Mas eu queria saber. (continuei a insistir)

- se você insistir eu vou desligar. (ameaçou)

- Tá bem. (houve um barulho de louça)

- Escola como foi? (perguntou-me)

- Como eu falei chato sem você pra jogar bolinhas no professor. (repeti a mensagem de hoje)

- É claro. Olha tenho que desligar, eu vou jogar o lixo lá fora e limpar a janela aí te ligo de novo depois. Ok? (perguntei)

- Ok. Tchauzinho. (desligou)

O telefone tocou assim que Wade desligou.

- Alô? (perguntei)

- Sr. Wade? (uma voz desconhecida)

- Sim. Quem deseja? (imitei a formalidade)

- Aqui é o delegado Morel o senhor deve imaginar por que eu liguei. (identificou-se)

- Na verdade não. (menti)

- Seu pai está detido aqui. O Senhor Precisa vir à delegacia depor e trazer os exames.

- Amanhã eu tenho aula. (eu não queria ir)

- Não se preocupe eu cuidei disso. Você vai estudar só pela manhã e a tarde virá à delegacia. Ah e isto não é um pedido. (que ódio)

- Seu endereço. (pedi)

Ele deu o endereço e desligou grossamente, isso me deixou em fúria.

Por um lado eu iria pra Seattle mais cedo. Eu não contaria a Wade. Eu comecei a arrumar minha mochila, roupas e outras coisas. Coloquei minha câmera digital pra não esquecer. O filme eu pegaria amanhã a caminho da delegacia.

Liguei a TV, ouvi uns barulhos no corredor, provavelmente era só Adrian ou Margareth, e sentei na cama com o celular na mão.

O dia amanheceu ensolarado e um pouco frio. Eu cheguei à escola dois minutos atrasado e fui o centro das atenções com a minha Ferrari. A aula foi um pouco engraçada já que era de teatro. Saí da escola ao meio dia, almocei no restaurante da Margareth e passei na locadora antes de chegar à delegacia. Eu aluguei o filme “A troca”, a pedido de Wade. Na delegacia foi tranqüilo, só levei os exames médicos e assinei alguns papéis. Quando me levantei pra sair, aquele maldito delegado disse que o velho porco (meu pai) queria falar comigo.

Eu me opus é claro, mas o delegado era a favor dele e praticamente me atirou lá.

- Olha Lucian... (o silenciei)

- Não chame o meu nome. (ordenei)

- Mas filho eu só quero...

- Também não me chame de filho. Eu não sou nada de você. (interrompi)

- Me perdoe. Me tira daqui. (implorou)

- Eu não vou fazer isso, olha só pra você! Você só está pedindo perdão porque sair daqui. Você não imagina a dor que você me causou. Eu quase tive um AVC por sua causa. Velho porco. Eu não quero ficar ouvindo mais nada. (disparei)

- Oh meu filho. (comecei a gritar)

- Não me chame de FILHO!!!

Saí da sala de visita e fui embora correndo antes que aquele delegado me colocasse lá de novo.

Peguei a estrada e cheguei em Seattle mais cedo do que pensei.

Às três da tarde eu estava lá. Wade estava na frente de casa de costas pra rua lavando um carro sem camisa. (um clássico) eu peguei minha câmera e desci da Ferrari um pouco antes dele percebê-la. Eu falei:

- SURPRESA! (quando ele se virou eu tirei a foto)

- Já? Nem deu tempo de eu me preparar. (reclamou)

- Você está preparado. (ele estava)

- coloca suas coisas no meu quarto e desce aqui. (disse)

Eu corri e subi as escadas, não foi difícil encontrar o quarto dele, coloquei as coisas lá tirei a camisa e desci.

- Onde estão todos? (ele me encarou diferente)

Murmurou algo como “UAU”.

- Na fazenda, não vem nem tão cedo.

- Eu te deixo lavar meu carrinho. (brinquei)

Ele olhou na direção que apontei e sorriu.

- Com certeza você deixa. Se não... (ameaçou)

- Se não? (perturbei)

- Se não eu te molho. (ameaçou de novo)

- Olha que medo! (brinquei)

Pra quê que eu disse isso, no momento que terminei de falar veio água pra todo lado. Eu comecei a rir todo molhado, peguei a mangueira dele e fiz o mesmo.

Lavamos os dois carros e nos secamos no resto de sol de fim de tarde.

- Vamos pelo quintal. Lá tem um chuveirão e deve ter uma toalha lá. (me mostrou o caminho)

Arrodeamos a casa e chegamos ao quintal. Era perfeito, tinha uma piscina, o chuveirão, churrasqueira e tudo mais.

Ele tirou a calça e ligou o chuveiro.

- Se quiser pode entrar. (disse olhando pra piscina)

- Não obrigado. Eu me contento em tomar uma chuveirada com você.

Repeti o que ele fez e entrei no chuveiro com ele.

- É tão bom que você esteja aqui. (disse)

- É maravilhoso estar aqui. (corrigi)

Ele me passou o sabonete liquido e uma esponja. Depois de estarmos enxaguados ele pegou duas toalhas e enrolou a dele na cintura e tirou a cueca, eu imitei ele.

Subimos pro quarto. Ele entrou pra se trocar no banheiro e me deixou no quarto me trocando.

- Quando o pessoal chega? (perguntei se ficaríamos sozinhos o fim-de-semana todo)

- Ah eu acho que vai demorar. Eles foram convidados de ultima hora pra um casamento no domingo em NY. Eles estarão de volta acho que na segunda-feira. (explicou)

- Vamos assistir ao filme?

- Sim, vamos. (saiu do banheiro)

Ele veio de calça jeans preta e de sandálias. Eu estava de regata, por causa do calor, e de shorts.

- Você pode se sentir em casa. Hoje tá um calorão, mas se eu tiver incomodando você diz que eu visto uma camisa. (começou)

- Você nunca é incômodo. (tranqüilizei-o)

- Ok. Vamos assistir lá embaixo. (descemos)

Ele colocou o filme e foi à cozinha.

E quando os créditos iniciais acabaram ele voltou.

Voltou em grande estilo, com uma tigela enorme cheia de pipoca.

E duas garrafas de coca.

- Nossa. (me admirei)

O filme foi passando lentamente, era uma historia bem triste, Christine Collins nunca encontrou o seu filho, mas também nunca parou de procurá-lo. Eu me imaginei nessa situação perdido em pensamentos. Imaginei o que Margareth faria, se dependesse dela eu nunca seria encontrado. Depois de um tempo no meu interior eu percebi os olhos de Wade me encarando.

Só aí que eu percebi que estava chorando. Malditas lágrimas me entregaram.

- O que foi Luc? (perguntou num sussurro)

- Eu tava me imaginando nesta situação com os pais que eu tenho. (eu não podia mentir pra Wade)

- Não se imagine. (recomendou)

As lágrimas continuaram até que eu não pude segurar, coloquei as mãos no rosto e comecei a chorar sem hesitar. Senti os braços de Wade ao meu redor. Ele estava murmurando algo que eu não ouvia. Eu estava tão perdido nos pensamentos, estava colocando pra fora todo sentimento de ódio que restava em mim.

- Chore... (finalmente entendi)

A tristeza completou meu coração, eu não parei de chorar, era tudo que eu conseguia fazer. Lágrimas e mais lágrimas desciam pelo meu rosto.

- Escute seu coração Lucian. Se ele diz pra você colocar pra fora apenas coloque. Eu estou aqui pra te proteger. (eu fui me tranqüilizando aos poucos)

Ainda chorando em seu ombro eu me lembrei de um fato na minha infância.

- Você não imagina o quanto isso dói. Parece que todo mundo que você ama quer ficar longe de você. Você é a única exceção. (consegui falar)

- Eu jamais vou me afastar de você Luc. (continuou)

- Se eu pudesse, eu nasceria de novo, você nasce e não é querido nem por seus pais, isso é traumático. Você vê todos os meninos na escola correr no fim da aula e abraçar os seus pais enquanto você só tem babás. Isso foi se juntando desde os primeiros anos de vida e eu não consigo tirar isso de mim. É horrível você viver preso a isso. Esse sentimento de que você nunca vai morrer em paz. (desabafei)

Eu o apertei mais forte e chorei mais que antes. Era reconfortante, Wade era a única pessoa que me fazia ficar bem e que gostava de mim mesmo me conhecendo.

Nem Adrian foi capaz de ficar perto de mim agora que eu tanto preciso.

- Aquela surra me levou ao limite. Aquilo teve uma dor emocional devastadora, muito pior que a física. (continuei depois de uma pausa)

- eu não tenho uma recordação deles na infância. Não tenho um momento pra lembrar, uma foto pra recordar.

- Você quer ouvir a minha história? (perguntou)

Provavelmente ele só queria me acalmar.

Eu não respondi e ele começou.

- Imagina você vivendo sua infância só com um pai, um pai que você ama e adora, o pai que é referência pra você, mas ele nunca está em casa, está sempre no trabalho, viver mudando de cidade em cidade durante uma vida toda, eu consegui ficar entre Seattle e Portland por quase um ano. Foi o máximo de tempo que eu consegui ficar em uma cidade só. Meu pai como seu emprego no exército nunca está presente. Eu fui criado praticamente sozinho, fiquei sozinho a maior parte da minha vida. Minha mãe morreu no parto. Eu só consegui me manter aqui por que tenho meus tios e só fiquei por que aqui eu fiz laços indestrutíveis.

(ele ficou pensativo)

Nós ainda estávamos abraçados, eu parei de chorar sem perceber. Ele tinha tanta dor como eu. Nós ficamos em silêncio por bastante tempo.

Eu resolvi falar.

- Nós temos um ao outro. (percebi)

- pretendo ter pra sempre.

Senti sua pele quente em minhas mãos enquanto acariciava suas costas. Ele se afastou um instante e segurou meu rosto em suas mãos. Ele me encarou e hesitou, eu pensei que ele estava me olhando apenas. Até que... Ele me beijou.

Eu não sei o que levaria um homem a beijar outro, eu não entendia o porquê ele dele ter me beijado. Era horrível ter que admitir, mas eu estava querendo isso tanto quanto ele, foi como um remédio, me tranqüilizou, eu retribui. Aquilo continuou sem percebemos por quanto tempo, até que quando resolvi parar...

Estávamos deitados no sofá. Eu descansei meu rosto em seu peito, ele colocou a mão nas minhas costas e ficou fazendo carinho. Ali em seus braços eu era o homem mais feliz. Eu nunca tinha me imaginado junto com outro homem e me sentindo assim, ainda mais com Wade.

Olhei pra TV e o filme estava lá parado esperando que eu removesse-o. Levantei-me e o tirei do aparelho de DVD. Eu estava com medo de olhar nos olhos dele de novo, eu não sabia o que dizer, eu não queria dizer nada agora. Eu subi pro quarto sem olhar pra trás. Eu estava envergonhado, me sentindo sujo e limpo ao mesmo tempo.

E N Andrade
Enviado por E N Andrade em 27/08/2010
Reeditado em 26/09/2010
Código do texto: T2462739
Classificação de conteúdo: seguro
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