[Original] Refém De Você - Capítulo 10
Capítulo 10
Leandro passou a madrugada em claro após o incidente do dia anterior. O sentimento de culpa queimava dentro dele, que tentou dissipa-lo fazendo uma ligação para Angélica pela manhã, a caminho da escola. Ela não atendeu. Ele ligou de novo. Nada. Mandou uma mensagem de texto e fora respondido minutos depois.
Leandro teve que ler duas vezes para ter certeza que não lera errado.
“Acabou. Se quiser fazer da minha vida um inferno, faça. Eu não me importo.”
Sua primeira reação fora rir, mas acabou sendo um riso forçado, depois balançou a cabeça, como debochasse das palavras lidas e por último ele correu até a escola, numa atitude desesperada de encontrar Angélica.
E ele a encontrou no pátio da escola conversando com alguns alunos do primeiro ano. Ao notar que um olhar lhe queimava a nuca, a garota se virou, e ao ver quem a olhava, fechou a cara instantaneamente e saiu andando sem se despedir das pessoas com quem conversava.
Leandro foi atrás dela em silêncio, quando a alcançou, seguiu andando ao seu lado.
- Você tá achando que eu não tenho coragem, né? – A voz estava mesclada de ameaça e desespero.
- Eu já disse pra fazer o que quiser.
Ele segurou seu cotovelo com força. Ela se soltou com alguma luta, mas fora novamente capturada.
- Angélica, vamos conversar civilizadamente?
- Não.
Acabaram indo pro corredor do 8º ano, pois sabiam que poderiam conversar em serem ouvidos. Ela tentou manter distância, mas Leandro a prensou contra a parede com força. Acuada, Angélica não soube o que fazer além de tentar empurra-lo.
- O QUE É QUE VOCÊ QUER DE MIM? – Gritou o garoto, furioso.
- EU QUERO QUE VOCÊ ME DEIXE EM PAZ!
- Você... – Ele tentava controlar o que achava ser fúria, mas na verdade era o medo de perde-la. – não pode fazer isso.
- Posso sim.
Leandro engoliu seco antes de finalmente dizer o que já prendia por muito tempo.
- Eu preciso de você.
Angélica ficou sem resposta com o que ouvira. Ela sentiu a mão de Leandro tocar seu rosto com suavidade, quase como se fosse quebrável. Depois entrelaçaram as mãos e o beijo aconteceu naturalmente. A garota se afastou abruptamente. O orgulho a lembrou de que não podia continuar presa a Leandro. Não quando já sentia demais por ele.
- Você vai se virar sem mim melhor do que pensa.
- Por que isso?
Ela o fitou, aturdida.
- Por que “isso”? – Repetiu, apontando com o dedo para ambos. – Você não acha que isso saiu do limite? Não acha que pra quem se odiava como nos odiávamos, estamos nos “tocando” demais? Você não acha que o fato de eu me sentir extremamente bem ao seu lado não é preocupante? Qual é o seu problema, Leandro? Você não enxerga o óbvio?
- Que você está se apaixonando por mim?
Sem-graça, Angélica ficou de costas para o garoto, que riu, divertido.
- Eu não estou apaixonada!
- Claro que não. – Disse, desdenhoso. – Eu sou gay, você não pode se apaixonar por um gay.
- É, não posso. – Concordou, pouco convicta. – Eu vou embora.
Mal dera dois passos e Leandro a puxou pela cintura.
- Você não quer terminar comigo.
- Quero sim.
- Angélica, eu ainda tenho coragem de te ferrar, viu? – Perguntou, tirando o celular do bolso e procurou pelas “provas” do crime. Ele sentiu o coração gelar quando não as encontrou. – SUA DESGRAÇADA!
- Ah... E da próxima vez que você for guardar provas em um pen-drive, o esconda melhor.
Poderosa como nunca havia se sentido antes, Angélica deixou o garoto esbravejando inumeráveis palavrões.
- Aquela desgraçada!! – Leandro gritava, o que fez Maya se assustar algumas vezes. – Maldita! Eu todo preocupado, com medo dela me deixar e ela faz isso!
- Você não salvou em outro lugar? Você é um gênio mesmo!
- Salvei em um pen-drive e ela achou! Eu não pensei que ela teria esse atrevimento! – Argumentou, indignado. – E outra, Angélica é tão falsa que eu tinha certeza de que ela...
Instintivamente, abriu a boca duas vezes para concluir o que diria, mas não teve coragem. Ainda tentava entender como pudera ser tão tolo em relação a ela.
- O que?
- Isso não importa. – Bufou, sentando-se ao lado da garota. - Ela não quer mais namorar, terei que inventar algo pros meus pais.
- Tipo o que?
- Sei lá! – Deu de ombros. – Vou pensar em algo...
O intervalo escolar era sempre marcado pela divisão dos alunos. O grupo mais popular era o de Angélica e João. O casal, considerado o mais adorado por todos eram um tipo de mito, inigualáveis, amados, odiados. Os outros grupos eram apenas “os outros”. Leandro passou pelo meio do salão principal da escola e avistou Angélica. Um frio percorreu seu estomago ao perceber que já estava sentindo a falta dela. Ele meneou a cabeça tentando afastar tais pensamentos.
“Não vale a pena.”
- Olá. – Leandro assustou-se ao ouvir a voz de Vivian atrás dele. – Desculpa! Não queria te assustar.
- Tudo bem. Eu estava mesmo distraído. E com bobagem. – Ela sorriu, divertida. – Como você está?
- Eu estou bem. Você que não parece estar muito feliz.
- Estou bem. – Mentiu, forçando um sorriso a garota. – É impressão sua.
Vivian segurou a mão de Leandro e o olhou com carinho. Talvez não conhecesse muito de mulher, é verdade, mas sabia o suficiente pra ter certeza que ela estava afim dele. Ele sentiu uma inesperada afeição quando a viu pela primeira vez.
- Eu posso não te conhecer muito, mas sei que não está bem. Se você quiser conversar, pode contar comigo.
- Valeu! – Leandro sorriu, sem jeito. Não estava acostumada com isso. – Ei, posso te fazer um convite?
- Claro. – Ela sorriu, suave, o que enaltecia suas covinhas.
- Certo. Então eu te busco na sua sala na hora da saída.
- Vou esperar, hein?
- Pode esperar.
Leandro observou Vivian se afastar, balançando os longos cabelos castanhos, até sumir em meio à multidão de alunos. “É claro que o que eu senti por Angélica não sentirei por nenhuma outra” – Admitiu, seguindo para a sala de aula quando ouviu o sinal tocou. O que significava o fim do intervalo. Com a mente ocupada em devaneios, não viu quando tropicou justamente com a última pessoa que queria ver.
- Desculpa. – Ela disse, num tom contido.
- Tudo bem. – Eles se olharam brevemente. O clima era estranho. Ele continuou andando, quando notou que Angélica ainda estava parada, o fitando. – O que foi?
- Quando é que você vai falar com seus pais sobre a gente? – Perguntou, sem se preocupar com as pessoas que poderiam ouvi-los. Ele a olhou sugestivamente. – Não me importo, terminei com o João.
- Você o que?
- Eu não sou obrigada a aguentar a Giovana praticamente dando pra ele na minha cara.
Naturalmente os dois foram caminhando para um canto mais reservado e ignorando os chamado de seus respectivos professores em sala.
- E o que ele disse? – Indagou Leandro, curioso.
- Não gostou, brigou um pouco... E eu acabei chorando, porque apesar de tudo ele foi um bom namorado, não tem culpa das minhas burrices.
Leandro balançou a cabeça, concordando. Ao mesmo tempo que queria persuadir Angélica a voltar com ele, não queria dar o braço a torcer.
- Você acha que a Giovana pode falar alguma coisa?
Angélica respirou fundo, parecendo temer algo.
- Se o João não quiser ficar com ela, o que de fato não quer, sim.
- Já tenho que me preparar pra uma futura briga, então... – Murmurou, olhando fixamente para a parede, pensativo. – E ah, pode deixar que eu vou dar uma desculpa qualquer a respeito de você pros meus pais.
- Desculpa qualquer. – Repetiu, debochada. – Como você sempre me tratou, não é? De uma maneira “qualquer”. – Ela fez aspas com os dedos. Leandro acabou sorrindo sem querer.
- É como você pede pra ser tratada! Você foi a pessoa mais cínica que eu já conheci.
Eles falavam em tom baixo, se metralhando com elegância.
- Cínica porque eu apaguei a foto que você queria usar contra mim? Eu chamaria de esperta, na verdade.
- Pra quem estava sentindo alguma coisa por mim você me deixou com muita facilidade.
- Estava não. – Corrigiu, desviando do olhar de Leandro. – Estou. Só não quero mais ser obrigada a te namorar por causa de uma chantagem.
- Ah é? E quer me namorar como?
- Quando por exemplo, você admitir que está apaixonado por mim. – Ela deu um selinho rápido no garoto. – E mesmo que você arrume outra namorada pra me substituir, seus pais não vão gostar dela como gostam de mim.
Abismado, ele observou Angélica lhe dar as costas rumo a sua sala.
E como combinado com Vivian, ele a convidou para tomar sorvete ao lado da escola. “Um convite bem simples, mas eu gostei” – ela disse, enquanto os dois saboreavam seus sorvetes. A conversa fluiu naturalmente, mas diferente do que sentiu por Angélica, ele não sentiu o fogo arder dentro de si quando Vivian tocou seu rosto, de repente. E nem mais tarde, quando se beijaram em frente à casa dela.
- Desculpe. Eu... Bom, você é lindo e legal. Eu não pude resistir. – A honestidade dela o deixou surpreso. – Eu não sei mentir. Você me interessou desde a nossa primeira conversa.
- Você também. – Ele respondeu, sincero, mas Vivian sabia que algo o preocupava.
- Só que seu coração está preso a outra pessoa, é isso? – Perguntou, sorrindo de maneira sábia.
- Eu sou gay.
Vivian engasgou com o próprio ar.
- Você está falando sério?
- Sim. Só que eu me envolvi com uma garota... E bem, nós... Eu... – Ele não sabia como explicar o que sentia por Angélica.
- Você se apaixonou?
- Não! – Exclamou, como a pergunta o ofendesse. – Ela mexe comigo.
- Entendi... – Vivian balançou a cabeça, assentindo. – Bom. E porque você não diz isso a ela?
- É melhor não. Nós tínhamos um trato e ela não cumpriu. – Ele sabia que não estava sendo totalmente honesto, mas para uma desconhecida, a castanha já sabia demais - Ela não é do tipo confiável.
Vivian se pôs na ponta dos pés e olhou Leandro com firmeza.
- Ela não é, mas eu quero ser confiável pra você. Eu gostei de você, Leandro. Gostei do seu jeito, do seu cheiro... Do seu beijo. E eu não procuro sentimento, procuro uma nova história. Algo que eu vá lembrar futuramente e com saudades.
Leandro sorriu, beijando a garota com fervor. Algo dizia que em Vivian ele encontraria a parceria descompromissada que faltava em Angélica.