Sorriso
-Não acredito que estou nessa roubada, Edu! – gritei pro meu irmão enquanto passava repelente. – Posso pegar malária!
- Eu não sabia que se pegava malária no interior do Rio. – ele respondeu.
- Sei lá. Mas aqui é fim de mundo! Vai que um mosquitinho com malária, vindo da África num navio negreiro em 1800, ficou esperando pelo meu maravilhoso sangue?
- Mosquitos não vivem 200 anos, Malu.
- Mas ele pode ter tido descendentes que...Bem, vão me matar. – eu disse depois que já havia me precavido contra os insetos. – Isso tudo só porque você tá a fim da Júlia?
Ele me olhou meio chateado.
- Custa tanto me ajudar?
- Custa. – disse enquanto eu saía da sala de TV.
Realmente, poderia ser muito pior. Meu irmão gêmeo poderia querer seguir a garota mais popular da escola no Himalaia. Aí a gente teria que assaltar um banco para pagar a viagem. Ou pra Amazônia, onde uma anaconda nos devoraria de sobremesa.
Fui para o pátio. A essa hora fazia frio, mesmo estando em pleno verão. Afinal, Nova Friburgo é região serrana. Estava triturando minha bala de menta. Foi aí que vi um cara lindo chegando, , cheio de bolsas.
- Tudo bem? – perguntei e fui ajudá-lo.
Devo ser doente. Ele poderia ser um psicopata serial killer e eu tava lá sem a proteção da SWAT.
Peguei duas das bolsas que ele estava carregando:
- Nossa, você é forte! – ele disse.
- Judô desde os sete anos. – respondi.
Deu um sorriso bonito e pela luz fluorescente do refeitório vi que seus olhos eram grandes, bonitos, cor de âmbar.
- Cássio. – Ele disse e veio me cumprimentar com dois beijinhos no rosto.
Mas ele se desequilibrou com aquelas bolsas de viagem e caiu. E eu, por estar perto dele, me desequilibrei e caí também. Rimos.
- Malu.
Ele levantou e me puxou. Só que, como eu sou muito magra, eu fui direto e nossos narizes se encostaram por uma fração de segundo.
- Donde você tá vindo com essas bagagens todas?
- Sou de um grupo que acabou de chegar de Belo Horizonte. Estou ajudando a levar as malas das meninas.
Nos despedimos e fui pro meu quarto.
No dia seguinte a gente se viu de novo, e conversou pra caramba depois que minha equipe o venceu no paintball.
- As mulheres vão dominar o mundo? – perguntei rindo.
Dias depois, ficamos. Nos desviamos da trilha e nos perdemos. Até que um monitor encontrou a gente. Ameacei contar que ele tava se agarrando com a Júlia durante a noite. Ele não falou nada pra ninguém.
Continuamos juntos, escondidos de todos. Se Edu ficasse sabendo, minha vida tava acabada. O verão acabou, voltamos pra casa.
Até que ontem, quando eu estava no elevador, eu o vi:
- O que você tá fazendo aqui? – perguntei surpresa.
- Vim morar com a minha tia. No 305. Não acredito que você mora aqui. – ele parecia surpreso e feliz.
Pulei em seus braços. Dane-se as câmeras de segurança.