AS AVENTURAS DE DUDU E A SEITA DO DIABO (9)

19

Roberto foi embora na manhã seguinte, cedo, logo após o café da manhã. Ao se ver sozinho com Fanny e vovó Joana, Dudu ficou receoso de que as duas falassem alguma coisa sobre o e-mail ou coisa parecida. Mas não. Como faziam diariamente, foram para a cozinha, não dando muita atenção para Dudu. E este, tenso, sentou-se nos degraus da varanda esperando que o carro do pai surgisse feito um louco pela estradinha de terra. Antes, havia conferido o telefone. Estava mudo, providencialmente. A diferença é de que desta vez Dudu tinha sido mais esperto. Nada mais o segurava na fazenda. Suas roupas já haviam sido guardadas na mochila. E Fanny e vovó Joana teriam que dar muitas explicações para a polícia. Bem feito.

Quando Dudu cansou de ficar sentado na escada e para não chamar muita atenção, foi ajudar o jardineiro. Ele plantava algumas flores justo no lugar onde as duas estavam cavoucando há algumas noites atrás. Quando perguntado porque naquele lugar, seu José sacudiu os ombros, pouco interessado. Disse apenas que “dona Joana havia mandado e ele estava obedecendo”. Bem, de nada adiantaria, pensou Dudu. A polícia teria que estragar o belo trabalho que seu José estava fazendo.

As horas foram passando e nada acontecia naquela fazenda. Fanny ficou o dia todo na cozinha e Joana até apareceu para fiscalizar o trabalho do jardineiro. Naquela manhã, vovó Joana estava muito querida e jovial, tal como Dudu sempre a tivera em sua mente. Quem não a conhecesse que a comprasse, pensou ele. Imagine, jamais alguém diria que aquela doce senhora fazia parte de uma seita demoníaca. Impressionante.

Estavam os três ali – Joana, Dudu e seu José – quando um carro surgiu na estradinha de terra, ao longe. Quem primeiro percebeu foi seu José. Ele colocou as mãos nos olhos para que o sol não atrapalhasse e avisou:

- Senhora Joana, parece que a senhora terá visitas novamente.

Dudu quase deu um pulo. Porém, para sua decepção, o carro que estava se aproximando, não era o do seu pai. Era um táxi, da cidade. Joana foi para frente da fazenda receber o visitante e Dudu, desanimado, nem saiu de perto do seu José. Se não era seu pai, então não era ninguém que interessasse. Ele já estava agachado conferindo uma das flores plantadas, quando ouviu a voz alegre da sua avó exclamar:

- Fabrício, meu querido! Mas que surpresa!

Ficando de pé em um salto, Dudu observou seu primo descer do táxi, desconfiado. Recebeu o abraço da vovó Joana e logo depois de Fanny, que viera recebê-lo também. O garoto ficou esperando que o pai desembarcasse do táxi, mas o carro partiu, velozmente. Dudu ficou furioso. Seu socorro não viera. Agora eram dois reféns das duas demônias. Com certeza, os dois primos não conseguiriam lutar contra uma seita inteira.

Dudu foi se aproximando, devagarzinho, sem disfarçar seu desapontamento. Fabrício o encarou, estranhamente. Deveria estar pensando que o primo era um louco. Joana, ainda abraçada ao neto, exclamou:

- Que surpresa maravilhosa você nos fez, Dudu, convidando seu primo para passar alguns dias conosco!

- É… eu achei… que ele curtiria… vir para cá.

- Peguei um ônibus hoje de manhã, bem cedo – disse Fabrício, naturalmente – Na verdade, a vida na cidade estava me deixando um pouco cansado.

- Venha, vamos subir. Quer tomar um banho? – perguntou Dudu.

- Eu quero. E estou morrendo de fome.

Dudu engoliu em seco. Coitado… poderia morrer envenenado a qualquer instante. Ele pediu:

- Vovó, Fabrício pode dormir comigo em meu quarto?

Quem respondeu foi Fanny:

- Ora, mas temos outro quarto sobrando na casa. Ele pode ficar lá, se quiser.

Sem desconfiar de nada, Fabrício respondeu:

- Não se preocupem comigo, garotas. Posso dormir no quarto, com Dudu. Para que fazer mais bagunça?

Apesar de tanto Joana como vovó Fanny jurarem que ele não faria bagunça nenhuma, ficou decidido que os primos dormiriam juntos. Depois da velha saber como estava a família na cidade, Dudu e Fabrício rumaram para o quarto, sozinhos e em silêncio. Somente quando ambos se trancaram, lá em cima, que Dudu desabafou:

- Puxa, Fabrício! Por que papai não veio junto com você?!

Fabrício começou a abrir a mochila, silencioso. Depois de algum tempo, respondeu:

- Eu… bem, eu não mostrei aquele seu e-mail fantasioso para nossos pais.

Dudu teve ganas de esmurrar seu primo. Controlando a voz para não falar mais alto do que deveria, ele perguntou:

- Fantasioso? Fique sabendo que tudo que eu escrevi ali é a mais pura verdade! Estou correndo risco de morte nesta casa. E agora você também está porque se atreveu a vir até aqui sozinho.

- E você acha que nossos pais acreditariam numa vírgula do que você escreveu ali? – Fabrício também estava zangado, agora – Eles viriam vir buscar você aqui e interná-lo direto em uma clínica para pessoas estressadas. Por isto vim sozinho. Inventei uma desculpa que você estava se sentindo sem companhia, meu pai me colocou em um ônibus esta manhã e aqui estou eu. Vou investigar tudo o que você me contou. Será uma aventura e tanto.

Dudu respirou fundo e perguntou:

- Afinal, você acredita no que eu lhe contei?

Com medo de ouvir a resposta, Dudu esperou que Fabrício respondesse. Ele escolheu as palavras e disse:

- Acredito que algo está acontecendo para lhe deixar tão perturbado.

- Estou muito perturbado, sim. E cuidado com tudo o que você vai comer aqui. Pode estar envenenado.

- Não fantasie as coisas, Dudu.

- Eu, fantasiando? Então vá tomar seu banho enquanto eu lhe conto tudo o que eu vi e ouvi nestes poucos dias que estou aqui.

20

- E pode ter certeza de que você será sacrificado junto comigo.

Fabrício estava colocando a camisa. Não sabia se devia acreditar em tudo o que o primo dizia. Era uma história de loucos.

- Eu acho… - tentou ele dizer.

- Você não tem que achar nada. Apenas acredite em mim.

Fabrício conhecia muito bem o primo e sabia quando Dudu estava mentindo. E, naquele momento, ele tinha certeza de que nunca Dudu falara tão sério em toda a sua vida. Depois de encará-lo por alguns segundos, sem ter o que dizer, Fabrício retrucou:

- Está bem. Eu vim para cá ajudar você. Sei que algo está acontecendo para lhe deixar tão neurótico e…

- Eu posso provar tudo a você – interrompeu Dudu, novamente.

- Este cemitério de que você falou…

- Está lá, no meio do bosque.

- Olha aqui, se você me interromper novamente, sou eu quem vai sacrificar você.

Dudu suspirou e disse:

- É tudo muito louco, Fabrício. Não faz nem sete dias que vovô Oscar morreu e já descobri coisas horríveis sobre vovó e a defunta da Fanny. E elas sabem que eu sei de tudo. Se você não viesse hoje, eu seria sacrificado.

- Depois do almoço damos uma desculpa e você me leva até o tal cemitério. O que você acha?

- Acho bom, se nós sobrevivermos ao almoço. Se elas não colocarem arsênico ou algum calmante, já estaremos no lucro.

- Bem, acredito que elas não me matariam assim, tão cedo – retorquiu Fabrício, rindo – E se tudo for real, elas vão ter que despistar. Vovó Joana e Fanny sabem que vim para cá investigar tudo.

- Papai deveria ter vindo para cá me buscar, isto sim – disse Dudu, emburrado, de braços cruzados – E você vai me dar razão logo, logo.

Fabrício apertou a barriga, fazendo uma careta.

- Ei, estou morrendo de fome. Vim comendo poeira durante toda a viagem. O que acha da gente descer e almoçar, hein? O almoço já deve estar na mesa.

- Coma você, entendeu? – Se você não morrer depois das cinco primeiras garfadas, então eu começo a comer também.

O rapaz riu do primo, enquanto ambos saíam do quarto que agora passariam a dividir. Por enquanto, ele ainda imaginava que Dudu estava realmente enxergando coisas.

... CONTINUA ...

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 02/04/2010
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