Não dá pra esquecer

É claro que o fato de o tempo estar nublado não ajudava, só piorava.

Até que o avistei em um dos bancos, o que ficava embaixo da árvore.

Dali podia-se ver toda a cidade. Se não havia sol não havia necessidade de ficar embaixo da árvore. Mas era o hábito. Me sentei ao lado dele.

Apenas lançou um olhar surpreso em minha direção, mas voltou os olhos para o livro. Era isso que ele gostava de fazer. Fica ali lendo para, entre um parágrafo e outro, olhar a paisagem. “Dá sensação de poder.”, ele dizia.

- Oi. – disse sem olhar em seus olhos.

Ele apenas me olhou de volta, sorriu rápido e voltou a ver o livro.

- Sabe, eu não acho que vai dar certo você me ignorar o tempo todo, Marcos – falei ainda olhando todas as construções misturadas as montanhas que haviam em nossa frente.

- Por quê? – ele respondeu, e agora parecia que não tiraria mais os olhos de mim.

Fechou o livro e o colocou sobre o banco. Olhei dentro de seus olhos cor de âmbar e mordi os lábios:

- Porque se a gente se conhece desde sempre e se a gente sempre

conviveu junto, e se a gente quebrou vários recordes de videogame juntos, não dá pra simplesmente ignorar. – minha voz começou a engasgar e ficar meio aguda. Droga. – Pelo menos eu acho.

- Mas eu também achava que não dava pra ignorar até que você mudou. Sabe a Malu que eu conheci? Pois é, não existe mais. Ela morreu e nasceu uma diva pop pré-adolescente que tá saindo com um vocalista imbecil de uma banda ridícula. – e pegou o livro de volta.

Ótimo, se tivesse um buraco agora eu daria uma de avestruz.

- Não é bem assim. Você sabe que não é.

- Ah, não? Então como que é, Malu?

- Esse lance com o Jhonny foi... a maior burrada. Quando eu ganhei aquele concurso de cantora na televisão eu não esperava isso tudo. E quando a gente tá lá em cima, é tudo... diferente. Eu só queria que você entendesse.

Meio que bufei e peguei uma pastilha de menta na bolsa.

- Quer? – ofereci e ele pegou uma.

- Você não atendia as minhas ligações. Você até esqueceu que eu estava lá, sentado no último banco da classe. Só queria andar com a “elite” da escola. Vai ver você nasceu pra isso, só demorou a descobrir. Por isso perdeu a vida toda sendo minha amiga.

- Não seja bobo. Foi só correr um boato que eu tava traindo o Jhonny e todo mundo passou a me odiar. Você acha legal, Marcos? Porque eu já nem tava mais saindo com o ele. E com nenhum outro cara. Eu descobri uma coisa, entende.

- Descobriu o quê? Que antes tivesse com aquele playboy?

- Não, eu descobri que sempre amei você. Mas você não precisa acreditar.

E foi aí que ele me beijou. Sério, que nem acontece em filme.

Luma Beatriz Peril
Enviado por Luma Beatriz Peril em 15/03/2010
Reeditado em 20/03/2010
Código do texto: T2140012
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