AS AVENTURAS DE DUDU E A SEITA DO DIABO PARTE 3

5

O sono de Dudu foi recheado de pesadelos com sangue, veneno e gritos na escuridão. Nas várias vezes em que se acordou durante a madrugada, Dudu teve a impressão de que ouvia sussurros ecoando pela casa, passos do lado de fora e até mesmo uivos de animais. Por fim, quando se levantou para o café, estava tão sonolento que teve vontade de ficar mais tempo na cama. Mas sua avó poderia desconfiar. E Fanny tinha jeito de ser muito esperta. Por isto, Dudu fez um esforço, superando seu sono e seus temores e desceu, tentando aparentar calma, para o café da manhã.

Felizmente, tanto vovó Joana como Fanny estavam tão absorvidas pelas tarefas diárias que mal deram bola para Dudu. Em nenhum momento foi tocado no assunto festa e Dudu levantou as mãos para o céu por ambas não estarem dando nenhum importância para ele.

O café terminou e vovó Joana saiu da mesa, ainda orientando Fanny nos afazeres que teria pela frente. Dudu pensava seriamente em voltar para a cama quando reparou em um corredor escuro, que nunca havia notado nas poucas vezes que visitara a avó em épocas passadas.

As duas haviam saído da casa e estavam do lado de fora. Suas vozes pareciam estar longe. Intrigado com aquele corredor sombrio, Dudu se certificou que ambas não estavam realmente por perto e se aventurou até ali.

Na verdade, o corredor deveria levar a uma ala mais antiga da casa, não sendo muito visível da parte mais nova por ficar sempre na escuridão. No final, Dudu podia ver que havia uma porta e nas paredes, de cada lado, havia dois candelabros. E estavam tão tomados pela poeira que há anos ninguém deveria acendê-los. Dudu reparou que a porta era feita de uma madeira muito sólida e parecia ser impossível abri-la. Mesmo assim, quando finalmente Dudu atravessou o comprido corredor e se parou à frente da porta, não pôde deixar de tentar forçá-la. Estava trancada.

Apesar de esperar por isto, Dudu suspirou, indignado. Se aquela porta estava no fundo de um corredor escuro, de uma ala abandonada da casa, era porque algo muito importante estava escondido atrás dela. O que poderia ser? Instrumentos de morte? Dudu já tinha forçado a porta três vezes, quando a voz esganiçada e surpreendentemente alta de Fanny ecoou nos seus ouvidos:

- O que você está fazendo aqui? Ninguém pode vir para este lado da casa. Dona Joana não permite ninguém mais além de mim.

Dudu deu um pulo e se voltou, sobressaltado. Fanny, alta e acima do peso, encarava Dudu com dois olhos furiosos e flamejantes. Gaguejando, ela tentou se explicar:

- Eu… eu… pensei que…

- Você não tem que pensar nada! – devolveu Fanny, grosseiramente – Vamos, volte para a ala nova da casa e vá procurar algo útil para fazer em vez de ficar bisbilhotando por aí.

Se não fosse Fanny uma assassina, comparsa da sua avó, Dudu teria respondido à altura. Mas como ele não queria ter o mesmo fim de vovô Oscar, resolveu sair dali, com o rabo entre as pernas, feito um vira-lata qualquer. Sem ter o que fazer e com medo do pudesse lhe acontecer, Dudu passou quase o dia todo enfiado na biblioteca, onde ninguém mais o incomodou.

6

Dudu corria pelo gramado, mas não encontrava um lugar para se esconder. Finalmente, conseguira despistar Fanny e vovó Joana, só que isto não era garantia de nada. Elas podiam aparecer a qualquer momento e Dudu se refugiou no bosque. Agachou-se atrás de uma árvore e ali ficou, até começar a ouvir murmúrios. O garoto se encolheu o mais que pôde, mas as duas mulheres se aproximavam e suas vozes adquiriam tons mais altos. De repente, Fanny colocou uma lanterna no rosto de Dudu e ele deu um grito que varou os mundos.

Sentado na cama, suando, Dudu se deu conta que a luz da lanterna não passava da luz da lua quase cheia. Dudu esperou a respiração voltar ao normal, com os olhos cerrados. Primeiro, só ouvia as batidas do seu próprio coração. Porém, as vozes que escutara no seu pesadelo, eram reais e podiam ser ouvidas do quarto de Dudu.

Ele custou a acreditar que aquilo estivesse acontecendo. Murmúrios na escuridão. Só podia ser Fanny e sua avó. Com as pernas bambas, ainda não refeito do seu terrível sonho, Dudu caminhou sorrateiro até a janela e através da veneziana, tentou enxergar o que se passava do lado de fora.

Seu quarto dava para a lateral da casa, onde havia um lindo jardim, seguido da horta do vovô Oscar. As vozes vinham exatamente daquele lado. Não dava para entender direito, mas sim, eram as assassinas. Curioso e muito silenciosamente, Dudu entreabriu as venezianas sem fazer ruído algum. Logo, Fanny e Joana estavam na sua área de visão. E em posições muito suspeitas.

Vovó Joana estava em pé, segurando uma lanterna – não seria a mesma lanterna do seu pesadelo? – e Fanny cavoucava alguma coisa no jardim. Às vezes com as próprias mãos. Outras tantas, com a ajuda de uma pá. Por causa da escuridão, Dudu não conseguia ver muita coisa. Ora, era ali que o dinheiro do vovô estava guardado, deduziu Dudu, ficando excitado. Elas haviam enterrado o dinheiro tal como um tesouro de piratas!

Sem poder controlar sua enorme curiosidade, Dudu entreabriu mais ainda as venezianas. Elas falavam entre si, mas não se podia identificar nenhuma palavra que fosse. A lanterna iluminava os cabelos despenteados de Fanny e seu esforço ao mexer na terra. De repente, vovó Joana olhou para cima.

Antes que a avó conseguisse identificá-lo, Dudu se jogou para trás, caindo no chão com um baque surdo. Mesmo que ela não tivesse lhe enxergado, com certeza repararia na veneziana entreaberta. As vozes murmuradas pararam lá embaixo. Encostado à parede, trêmulo, Dudu desconfiou que as duas deveriam ter abandonado o que estavam fazendo. Ele ouviu passos na escada lá fora e praticamente se arrastando pelo chão, Dudu foi até a porta do quarto e certificou-se de que estava trancada. Depois, ainda se arrastando pelo piso frio, voltou até a janela e conferiu que, realmente, Fanny e vovó Joana não estavam mais no jardim. Dudu rezou a todos os santos para que as duas não fossem até o seu quarto. Sem coragem até para fechar a veneziana, Dudu se cobriu com o lençol e dormiu. Um sono cheio de pesadelos e sangue, novamente.

...CONTINUA...

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 20/02/2010
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