Os Cavaleiros - parte 15

Cheguei até a casa de capricórnio com o coração palpitante.

O sol castigava minhas costas, o ar estava seco e a garganta começava a arranhar um pouco.

Parei no batente e olhei pelo hall de entrada e me deparei com uma decoração extremamente rústica, de bom gosto medieval.

Nas paredes existiam centenas de espadas de diferentes modelos e tamanhos. Tudo ali dentro parecia ter séculos de existência, mas estava brilhando como novo.

Eu ainda não tinha entrado quando senti um vento mover a barra de meu vestido. Senti um vulto transpassar meu corpo.

Fechei os olhos. O aroma leve de perfume de flores pairou atrás de mim. Quando os abri procurei ver algo com a visão periférica, deixando o corpo imóvel.

Seja quem for que estivesse ali, não me agradou com esta ação.

Algo pequeno e metálico fora lançado em cima de mim eu ouvia o chiado que cortava o ar antes de chegar ate mim. Respirei fundo, fechei meus olhos novamente e estiquei meu braço em posição de defesa. No meio do ato, interceptei o objeto com uma das mãos.

- Que tipo de recepção é essa?? – falei alto segurando a adaga de ouro que tinha sido lançada em mim.

- Sou eu quem pergunto que tipo de visita é essa. -Um homem de voz estremecedora, de cabelos curtos e negros parou a centímetros de mim em alguns segundos após sua voz ecoar pelo hall.

Como ele estava muito perto, tive que levantar a cabeça para enxergar seu rosto.

-Você.... – fiz cara de dúvida e olhei para trás, para a casa zodiacal que eu havia acabado de sair.

Muitas impressões me vieram a mente, talvez fossem as lembranças de Aioros ecoando em minha cabeça de telepata.

Senti algo ruim correndo nas minhas veias, uma corrente de gelo a passar pela espinha. Em seguida veio a sensação de ardor de centenas de cortes pelo meu corpo.

Tudo foi extremamente rápido. Era impressões de outros tempos, de outro lugar.

Um leve torpor tomou conta de mim e quase perdi o equilíbrio.

-Hey... garota... Você está bem? – ele estava segurando meus ombros com ambas a mãos e me sacudindo levemente.

Aos poucos a minha visão voltou ao normal, o cenário onde estava naquele momento aparecia após uma cortina negra ser levantada em meus olhos.

- Isso foi uma impressão sensorial... nada demais. – toquei aquele braço vestido com a armadura dourada e um choque repentino me acordou de um sonho de milésimos de segundo.

Novamente uma onda de memórias invadiu minha mente como uma corrente elétrica intermitente.

Aquele homem tinha estado ao lado de Aioros em algum momento. Abri a boca mas o som de minha voz demorou um pouco para sair.

– Você é o Shura...? – fiz cara de duvida.

- huh...- ele consentiu com uma ruga na testa - E você é quem, garota?

Uma frase passou rapidamente em minha cabeça enquanto cerrava o cenho com certo rancor:

“Alguém que sabe do crime que você cometeu há dois anos!!”

Quase soltei as palavras presas na língua... mas parei antes de causar mais impacto.

– Sou Nisa Benthon. – as mãos dele ainda estavam segurando meus ombros, e muitas memórias que ele tinha estavam passando em minha mente como um pequeno filme embaçado.

Empurrei-o para que não tocasse em mim. Algo me fez olhar em seus olhos cor e âmbar e vi que não era um rosto mau... nem rancoroso. Tomei fôlego, abaixei a cabeça e completei:

- Desculpe a invasão de sua casa, estou em uma incursão descobrindo sobre a vida dos cavaleiros de ouro que vivem aqui em Athenas.

Aquele de estatura considerável, de voz grave riu em tom animado e se jogou em umas almofadas de pele de animais que estavam espalhadas no chão e me apontou

- Você é a famosa protegida do mestre Saga?

O gesto dele me desarmou as defesas. Estava rindo de mim ou para mim?

- Que papo é esse de “protegida”? – Me agachei próximo a ele com jeito de quem não sabe do que ele falava.

Ele respirou fagueiramente e começou a falar:

- Fiquei sabendo que ele autorizou uma estrangeira a andar aqui no santuário. E pior!! Deixou que trilhasse as 12 casas!! – me olhou de cabo a rabo - Você não parece muito com uma estudiosa, muito menos com uma aprendiz de amazona.

Fiquei sem jeito e gaguejei.

- Pessoas normais não tem coragem de vir aqui pedir estas coisas. Mas eu sou estudiosa de vocês, sim. Há alguns anos tenho lido muito sobre suas regras. – cocei a cabeça – E acho que vim aqui quebrar algumas delas.

Ele gargalhou novamente.

- Bem vinda menina Nisa. Pessoas como você são raras. Diria, impossíveis, de aparecerem por aqui.

Fechei a minha boca e o encarei incredulamente.

“Caramba!! Ele nem ligou para o que eu falei.”

Olhei novamente para a casa vizinha, parecia que Aioros me olhava lá de cima. Sacudi a cabeça para espantar a impressão. Aquilo não podia ser verdade.

Uma pergunta entalou na minha garganta.

- Com todo esse riso e forma de falar você definitivamente não parece ser a pessoa que vejo na morte de Aioros.... Mas é você, não é ? – estacionei o olhar na ruga que estava nascendo no rosto dele.

Bem, essa pergunta foi o estopim para ele de levantar e falar sobre o que aconteceu há anos atrás, sobre a traição de Aioros, a tal criança que ele protegeu e a punição que sofreu.

-Punição??? – me indignei – você matou um homem, um cavaleiro, um companheiro seu, sem que ele estivesse usando sua armadura par se proteger e chama isso de punição?

Gritei tão alto que ouvi minha voz irritante ecoar pelas outras casas.

-Você não entende garota, você não passou sua vida daqui. Apenas leu contos e especulações sobre nossas leis e nosso comportamento – ele sorriu levemente e se levantou. – E agora que esta conhecendo de verdade, sei que é difícil compreender.

– Absurdo.... vocês podem ser poderosos, dominar toda essa besteira de técnicas, mas ainda não passam marionetes de alguém que manda e desmanda em suas ações. – esmurrei a mesa de madeira que estava ao meu lado.

Após gritar a plenos pulmões, permaneci muda olhando as paredes cobertas de armas.

Ele, esperando em vão que eu falasse algo, apontou para as armas nas paredes.

– Gostou delas? – cruzou os braços e ficou atrás de mim.

Desviei a atenção, não tinha como convencê-lo da forma como eu raciocinava. Gostaria que eles tivessem vidas próprias. Gostaria que estes cavaleiros me mostrassem suas facetas reais e não a faceta de um guerreiro. Aqueles homens não deveriam viver apenas para morrer por alguém.

Novamente uma enxurrada de palavras vieram a minha boca, mas desisti de falar.

Olhei para as espadas novamente e sorri.

- São lindas. - Fiz um gesto de pegar a espada dourada no centro do hall - Posso?

Pois bem, nada como um bom acidente para melhorar meu ânimo. E assim se fez:

Assim que estiquei o braço para tocar a espada, tropecei em uma pedra saliente e caí em frente às armas com o braço estendido, levando grande quantidade de metal afiado ao chão comigo... foi uma barulheira só.

O pior de tudo foi ver aqueles facões, espadas, machados e afins caindo em cima de mim, por todos os lados.

Me teleportei para trás, mas uma das espadas estava a um passo de mim. caída no chão com a lâmina para cima

Senti que fui puxada por Shura, mas ainda caí em cima dela, cortando a lateral da perna.

Após alguns segundos, quando o último tilintar de metal ecoou eu olhei ao meu redor.

O estrago estava feito. Tudo que uma minuto atrás estava organizado, agora pendia espalhado pelo chão. O sol batia em algumas lâminas e formava desenhos prateados nas paredes.

O cavaleiro de Capricórnio estava me segurando o braço, olhando apreensivo para minha perna que sangrava.

- Cortou... – olhou para a poça de sangue diferente que surgia a minha frente

Bati minha mão na testa “ Afff.... esqueci de dizer que meu sangue é um tanto........... colorido.” (essa era a palavra certa para descrever)

Um fio com sete cores saia do machucado na perna e pingava ao chão na mesma velocidade que os olhos dele acompanhavam.

Em alguns instantes senti sua aura brilhar um pouco mais forte e se concentrar em sua mão. Ainda surpreso ele depositou a mão brilhante em cima do ferimento. Vi que seus dedos ficaram sujos de meu sangue, mas o corte não estava mais lá.

- Não achei que humanos tivessem esses poderes.. eu mesma resolveria...

Naquele instante senti uma pessoa se materializar atrás de mim. Virei o rosto o máximo que podia para ver quem era.

- Peço permissão para adentrar em sua casa, amigo Shura. – a voz calma de Mu me fez relaxar.

- Claro amigo Carneiro, sinta-se a vontade. – Shura falou em completo tom de amizade

Olhei pra trás, um tanto envergonhada daquilo. Acenei as mãos para Mu ali do chão mesmo.

Gemi com um pouco de dor que ainda persistia no local do corte enquanto dava um sorriso amarelo.

– Oi Mu. – pisquei.

Ele olhou atento para minha situação e para a bagunça espalhada ao chão.

-Você deve ter arrancado a alma de todos os cavaleiros que te viram, garota. – Mu parou ao meu lado e se abaixou para olhar minha perna.

- Você sabe que eu não estou aqui para roubar almas... – sorri mesmo sentindo dor.

– Pensei que haviam te recepcionado mal – e olhou para o colega sorrindo. - Ouvi muitos barulhos e quedas de muitas coisas ao longo do seu passeio. Você parece que aprontou algumas boas por aqui.

Shura riu mas logo seu rosto ficou com ar preocupado.

- E dá para ela fazer isso, ficar em pé? – retrucou o cavaleiro de Capricórnio me vendo levantar.

- Ah, fala sério. – Bati a poeira do corpo e levantei - Tenho que arrumar isso...

Respirei fundo e olhei para eles - nem precisava se preocupar. Tenho minhas defesas. – falei para Mu.

Movi as mãos mentalizando as espadas em ordem crescente de tamanho. E todas estalaram de volta nas paredes novamente.

- Muito bem... não nega o signo de Áries em que nasceu. – Mu comentou atrás de mim orgulhosamente. – telepata e dona de si.

Deixei os dois dourados de Capricórnio e Áries conversando e dei as costas.

Sai em após ter terminado a arrumação das espadas que eu havia derrubado e recomecei a minha caminhada por aquelas escadarias infinitas.