Os Cavaleiros - parte 10
A todo o momento que piscava eu tinha a sensação de ver rostos, reflexos de armaduras, golpes reluzentes de grande poder, dor, perda.
Será que estava ficando louca? Ou tinha atado laços com aquele lugar, aos quais eu jamais conseguiria me desfazer?
Aqueles rostos que eu via nem sempre me eram estranhos. Eram semblantes já vistos antes em algum lugar.
Ao me aproximar da quinta casa, senti uma sensação de revolta que pairava no ar, como se algo de um passado não muito distante tivesse assombrando o lugar.
Por alguns instantes, ao olhar para a porta da casa de Leão, eu tive a impressão de ter visto o rosto entristecido de um amigo.
Ser só uma impressão?
Olhei para os lados e para o último degrau que tinha para subir. Ao dar o último passo, senti o peso de um braço me segurando pelos ombros, prendendo meus pés ao chão.
– Fui pega por um leão? - balbuciei a piada sem olhar para trás, esperando uma reação.
A mão que me segurava afrouxou os dedos assim que me virei e encarei o homem de rosto quase coberto pelos cabelos castanhos claros revoltos com o vento que soprava.
Eu estava surpresa com o que eu via.
“ Deus!! Como é parecido com Aioros...” Levei as mãos aos meus labios espantada.
Arqueando a sobrancelha prontamente ele se apresentou:
- Sou Aioria, guardião da casa de Leão.– soltou meus ombros, tirou o cabelos dos olhos, arrumou a capa de sua armadura que esvoaçava e sorriu.
Deixei que as palavras escapassem de minha boca inadequadamente:
-Nossa! Você é muito parecido com um cavaleiro que conheci aqui há alguns anos atrás... –
Pensei comigo mesma: poderiam ser parentes?
- Você é a famosa Nisa, suponho? – um esboço amigável em sua face me deixava mais calma.
Senti o rubor ao perceber que não tinha me apresentado adequadamente.
- Sim,,, sou Nisa... – segurei a mão dele firmemente.
Uma onda parecida com choque elétrico pequeno me percorreu o sistema nervoso. Naquele momento localizei de onde vinha a sensação de revolta e dor.
Aoria foi treinado por seu irmão mais velho. Aioros a quem era muito ligado.Ele havia passado sua vida inteira no Santuário, e parece não gostar muito do Mestre ao qual jurou servir. Porém, sem Athena, não há outro que ele julgaria como líder, então não faz nada para parar o mal que parece ocorrer no Santuário.
Era daquele rapaz. Ele possuía uma aura repleta de justiça e amor, mas no fundo havia indignação e tristeza.
.
“Por quê?” eu pensava sozinha enquanto o encarava sorrindo.
- Eu tinha um irmão chamado Aioros. Éramos parecidos sim, mas ele morreu há um tempo. Por acaso você o conheceu? – ele fez cara de curioso e olhou em meus olhos fulminantemente.
Fiz um gesto positivo com a cabeça, apenas por reflexo. Já que muitas coisas passavam em minha mente em ritmo de locomotiva.
- Meu deus... – balbuciei sentindo um nó na garganta.
Senti a mão gentil de Aioria me guiar para dentro da casa zodiacal de leão.
- Não sei se posso lhe contar isso, mas como você esta sentindo os pensamentos de todos que nos cercam, acho que não é novidade o que vou falar... Houve uma batalha entre cavaleiros de ouro, devido a uma menina que diziam ser a reencarnação da Athena.
Aquele rapaz me levou calmamente para sentar em umas almofadas que estavam espalhadas pelo chão, me serviu uma bebida fria que eu não soube identificar, por causa do sabor de sangue ainda na boca.
- Aquelas imagens que eu tinha visualizado nas escadaria antes de encontrá-lo eram de Aioros?! - senti algumas lágrimas correrem pelo meu rosto. – Aquela dor, o sangue, os cortes.. Tudo foi com ele???
Minutos se passaram até que Aioria quebrou o silêncio.
Em um tom muito sério na voz, ele passou para palavras toda a seqüência de imagens que eu tinha visto em minha mente. Ele narrou tudo o que houve com se irmão há anos atrás. Agora tudo estava revivendo dentro de mim por uma dor que não me pertencia, mas que eu sentia profundamente.
- Aioros foi assassinado! – a essa altura as lágrimas me corriam pelo rosto compulsivamente. – Vocês, cavaleiros de ouro, supõem que fizeram justiça quando o mataram? De que forma?
O jovem de cabelos claros me olhava confuso.
- Meu irmão não se defendeu, ele tinha culpa, mesmo sendo um servidor do santuário, falhou em sua missão. – Aioria falava convicto e com uma raiva profunda de seu irmão.
- Como pode falar isso dele.... seu próprio irmão! Que armadura ele possuía? – sequei as lágrimas com as costas das mãos e o encarei.
- Sagitário. Supostamente era para ser nosso próximo mentor do santuário – em um gesto rústico ele pegou o copo vazio que estava em minhas mãos. - Quando meu irmão foi acusado de ter raptado Athena eu fui perseguido. Quase morto, me defendia com todas as minhas forças, até que esta armadura surgiu a minha frente e me salvou dos ataques dos cavaleiros que queriam minha morte. Passei de um mero aprendiz de um traidor para um Cavaleiro de Ouro.
Naquele momento me deu uma imensa vontade de me transportar para a casa de sagitário e ler todas as impressões que existiam ali. Apurar qual faceta era verdadeira. Se a historia que o jovem irmão contava ou se as sensações que eu tinha.
Passei as mãos nas minhas pernas e senti em meu bolso a carta que havia recebido há um tempo atrás antes de voltar ao santuário.
Saquei a folha de papel e entreguei a Airoia, que identificou a letra assim que depositou os olhos na caligrafia.
- A carta era de fato de sagitário, de meu irmão. Como você tem isso menina? - vorazmente começou a lê-la sem esperar minha resposta.
De novo, senti uma imensidão de energias pairando sobre mim.
Era como se eu soubesse da existência de todos aqueles cavaleiros há muitos anos.
- Você imagina o porquê dele ter me escrito isso há anos atrás? Você acha que eu poderia te-lo ajudado em algo?
Ao poucos, conforme eu pensava em cada um dos cavaleiros que tinha conhecido até ali, eu conseguia identificar cada um dos seus cosmos, cada uma de suas marcas de energia. Sabia dizer claramente que emanavam energias e de onde vinham.
Um dos cosmos mais intrigantes que eu estava sentindo vinha da casa seguinte. Era algo muito forte, muito sincero e extremamente contido.
Olhei para cima e localizei meu caminho de escadas que guiavam ate a casa de Virgem.
Eu queria mudar de assunto com Aioria e aquele era o momento certo. Aioria seguiu meu olhar e falou animado, como quem tivesse entendido que o assunto amargo findara:
- O cavaleiro daquela casa é o Shaka. Conhece a história dele? – sentou-se na almofada ao meu lado e apoiou as mãos nos joelhos.
- Conheço o que acabei de sentir em você....- eu lia a memória de Aioria com facilidade enquanto ele visualizava o cavaleiro de Virgem.
Talvez ele fosse o único que tinha a mente aberta para leituras, sem medo de qualquer interferencia
- O que você vê, pequena curiosa? – o cavaleiro de leão sorriu quando me viu mergulhada em seus pensamentos.
- Vejo que todo mundo pensa coisa demais desse cavaleiro de Virgem.
- Menina, você o conhecerá. Espero que isso que está sentindo seja o que você vai ver lá: paz – ele sorriu tranquilizado com a conversa.
Pisquei algumas vezes pensando rapidamente.
.- Aioria, você possui a mesma intensidade de energia que o tal Shaka, só que esta energia está canalizada em outras direções. Dentre essas direções, há uma raiva imensa por seu irmão. Isso eu não compreendo. - Acariciei os cachos revoltos de seu cabelo.
Senti seus olhos fechando, tentei com a maior sutileza passar para ele as sensações boas que tive com o irmão mais velho dele quando nos vimos pela primeira vez.
Vi uma lágrima correr livremente pelo rosto daquele rapaz e morrer em seus lábios.
Nada podíamos fazer por aquele sentimento. O vi se ajoelhar diante de mim como um cavaleiro faz diante de um rei.
Dei um passo a frente, o enlacei em um abraço apertado e beijei seu rosto, secando a lágrima que corria.
- Se cuida Aioria, seu coração é grande demais para as pessoas semearem idéias más nele.
Dei alguns passos em direção a saída, ao olhar para trás novamente vi o tamanho de seu cosmo ao mesmo tempo que senti o tamanho de sua dor