Os Cavaleiros - parte 9
Quando estava para sair da casa de gêmeos senti uma energia muito destoante da paz que havia naquelas construções.
Dessa vez subir as escadas estava fora do meu roteiro. Então fechei os olhos devagar e transportei-me direto para a entrada da casa de câncer.
Nem bem a pequena poeira que se levanta no teletransporte se desfez eu já via alguém a minha frente.
Ali estava um homem magro, ombros largos, imensas cicatrizes nos braços, parado de costas para a porta, e conseqüentemente, de costas para mim. Sua armadura tinha uma série de pontas que brilhavam aos reflexos do sol.
- Ele recebe visitas dando as costas? – falei baixo, mas com intenção de que me ouvisse.
- Você deve ser a atrevida que muitos estão falando que está passeando por entre as doze casas. – o homem de cabelos curtos repicados e azulados virou-se para mim com flamejantes olhos acinzentados.
Com a recepção calorosa, eu não estava me sentindo bem vinda. Aquele homem tinha o olhar maldoso.
Tomei fôlego após pensar por alguns segundos e resolvi responder-lhe a altura:
- Sim, sou eu. – apontei para mim mesma com uma das mãos – Tem algum problema em me deixar passar ou me contar um pouco de você?
Fiz cara de pedante e me sentei na soleira da porta, olhando em direção a casa de gêmeos, ficando de costas para ele.
Levei as mãos à cabeça e mexi em uma mecha de cabelo fingindo não prestar atenção naquele mal humorado bufando atrás de mim.
Que impressão horrível tive daquele homem!
Prestando atenção em sua voz, lembrei que era ele quem falava alto no bar que visitei há um tempo atrás. Já tinha tido essa má impressão antes. Agora, para mudar essa imagem que eu havia feito dele seria quase impossível.
Ficamos alguns instantes calados e eu me virei de frente para ele, ainda sentada ao chão e comecei a observá-lo.
- Você tem nome?
Uma aura horrível pairava sobre sua cabeça. Será que ele é amargo assim porque aconteceu alguma coisa muito ruim em sua vida? Alguém que tenha perdido.... ou até mesmo um amor não correspondido?
Muitas pessoas se fecham em mascaras más ou tristes quando acontecem esses tipos de coisas.
- Me chame como todos os outros: Mascara da Morte.
Os olhos dele inflamaram de raiva após responder minha pergunta mas ele permaneceu me encarando. Então resolvi cutucar mais ainda:
- Eu sei que você pode entender e ler o que eu penso. Então responde logo o que eu me questionava!!!! – virei os olhos para encará-lo, sem virar o rosto.
Obviamente ele se incomodou com minha observação. Além de ser bom no combate corporal, Máscara da Morte possui poderes telepáticos e telecinéticos
- Não tem nada pra você entender, menina enxerida – ele aumentou o volume da voz
- Ah, vai gritar agora cavaleiro? Não sabia que vocês eram treinados durante tantos anos para serem sem educação!!! – levantei em um pulo furioso e coloquei a ponta de meu dedo na testa dele.
Agora estava entendendo o motivo das pessoas o chamarem de mascara da morte. Ele é um ser sanguinário, forte, sádico, adora lutas, matanças e acredita que, para um objetivo maior, alguns sacrifícios são inevitáveis.
Eu ainda não tinha passado da porta da quarta casa zodiacal, não podia ver nada ali dentro alem dele a minha frente.
Um olhar ácido cruzou com o meu.
- Você pensa que sabe muito sobre nós, mas não conhece os sacrifícios que muitos fazem para chegar onde estou. E saiba que essa caminhada que você esta fazendo não me toca em momento nenhum! É só turismo de uma menina mimada!
Continuei falando assim que senti uma pausa em sua frase:
– Você deve estar se sentindo muito homem gritando comigo. Só porque está vestido de siri !
Dei um passo a frente, entrando de verdade em seu território. Senti uma fisgada em meu estômago. Havia muito miasma negativo ali dentro. Aquilo me tirava o fôlego a cada arfada de respiração que eu dava.
Uma de minhas mãos tocou no peito de sua armadura em um gesto nervoso.
Ouvimos um tilintar, parecido de cristal ressoante e em seguida barulhinho de metal caindo chão.
Gemi baixinho e arqueei as sobrancelhas quando vi o que tinha feito.
- Ops! – a armadura de câncer estava totalmente desmontada no chão, dividida em varias partes douradas.
Olhei sorrindo para Mascara da Morte. Ele me encarava e rosnava se segurando para não me atacar.
- Agora você ta sem o “siri” pra te proteger rapaz! Que absurdo! – sorri cinicamente.
A cara dele era indescritível. Era um misto de raiva e incredulidade. Ele tinha uma espécie de tique nervoso na testa que deixava a situação mais hilária.
Suprimi meu riso e passei bem ao lado dele, esbarrando em seu braço de propósito e sussurrei:
- Quem ele pensa que é para ser tão ruim assim? – ajeitei meus cabelos e sorri.
Dei alguns passos após esbarrar nele e em seguida vi um clarão precedido de um som agudo que passou pelas minhas orelhas.
Senti um gosto estranho na boca. Um gosto férreo.
Uma leve brisa moveu meus cabelos e senti uma mecha dele se soltar da minha testa desenhando uma franja e espalhando pelo chão uma mecha consistente de fios.
Dei um grito de raiva.
– Ahhh!!! Cortou meu cabelo!
- Você é muito atrevida!! – apontou o indicador para mim quando me virei tentando entender o ocorrido.
Pequenos feixes dourados de luz ainda ricocheteavam nas paredes escuras da casa de Câncer.
Existiam milhares de faces esculpidas nas paredes. Cada uma mostrando uma forma de horror diferente em sua feição. Senti meus braços se arrepiarem ao ler totalmente as energias daquele homem a minha frente.
“O cavaleiro de câncer pode transitar facilmente entre o mundo dos vivos e o pelo vale dos mortos.” Parecia que ouvia um voz dentro de mim.
Engoli a seco e o encarei. Ele ainda estava com o dedo em riste em minha direção.
- Fez isso com o indicador? – falei boquiaberta sentindo frio na boca estômago.
Um sorriso sádico brotou no rosto do Mascara da Morte.
- Amostra grátis por sua petulância, menina. – estalou os dedos ao finalizar a frase.
- Eu nem tenho como te machucar e você fez isso comigo? Tem certeza de que você luta por justiça, seu infeliz!? - reparei em cada cicatriz que aquele homem ostentava em seu corpo e sorri quando percebi que estava vestido apenas com uma calça colante.
- Você realmente não pode fazer nada comigo, menina insolente! – gargalhou monstruosamente quando ele viu meus olhos presos nos enfeites das paredes.
Um passo a mais e Mascara da Morte estava com o rosto colado no meu. Fechei os olhos e deixei minhas mãos espalmadas contra seu peito.
Desejava pode fazer algo contra ele. Mas eu não sou treinada para atingir ninguém, ainda mais no nível de técnica que ele parecia ter.
Outro clarão surgiu na casa zodiacal e, dessa vez, o cavaleiro de câncer ele estava no chão, fora arremessado de bruços contra o chão de pedra polida.
Pisquei incredulamente quando o vi. Não digo que ele ficou “estatelado” mas pelo menos estava de calças quase nas mãos.
- Hug... sem vergonha e insolente é você que não sabe vestir roupas direito embaixo dessa casquinha de siri que você usa! Vê se pode.... – apontei para as calças que ele usava – uma leg grudada aos documentos, deixando tudo a mostra!
Como quem acordasse de um sonho ele deu um salto. Não conseguiu se levantar. Alguma força aquém dele o segurava ao chão.
Seu rosto irado estava inflamado enquanto era obrigado a ficar sentado olhando em minha direção imóvel enquanto eu atravessava a casa de Câncer .
Fui embora caminhando e xingando a péssima idéia de ter entrado naquele lugar. Poderia ter simplesmente me teleportado para a casa seguinte e pulado aquela tortura.
- Como uma pessoa daquela pode ser um cavaleiro? O cara é uma criança que se acha dona do mundo com coroa de ouro.... – toquei meu lábio e percebi que estava cortado
Olhei na direção da casa de leão e me transportei até metade do caminho de escadas.
Respirei aliviada quando vi que estava longe de tudo que tinha sentido.
Senti uma brisa leve me tocar. Parei em certa parte da escadaria branca para observar a beleza arquitetônica o lugar.
Fechei meus olhos por segundos e senti uma troca de imagens boas e ruins passar em minha cabeça.