Sol e Lua (Gênios x Esforçados)
Nota inicial: um conceito relativamente comum em histórias juvenis de fantasia é o de "gênio x esforçado". Gênio é alguém que possui um dom especial, capaz de desenvolver uma determinada habilidade além do que as demais pessoas conseguem, em um tempo muito curto. Esforçado é a pessoa considerada sem dom, que precisa treinar e desenvolver as habilidades.
Nas histórias, os gênios são sempre valorizados, e acredita-se que um esforçado nunca pode superar um gênio. (Será?)
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Dan estava apreensivo. Desde quando ele fora reconhecido oficialmente como Gênio sua amiga Nina não ousava falar com ele. Na realidade, desde então ela desapareceu. A garota certamente estava frustrada: dos amigos de infância, ela era a única que não possuía um dom, estava destinada a ser uma Esforçada.
Estranhamente, aquele dia ela voltou a aparecer, como se nada tivesse acontecido. Ou melhor, aquela noite, após as aulas. Antes que Dan pudesse perguntar qualquer coisa, ela logo disse:
- Eu não sou Gênio. Eu não tenho um dom próprio. Quer dizer, o meu dom é o de aprender rápido. Mas esse não é um dom reconhecido pelas pessoas.
Dan não disse nada. Nina continuou:
- Mas eu acho o meu dom o melhor de todos. Não há nada neste mundo que eu não possa aprender, eu posso ter a habilidade que eu quiser.
Dan resolveu interferir:
- É, mas qual é a graça de não ter uma habilidade própria? Qualquer um pode aprender qualquer coisa, basta se dedicar.
Ela fez sinal de silêncio e olhou para o céu.
- Você não deveria dizer uma coisa dessas...
- Por quê? - perguntou Dan.
- Hoje é Lua-Cheia... - respondeu somente Nina.
Dan não entendia mais nada:
- Sim. E daí?
- Olha como a Lua está bonita... Essa é o que chamam de Inspiração dos Namorados e Poetas...
- Não mude de assunto.
Ela nem ligou. Continuou:
- Mas sabia que a Lua é uma parasita?
"Onde ela quer chegar com isso?", pensou ele.
- É sim - Ela disse ao ver a incredulidade do amigo - E não me olhe como quem não estivesse me entendendo. O brilho da Lua é mágico, mas só existe porque a Lua rouba a Luz do Sol.
- "Rouba"? Ela reflete!
- Tanto faz, de qualquer forma, o brilho não é dela, mas ela rouba a luz do Sol e a reflete para gente ver como ela fica bonita. E grande.
"Isso é verdade", ele pensou. A Lua não tem Luz própria, o que vemos é a Luz do Sol refletida nela. E quando a Lua está Cheia, seu brilho causa a impressão de que ela está maior.
- Dan, você alguma vez ouviu alguém usar o Sol como inspiração romântica?
- Não, realmente não.
- No entanto, ele é a fonte causadora do brilho e da beleza da Lua.
- Também, você já conseguiu olhar direto para o Sol e admirá-lo por algum tempo?
- O Sol não sabe controlar sua Luz. Seu brilho é tão intenso que nos ofusca. Mas a Lua se aproveita dessa Luz e a usa do modo conveniente para que possamos admirá-la.
- Mas isso não é algo consciente, é coisa da natureza!
- Sim. E você pode chamar de um outro nome. Dom. É um dom natural. Algo que não depende do querer, mas é algo com que cada pessoa, animal, coisa, nasce.
Ela estendeu suas mãos como se fosse abraçar a Lua.
- O Sol é gênio. A Lua é esforçada.
Dan finalmente entendeu:
- Eu sou o Sol. Você é a Lua.
Nina sorriu.
- Dan não é tão "devagar" como eu achava!
Depois séria:
- Eu não mudei de assunto. E eu tenho uma boa memória.
Dan suspirou, nem queria tentar entender o que ela estava dizendo dessa vez. Pelo menos Nina havia superado sua aparente desvantagem e podia voltar ao grupo.
(trecho de uma história, escrito em 2005)