Semente
Caminha descalça na areia. A manhã está chegando com seus matizes. Deseja abranger na alma toda a vida que canta a seu redor. Os pés delicados e pequenos vão seguindo o caminho ao rio. Uma vereda antiga abraçada por pés de atas e goiabeiras. A preferência dela é por goiabas da carne branca. Visualiza a fruta macia, carnuda sendo devorada por seus dentes alvos; o sabor adocicado na boca, deixando um aroma penetrar em seu corpo; passando a língua nos lábios para sentir com mais intensidade.
E vai pela vereda cantando ao mundo da felicidade de ser uma adolescente. Cruza os braços, respirando fundo. Enlaça o corpo tão fortemente como se desejasse fundir-se interiormente, como se estivesse separada de sua outra parte. Acaricia-se com as mãos contrárias. Quer sentir uma carícia na pele. A vida nascendo na manhã, enchendo-lhe o ser de percepções. As flores desabrochando devagar, caminhando lentamente para o encontro da vida. Brotando da terra uma seiva a alimentar as plantas. E as folhas das árvores sacudindo-se ao vento ainda menino de calor tal uma dança em gingados crescentes.
E no meio do caminho, uma adolescente aproximando-se do rio que corre em direção a um mar. Quer ser ampla, completamente dona de si. Entre tanto verde seus olhos se extasiam. A cabeça cheia de pensamentos, de tantos nomes, de tantos olhares, de tantos lugares a ir. Uma adolescente, tal uma semente que se lança na terra para germinar. É ela mesma em seu mundo e ainda assim não se sabe toda. Pensa-se dividida. Um fragmento de um texto; uma leitura incompleta.
Deixa os olhos irem ao longo do corpo. Impressiona-se com o tamanho das pernas. Não compreendo o que ocorreu. Mas gosta de estar mudando de menina para mulher. Sorri. Docemente passa as mãos no rosto. Fecha os olhos. O vento bate-lhe nas faces. Suspira. As mãos vêm pelos seios pequenos, assustado-a o com o toque. Abre os olhos. A íris castanha brilhando nos raios do sol que surge.
Agarra-se ao pensamento de que só está começando a viver. Um fascínio pelos sons matutinos é só um pedaço de seus ouvidos. Há outro ponto que a atraia. O bater das águas nas pedras das margens. O rio estava ganhando água. O aspecto barrento não a assusta. Galhos e folhas secas descem na correnteza ainda leve. Está apenas começando a chover na nascente do rio.
Retira as sandálias dos pés. Coloca a toalha num ponto afastado da margem em cima de uma pedra. Sobe noutra mais alta parcialmente coberta pelas águas e se lança ao ar emergindo mais adiante em braçadas ao largo do rio...