Os Três Filhotes
Eram três bichinhos assustados que me olhavam entre as folhagens. Dois mais robustos e brincalhões pareciam menos maltratados, porém o terceiro era magricela, tinha um olhar triste; assim que me viu correu para se esconder.
Procurei uma pessoa que me passasse uma informação a respeito daqueles animais. Foi quando me apareceu uma senhora gorda, cerca de sessenta anos; veio ao meu encontro e me falou:
_Esses animais não tem dono. Uma cadela pariu aí nos matos, um pessoal levou os machos e deixaram as fêmeas.
Fiquei penalizada. Aqueles animais nasceram para sofrer a não ser que alguém os aceitasse, lhes dando os cuidados necessários. A mulher percebendo meu interesse foi logo se oferecendo para ajudar a pegar os bichinhos.
_A senhora gosta de animais? Perguntou-me só pra puxar conversa.
_ Sim, eu gosto. Gosto tanto que tenho treze cães, oito gatos.
Ela pareceu assombrada. Sabia que iria causar-lhe maior assombro quando acrescentei:
E, além disso, tenho coelhos, tartarugas, papagaio, ovelha, bode, cavalo. Minha casa é um mini-zoológico.
Ela com um olhar arregalado, disse:
_Então a senhora leva esses coitados. Tenho certeza de que lá serão bem tratados.
Já estava com o coração amolecido. Imaginava a cara de meu esposo e dos empregados quando chegasse em casa com aqueles três filhotes. Sabia de cor o que diriam: ¨Você nos prometeu que não traria mais nenhum animal!¨
Olhei para aqueles olhos tristonhos do filhote magricela. Ele me fitava com um de quem me pedia casa e carinho. Não pensei duas vezes. Voltei-me para aquela senhora, e lhe fiz o pedido:
_Como podemos pegá-los, parecem tão ariscos? E se a mãe deles chegar?
Ela me deu um sorriso banguela, e aquietou meus temores: ¨Nesse momento ela está lá pelas bandas do mercado, só volta a tardinha.¨Chamou um garoto que brincava com outros moleques, e lhe mandou entrar no cercado.
_Cuidado com o arame, menino! Bote esses bichinhos pra cá que essa senhora vai levá-los. Não deixe que passem por debaixo dos teus cambitos,viu?
Vó, a senhora não vai ficar com a pretinha?
Deixe de ser enxerido, menino. Mandei foi você tanger os cachorros pra cá. Não pedi sua opinião, nem vou ficar com nenhum cachorro. Já basta a trabalheira que vocês me dão.
Virou-se em minha direção, e como pedindo desculpas foi me explicando: É que cuido de três netos, meu esposo é de idade, e minha mãe está muito doente; tenho que está sempre o pé numa casa e o pé na outra. Não tenho descanso. ¨ Disse para o neto:
_Vá menino!
O moleque todo suado e sujo de suas andanças na rua, agachou-se sem esforço aparente, e desapareceu no mato; logo depois o ouvimos gritar de lá de dentro:
_Pega os bichos, vó!
De repente saem dois animais correndo assustados; a velha apesar de estar acima do peso abaixa-se com rapidez e os pega com a maior facilidade. Logo depois aparece o garoto com o magricela pendurado pelas pernas. Mesmo que eu quisesse não teria pegado nenhum. Fiquei de mãos abanando.
Fui até o carro, peguei uma caixa e, meus ajudantes colocaram os filhotes ali dentro. Abri a bolsa, dei um trocado ao garoto, agradecendo pelos esforços. No que ele retribuiu dando-me um sorriso faltando dois dentes; tinha uns oito anos de idade. Depois saiu numa disparada, na certa entraria numa venda para comprar uns pirulitos ou pipoca. Fui oferecer uns trocados à senhora, no que ela balançando a cabeça, me disse:
_ Não precisa dona, só pelo que a senhora está fazendo por esses bichos já me sinto recompensada. Vá com Deus, e cuide bem dos animais.
Sai dali já pensando no trabalho que teria pela frente. Os filhotes estavam desnutridos, cheios de vermes e com o corpo ferido. Ao chegar em casa, entraria em contato com Dr. Samu e lhe pediria que viesse cuidar dos bichinhos.
Meu marido que estava junto ao caseiro, quando me viu sair do carro com uma caixa pesada, disse algo pra seu Atílio, e veio ao meu encontro. Olhou dentro da caixa, levantou uma sobrancelha, e me disse com uma voz cheia de um riso contido:
_Estava com saudade. Quem são esses agraciados?
_São uns bichinhos que estavam jogados à míngua.
Virei para o caseiro e depois de saudá-lo, pedi-lhe que fosse preparar um local para os filhotes. Contei para meu esposo toda história, preocupada com sua falta de entusiasmo. Pedi que olhasse os bichos enquanto subia para tomar um banho; ao voltar percebi que meu esposo já tinha entrado em contato com o veterinário, os filhotes já tinham tomado banho, e estavam de barriga cheia.
Reconheço que todos têm com razão ao se preocuparem com essa mania que eu tenho de trazer pra casa todo tipo de animal, porém não consigo me controlar. Como deitar a cabeça no travesseiro sem lembrar daqueles animais indefesos, jogados à própria sorte?Quando estiverem gordos, bonitos e sarados encontrarei um lar para eles; um lar que os trate com carinho; também tenho que me preocupar com os outros; que ninguém os quer como animais de estimação: são cegos, aleijados e velhos. Esses animais foram abandonados pelos próprios donos, que um dia os pegaram no colo, levaram para passear, brincaram e receberam tanta fidelidade, pra hoje... Não terem um lar pra ficar, quando mais precisam de amor.