A TENTAÇÃO DO LUCAS
Quando Mamãe foi à padaria naquele dia, viu uns bolinhos de arroz que deviam ser deliciosos. Cheiravam tão bem... Perguntou à empregada se eram frescos e quanto custavam.
—Ainda estão quentinhos, minha Senhora, e custam 60 cêntimos cada. Quer levar?
Mamãe hesitou...
—Mas são tão pequeninos, meu Deus!...
—Mas são muito saborosos, uma delícia. Compre, minha Senhora, que vai gostar.
E Mamãe pensou no Lucas, na Nádia e no Papai e resolveu comprar. Sobretudo no Lucas que era muito guloso e nunca tinha comido bolinhos de arroz.
—Levo quatro mas embrulhe-os individualmente, se faz favor.
A empregada da padaria fez quatro embrulhinhos muito bem feitos e, dentro de cada um, um bolinho de arroz.

Mamãe chegou a casa, guardou os quatro embrulhinhos na gaveta do louceiro e foi a casa da vizinha, D. Belinha, buscar o Lucas que tinha ficado lá enquanto Mamãe ia às compras. Depois, o Lucas ficou a brincar no pátio com o gato Cambalhotas e Mamãe foi para a cozinha fazer o almoço.
Daí a pouco já cheirava a comida. Lucas deixou a brincadeira e foi à cozinha meter o nariz nos cozinhados de Mamãe. Estava com fome e além disso era muito guloso.
—Mamãe, que é que estás fazendo para o almoço?
—Sopa de cebola, da que tu gostas.
—Ah! Por isso é que cheira tão bem.
—E mais quê?
—Vai ser peixe.
—De peixe não gosto muito. E sobremesa, não tem?
Mamãe pensou nos bolinhos de arroz, mas não disse nada. Era para ser surpresa:
—Sobremesa hoje não tem. Come-se uma fruta e pronto. Uma laranja ou uma maçã.
—E agora deixa-me acabar o almoço que a Nádia e o Papai estão quase a chegar.

Lucas deixou Mamãe na cozinha e foi à casa de jantar buscar o seu ioiô para ir brincar com ele no pátio. Em cima da mesa estava uma fruteira com maçãs, peras, laranjas e ameixas. As ameixas são frescas, pensou o Lucas, foi Mamãe que as trouxe do mercado, e apalpou a mais vermelhinha a ver se estava madura.
—Hum!.. ainda está dura. Não gosto assim... são azedas.
Abriu a gaveta do louceiro onde tinha guardado o ioiô. Tirou-o, fechou a gaveta e já ia a caminho do pátio quando...
—Ai, aqueles embrulhinhos... que será aquilo?
Voltou para junto do louceiro, abriu a gaveta, e lá estavam os quatro embrulhinhos...
—Meu Deus, que será isto? Isto não estava aqui...
Apalpou um, depois outro, depois apalpou mais um... são molinhos, pensou o Lucas... isto é... o quê? O Lucas além de ser guloso era curioso... cheirou um, cheirou outro... isto são bolinhos de qualquer coisa. Vou abrir um... Abro este... Não! Não abro... Não é bonito mexer... e não abriu. Resistiu à tentação.
—Mamãe vai ficar zangada, se eu abrir. Não. Não abro!
Pôs o bolinho junto dos outros três, fechou a gaveta do louceiro e foi até á janela. O gato Cambalhotas estava sentado lá fora, no pátio, à espera dele e do ioiô. Foi indo para a porta, mas antes de sair, sentiu de novo aquela curiosidade...
—Que bolinhos seriam aqueles?
Voltou para junto do louceiro e abriu a gaveta, mas não tocou em nada. Ficou só a olhar para os quatro embrulhinhos. Fechou a gaveta. Mas voltou a abri-la... pegou num dos embrulhinhos...
—Só vou provar... só uma migalhinha...

****************

À hora do almoço Nádia voltou da escola e Papai do Serviço. Nádia ficou no pátio a brincar com Lucas e com o gato Cambalhotas, enquanto Papai ajudava Mamãe a ultimar o almoço e a pôr a mesa. Foi então que Mamãe deu pela falta de um dos bolinhos de arroz.
—Eu comprei quatro — dizia ela — e agora só tem três. Era um para cada um... Alguém mexeu...
—Só pode ter sido o guloso do Lucas — disse Papai — mas não digas nada que mais depressa se apanha um mentiroso que um coxo...

Quando acabou o almoço Mamãe disse:
—Pronto. Hoje não tem sobremesa. Come-se fruta, uma pêra ou uma maçã...
—Eu prefiro uma ameixa — disse Papai escolhendo a mais madura — esta deve ser docinha.
Nádia escolheu a banana mais pequenina, porque era mais fácil de descascar... e Lucas não escolheu nada... Quando acabou de comer a sua ameixa, Papai levantou-se, abriu a gaveta do louceiro, tirou os três embrulhinhos que lá estavam, fingiu-se muito admirado e disse:
—Falta um destes embrulhinhos aqui... alguém tirou?
Todos disseram que não.
—Eu preciso de saber se alguém tirou um embrulhinho destes... é muito importante. Digam-me, alguém mexeu nos embrulhinhos que estavam aqui na gaveta do louceiro?
Mamãe disse que não, Nádia também e Lucas jurou que nem sabia que estava embrulhinho nenhum na gaveta do louceiro.
—Eu não toquei em nada, nada!
—Tens a certeza que não tocaste, Lucas?
—Juro! Eu nem sabia de nada... Juro! Não mexi em nada!
—Pronto. Não faz mal. Se não mexeste, não tem problema. Julgava que eram quatro... São para os ratos que aparecem na garagem... têm veneno...
Lucas deu um salto na cadeira, aflito, e pôs-se a chorar e a tremer de medo.
—Ai... Eu... Eu vou morrer! A barriga dói!... Ai!... Ai!...
Mamãe acudiu, sentou-o no colo e aconchegou-o.
—Deixa, Lucas, Papai está mangando. Não é veneno de ratos, não. São bolinhos de arroz para a sobremesa. Mas tu já comeste o teu... Tá?