FLIN E A CIDADE FLUTUANTE CAP 2 : PERDIDO

De certo, o ambiente hostil daquele lugar era a constatação clara de estar vivo. A imensidão da floresta era tão assustadora quanto o seu enigmático silêncio, e nem mesmo os passos curtos de minha empreitada, minimizavam o incômodo mórbido do meu corpo. Tudo alcançava uma imensidão desproporcional em intensidade e extensão, apesar de que naquele momento, a minha visão turva tornava quase nada visível, no meu mais profundo íntimo, sabia que estava sendo observado. Cenas de um passado longículo retornavam com vibrantes alucinações na minha mente. O grito ensurdecedor arrematou para o céu um lampejo de agonia, repercutido por toda floresta. Uma sonora melodia, fina e cautelosa, entremeou-se pelas folhagens num suplico lamento, em cumplicidade, o vento, harmonioso, assobiou um cântico, no arfar das asas simétricas dos pássaros. Princípio, meio e fim, sem origem, ordem ou direção, envolveu toda a atmosfera, enquanto me encontrava estarrecido e desnorteado a procura de salvação.

Meus olhos abertos e atentos ao mesmo tempo a um sinal qualquer de civilidade. O medo absorvido pelo meu corpo exalava um cheiro forte de insegurança. Dizem que os animais pressentem o pavor de suas presas pelo odor. Apesar dos vários acontecimentos dos últimos meses, ainda não me acostumara com aquela devassidão de mundo.

Os lábios ressecados e as mãos trêmulas demonstravam a precariedade do meu estado de saúde, mas a determinação ainda permitia aos movimentos contínua força e coragem. O sangue seco da fronte e a enorme cicatriz da perna era um enorme enigma a ser desvendado. Lampejos de imagens flutuavam pela memória. Ora uma jovem singela de contornos perfeitos. Ora, um jovem de semblante sereno e sorriso cativante arrematavam-se aos meus braços, envolvendo-me. Árvores com galhos pontiagudos e um bicho com enorme boca, constantemente apareciam como um flash de máquina fotográfica.

Perto de qualquer lugar, longe de todas as coisas conhecidas. Fatos que não se encaixavam, como um quebra-cabeça de peças perdidas, em tabuleiros suspensos por pilares invisíveis. Meu nome, este sim era evidentemente claro. Suspirei aliviado com o súbito reconhecimento. As gotas de lágrimas salgadas escorriam pela minha face enlameada.

Não obstante, um barulho acordou meu instinto de sobrevivência. O que seria? Parecia um motor. Um helicóptero. Um avião? Chegara finalmente à salvação. Olhei estarrecido o imenso pássaro de ferro flutuante no límpido ar de Primavera.

__Estou aqui! - acenei com os braços pelo descampado, __por favor, supliquei quase sem forças __olhem. Continuei gesticulando.

O helicóptero sobrevoou a área visivelmente a procura de algo ou alguém. Ainda dia, perto da sombria noite que se adiantava. Desespero assolou meu corpo sofrido e dilacerouminha alma contida. Com um esforço sobre-humano, contorci as pernas bambas e me pus de pé. Meu peso era demasiado para o tronco adormecido pelo cansaço e a dor. Apesar de tudo, a grande ave circulou o ponto, identificando o alvo.

Tombei por um segundo diante da esperança clara da sobrevivência, onde as peças que faltavam em minha memória, distorcida pela fome e amargura da solidão, reinavam tranqüilas em alguma parte de mim. Seria chegada à hora A escuridão se apossou e em frações, tudo ao redor virou cinzas.

Uma pequena luz circundou os meus olhos pelas mãos de um homem que vestia um grande jaleco branco. As pálpebras cansadas abriam e fechavam. As retinas ardiam sob o contato da luz.

__Qual o seu nome? —o médico falou pausadamente, continuando os movimentos com as mãos em pequenos círculos. __Você se lembra do seu nome?

__Meu nome? Pensei por um momento __Sim, eu sabia, mas por um motivo inexplicável, meus lábios não o pronunciaram. E minha imaginação, febre ou lembrança me carregara profundamente para um mundo do qual jamais esqueceria.

brisse
Enviado por brisse em 16/04/2025
Código do texto: T8311015
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