No pequeno recanto dos brinquedos

Onde não se podia guardar segredos,

Dormia placidamente em uma caixa

Tendo oculto o rosto por uma faixa,

 

Um boneco todo vestido de amarelo.

Seria um príncipe de algum castelo?

Falava bem alto uma boneca de louça

Que para acordar o boneco fazia força.

 

Um boneco palhaço muito respeitado

Disse: ele pode ser um nobre enjeitado

Por isso daquela caixa não queria sair

Para não se revelar se a faixa cair.

 

Programada estava naquele recanto

A festa de natal com dança e canto.

Era o adeus dos brinquedos vendidos

Para os que no recanto ficam retidos.

 

E no pequeno recanto dos brinquedos

Onde ninguém pode guardar segredos

Começaram todos os preparativos

Para a festa com muitos atrativos.

 

Lili, a boneca de louça queria saber

A quem missão delicada poderia caber:

Despertar o boneco vestido de amarelo

Tirar-lhe a faixa e dizer: como é belo!

 

Foi a Tino, o boneco vestido de palhaço,

Que coube a missão de pegar pelo braço

O boneco, acordá-lo e sentá-lo na caixa,

Convencê-lo a tirar do rosto a feia faixa.

 

E no pequeno recanto dos brinquedos,

Onde ninguém jamais guardou segredos,

Despertou o boneco vestido de amarelo:

Onde estou? Pergunta surpreso Marcelo,

 

Jovem príncipe do reino dos brinquedos,

Levado por Violante durante os folguedos

A bruxa que detestava o riso das crianças,

Raptando-as durante suas longas andanças.

 

Foi assim que Marcelo, vestido de amarelo,

Depois da queda viu seu nariz virar farelo

Fugindo de Violante horripilante, a bruxa má.

E chegou a uma casa que tinha picareta e pá

 

Encostadas na parede de pedra. De quem seria

Aquela casinha? Logo soube e sem grosseria

Bateu à porta pedindo ajuda a quem atendeu

Com habilidade e presteza ao boneco socorreu.

 

Era o gnomo que trabalhava nas minas de prata

Reconhecendo Marcelo com deferência o trata:

Para consertar seu belo nariz todo esfacelado

Só há uma solução: não sei se será do seu agrado.

 

Disse o gnomo: farei de prata um belíssimo nariz

Será minha obra de arte para fazê-lo muito feliz.

Assim foi feito. E depois de no espelho se olhar

Marcelo chorou. Não era obra para se admirar:

 

Pensou Marcelo o boneco que dormia na caixa.

E ele saiu da casa decidido a encontrar uma faixa

Para esconder aquele nariz prateado disforme

Pois não há quem nessa situação se conforme

 

Com risinhos, piadinhas e muito deboche.

Aqui não existe isso: disse Gil o fantoche:

Saiba que no nosso recanto dos brinquedos

Onde ninguém jamais guardou segredos

 

Somos todos iguais, pode ser sem pernas,

Sem braços, só dizemos palavras ternas

Não importa se perfeitos ou imperfeitos

Ignoramos os físicos defeitos

 

Fixando-nos no conteúdo, a inteligência,

A honestidade, a prudência e a inocência.

E o recanto dos brinquedos foi sacudido

Com palmas, gritos num tremendo alarido

 

De todos os brinquedos pedindo insistentes:

Sai dessa caixa que te deixa tão impotente

Boneco Marcelo todo vestido de amarelo.

Para nós teu prateado nariz é perfeito e belo

 

Igualzinho ao teu coração de príncipe boneco

Disse a boneca que vestia um branco jaleco.

E foi nessa bela festa no recanto dos brinquedos

O lugar onde não se esconde segredos

 

Que os brinquedos tiraram o boneco Marcelo

Da triste solidão fazendo da caixa um castelo

Onde ele está à espera do próximo natal

E se uma menina o levasse seria o ideal.

 

07/05/22.

(Maria Hilda de J. Alão)

(Histórias que contava para o meu neto)