ROSINHA
(- ALBERTO VASCONCELOS)
Rosinha é uma menina meiga, agradável, delicada e sempre sorridente. Todos gostam dela. Mora naquela vilinha de seis casas, três de cada lado, cujo final da rua é o muro do Colégio Sagrado Coração de Jesus, aonde Rosinha estuda. A maior parte das freiras gosta dela, mas a Madre Jacinta, que as meninas mais velhas chamam de Bruxinta, não perde a oportunidade de castigar as crianças.
Rosinha, pela inocência da idade, está sempre distraída com as coleguinhas e a Madre Bruxinta não perdoa nunca qualquer desatenção, por menor que seja.
Sabe como é criança, né? Rosinha e Luíza, a sua melhor amiga, têm um estoque inesgotável de assuntos hilariantes para serem comentados e saboreados com gostosas risadinhas abafadas nas aulas de bordado, nas rezas dentro da capela, nas aulas de jardinagem e também nas aulas das matérias de gente grande, aritmética, história, geografia, português...
As melhores aulas são as de canto orfeônico com a Irmã Cecília.
As meninas são divididas em quatro vozes e a sanfoninha da irmã ensina a melodia e faz o acompanhamento. É uma hora de lazer e encantamento. Pena que só tem duas vezes por semana.
Agora, no segundo semestre, as aulas de canto serão com músicas para serem cantadas na festa do Natal.
Rosinha queria saber o que quer dizer “Adeste, fideles, laeti triumphantes, venite, venite in Bethlehem! ” que ela canta a plenos pulmões sem saber o significado.
Rosinha e Luíza gostam de brincar de se esconder e de correr pelos imensos corredores do colégio, cheios de colunas e de vasos enormes com palmeiras.
No solário tem o tanque redondo das carpas e as roseiras que, um dia qualquer, a Irmã Clara, professora de jardinagem, vai deixar que elas podem os galhos secos.
(- CLÉA MAGNANI)
Mesmo sem conhecer o sentido das palavras que canta, Rosinha sente muito prazer em cantar para o Menino Jesus, como ensina a Irmã Cecília, e eram aquelas palavras estranhas e a melodia festiva que ela costuma cantar, enquanto brinca, faz os deveres de casa, e até no seu banho, que não lhe sai da cabeça.
Na aula de jardinagem, da Irmã Clara, enquanto manuseia a tesoura de poda, ela canta baixinho, parecendo querer que a planta não sinta os cortes, embalada pela melodia.
Na próxima aula, a mudinha que ela podou já apontava brotos verdinhos, como que sorrindo para ela. E a de suas amigas, ainda não brotaram.
Parece que as plantinhas querem nascer logo, para conhecerem Rosinha e ouvir sua doce voz cantando para elas.
Luiza começou a chorar por seu vasinho não haver brotado.
Mas Irmã Clara a consolou dizendo que havia sido por causa da música que Rosinha canta enquanto trabalha.
Aquilo faz com que Luiza e outras coleguinhas comessem a cantar enquanto fazem suas tarefas.
Os resultados foram visíveis.
Agora as meninas têm prazer em participar das aulas de jardinagem, e a natureza parece responder, com ramos verdes e flores coloridas e perfumadas, às suaves canções das meninas.
Certa manhã, durante as aulas de bordado, Madre Jacinta entra na sala de artes e presencia toda classe cantando Adeste Fideles enquanto fazem seus trabalhos manuais.
A rigorosa Madre quis saber o porquê da cantoria.
Quando soube que a ideia vinha do comportamento de Rosinha, severamente a proíbe, e a todas as alunas, de cantarem, a não ser durante as aulas de canto orfeônico. E só o que irmã Cecilia ensinasse no dia. E dentro da classe.
Isso entristece a todas, inclusive às Irmãs que davam as aulas.
Mas quem desafiaria a severa Madre Jacinta?
E assim se fez. Silêncio total durante toda e qualquer aula, menos nas de canto, evidentemente, e só o canto que fosse aprendido naquele dia.
As aulas ficaram triste... O canto fazia falta... Até as plantinhas pareciam sentir a ausência da música....
Mas chega o Natal e todo o Colégio se reúne em torno do Presépio e canta lindamente o Adeste Fideles, e outras tocantes melodias para o Menino Jesus, com muita alegria.
Madre Jacinta orgulhosa pelo sucesso das alunas do Colégio sob sua direção, sente que tem capacidade de administrar a tradicional Escola com menos rigidez. Afinal não está tratando com um batalhão, e sim com meninas, como ela foi um dia... lembrou-se de sua infância, quando cantava enquanto ajudava sua mãe na cozinha.
Distraíra-se dançando com a vassoura e deixara o leite ferver e se derramar todo sobre o fogão. Havia sido posta de castigo por isso... E ainda hoje descontava nas meninas exigindo toda a atenção nas menores tarefas, se esquecendo de que a música harmoniza, equilibra, alegra e nos aproxima de Deus...
Na reunião com as irmãs depois do reinício das aulas, Madre Jacinta, surpreende a todos liberando o canto durante as aulas em que não fosse preciso atenção e concentração para o aprendizado.
Assim Rosinha continua a cantar todas as músicas das aulas de canto, com suas colegas, nas outras atividades, e até durante o recreio.
A alegria volta a reinar na Escola, e no coração de Rosinha, de suas amiguinhas, das Irmãs e até da antes rabugenta Madre Jacinta, que perde o apelido.
Ah! E nunca o Coro Orfeônico do Colégio Sagrado Coração de Jesus fez tanto sucesso como depois disso...