Cadê a Fogueira de São João, Sebastião?
Era noite de São João. Sebastião queria festejar. Fez uma grande fogueira com lenha de marmeleiro e arrumou na frente da casa, colocou um pouco de gás, acendeu o fósforo e jogou-o na fogueira para queimar.
Entrou para se vestir, pois já se iniciaria as comemorações ao santo padroeiro, mas ao voltar teve uma surpresa:
Que fogueira que nada. A fogueira de São João estava apagada.
Inconformado, Sebastião resolveu tomar satisfações e foi ao pau do marmeleiro perguntar:
– Oh! Pau de marmeleiro porque não acendeu a fogueira de São João?
O pau de marmeleiro a Sebastião logo respondeu:
– Foi o vento que apagou o fogo, o fogo que queimava o pau, o pau de marmeleiro que acendia a fogueira de São João.
Sebastião então resolveu perguntar ao vento o motivo de ter apagado a fogueira:
– Oh vento! Por que apagou o fogo, o fogo que queimava o pau, o pau de marmeleiro que acendia a fogueira de São João?
O vento soprando forte, a Sebastião logo responde:
– Foi a nuvem de chuva, a chuva que apagou o fogo, o fogo que queimava o pau, o pau de marmeleiro que acendia a fogueira de São João.
Já era tarde da noite e por causa do céu nublado, não havia estrelas no céu, mas apenas uma nuvem de sereno, a quem logo Sebastião indagou:
– Oh! Chuva porque veio com o vento, o vento que apagou o fogo, o fogo que queimava o pau, o pau de marmeleiro que acendia a fogueira de São João?
A nuvem com voz mansa de água ouvindo a Sebastião, prontamente explicou-lhe o motivo que a fez apagar a fogueira de São João:
– Foi a caatinga que mandou o vento quente, o vento que fez a nuvem, a nuvem que trouxe a chuva, a chuva que apagou o fogo, o fogo que queimava o pau, o pau de marmeleiro que acendia a fogueira de São João.
Percebendo que a noite logo iria embora, e cansado de tanto procurar, Sebastião deixou a chuva cair e procurou na caatinga para perguntar:
– Boa noite caatinga, porque mandou a chuva, a chuva levada pelo vento, o vento que apagou o fogo, o fogo que queimava o pau, o pau de marmeleiro que acendia a fogueira de São João?
A Caatinga ouvindo-o, com grande lamento fez a seguinte declaração:
– Ah! Sebastião ouça com atenção: foram as poucas árvores em seus espinhos; foram os bichos em extinção: a ararinha azul, o lobo-guará, a cutia e o preá, o tatupeba e o gambá, o veado-catingueiro e tudo que nesta fauna há.
E continuou dizendo:
– O homem só corta, derruba árvores, que são casas e ninhos, e põe fogo que queima a terra que tudo dá, mesmo em meus espinhos, na secura vida há. Se há fogo aqui nada vai restar.
E continuou seu discurso para a Sebastião alertar:
– Produzo vento para o calor amenizar, faço a chuva para o fogo apagar, e a chuva ao se derramar enche os rios. É o inverno no sertão a chegar. O inverno faz a fartura, comida para homens e bichos alimentar.
Sebastião ouviu tudo constrangido e tomou consciência. Uma ideia nascia em sua mente.
Aos vizinhos saiu a convidar para fazer uma brigada contra incêndio, para a caatinga ajudar.
O pau de marmeleiro apagado na frente da casa, serviu para colocar uma placa com os seguintes dizeres:
“Não acenda fogueira, não polua o ar. A fogueira mata a mata,
deixa as aves sem um lar. Mata o solo onde cresce a macambira,
o facheiro, a palmeira e o juazeiro. Mata as árvores que fazem a
chuva, a chuva que enche os rios, rios que dão a água que mata
a sede e produz alimento. Mata a caatinga, e outros biomas que são
vida, natureza, e sem ela a humanidade morre com certeza”.
Depois que Sebastião aprendeu esta lição, todos os anos, nas noites de São João se fantasia de roupa caipira, coloca seu chapéu de palha, e chama os sanfoneiros da região para com muita música cantar e dançar. Faz ainda, deliciosas receitas típicas para o São João celebrar. Fogueira, no entanto, só artesanal para representar, com gravetos secos de alguma árvore que não aguentou a seca, e ainda assim teve outra plantada em seu lugar.
Nas noites de São João o quintal da casa de Sebastião se ilumina sob a luz do lampião, e é enfeitado de bandeirinhas e por balões de papel, pois Sebastião aprendeu a lição:
Festa de São João não combina com balão! E balão não solta mais! E até tenta fazer fogos de artifício silenciosos para não incomodar bichos e pessoas sensíveis ou doentes.
E, assim Sebastião une tradição e consciência ambiental, e ali bem perto, no meio da caatinga bichos e plantas sob o luar festejam a vida. Sem medo de fogaréu, pois sabem que a única luz sempre acesa, são as estrelas e a lua a brilhar no céu, de onde São João sorri feliz.
Paula Belmino