O PAÍS DOS ELFOS -- PRIMEIRA PARTE
O PAÍS DOS ELFOS
Folklore irlandês, adaptado e versificado
por William Lagos, 6 julho 2020
(Primeira parte de quatro)
O PAÍS DOS ELFOS I
Havia um castelo numa região remota
da Irlanda, em parte já arruinado,
permanecendo, contudo, ainda habitado
pelo Barão O’Callagham e pelos filhos,
doze meninos a acompanhar seus trilhos
nessa região por tantos ignota.
O castelo parecia já cansado,
depois de tantos anos existente;
e de fato, até seria diferente,
não fosse de magia o encantamento,
que ali morava, com seu consentimento,
a irmã da jovem com quem se havia casado.
Ora, o Barão fôra ferido num combate
e embora sobrevivesse, nunca mais
armadura usaria em situações marciais;
caminhava com auxílio de bengala,
sem de novo conseguir transpor a vala
que o castelo protegia contra embate,
ante a ambição de quaisquer inimigos,
porém tomara o partido perdedor,
seus bens sendo confiscados com rigor,
a um ponto tal que nem tinha mais criados,
muitos labores a ser desempenhados,
pela Tia Grissy, mesmo os de mais perigos.
O PAÍS DOS ELFOS II
Ora, acontece que sua irmã era uma fada,
mas ela mesma pouca magia possuía
e quanta tinha, ali a dispendia,
em manter a construção ainda de pé;
só lhe sobrando para realizar, com boa fé,
as tarefas domésticas e mais nada!...
outra irmã ela tivera, a bela Eileen,
que havia morrido após o último parto,
seu corpo já cansado e muito farto,
pois doze filhos ela dera à luz,
acompanhados por uma estranha cruz:
todos nascidos totalmente iguais assim.
Olhos azuis e cabelos arruivados,
louro-vermelho, esse que chamam alburno;
cada um deles crescera, por seu turno,
até chegarem a uma certa altura,
de uns dez ou doze anos, em segura
contrariedade dos fatos esperados.
Seu pai doente, pouco podia fazer
e assim a Tia Grissy se esforçava,
mantinha o solar limpo e cozinhava,
pelo exercicio de sua gentil magia;
limpos e sadios ainda conseguia
aos barõezinhos, com amor, manter!
O PAÍS DOS ELFOS III
Na verdade, eram três irmãs:
a mais velha, Farsália, era uma fada;
Tia Grissy, ou Griselda, era dotada
de alguns poderes, como descrevemos;
das três, Eileen era a que tinha menos
e essas forças se tornaram vãs,
depois que se casou, já quase humana;
o Barão O’Callagham, na juventude,
era um garboso rapaz e assim se ilude
a desistir de sua herança antiga
e doze filhos a gerar se obriga;
com o marido, dessa forma, ela se irmana.
Mas a cada bebê que dava à luz,
conferia uma parte do que tinha;
por isso todos de igual alturinha,
sem passarem pelos anos de nenês:
coisa muito bizarra, como vês,
e que ao Barão por certo não seduz.
E assim um dia, ela se desvaneceu,
após nascer o último menino;
por ela, nem sequer tocou-se um sino,
já que do corpo não sobrou nem esqueleto,
apenas um suspiro bem discreto
e de repente, ela desapareceu!...
O PAÍS DOS ELFOS IV
Pois ao país das fadas retornou
o seu espírito, ainda cintilante;
sua parte humana fora levada avante
pelos doze filhos ruivos que tivera,
em seus olhos azuis essa quimera,
que a descendência não mais apresentou.
Mas por todo o carinho da Titia,
os doze irmãos eram muito bagunceiros
e por serem na verdade tão arteiros,
a Tia Grissy tudo tinha de arrumar;
não que de fato fossem-na desrespeitar,
porém muitas brincadeiras se fazia!
Como o castelo já era muito antigo,
muitos dos quartos já desocupados,
em um grande salão foram todos alojados,
onde era mais fácil para a tia controlar
qualquer partida que lhe quisessem aprontar,
depois de recolher-se ao próprio abrigo...
Mas como eram todos tão iguais.
a Tia Grissy seus nomes nem lembrava
e era por números então que os apelava,
pela ordem de nascença. O Número Um
era o mais velho; e essa ordem comum,
o Dois e o Três aceitavam naturais.
O PAÍS DOS ELFOS V
Então o menor de todos era o Doze;
menor por ser o último a nascer;
como foi dito, todos paravam de crescer
quando alcançavam aquela mesma altura
que o pai olhava com certa desventura,
porém Tia Grissy aceitava bem tal pose.
Mas a coitada, por guardar toda a magia
no difícil manter desse castelo,
não reservara para si qualquer desvelo
e como era meio-fada, realmente,
tinha alguns séculos de vida e finalmente
mostrava o efeito dos anos que vivia...
Já estava meio surda e meio cega,
até mancava um pouco, ao caminhar,
grande touca seus cabelos a guardar,
seu nariz como tromba de elefante,
o queixo era pontudo para avante:
de ser bruxa a suspeita se lhe pega!
Mas seu sorriso tudo desmentia,
junto ao brilho gentil de seu olhar
e aos meninos gostava de educar,
pois todos doze já sabiam ler,
a vasta biblioteca a percorrer,
que há séculos no castelo se reunia!
O PAÍS DOS ELFOS VI
Knocknasheega chamava-se a colina,
ou Nocassígia, que se diz melhor
e se dizia, para bem ou mal maior,
que abaixo dela o País dos Elfos existia,
que em subterrâneo um feio Troll havia,
em velha lenda que o imaginar fascina...
Um dia, em que o Barão estava doente,
os doze garotinhos se esconderam,
à Tia Grissy nunca responderam,
pois acontece que detestavam banho,
igual cachorros, com desdém tamanho,
que se tornava, de fato, deprimente!
E como eram assim tão parecidos,
alguns mentiam já terem tomado,
fazendo outro de novo a ser lavado...
Então Tia Grissy encantara grande tina,
sofrendo todos doze a mesma sina:
na água morna fingiam-se entanguidos!
Mas logo após, tudo virava brincadeira;
com o sabão uns aos outros se esfregavam,
enquanto as roupas magicamente se levavam
e assim Tia Grissy os vestia novamente,
fazendo a água sumir-se de repente,
com vapor a secar a turma inteira!...