A SAGA DE UM GRÃO DE ARROZ
A SAGA DE UM GRÃO DE ARROZ
Autor: Moyses Laredo
Muito se comenta atualmente, sobre o custo do nosso arroz de cada dia. Lembrei-me de um conto, que escrevi, para sensibilizar meus filhos, ainda pequenos, que desperdiçavam grandes quantidades de arroz nos seus pratos.
Assim se inicia: Tudo começou ainda no plantio, bem lá no Sul do País, no Rio Grande do Sul. Veja, a sementinha (da nossa estória) ao ser lançada na terra úmida, corre muito risco de ser comida pelos pássaros quando ainda se encontra no solo à vista. Depois que floresce e brota, seus brotinhos também passam seus riscos até se transformarem em arroz propriamente dito. Nossa descrição parte quando o grãozinho Aróis já é arroz mesmo. Está entre os outros no galhinho, que balouçam ao sabor do vento, no imenso arrozal. O movimento sincronizado que fazem - é igual ao daqueles peixinhos de aquário, quando você bate no vidro, todos se movimentam ao mesmo tempo e na mesma direção, é assim mesmo!
Deste ponto, quando é ainda um grão de arroz, seus verdadeiros inimigos aparecem de todos os lados e de todas as formas possíveis. Enquanto você está lendo este texto, um pássaro, acabou de engolir de uma só vez, um montão dos seus amiguinhos que estavam ao seu lado. As pragas, as chuvas, o vento, alguém caminhando no arrozal para limpá-los das ervas daninhas, insetos, enfim, mesmo com todos esses perigos, ele consegue escapar, crescer e ficar maduro. É então chegada à época da colheita, vem àquela máquina estúpida e barulhenta em sua direção, esmagando tudo debaixo de si. O nosso amiguinho Aróis fecha os olhos e....consegue ser colhido e mais uma vez, está junto com os outros que já se encontram dentro da barriga da tal máquina infernal, - Como você sabe, grande quantidade de grãos, se perdem na colheita. Ele, por sorte, está inteiro, o que é outro fenômeno, visto que também, uma boa parte se quebra durante a colheita. Deste ponto, ele, inteirinho, é transportado para o galpão e juntamente com os demais segue para ser ensacado em grandes fardos. Terminada a colheita os fardos seguem para a “peladeira” onde lá lhe é retirado a casca e ele desnudo, um pouquinho envergonhado, se junta aos demais, mas ainda inteirinho, outro fenômeno! Segue, com os companheiros já pesados, para ser guardado em grandes fardos no galpão, a espera do transporte para as empacotadeiras. Percorre para tal, grandes distâncias de caminhão. É retirado e colocado várias vezes até que finalmente chega na empacotadeira onde é dividido em sacos de cinco quilos! Lá ele tem um pouquinho de sossego, mas, ainda não tem ideia de nada ao seu redor. Novamente já está de volta naqueles caminhões imensos, a percorrer outras enormes distâncias, desta vez aos centros de consumo do País. Bom, no nosso caso, ele vai mais um pouquinho longe, pois tem que ser transportado para o extremo Sudeste do País, o Estado do Acre, para a cidade de Rio Branco especificamente. Mais outra grande etapa vencida com grandes riscos para todos. Por fim, o pacote onde o nosso amiguinho Aróis se encontra, chega ao Supermercado. Escapando de ser pego por outras pessoas, ele cai justamente no carrinho de compras da sua mãe e então, é levado consigo para casa. Novo transporte até lá e consequentemente à sua panela. Antes porém, o saco é despejado num vasilhame para ser armazenado, e em seguida, é separada a quantidade que deverá ser consumida naquele dia. A pequena quantidade é selecionada, lavada, temperada e.... por sorte lá está o nosso amiguinho grão de arroz, todo contente no meio dos que vão para a sua panela. Isso é o clímax de tudo com que ele sonhou desde o momento em que ainda no Sul, se sentiu pela primeira vez um arroz, bem lá no meio do arrozal com seus amigos, era o mais comunicativo, entre eles. Finalmente, é servido à mesa, e por mais uma coincidência, sua mãe o coloca exatamente em seu prato, mas, ... no momento que você leva o garfo à boca, onde está o nosso valente Aróis, já não se contendo de tanta alegria, e, num movimento desajeitado, você o deixa cair do garfo, e ele, incrédulo, agora jaz em cima da mesa, sem chance de retornar ao seu prato, ele é um simples grãozinho de arroz, quem se preocupa em pegá-lo de volta? ...esse pensamento o deixa mudo, perplexo, tremendo de excitação, todo temperadinho, sem entender o porquê de ter acontecido essa tragédia com ele, depois de tudo que passou para chegar até ali, fica inconsolável, não acredita ...não é justo, não é justo! Teima em repetir para si.
-Você que está lendo ou ouvindo este conto...ande, resgate-o, pegue-o de volta e coma-o. Ele viveu por esse momento, ele merece isso!!
Só sei que depois de me ouvirem contar, com todas as emoções possíveis, incluindo a sonoplastia, ou seja, os roncos dos motores das máquinas e dos caminhões, eles nunca mais deixaram nenhum grãozinho de arroz fora do prato, até vigiavam uns aos outros.