A semente solitária

Era uma vez uma semente, que se sentia só, pequenina e incapaz.

A sementinha não sabia como chegou ali, mas foi deixada à beira do caminho, talvez pelo vento, ou jogada por algum passageiro. A semente sozinha, triste, em pleno deserto.

Certo dia, cansada da solidão, a semente viu chegar por ali um passarinho, pequeno e faminto. O bichinho parecia ter se perdido do seu bando. No meio do deserto, pousou, ciscou, e com seu bico certeiro, a semente encontrou, recolheu-a, fechou a semente no seu bico, bateu asas e depois voou para ver se achava o que havia perdido.

A semente agora não era tão solitária, era ela e a ave, em meio à imensidão.

Durante o voo, quando a ave respirava abria um pouco o bico, e dentro dele a semente podia ouvir um canto, podia sentir o vento, ver montanhas e vales.

Depois de um certo tempo, a ave pousou, parecia ter achado o que procurava ... Era um ninho, a ave tinha um filhote, faminto à espera da sua mãe. Que logo deitou a semente no pequeno bico, e .com a semente pequenina seu filho alimentou.

A semente pensou que esta devia ser sua missão : Viver num deserto sozinha, ser achada por uma ave, ser recolhida do deserto em pleno voo, no bico da ave mãe, e virar comida de passarinho.

A semente se sentiu completa, um pouco feliz, esta era uma boa missão, alimentar uma ave, e acabar ali.

Mas, que nada, mal entrou na boca do pássaro, saiu deslizando num percurso estranho, enfrentou a escuridão, e mais um tempo a sós.

E só depois de alguns dias, a semente avistou um clarão, e se viu a rolar, num túnel até o chão, agora não mais árida, mas uma terra diferente do deserto em que vivia, agora a terra era úmida, forte, e perto de um riacho. Mal deu tempo de olhar em volta e foi engolida pela terra molhada, que abrigou a semente por alguns dias.

Seria o seu fim? Sair do deserto, virar comida de passarinho, e ir parar embaixo do chão?

Tragada na escuridão, a semente se sentia fraca , sonolenta e só ouviu de longe o canto do pássaro e suas asas baterem em alto voo, adormeceu.

Cansada, dormiu profundamente por um longo tempo ali e sonhou ...

No seu sonho veio o sol, a chuva, a água do riacho a bater leve nas paredes da terra onde ela descansava.

- Sou tão solitária! -disse a semente. -Que triste fim!

Foi quando de seu quarto escuro, a semente enxergou um ponto de luz verde, e viu que não estava sonhando, ela estava se transformando . A terra foi afofando, e de dentro dela um broto surgiu.

O pequenino broto, virou um talinho, acolhido pelos raios de sol.

A ave mãe que lhe deixou ali, voltou com seu filho e outros passarinhos, e outras sementes foram deixadas perto dela.

Agora a semente compreendia, ela nunca fora sozinha, pois dentro dela tinha um broto, e o broto era um talinho, o talinho abrigava ramos, e os ramos com o passar do tempo, se balançava ao vento e acada estação cresciam.

A semente que era sozinha, agora viu nos galhos nascerem uma flor, silvestre e perfumada a convidar insetos e pássaros de toda cor.

Todo dia os passarinhos voltavam ali, acordando a semente, que agora era uma pequena árvore e com suas cantigas, podia contar sua história as novas sementes à sua volta.

E foi assim que a semente solitária se viu árvore, e entendeu que tudo na vida é ciclo, é passagem e transformação e bem ao lado dela as novas sementes brotaram ouvindo da árvore a boa lição:

A gente nasce semente, mas guarda dentro da gente a força de mudar a nós, e ao nosso redor. Um deserto vira flor.

As sementinhas aprendiam com a árvore , e se descobriam, algumas cresciam para flores, outras para frutas doces, para os pássaros alimentar, outras davam galhos prontos para aninhar os bichos que chegavam ali.

A semente solitária guardava dentro dela um broto, uma folha, uma flor, uma árvore, e agora vivia rodeada de uma floresta multicor, cheia de bichos de toda espécie,entre eles, os mais amigos: passarinhos e abelhas que levavam suas novas sementes para transformar o deserto solitário e quieto em uma floresta cheia de cor e de sons, produzindo vida para perto e para bem longe,quando nas asas do vento, ou no bico de uma ave voavam, enfeitando outros mundos de amores, de árvores.

Paula Belmino