A DANÇARINA

A DANÇARINA I – 26 OUT 2016

Esta história transcorreu em Samaria,

na Cisjordânia atual localizada,

em que Kasbah era dançarina procurada

para todos os eventos que lá havia.

Ela espalhava nos cafés a sua magia

e até na praça central movimentada;

ante o palácio do Sultão era avistada

e junto ao mar e à beira-rio seguia...

Mas embora sendo assim tão requestada

sempre Kasbah preservara sua pureza,

por seu pai e seus irmãos acompanhada.

Ao invés de véu usava os seus cabelos,

trançados com cuidado, na esperteza

de apenas revelar seus olhos belos...

Com jodhpurs as suas pernas protegidas, (*)

blusa bordada a lhe ocultar o peito,

mostrando apenas a cintura sem defeito,

em sandálias os seus pés tendo guaridas...

(*) Espécie de bombacha de seda transparente.

E recolhiam as mil moedas concedidas

os seus irmãos, em bem treinado jeito,

enquanto o pai a vigiava, ao brando leito

dos narguilés em suas nuvens aquecidas...

E na cidade todos respeitavam

a sua habilidade e extrema graça

e nenhum mal jamais dela suspeitavam,

mas com seus passos todos se encantavam

a protegê-la de algum mal que ali perpassa:

de ninguém era – e todos a louvavam!...

Ora, um dia disfarçou-se o soberano,

que se encantou por tal graça também

e quis comprá-la para o seu harém,

porém seu pai não atendeu a seu reclamo.

“Minha filha é virgem, poderoso amo;

um casto voto ela assumiu, porém,

que buscaria a todos dar o bem

de seu talento, no mais gentil afano...”

“Mas não seria de ninguém, até que Alá

de seu marido o nome então falasse;

e sua pureza até então conservará,

“embora exposta a todos sua beleza,

sem lamentar que desejo despertasse

desde o mendigo até a maior nobreza...”

Nem quando o rei se deu a conhecer

concordaram com sua venda os familiares;

e o povo inteiro, em todos os lugares,

ergueu-se em breve para a defender...

Então o Sultão limitou-se a requerer

que na sua corte seus dotes invulgares

também tivessem seus apresentares,

ali a família igualmente a proteger...

A dançarina assim se apresentava,

uma vez por semana, sem deixar

os demais pontos em que se revelava;

e ao final de cada dança, conversava

com o Sultão, em elegante linguajar

e deste modo ainda mais o encantava!...

A DANÇARINA II

Mas a esposa do soberano observava

conversa e dança, por detrás dos reposteiros,

os seus ciúmes crescendo bem ligeiros,

pois o interesse do Sultão bem suspeitava!

Logo Sulema com o Vizir confabulava,

malvados planos a conceber certeiros,

temendo este se tornassem conselheiros

os seus irmãos ou o pai que a acompanhava.

E deste modo, disfarçadamente,

tomou um anel que pertencia à rainha

e o escondeu nas roupas que, frequente,

Kasbah deixava, descuidadamente,

porque nas ruas grande recato tinha,

quando evitava se mostrar a toda a gente...

Então Sulema, a chorar, se apresentou.

para dizer que haviam roubado tal anel

e que Kasbah se mostrara em ouropel

quando a seu próprio salão a convidou;

a sua roupagem então se revistou;

mostrou o Vizir, a sorrir qual cascavel,

a joia achada na burkha cor de mel (*)

que na salinha do lado se encontrou...

(*) Trajo feminino, que só deixa à mostra os olhos.

Que mais fazer poderia esse Sultão?

Apesar de seus protestos de inocência,

mandou prender Kasbah e seus parentes,

mas sem mandar aplicar a punição

que a Sharyia determinava sem leniência, (*)

por grande pena sentir no coração...

(*) Lei islâmica, com castigos bem cruéis.

Mas a Sultana insistia em tal castigo,

mesmo a joia lhe tendo sido devolvida;

e o Vizir, com veemência desmedida,

queria à letra da Lei dar pleno abrigo!...

Pôs-se o Sultão a meditar consigo

que alguma trama ali fora concebida

e muito em breve testemunha foi ouvida

que denunciou tal maldade de inimigo!

E quando o mau Vizir foi denunciado

de cuja corrupção já suspeitava,

sumariamente ele foi decapitado;

porém Sulema, apesar de seu pecado,

agora o rei simplesmente repudiava,

o seu divórcio prontamente decretado!

Mandou o rei libertar de sua prisão

a dançarina e todos os seus parentes,

como desculpa, magníficos presentes,

logo pedindo que seu pai lhe desse a mão.

Kasbah lhe concedeu o seu perdão,

indo à mesquita agradecer nesse entrementes,

aos céus erguendo preces consistentes

para que Alá lhe concedesse a permissão...

E desse modo, realizou-se o casamento,

suntuosa a pompa da festividade,

mostrando a noiva o seu merecimento,

embora muitos ficassem a lamentar,

pelos cafés e praças da cidade,

que nunca mais a pudessem ver dançar!