Assinatura do pai ou responsável
A mãe é, foi, e sempre será uma, mas ao pai é que cabia assinar os boletins escolares. Ou ao "responsável", como constava na tantas papeletas da vida.
Com o tempo, mudou tudo: o título eleitoral leva agora só o nome da mãe do titular, e a ela é que se inscreve nos programas sociais de governo e, enfim, lhe é reconhecida a responsabilidade maior na constituição da família, do lar, da cidadania, e qualquer outra forania.
Menos na igreja da padraria, cevada em lixurgia e sacristia...a despeito da louvação a Maria...
Com o pai na fábrica, ou repousando da pesada lide da terceira turma, matinal e maquinalmente recorri à "responsável", para assinar meu boletim que trazia uma média de 5,6. Escolhi bem o tempo: faltavam 20 para as sete e eu tinha a desculpa de ter que sair correndo para chegar no horário, e a "responsável"amamentando mais um irmãozinho no leito, provavelmente não se ateria àquele pequeno detalhe dos 5,6, que, aliás vinha precedido de um outro 5,8 do mês anterior, aparentemente ainda desapercebido e quase já na conta da prescrição.
E a luminosidade, no quarto, me parecia ideal ao meu intento: só uma réstia de luz entrava e, sem sair da cama, a "responsável" não teria senão que virar-se no leito, apoiar-se no criado - oposto ao criado-gêmeo, que tinha o incômodo do abajur - e apor ali, no boletim, sua assinatura. Em meu benefício eu contava aí com o requisito do silêncio para que o bebê não se despertasse.
Mas o plano falhou. Rotundamente. A "responsável" esmiuçou os olhos, centrou-os naquela sequência de 5,8 e 5,6 e, ignorando minha sacra intenção de ser pontual, passou-me o esculacho da vida. Onde já se via, um filho de operários, para quem o estudo era a única possibilidade de vencer na vida, depravar-se daquela maneira?
De que valiam os esforços dos pais, dando murros em pontas de faca, e eu lhes dar aquela paga tão minguada, tão irresponsável, e patati, patatá. Perdi as primeiras lições escolares naquela matina, mas tive devolvido o senso de que tinha que lutar também. E no mês seguinte, nem me preocupei com o sono do bebê, ou a chinelada moral para apresentar meu 8,2. A "responsável" me havia recuperado. E o pai podia dormir tranquilo