Belezura em A Gata de Botinas.

Belezura em A Gata de Botinas.

Por Pedro Leão.

Armandinho

Belezura

Gata de Botinas

(Entram Armandinho enfezado e Belezura preocupada logo atrás).

Armandinho – Parece que a minha cabeça vai explodir! E você não para de ficar atrás de mim; falando, falando e falando.

Belezura – Armandim, eu vou relevar suas grosseria que faz ocê parace um asno bronco...de novo, por dicausa do que ocê ta passando pelos perrengue. Mai eu preciso fala cocê.

Armandinho (olha com carinho) – Aí me perdoe Belezura. Eu ando muito preocupado com tudo. As coisas no Rancho Beijo Doce não andam nada bem nesse período. Os negócios vão mal. A Nhá Bubu, quituteira que faz os queijos e os doces em compota e especiarias pra gente vender precisou viajar pra cuidar de uma tia adoentada numa cidade distante e levou a Quitéria Canequinha junto para ajudar, o dinheiro dos quitutes é fundamental. Os impostos nesse país acabam com a gente, ninguém se preocupa com o trabalhador rural, ainda mais no momento atual, as dividas só chegam e nenhuma vai embora.

Belezura – Expursa elas...

Armandinho – Fosse bom...e tudo isso logo agora que a gente tá de casamento marcado.

Belezura – E bem agora que o Pai e a Mãe também num tão aqui né. Mãe fez questão de monta o enxovar do nosso casório interim na capitar.

Armandinho – Você percebeu que sua mãe nunca está aqui quando a gente precisa?

Belezura – Ara ocê num fala da Mãe não. Aquela muié linda de viver, sorridente, alegre, cheia de vida, com uma cabeleira farta e um corpo roliço é só que ela não anda querendo aparece muito ultimamente. Ela é uma muié reservada.

Armandinho – Sei...

Belezura – Bão, mas, o que to tentando fazer é te entregar esse telegrama aqui oh (mostra). Eu fui na estação de trem recebe umas coisas do casório e o seu Malaquias pediu pra te entregar. É urgente!

Armandinho – Nossa quanto tempo eu num recebo um telegrama.

Belezura – Claro né Armandim, agora tamos pas modernidade, é só whats app, ele aposento o telegrama, o pombo correio, o sinar de furmaça!

Armandinho – É fumaça...

Belezura – Ocê não me acorrige que eu falo do jeito que eu bem entende, ocê me conheceu assim e sabe que faz parte do meu charme caipira (piscadinha e beijinho pro público – estalo).

Armandinho (apaixonado) – Isso eu não posso negar. Deixa eu ler logo essa carta...(fica chocado) NÃO! (PAM-PAM-PAM).

Belezura – O que foi? (PAM-PAM-PAM).

Armandinho – Morreu! (PAM-PAM-PAM).

Belezura – Quem morreu? (PAM-PAM-PAM).

Armandinho – A Tia Gertrudes (PAM-PAM-PAM).

Belezura – NÃO! (PAM-PAM-PAM).

Armandinho – Não o que?

Belezura – Não conheço (fom-fom-fom). Alias ocê nunca falou dessa tia...

Armandinho – Uma tia distante, mas, muito querida, velhinha (pega celular e mostra foto). Essa aqui oh!

Belezura – Nunca vi mais feia!

Armandinho – O QUE? A minha tia não é feia...

Belezura – Verdade, ela não é feia...

Armandinho – Ah bom..

Belezura – Ela é muito feia.

Armandinho – BELEZURA!

Belezura – Cê quer uma prova de que ela é muito feia?

Armandinho – Quero!

Belezura (pega celular e mostra) – Óia aqui! Ela é iguarzinha, cuspida e escarrada a sua mãe!

Armandinho – O QUE? VOCÊ TÁ CHAMANDO MINHA MÃE DE MUITO FEIA?

Belezura – Horriver...

Armandinho – Belezura. Respeito, minha tia morreu...

Belezura – Antes ela do que eu!

Armandinho – Insensível!

Belezura – Descurpa, é força do habito. Mas, ocê também para com essas froxura, parece o pai. E outra sua tia pela foto já tinha uns 200 anos, tava na hora de subi a grande né? E aí? Ocê vai no veróio?

Armandinho – Já passou, foi tudo muito rápido. O telegrama é mais pra avisar que ela me deixou uma herança que chega no (olha novamente) trem das 11h, hoje!

Belezura (estalo) – Armandim, sua tia muito feia morreu na hora certa. Com a herança que ela te deixo, ocê vai poder pagar os imposto e tarveis até paga alguém pa módi fica no lugar da Nha Bubu e Quitéria Canequinha fazendo os quitute. Quem sabe assobra até uns trocado pah módi nóis fazer uma lua de merrrrr...Afinar de contas com essa pobreza que nóis tá a lua que nós vai ter é de merrrrrrd...laaaaama! (olha pra plateia e brinca) Acharam que eu ia falar palavrão né? Os pai arregararo tudo os zóio. Que nada, sô moça fina, nóis só ensina coisa boa pras criança.

Armandinho – Preferia ter a minha tia no casamento.

Belezura – ARMANDIM! Do jeito que nóis tá no fundo do poço nem casório vai ter. Sua tia é uma santa, sarvo nóis e além do mais feiura por feiura, sua mãe já vem assusta por essas banda.

Armandinho – Olha Belezura, melhor eu ir na Estação de Trem de Barranquinho logo buscar essa herança por que você tirou o dia pra falar asneiras...(sai).

Belezura – Verdades! Eu falo verdades! Hum...já foi! Quer saber eu vou é pesquisar uns pacote de viagem no site da CVC. Aí pra onde eu quero ir? Hummm....um lugar bem chique e luxuoso. Já sei Mongaguá, Cubatão? Já decidi! PRAIA GRANDE (sai de cena – música de transição – barulho de trem – Armandinho fora de cena).

Armandinho (fora de cena) – Ai que caixa pesada o que será que tem aqui? (Miado) O que é isso? (Miado) Socorrooooo! (entrando em cena – seguido de Gata).

Gata – Miau! Assustei você? Logo eu uma pobre gatinha?

Armandinho – Cruzes! Ocê fala?

Gata – Miau. Falo, canto, danço, sapateio e tudo mais que precisar.

Armandinho – Com tanta coisa pra me deixar de herança, a Tia Gertrudes foi me deixa uma gata velha e feiosa? (olhando pro céu) Piso na bola hein tia?

Gata – Velha não! Muito menos feiosa. E sua tia devia gostar muito de você. Eu era seu bem mais precioso; sua fiel escudeira, seu braço direito. Não sou uma gata qualquer, tenho muitos talentos, miau. Mas, para demonstra-los preciso de umas botas novas, eu as perdi durante a viagem, não posso ficar descalça.

Armandinho – Bom, melhor a gente ir pro Rancho Beijo Doce e lá eu encontro algo pra você calçar. Vamos?

Gata – Miau, sim!

(Saem de cena – Barulho de motor e carro que não funciona – Voltam pra cena).

Armandinho – Mais essa. A camioneta não funciona! Eu não tenho como levar ela pro concerto e sem ela vai atrasar muitos dos nossos trabalhos. O que será de nós do Rancho Beijo Doce?

Gata – Miau. Fique calmo, você tem algumas ferramentas? Eu posso dar uma olhada e...

Armandinho – Você entende de mecânica de camioneta?

Gata – Adoro mecânica, fiz muitos cursos e posso dizer que entendo um pouco. Miau!

Armandinho – Duvido!

Gata – Então deixe comigo! (Sai de cena – Barulho de concerto, ferramentas e volta meio suja de graxa). Prontinho!

Armandinho – E você concertou a camioneta?

Gata – Sim, miau!

Armandinho – Deixe eu ver isso (Sai de cena e áudio de carro ligado, enquanto ele volta áudio permanece como se carro permanecesse ligado, mas, mais baixo – ele retorna a cena). E não é que você arrumou mesmo? Você é uma gata descalça porreta. Vixe, agora além das botas, você vai precisar de um banho.

Gata – Banho? Hurgh....(treme). Isso eu também me resolvo sozinha.

Armandinho – Como?

Gata – Miau. Assim oh (começa a se lamber e sai de cena).

Armandinho – Gata e porca! Ecat (Sai de cena também – Transição entra Belezura e em seguida Armandinho e Gata).

Belezura (entra com umas caixas e coloca no chão) – Aí esse vestido anda apertado, acho que encolheu quando fui módi lavar e (olha pra plateia). É o vestido que encolheu mesmo viu, não fui eu que engordei não.

Armandinho (fora de cena e entrando) – Belezura...Belezura!

Belezura – Qui foi?

Armandinho – Temos visita.

Belezura – Visita? (Muda Tom). Ah não! Ocê não diz pra eu que sua mãe veio antes pro casamento e...

Armandinho – Você tá com coisa com a minha mãe hoje hein! Não é minha mãe!

Belezura – Ufa..mas, ocê não tinha ido módi busca a herança da sua tia muito feia?

Armandinho – Sim, a visita é a herança! Tchanrã ! (entra gata rodopiando).

Gata – Miau, Gata de Botas, ao seu dispor!

Belezura – Gata de Botas? Que nem que no conto de fadas?

Armandinho – Puxa, não tinha pensando nisso.

Gata – Não ficou surpresa que eu falo?

Belezura (ri) – Ocê que ficaria surpresa cas coisa que acontece em Barranquinho. Asno vira moço pra casa. Espantaio ganha vida; corage, cérebro e sentimentos. Mãe Madrinha transformando vestido rasgado em novo. Gênio realizando pedido por aí a fora. Boneco de ripa virando garoto de verdade. Gata falando é o de menos.

Gata – Na verdade eu sou desquitada dele, do gato. O do conto é o Gato de Botas, fomos casados, mas, acabamos nos separando, ela andava muito com o judas lá pelas bandas onde ele perdeu as botas, ficava muito ausente e preferi colocar um basta na relação. Na separação fiquei com as botas e o título.

Belezura – Ara, certinha, eu tamém se separa do Armandinho vou tirar as bota, as carça e até as cueca dele. (para Armandinho) Então ocê anda na linha viu, to avisando!

Armandinho – Nem casou e já tá pensando em separar?

Belezura – Mais, cadê as bota?

Gata – Infelizmente perdi na viagem.

Belezura (gargalhando) – Agora ocê é a Gata Descarçada (gargalha mais).

Gata – Pois é...

Belezura (se tocando) – Pera aí, a sua tia muito feia deixo essa gata véia, purguenta, vira lata e descarçada de herança pro cê?

Armandinho – Exatamente!

Belezura – Uma boca mais pra alimenta? Sua tia deixo gasto e prejuízo de herança pro cê. Tamo perdido!

Gata – Miau, eu não sou um gata velha, pulguenta e vira lata, e só estou descalça por enquanto.

Armandinho – Alias Belezura, precisa pegar um par de botas pra Dona Gata.

Belezura – Agora ela vai ficar cas minha bota tamém? Só me fartava. Óia Armandim essa sua famia além de muito feia é inconveniente viu eu vou junta minhas traia e (vai pegar as caixas e áudio de rasgo). Ops.

Armandinho – O que foi?

Belezura – Meu vestio arrasgo na traseira.

Armandinho (olhando) – Vixe...

Belezura – Arrasgo muito?

Armandinho – Muito!

Belezura – Vixe

Armandinho – Vai saindo de lado para as crianças não verem seu traseiro.

Gata – Miau, espere aí! Venha comigo, eu resolvo isso!

Belezura – Resorve?

Gata – Miau, claro! (Vai tirando Belezura de lado – saem de cena – algum áudio que ilustre e voltam. Um retalho de pano precisa ser colocado atrás do vestido da Belezura com cola de tecido para ilustrar a cena, como se a gata tivesse costurado o vestido). Prontinho, esse retalho deve resolver por enquanto, e depois eu o costuro e ficará novinho, nem vai parecer que foi refeito.

Armandinho – Você entende de costura também?

Belezura – Claro que entende, oía aqui, posso vira de costa sem medo de mostra a traseira pras criança.

Gata – Miau. Eu tenho muitos talentos, fiz os melhores cursos e adoro corte e costura.

Armandinho – To começando a achar que você pode nos ajudar e muito...

Gata – O que está acontecendo aqui?

Belezura – A bem verdade gata descarçada é que nóis tá numa pior. Os negócio do Rancho Beijo Doce não vai bem não, nóis também queria casa. Aí a tia muito feia morreu e achamo que ia resorve tudo, mas, parece que não. Ocê é uma gata bacana, mas, só cortar e costurar não vai salvar a gente das conta, divida, cobrança e imposto.

Gata – Miau. Eu poderia analisar os números? A situação?

Belezura – Número? Só se ocê tiver os da Mega Sena!

Armandinho – Vamos até o escritório e lá você vê tudo que precisa (Vai levando a Gata – áudios de calculadora, caixa registradora e moedas).

Belezura – Hum....enquanto isso eu vou fazer uma outra coisinha (sai também – transição, todos retornam juntos).

Armandinho – Então você entende tudo de finanças também?

Gata – Miau. Eu fiz muitos cursos de cálculos e contabilidade.

Armandinho – E o que descobriu?

Belezura – Nós tá falido?

Gata – Há dinheiro para pagar todos os fornecedores tanto do Rancho quanto do casamento. Só precisamos produzir para aí sim lucrar e pagar os impostos. Claro, fechando o cinto em todos os gastos.

Armandinho – Aí tá o problema (aponta para Belezura).

Belezura – O quê? O cinto tá um pouco apertado? Tá! Mas, ta fechano.

Armandinho – Não é disso que eu estou falando. Como produzir sem a Nhá Bubu e a Quitéria Canequinha?

Gata – Miau. Eu também já pensei nisso!

Armandinho e Belezura – Já?

Gata – Sim, eu entendo tudo de quitutes; queijos, doces em compotas e especiarias.

Armandinho – Mentira...

Gata – Sim, fiz muitos cursos de culinária e gastronomia. Principalmente no Espaço Gastronômico EGRP no Shopping SantaÚrsula, as terças-feiras as 16h e as quintas as 19h em parceria com a Escola de Gastronomia de Ribeirão Preto. Miau!

Armandinho – Puxa vida!

Gata – Vou ser a primeira Gata Masterchef do Brasil!

Armandinho – Supimpa!

Belezura – Agora a primeira Gata Masterchef Carçada do Brasil! (entrega).

Gata – Miau, você vai me dar suas botas?

Belezura – Claro que não, aqui nóis usa Botina, comprei umas pro cê! Agora cê é a Gata de Botinas.

Gata – Miau, adorei, vintage, old fashion, entendo de moda também!

Armandinho (abraça gata) – Muito obrigado! Por tudo! E me desculpe por ter duvidado de sua capacidade. Você não foi uma herança, foi um presente em nossas vidas. Veio transformar nossa realidade para melhor.

Belezura – Eu também devo descurpas pro cê. Ocê podia até cê uma gata véia, fedida, purguenta, vira-lata e descarçada? Podia! E isso não devia importa. O que importa é o que nóis tem no coração e no cérebro, e em ambos ocê é boa por demais. Ocê é uma gata amiga, carinhosa, inteligente, esperta e sabida por demais. (Olha pro céu) Tia Gerturdes, descurpa eu? A senhora é muito feia? É! Mas, é um anjo muito feio nas nossa vida da gente! Ocê sarvo nóis com essa bichana pra lá de especiar. Espero que a senhora esteja num bom lugar. Tenho certeza que papai do cér reservo um lugar especiar pro cê. Fica com Deus. (muda) Gata, tamém posso te dar um abraço?

Gata – Miau, claro que sim Belezura! (se abraçam).

Armandinho – Eu quero te fazer um convite! Pra você vir morar no Rancho Beijo Doce e virar administradora dos negócios.

Gata – Gente virei uma colaboradora?

Belezura – Não, ocê agora é da famia. Também quero te fazer um convite. Pra ser daminha no nosso casório e entra cas aliança, ocê aceita?

Gata – Claro que sim!

Belezura – Aí vou te da sardinha, leva ocê no pet e enche de frufru e balangandã na cabeça e...

Armandinho – Menos Belezura, menos!

Gata – Deixa ela Armandinho, afinal de conta Belezura fez A GATA DE BOTINAS! VIVA!

Todos – VIVA!

FIM