Mariana no reino dos meninos carecas Vol II/V
Vol. 2
Willie, um dos colegas de classe da bruxa Ma, subitamente foi atacado por uma grave doença.
Ele começou a fazer um tratamento para impedir que a doença se alastrasse, e logo seus cabelos começaram a cair.
Na escola, começou a ser alvo de zombarias, e muito envergonhado, pouco a pouco foi deixando de frequentar à escola. A esta altura, já não tinha um só fio de cabelo na cabeça. Willie sofria muito por não ter o apoio de seus companheiros de escola. E isto doía muito mais do que o doloroso tratamento de quimioterapia. Emagreceu bastante e estava pálido e carequinha. Decidiu então se afastar do convívio de todos. Não saía de casa a não ser para ir ao hospital, e só se sentia seguro ao lado de seus familiares. Os pais de Willie ficaram tristes e decepcionados com o tratamento dos colegas para com seu filho.
Bruxa Amélia, a mãe de Mariana, ao saber da indiferença dos colegas para com o amigo Willie, resolveu dar uma lição na menina. No fim de semana ela convidou a filha para juntas fazerem um delicioso bolo de chocolate. Amélia pediu à menina que fosse até o velho armário da despensa e pegasse bem lá no fundo um pacote de farinha de trigo. Mariana adorava bolo de chocolate. Ela queria comê-lo sozinha e então foi sem demora pegar o pacote de farinha para sua mãe. A cachorra Lola veio logo atrás. O armário era muito grande e sem necessidade, pois as bruxas comiam bem pouco. Embora este não fosse o caso de Mariana. A bruxinha comia muito mesmo! Eram potes e mais potes de Nutela. Mariana abriu o armário, mas, nada encontrou.
Lola, numa correria só, pulou para dentro do velho armário e de repente, desapareceu. A menina entrou logo atrás para ver se pegava a cachorra xereta.
E de repente algo muito estranho aconteceu.
O fundo do armário se abriu como por encanto e a menina e a cachorrinha foram caindo num buraco sem fim. Uma força misteriosa vai puxando as duas rumo ao desconhecido.
E elas vão caindo, caindo, caindo.
Mariana gritou bem alto:
_Lola onde está você?
A cachorrinha respondeu com um latido ao longe.
A queda parecia não ter fim. Mariana, valente como era, foi se deixando levar. Queria ver até onde isso iria parar.
A queda foi lhe dando um sono danado e de repente ela adormeceu.
Na Carecolândia
Os latidos de Lola acordaram Mariana. Ela latia ferozmente para um bando de crianças que riam e apontavam para elas. A menina sem entender o que estava acontecendo e sem saber onde estava, perguntou aos meninos que lugar era aquele em que ela caíra.
_Por favor, alguém poderia me dizer que lugar é este? E quem são vocês?
Ela observou o bando mais atentamente e percebeu que todas as crianças eram carecas. O menor garoto do bando chegou perto da menina e puxou-lhe os cabelos com toda sua força. Lola abocanhou-lhe a canela e o menino deu-lhe um tremendo chute no focinho. Mariana abraçou Lola consolando-a e inocente perguntou para as crianças porque estavam se divertindo à custa dela?
Foi uma garota careca quem lhe respondeu:
_É porque você é muito engraçada com todo este pelo na cabeça. Parece até uma espiga de milho!
As crianças carecas riram até não mais poder. E Mariana falou:
_No mundo em que vivo, as pessoas têm cabelos assim como eu. Porque aqui neste lugar, vocês são todos carequinhas? Por acaso foi algum surto de piolhos? Perguntou a curiosa Mariana.
As crianças não acharam graça nenhuma. Ninguém ali sabia o que era piolho. Seus pais e avós não tinham nenhum pelo na cabeça. Para eles ser careca era algo normal.
E aquela menina intrusa era uma criatura muito esquisita. Aqueles dois rabos de cavalos que ela trazia presos por Maria chiquinhas se assemelhavam a dois grandes chifres de touro.
_Vai ver essa menina estranha é filha do *touro Vladimir! Disse uma garotinha careca.
E então começaram a atacar Mariana. Alguns mais exaltados lhe atiravam pedaços de pau e pequenas pedras. Outros a puxavam pelos cabelos. Porque as pessoas têm tantas dificuldades em conviver com as diferenças? Mariana e Lola estavam acuadas e com medo. Não havia como fugir do bando de carecas. O que elas iam fazer? Estavam perdidas para sempre!
De repente surgiu um lindo garoto careca. Era alto e forte.
Junto com ele vinha um cachorro São Bernardo que babava com a língua de fora. Parecia que tinham corrido um bocado!
O garoto se virou para o bando de meninos carecas e perguntou com voz firme:
_O que está acontecendo aqui? Por que vocês estão atacando à intrusa? Só porque ela é diferente de nós? O que ela fez a vocês para a tratarem desse jeito?
Os meninos, envergonhados, foram logo se afastando.
Benjamin era o líder dos garotos carecas e era muito respeitado por todos. E por sua indignada reação eles sentiram que não foram corretos com a garota. Que culpa tinha a menina por ser diferente deles? Pingo, um dos garotos que havia puxado o cabelo de Mariana, voltou, e lhe pediu desculpas. E assim todos fizeram o mesmo e ainda a chamaram para brincar. O que Mariana aceitou feliz, pois ressentimento de criança dura pouco.
Mariana e o bando dos carecas foram para o lago e lá nadaram por suas águas cristalinas. A menina percebeu a felicidade daquelas crianças e lembrou-se de Willie, o garoto carequinha da escola. Como ele se sentiria feliz junto àquelas crianças iguais a ele! Logo depois, Benjamin chamou as crianças para irem embora, porque ao cair da tarde o touro Vladimir costumava ir ao lago para beber de suas águas. Todos saem a contragosto da água, menos o pequeno Pingo, que resolveu fazer uma molecagem e escondeu-se atrás de uma moita de papiro.
As crianças procuraram em vão por Pingo que estava muito bem escondido e decidido a não voltar tão cedo para casa.
De repente Elvis, o cachorro São Bernardo de Ben, começou a latir muito alto. Lola se juntou a Elvis. Parecia que os dois cães pressentiam que algo ruim estava prestes a acontecer.
As crianças ficaram mudas. Um enorme touro negro se aproximou do lago. Era Vladimir, o touro fura olho. Ele caminhou em direção à moita em que Pingo estava escondido.
Pingo, através de uma brecha que o vento abriu na moita, viu o touro chegando perto dele. O garoto assustou-se e saiu nadando em disparada na direção dos meninos carecas. Mas o touro, ao perceber que o menino estava ao seu alcance, galopou bufando em sua direção. Quando Vladimir bufava, ele expelia fumaça pelas ventas. O touro parecia um dragão. Já diante do pequeno garoto, Vladimir apontou os chifres em direção a seus olhos.
O touro Vladimir era muito cruel. Ele furava com seus afiados chifres os olhos de suas vítimas. Foi por isso que o touro foi apelidado pelo bando de carecas, de *Vlad fura olho.
Seria o fim daquele moleque travesso?
Mas Ben, o valente garoto careca decidiu agir. Ele tirou do bolso de sua velha camisa um pequeno frasco contendo uma fina poeira dourada. Destampou o frasco com força e despejou todo o seu conteúdo na palma da mão e foi andando em direção de Vlad fura olho. Ben se aproximou do touro bem devagarzinho.
O touro não percebeu a sua presença, pois, queria a todo custo furar os olhos do insolente moleque Pingo.
Quando já estava bem próximo ao touro, Ben puxou-lhe o rabo com uma só mão e quando o touro virou-se para investir contra Ben, o garoto atirou nos olhos de Vlad fura-olho o pó que ele trazia na outra mão. Ben não podia errar o alvo. O pó teria de ir parar nos olhos de fura-olho, porque senão, ele e as crianças estariam em apuros. Mas o pó foi parar direto nos olhos de Vlad fura-olho, que não enxergando mais nada em sua frente, saiu dando chifradas e cabeçadas a esmo. Os meninos, aproveitando a cegueira temporária de Vlad, puseram-se a correr. Ben e Mariana ficaram para trás. A menina ficou admirada pela coragem do careca Benjamin. Não foi à toa que Ben foi escolhido para ser o líder do bando dos carecas. Como ele era belo e corajoso. Arriscando sua própria vida para salvar um amigo. Mariana suspirou apaixonada!
Apaixonada?
Ben convidou Mariana e Lola para conhecer sua amiga Manu. Ela era muito especial e Ben queria que as duas meninas se conhecessem. Ele contou a Mariana, que foi Manu quem criou o pó mágico que cegava temporariamente.
Ela era muito inteligente e Ben tinha um carinho todo especial por ela, deixando Mariana enciumada.
Chegando a casa de Manu, foram recebidos por uma menina muito sorridente. Ela era carequinha, como todas as crianças da *Carecolândia.
Assim se chamava aquele reino. O reino dos meninos carecas.
Manu era gordinha e tinha as bochechas rosadas. Mas o que surpreendeu Mariana é que Manu não andava. Ele vivia sobre uma cadeira de rodas.
Manu foi abandonada ainda bebê. Quando ela nasceu, seus pais notaram que a menina tinha uma perna maior que a outra. E assim rejeitaram-na, abandonando-a diante do portão da casa de Ben.
Dona Juliete, a mãe de Ben, criou a menina com todo o carinho. Ela não fazia distinção entre Benjamin e Manu. Amava-os igualmente.
Um dia, a convite do rei Sapo, Ben passou uma longa temporada no planeta Verde, para treinar com o lendário *Batalhão dos Batráquios, as técnicas de ataque e defesa utilizadas pelo exército de sapos. Lá, ele permaneceu por longo tempo. Deixando a sua mãe sob os cuidados de Manu.
Numa das idas à cisterna da comunidade, dona Juliete se desequilibrou com o pesado jarro de água e acabou quebrando o pé. Manu cuidou de dona Juliete durante todo aquele tempo, e o fez com muito carinho apesar das suas sérias dificuldades de locomoção. Manu bem que tentava ajudar, mas, a sua cadeira de rodas era muito lenta, impedindo a menina de fazer muitas coisas.
Manu então, inteligente como era, decidiu inventar algo que facilitasse a sua vida.
Passou a noite na oficina de Bem e de lá só saiu quando criou a sua fantástica cadeira de rodas voadora.
Manu adaptou um velho motor de disco voador em sua lenta cadeira de rodas. E foi sensacional. Manu agora voava por todos os lados. Buscava água no lago sem se preocupar com Vlad-fura olho e cuidou direitinho de dona Juliete, até Ben voltar finalmente para a Carecolândia. Manu então se mudou de vez para a oficina e de lá saem grandes invenções. A poeira cegante, era uma dessas poderosas invenções de Manu. Agora ela está tentando criar uma nave espacial para o seu ajudante Thomas, o extraterrestre, para que ele possa voltar para a sua casa em um distante planeta.
Mariana ficou encantada com a Carecolândia. Ali ela fez grandes amizades para toda a vida. Jamais se esquecerá de Ben, Manu e o bando de crianças carecas. Sem falar de Elvis, o cão de Benjamin.
De repente a garota se lembrou de uma coisa que ficou para trás e sorriu por dentro chegando a seguinte a conclusão:
“Apesar de sermos fisicamente diferentes, somos todos iguais. Somos crianças e com um só objetivo: ser feliz. Preconceito é besteira, coisa de gente ignorante, e que só existe para nos privar de conhecer outras pessoas, raças e culturas diferentes.”
Que graça teria a vida se fôssemos todos iguais? Com certeza insípida, completamente sem graça!
Mariana lembrou-se de que estava em débito com "alguém" e quis reparar esse grande erro. Mas primeiro, era preciso voltar para casa.
_Ben, como eu faço para voltar para casa?
Ben ficou triste, mas a menina precisava mesmo ir embora.
_Há um pequeno portal escondido na caverna. Este portal liga os nossos planetas. Vou te levar até lá. Mas antes quero pedi-la que sempre que sentir saudades venha nos visitar. Estaremos sempre te esperando de braços abertos e muitas brincadeiras diferentes.
Ben e Manu levaram Mariana até o portal. As três crianças se abraçaram e Benjamin discretamente colocou algo na mão da menina apertando-a em seguida.
O portal se abriu e a garota não tem tempo de ver o que era. Ela correu para o portal antes que ele se fechasse.
Lola, intrometida como sempre, atravessou em sua frente e Mariana tropeçou na cachorrinha, caindo de cabeça para o outro lado.
De repente Mariana acordou assustada.
_Que barulho foi esse? Será que Vlad fura-olho vem atrás de mim?
A porta se abriu e a bruxa Amélia olhou para a filha sem nada entender. A garota foi buscar a farinha no armário e acabou adormecendo dentro dele.
_ Meu Deus, será que tudo não passou um sonho? Parecia tão real. Ben, Elvis, Manu, os carecas.
Mariana se perguntou desolada. Ela não queria acreditar que tudo aquilo foi só um sonho. Foi quando percebeu que algo brilhava em sua mão e ao abri-la uma linda estrela dourada lhe sorria. E então ela soube que aquela aventura não foi só um sonho.
_Vamos mamãe! Vamos preparar um bolo de chocolate no capricho hein?
_Por quê? Por acaso a soneca te deu apetite?
Perguntou Amélia, maliciosa. Na verdade ela já sabia de tudo que havia acontecido. Ela quis dar uma lição na filha por ter zombado de seu colega de classe.
As duas prepararam um bolo especial, coberto com muito chocolate granulado. Depois de pronto, Amélia e Lola ficaram à espera. Ambas queriam comer um pedaçinho daquele bolo. Mas Mariana pegou o bolo inteiro, chamou Lola e foi saindo de fininho. Amélia preocupada chamou a menina:
_Onde você pensa que vai a essa hora mocinha?
Mariana sorriu e disse:
_ Este bolo é para o meu amigo Willie. Ele precisa mais dele do que eu. Ele está tão magrinho!
E saiu equilibrando o pesado bolo com os olhos famintos de Lola fixos na deliciosa iguaria!
Notas
*Touro Vladimir Ou Vlad Fura Olho: Touro vingador que apavorava as crianças de Carecolândia furando lhes os olhos;
*Carecolândia: Nome do planeta dos meninos carecas;
*Sapo Katitu: Rei de verdugo;
*Verdugo: Planeta dos sapos e também conhecido como planeta verde;
*Batalhão Dos Batráquios: Poderoso exército dos sapos guerreiros.
Síria Malta
Continua