Parole, parole...

Se fui menino ladino pra algumas coisas, fui bobo que dói para outras. E ao fim e ao cabo, a carga se equilibra e a vida segue. Eu ficava embasbacado por exemplo com aquelas meninas à volta da mana mais velha falando vipitoporipiapá naquele linguajar em que tanto p se metia sem que eu nada pescasse - ou pespescacassesse?

E o Farofino, aquele gato pomposo que causava tanto estrago na rataria, sem que houvesse algum deles que ousasse amarrar-lhe o guizo à cauda...? E eu ainda ficava intrigado com esse nome que parecia ter tudo a ver com farofa...

Quando fomos parar em Pitangui, a cidade, o arsenal de dúvidas continuou a crescer...Nos anúncios fúnebres, por exemplo, feitos pelo alto-falante da matriz eu entendia tudo, menos porém a passagem que parecia me dizer:

...saindo perto da rua tal tal para o cemitério local... Eu ficava perplexo mas nem ao menos me valia da sapiência de papai para questioná-lo sobre o porque do perto, e não dum exato local...

E assim, fui guardando essas dúvidas que já enchiam mais que um saco...

até que, num estalo após outro, as coisas foram passando a se clarear, muito embora Inês já fosse morta, décadas dispois - para parodiar aqui o dispois, sempre usado por - e só por - Tia Rita, logo a mais letrada das tias paternas, vizinhas nossas, que chegou até a se jactar de frequentar, a Universidade Popular da Manhã, da tevê Globo.

Pois é, duma hora pra outra, já em plagas distantes, vi que, como sói a todos os gatos - e mais que eles aos cães - o gato das Mais Belas Histórias era de faro fino...e que a vipitoporipiapá, como tudo o que se lhe seguia se lograva com a metida intrometida do p sempre se apoiando numa vogal como a anterior...língua do pê, vopocepê enpentenpendepe?

E o perto que tanto me encabulou, cabulosamente féretro se revelou...

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 27/08/2018
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