DUETO DO CORAÇÃO
Era uma vez, em um jardim distante, um Sabiá muito bonito vivia a cantar. Tinha um belo ninho e penas muito bonitas. Todas as passarinhas o admiravam. Ele cantava canções pequenas e românticas com notas perfeitas. Voava pela floresta espalhando sua canção, para que assim, encontrasse o par perfeito para o dueto de seu coração. Triste era a vida deste Sabiá. Nunca achara alguém que cantasse sua música com perfeição. Os Canários cantavam muito agudo e os Corrupiões, muito grave. O pobre passarinho vagava triste pela floresta, em busca de sua amada. Tão cheio de amigos ao seu redor, mas tão solitário.
Um dia, o Sabiá, já cansado da vida, foi parar no meio de uma estrada, pois viver já não lhe fazia mais sentido. Vendo o carro se aproximando para selar seu destino, olhou para o horizonte nublado e cantou, pela última vez, sua canção:
"Vou cantando pelo ar
Triste é minha canção
Quem vai acompanhar
O dueto do meu coração?"
"O dueto do meu coração?..." - repetiu, esperançoso de que alguém respondesse.
Então ao longe ele ouve uma voz angelical responder sua canção:
"Eu canto pra você
Linda é tua canção
Deixe-me acompanhar
O dueto do teu coração!"
Como se fosse um chamado dos anjos, o Sabiá volta a realidade e levanta voo assim que notou a aproximidade do carro em sua direção. Porém, o carro ainda lhe acertou em cheio, não tirando sua vida, mas o deixando com uma asa quebrada. Rastejando, o Sabiá seguia a fonte daquele canto que lhe devolveu a vida, que lhe salvou da morte. Ele queria achar o anjo que lhe tirou do abismo da depressão.
Ao entrar na floresta, ele se depara com uma Canarinha.
- Onde vai deste jeito, Sabiá? - perguntou ela.
- Estou a procurar daquela que respondeu minha canção!
Com um ar de felicidade, a Canarinha respondeu:
- Ora, meu querido Sabiá! Sou eu a voz que completou tua canção!
O Sabiá ficou meio desconfiado com o que acabara de ouvir, pois já ouviu vários canários cantando sua canção e nenhum conseguiu completá-la com tamanha perfeição. Então, o Sabiá, que de ingênuo não tinha nada, perguntou:
- Se foi você, entrego-te meu amor, se cantar novamente para mim! - disse Sabiá.
Então a Canarinha subiu em um tronco e começou a cantar:
"Meu querido Sabiá
Lindas são tuas penas
Brilham como o sol da manhã
Tu és puro poema!"
O Sabiá ficou furioso por aquele não ser o canto que esperava e disse:
- Não foi você que respondeu a minha canção de amor! Você apenas falou das minhas penas! Sou apenas isso? Um punhado de penas ambulantes que só servem para enfeite? E como se não bastasse, ainda saiu do tom!
- Está com sorte de que ainda gastei meu tempo para responder a esta sua canção chata e tristonha! - disse a Canarinha, levantando voo e deixando o pobre Sabiá sozinho.
Ele seguiu viagem a pé, coisa que nunca havia feito antes. Deparou-se com um jardim repleto de flores de todas as espécies. Lá encontrou uma Corrupiã, admirando-se no reflexo de um riachinho. Ela logo notou sua presença e disse:
- O que procura, meu lindo Sabiá?
- Estou procurando aquela que respondeu a minha canção!
A Corrupiã deu um salto em direção ao Sabiá e disse com entusiasmo:
- Oh! Está falando com ela, meu bem!
- Pois bem, então cante para mim, meu amor! - ordenou o Sabiá, desconfiado.
A Corrupiã estufou o peito e começou sua canção:
"Passarinho, meu amor,
Lindo é o teu ninho
Vamos logo namorar
E viver bem juntinhos!"
O Sabiá, nenhum pouco surpreso, respondeu:
- Não é este canto que procuro. Sinto muito, mas não sou apenas um punhado de penas bonitas com um belo ninho no topo de uma árvore.
A Corrupiã, irritada, disse:
- Pois bem, seu passarinho exibido e sonhador! Gosta de gabar seu canto triste por aí a procura de alguém que o complete com perfeição, mas adivinha, meu bem, ninguém é perfeito a este ponto!
Já distante, o Sabiá respondeu baixinho:
- Mas o amor, é!
Sabiá caminhou por várias horas, com sua asa dolorida, até se perder pela mata. Estava exausto, faminto e sedento. Até cogitou a ideia de que o canto de sua amada poderia ser a morte o chamando mais depressa. Já sem linha nenhuma de raciocínio, Sabiá encostou-se na raiz de uma árvore e adormeceu. Uma Rouxinol que passava por lá, viu o pobre Sabiá com aquela asa danificada e resolveu socorrê-lo.
- Acorde, passarinho! Deixe-me fazer um curativo em você! - disse ela com sua voz calma e serena.
Sabiá acordou lentamente e viu a bela passarinha a sua frente.
- Quem é você? - perguntou ele.
- Uma Rouxinolzinha qualquer.
Enquanto ela enfaixava a asa dele com pequenas folhas, Sabiá observava que ela não tinha penas em suas asas.
- O que houve com você? - perguntou ele.
- Uma longa história. Caí na hélice de um ventilador na casa do meu antigo dono. Desde lá, nunca mais pude voar.
- Sinto muito.
- Tudo bem. Você não terá este mesmo destino. Veja! Sua asa vai se curar logo, logo!
Os dois passarinhos iniciaram uma longa conversa.
- Bem, Sabiás não são muito comuns nesta área da floresta. Se está aqui, é porque procura algo, não é?
- Sim. Procuro aquela que completou minha canção de amor.
A Rouxinol se espantou com aquele comentário e disse:
- Canção? Que canção?
- Ah sim! Esta canção... - Sabiá começou a cantar:
"Vou cantando pelo ar
Triste é minha canção
Quem vai acompanhar
O dueto do meu coração?"
A Rouxinol ficou encantada com a musiquinha e cantou em seguida:
"Eu canto pra você
Linda é tua canção
Deixe-me acompanhar
O dueto do teu coração!"
O Sabiá, ao ouvir aquela melodia familiar, caiu aos prantos rapidamente. Pura emoção jorrava de seus olhos!
- É você! É você! O dueto do meu coração! - gritava ele de felicidade.
- Sim, meu querido passarinho. Teus apelos tristonhos me tocaram.
Os passarinhos apaixonados passaram a tarde conversando e cantando sem parar. Quando a noite chegou...
- Preciso ir. Venha comigo!
- Não posso, Sabiá. Teu ninho é muito alto para eu alcançar. Não posso voar!
- Ó céus! O que faremos agora?
- Bem, eu te dei minha prova de amor. Agora é sua vez.
Sabiá entendia o que ela queria dizer. Então, ele abriu mão de voar para o seu ninho e ficou para sempre no chão com sua amada Rouxinol. Sabiá, enfim, encontrou o dueto perfeito do seu coração.