Era Uma Vez Uma Gotinha
Era uma vez uma gotinha de água que nasceu cristalina na mata virgem. Era uma vez uma gotinha que sonhava chegar ao mar. Ela conheceu outras gotas que também brotaram naquela bica, e correram montanha abaixo em direção à planície.
Enquanto brincavam e cantavam com sua voz suave, uniram-se ao coro os pingos da chuva formando um coral esplêndido. Todas elas apertaram o passo em direção ao riacho. Quando enfim encontraram a cascata, explodiram saltando nas pedras, alguém gritou: “avante, catarata adiante”, o coração das águas acelerou!
Nem em sonho tinham visto tamanha cachoeira, “Segurem-se bem que vamos descer a russa montanha”. Que frio na barriga! E as gotas e os pingos cantaram um “Chuá-Chuá” enquanto quedavam maravilhosamente.
E a jornada prosseguiria então no caudaloso rio até enfim unirem-se às águas salgadas e se transformarem para sempre. Porém uma gota experiente perguntou às gotas adolescentes: “Vocês já irrigaram algum solo, já molharam alguma planta? Já saciaram a sede de um homem ou animal?
Elas responderam: “Nós queremos chegar ao mediterrâneo, viajar ao atlântico, conhecer o pacífico”. Questionou a sábia gota: “Mas sua missão como água doce é muito mais que correr ao mar.” A gotinha disse: “Quero ser então o que Deus quiser de mim” e nesse momento ela se evaporou e foi levada pelo vento para longe.
Como nuvem pôde ver que a terra é imensa, e liquidificada outra vez, caiu sobre a horta. Tornou-se parte do corpo humano e depois voltou para terra. Purificada saciou a sede de animais e algum tempo depois se viu outra vez em um rio. Do rio foi coletada e chegou a um vaso de flores. Percebeu quão distante estava o futuro de formar oceano, mas sentiu a felicidade de ser água neste universo.
Quando muitos anos mais tarde, Deus lhe deu a graça de se tornar salina, estava satisfeita por ter cumprido árdua missão e pensou que enfim repousaria no oceano da tranquilidade. Mas uma forte ventania a fez tornar-se maremoto, afundar navios e inundar cidades.
Uma gota salgada lhe perguntou: “Por que estás aflita?” A gotinha respondeu: “Sonhei em ser água do mar, mas tenho saudade do quão doce eu era irrigando vidas, lavando o ar”. A gota salgada deu uma gargalhada: “Você é muito jovem mesmo! Logo virá o sol e você voltará a ser como antes”. A gotinha sorriu e esperou a oportunidade de se evaporar e outra vez voltar a ser doce para irrigar o coração de um ser apaixonado.
Águas dos oceanos contêm e sustêm muitas vidas, águas das nascentes formam os riachos, águas dos rios correm para o mar e irrigam a terra, águas das chuvas lavam o ar e hidratam as plantas.
Aberio Christe