Dona Maria e a bola
Texto de: Rosângela Trajano
Cordel: Rosa Regis
Ilustração: Danda
A rua era muito pobre
Ali ninguém tinha nada
E se um garoto ganhasse
Uma bola pra pelada
A alegria se apossava.
No geral, da molecada.
Juntava-se todo mundo
Um campinho se fazia
A trave, com dois chinelos,
Os olhares de alegria
Mostrava a satisfação
Que nos rostos se acendia.
A disputa se estendia
Até a noite cansar
De olhar nossas jogadas
Ou nossas mães nos chamar
Porque o tempo passava
Sem a gente se tocar.
De um lado a outro da rua
Rolava a bola no chão.
Cada jogada bonita!
Que provocava emoção
Ao receber da plateia
Gritos de admiração.
O Nico tocava a bola
Com a cabeça a cada instante
O Beto, na bicicleta,
Era muito interessante,
E o Bartolomeu, lesado,
Mão na bola era constante.
Para o gol ninguém queria
Ir para não ser chamado
De fraco. Uma confusão
Formava-se, lado a lado,
Pois quem ia, se deixava,
Com raiva, ser goleado.
Só o Zeca se orgulhava
De ser goleiro, pois sendo
Gordinho, não conseguia
Seguir os outros correndo,
E na trave demonstrava
O seu valor, defendendo.
Mas em meio a tudo isso,
Com sua casa cercada
De muro baixo e portão
E janela envidraçada,
Havia a Dona Maria
Que sempre estava zangada.
Quando o jogo começava
Já se ouvia a voz dela:
- Cuidado para essa bola
Não quebrar minha janela!
Pois se isso acontecer
Vocês não verão mais ela.
A turma toda sabia
Que ela falava a verdade.
Se a mesma pegasse a bola,
Só de ruim, sem piedade,
Cortava à faca, e jogava
No meio da rua a metade.
Depois a outra metade
A mesma, sem compaixão,
Também jogava, com raiva,
E a gente, sem ter caixão,
Enterrava a nossa bola
No mais próximo lixão.
Não era fácil jogar
Uma pelada na rua,
Pois a tal dona Maria
Na calçada, só na sua,
Com uma faca nas mãos
Como se fosse uma pua,
Esperando que algum chute
Fizesse a bola voar
Pro lado da sua casa
Pra nossa bola cortar.
- Cuidado dona Maria!
Se ouvia a turma gritar.
Mas se não havia campo,
O nosso campo era a rua
Ou era o sonho que dentro
Do nosso serzinho atua,
E cada um tem seu campo
Na sua verdade nua.
E muitas e muitas bolas
Dona Maria cortou.
Certa vez um dos seus netos,
Pedro, dez anos, chegou
Para vir morar com ela
Porém nem isso a domou.
Porque ela o proibiu
De vir conosco brincar
Ele ficava à janela
Somente pra nos olhar
Com aquele olhar pidão
Com o desejo de jogar.
Um dia Beto chutou
Com tanta força na bola
Que ela rodopiou
No ar e, assim, sem bitola,
Foi até perto da lua,
Voltou e caiu de sola
Na janela envidraçada
Que era, à faca, defendida.
Dona Maria, por sorte
Nossa, não teve saída,
Pois não viu o que ocorreu
Ali na hora devida.
Seu neto Pedro pegou
A bola e nos devolveu,
Ela, um monte de carão,
No menino ainda deu
E mandou o mesmo embora
Por causa do que ocorreu.
Uma bola colorida
Nós lhe demos de presente
Pelo seu comportamento.
E ainda até hoje a gente
Joga e vê dona Maria
Com a faca aguardando o dia
De jogada inconsequente.
Natal/RN
18.04.2014 – 20h:27min.
Texto de: Rosângela Trajano
Cordel: Rosa Regis
Ilustração: Danda
A rua era muito pobre
Ali ninguém tinha nada
E se um garoto ganhasse
Uma bola pra pelada
A alegria se apossava.
No geral, da molecada.
Juntava-se todo mundo
Um campinho se fazia
A trave, com dois chinelos,
Os olhares de alegria
Mostrava a satisfação
Que nos rostos se acendia.
A disputa se estendia
Até a noite cansar
De olhar nossas jogadas
Ou nossas mães nos chamar
Porque o tempo passava
Sem a gente se tocar.
De um lado a outro da rua
Rolava a bola no chão.
Cada jogada bonita!
Que provocava emoção
Ao receber da plateia
Gritos de admiração.
O Nico tocava a bola
Com a cabeça a cada instante
O Beto, na bicicleta,
Era muito interessante,
E o Bartolomeu, lesado,
Mão na bola era constante.
Para o gol ninguém queria
Ir para não ser chamado
De fraco. Uma confusão
Formava-se, lado a lado,
Pois quem ia, se deixava,
Com raiva, ser goleado.
Só o Zeca se orgulhava
De ser goleiro, pois sendo
Gordinho, não conseguia
Seguir os outros correndo,
E na trave demonstrava
O seu valor, defendendo.
Mas em meio a tudo isso,
Com sua casa cercada
De muro baixo e portão
E janela envidraçada,
Havia a Dona Maria
Que sempre estava zangada.
Quando o jogo começava
Já se ouvia a voz dela:
- Cuidado para essa bola
Não quebrar minha janela!
Pois se isso acontecer
Vocês não verão mais ela.
A turma toda sabia
Que ela falava a verdade.
Se a mesma pegasse a bola,
Só de ruim, sem piedade,
Cortava à faca, e jogava
No meio da rua a metade.
Depois a outra metade
A mesma, sem compaixão,
Também jogava, com raiva,
E a gente, sem ter caixão,
Enterrava a nossa bola
No mais próximo lixão.
Não era fácil jogar
Uma pelada na rua,
Pois a tal dona Maria
Na calçada, só na sua,
Com uma faca nas mãos
Como se fosse uma pua,
Esperando que algum chute
Fizesse a bola voar
Pro lado da sua casa
Pra nossa bola cortar.
- Cuidado dona Maria!
Se ouvia a turma gritar.
Mas se não havia campo,
O nosso campo era a rua
Ou era o sonho que dentro
Do nosso serzinho atua,
E cada um tem seu campo
Na sua verdade nua.
E muitas e muitas bolas
Dona Maria cortou.
Certa vez um dos seus netos,
Pedro, dez anos, chegou
Para vir morar com ela
Porém nem isso a domou.
Porque ela o proibiu
De vir conosco brincar
Ele ficava à janela
Somente pra nos olhar
Com aquele olhar pidão
Com o desejo de jogar.
Um dia Beto chutou
Com tanta força na bola
Que ela rodopiou
No ar e, assim, sem bitola,
Foi até perto da lua,
Voltou e caiu de sola
Na janela envidraçada
Que era, à faca, defendida.
Dona Maria, por sorte
Nossa, não teve saída,
Pois não viu o que ocorreu
Ali na hora devida.
Seu neto Pedro pegou
A bola e nos devolveu,
Ela, um monte de carão,
No menino ainda deu
E mandou o mesmo embora
Por causa do que ocorreu.
Uma bola colorida
Nós lhe demos de presente
Pelo seu comportamento.
E ainda até hoje a gente
Joga e vê dona Maria
Com a faca aguardando o dia
De jogada inconsequente.
Natal/RN
18.04.2014 – 20h:27min.