OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES &+

(Mitologia helênica compilada por Hesíodo em sua Teogonia, versão poética de

William Lagos, 29 ago / 3 set 2017)

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES – 29 AGO 17

IRONIA CAPILAR - 30 AGO 2017

REGIMES – 31 AGO 2017

REPRESSÃO – 1º SET 2017

ROUBO DE AMOR – 2 SET 2017

MENESTREL – 3 SET 2017

PRÓLOGO

Há vários anos, fiz “Coroa de Sonetos”,

com os trabalhos de Hércules completos,

mas sem grandes descrições

e por capricho, volto agora ao mesmo tema,

mas envolvido, destarte, num dilema

de variadas mutações!...

Para modelo, tomei versos castrinos,

de Castro Alves, hemistíquios pequeninos,

em vasta pretensão!

E sou forçado a confessar, agora,

quão difícil foi a escolha desta hora,

esforço de paixão!

Naturalmente, para mim natural sendo

o formato de soneto recebendo

completa minha atenção

o atual formato mais perturbador,

mas que aos “Trabalhos” dará maior sabor

em sua aplicação.

Assim espero que os leias com paciência,

no meu esforço de uma leve inconsequência

e de mais atrevimento!

E com Hesíodo assim os deixarei;

é dele o mérito, não o contestarei,

não meu merecimento!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES I

Um dia Zeus por mortal se apaixonou:

doce Alcmena, que ligeiro conquistou:

promíscuo era esse deus!

A linda jovem sentiu-se muito honrada

quando Zeus a pediu por namorada,

entre suspiros seus!...

Qual mulher rejeitaria a corte alada

do pai dos deuses? Facilmente conquistada

a jovem bela!

E assim gozaram ambos tais amores,

sem Alcmena perceber que seus pendores

não eram dela!...

Zeus não mais era que um conquistador,

sobre centenas derramando o seu amor

e foi-se embora,

nela deixando o fruto do prazer,

filho gerado no ventre da mulher,

terrível hora!...

Assim foi esse o destino de Alcmena,

da gravidez a suportar, sozinha, a pena:

Zeus logo se cansou!

Já se afastando para outros carinhos,

que percorrendo alado os seus caminhos,

a muitos mais gerou!...

Cumprido o tempo, dois gêmeos lhe nasceram:

dois belos filhos que rápido cresceram

de seu materno leite,

um demonstrando ter poderes, realmente,

mas o outro sendo humano inteiramente:

duplo deleite!...

Um deles foi Hérakles, o forte,

o irmão chamado Ifikles, tendo um porte

muito menor;

no mesmo berço os dois irmãos dormiam,

enquanto os fados aos poucos se cumpriam,

sem estridor.

Por uma vez, Zeus mostrou-se como homem;

em cem disfarces houve outras que o tomem,

sabendo ou não;

sobre Dânae desceu em chuva de ouro

e sobre Leda foi cisne, estranho agouro:

vasta paixão!

Sabe-se bem qual foi o resultado:

violentamente tomou-a o cisne alado,

em tal surpresa;

mas seu marido, ao saber do acontecido,

logo a tomou, para ver-se garantido,

não por vileza!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES II

Foi mais em prova de real veneração,

que os próprios filhos alcançassem a proteção,

que o rei ansiava;

passados meses, a dois ovos gigantes

a meiga Leda deu à luz e instantes

depois chocava!...

E teve assim quatro filhos encantados:

pelo deus haviam dois sido gerados,

semidivinos,

já os outros dois completamente humanos,

dos mesmo ovos saindo, sem enganos,

esses meninos!...

Assim, Helena foi de todas a mais bela,

filha de Zeus, brilhante como estrela:

mulher fatal!

E Clitemnestra, sua irmã, audaz e forte,

porém seus traços sem qualquer divino porte:

mulher mortal!

Clitemnestra e Castor foram humanos,

Póllux e Helena semideuses soberanos:

Zeus os gerara!

Porém os seus irmãos eram mortais,

mas Póllux pediu a Zeus fossem iguais:

prece preclara!

E aos dois irmãos deu Zeus imortalidade,

assim os transformando, sem maldade,

numa constelação!

Que no Zodíaco como signo se apresente,

foram os Gêmeos, muito certamente,

do horóscopo atração!...

Contudo Hérakles, também ser semidivino,

não demonstrou igual gesto peregrino

de Ifikles em favor,

que desta forma, não se tornou imortal,

mas teve morte bastante triunfal,

segundo o narrador!...

O fato é que Hera, esposa ciumenta,

sempre do Olimpo observando atenta,

aos dois meninos descobriu;

cheia de ódio, duas serpentes enviou,

porém a Zeus nem um pouco incomodou,

que sorrateiro riu!

Ifikles, vendo as cobras, assustado,

pulou do berço e por terror levado,

fugiu engatinhando!

Porém Hérakles aos ofídios agarrou

e com as duas mãos, os sufocou,

apenas apertando!

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES III

Outros autores dizem ter sido Anfitrião,

pai de Alcmena, que, nessa ocasião,

mandou as duas serpentes,

para saber qual dos dois era seu neto,

experimento que não foi nada discreto,

porém de resultados eficientes!

Cresceu Hérakles, realizando mil proezas,

nem todas elas perfeitas em belezas,

e algumas bem brutais!

Quis a conquista de Esparta realizar,

quando de Ifikles foi a morte provocar,

sem intenções reais.

Este morreu pela mão de Hipocoonte,

o rei dessa cidade, ou seu arconte,

em combate singular,

não permitindo que o irmão interferisse,

Eu também sou valente! – o infeliz disse,

querendo-o impressionar!.

Naturalmente, o forte Hérakles o vingou

e os ritos fúnebres por ele celebrou,

em honrada cremação;

mas essa culpa sempre o perseguiu,

pois no combate de então não acudiu,

a Ifikles seu irmão!

De outra feita, a Etiópia percorria,

esse nome com que a Grécia referia

a terra ao sul do mar.

(Depois província criaram os Romanos,

chamada África, após seus soberanos

a Cartago derrotar).

E aconteceu-lhe chegar à cordilheira,

no deserto erguendo-se, altaneira,

altíssima montanha,

ali a encontrar um dos titãs,

o velho Atlas, que com palavras vãs,

porém de vasta manha,

o convenceu a lhe dar certo descanso,

enquanto ia banhar-se num remanso

e Hérakles aceitou,

nos fortes ombros tomando o vasto céu,

enquanto Atlas malandreava ao léu,

quase tal peso o esmagou!

É bem possível que o titã não retornasse,

se essa esfera dos céus não balançasse,

provável a desgraça!

Aos próprios ombros a carga retornando,

quando Hérakles percebeu periclitando,

ao peso dessa massa!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES IV

E de outra feita, a Anteu desafiou,

outro gigante, a quem por horas enfrentou,

sem conseguir vencer!

Ele era filho de Géia, a Deusa-Terra,

a mesma Gaia – a energia que ela encerra,

constante a lhe ceder!,

Pois cada vez que o herói o derrubava,

renovado, do chão se levantava,

e a luta continuava!...

Até que Hérakles o ergueu em pleno ar,

sem na Terra conseguir os pés tocar

e assim o estrangulou!...

Contudo Hera, inclemente, o perseguia,

mais que a outros filhos de Zeus o malqueria.

por ser o mais famoso!

Chegou um dia, depois de o ver casado,

que em acesso de loucura – por ela provocado,

cometeu crime horroroso!

E os próprios filhos o semideus assassinou,

que monstros eram a deusa o enganou.

pura maldade!

Que não deixasse de si a descendência:

netos seriam de Zeus – vasta indecência,

um ato de impiedade!...

Quando Hérakles despertou de sua loucura

a deusa Nêmesis o perseguia e já o tortura,

e ele mesmo não podia se perdoar!

A própria Hera determinou o seu castigo:

doze trabalhos do maior perigo

deveria realizar!...

Mas veja bem como foi contraditória

a deusa-mãe, que potente na sua glória,

a loucura lhe enviou

e pelos atos que inconsciente praticara,

em vasto escárnio também o condenara

e assim dele zombou!...

Tinha então Hera um fervente adorador,

Euristeu, de Argólida o senhor

e a este encarregou

de as doze penas ao herói determinar

e assim por anos pôde em Hérakles mandar

o juiz que ela indicou!...

Euristeu aproveitou-se da ocasião,

para de um monstro se livrar, sem compaixão,

que a Argólida assolava!...

Pois no pântano de Lerna uma serpente,

com sete cabeças, cada qual delas diferente,

aos homens devorava!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES V

E se o rei vítima ali não enviasse,

em cada aldeia por onde passasse

causava morte e horror.

pois cada qual que a cobra assim mordia

nas mais terríveis dores perecia,

venenoso o seu ardor!

Pensou Euristeu que, se Hérakles vencesse,

porém que a Hidra no combate ainda o mordesse.

seria duplo o resultado!...

Pois caso fosse uma cabeça assim cortada,

outra brotava da garganta decepada,

em combate prolongado!...

E até o perigo continuava pelo chão,

pois as cabeças ainda mordiam sem perdão.

se não fossem esmagadas!

Chamou Hérakles a Yolau, valente amigo,

que muitas tochas carregou consigo,

aos pescoços destinadas!...

Assim Hérakles cortava uma cabeça

e dava um pulo para trás, com pressa,

no chão a esmagá-la!

Então Yolau suas tochas aplicava,

cada garganta assim cauterizava,

mais ágil que uma bala!...

Pouco a pouco destruiu todas as sete,

seu sangue impuro a respingar como confete,

deixando a Hidra morta!...

Hérakles então desabotoou a sua aljava,

pontas das flechas no sangue mergulhava,

que a cabeça ainda comporta!...

Deixou suas setas assim envenenadas,

mesmo as mais leves feridas condenadas

à morte dolorosa!

Seriam vítimas quantas alvejasse,

caso em batalhas Hérakles ingressasse,

até a mais corajosa!

Ele mesmo dos respingos se curou,

mas Yolau, coitado! -- então matou,

mas poupá-lo de tanto sofrimento...

Seu bom amigo o final golpe agradeceu;

mesmo no reino dos mortos, prometeu

ajudá-lo em algum momento...

Hérakles o corpo da Hidra carregou,

e para o rei então o entregou:

a tarefa foi cumprida!

Para Yolau cumpriu os santos ritos,

vertendo lágrimas dos olhos aflitos,

durante a despedida!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES VI

Constrangido, afirmou ser a fumaça

que no canto de suas vistas fez trapaça

e seu choro provocou...

Não pôde Hera ver cumprida sua vingança,

porém seu ódio perpétuo não se cansa

que tanto o condenou!...

Contra a Argólida enviou ela um Leão,

determinando a Euristeu, então,

que a Hérakles mandasse

até a Nemeia, contra o leão invulnerável.

mesmo por golpes de clava ainda intocável,

pensando assim que o condenasse...

Contra seu pelo as flechas se quebravam

e os duros golpes somente o abalavam:

de novo ele atacava!...

Mas então Hérakles no chão o derrubou,

montou-lhe às costas e então o estrangulou

e já não respirava!...

Sua pele invulnerável esfolou

com as próprias garras e ao sol a colocou:

em breve ele a curtiu!

Uma túnica a pouco e pouco costurou

com as grossas tripas que de ventre retirou

e com ela se vestiu!...

Tornou-se assim, em parte, invulnerável,

um lucro assim a ganhar considerável

após cada castigo!...

Euristeu cada vez mais assombrado,

ao descobrir qual fora o resultado:

a vitória do perigo!...

Cada vez mais ficou Hera despeitada,

em suas más intenções assim frustrada

e ao herói fortalecendo!...

Pois via Zeus em seu trono sorridente,

muito embora se fingisse indiferente,

a seu filho protegendo...

E de igual modo, em segredo, o auxiliou

quando a Corça de Cirene ele caçou,

que então, de astúcia usando,

pensou Hera que só por força ele vencia,

mas que essa corça matar não poderia,

tão só capturando!...

Porque era a Corça a Ártemis consagrada,

e desse modo não poderia ser magoada,

sem ofensa à Caçadora,

que de fato, protegia a Natureza.

perpetua virgem, por maior a sua beleza:

para si só ela entesoura!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES VII

Ficava o templo no Monte de Cirene,

cascos de bronze a manter-lhe o passo indene

de pedras ou de espinhos;

Por um ano, caçou-a Hérakles em vão,

que Ártemis Diana lhe dava proteção

ao longo dos caminhos...

Finalmente, Zeus cansou do esconde-esconde,

enviando Hermes para explicar aonde

lançar uma armadilha,

sem deixar Hera a par desse segredo;

Zeus prometera não meter sequer um dedo

de Hérakles na trilha...

Por Mercúrio ou Hermes de tal sorte instruído,

prendeu Hérakles fina teia de tecido

quase invisível

contra as colunas do pórtico do templo,

que à deusa Ártemis, de Arakne no exemplo. (*)

seria imperceptível!...

(*) A deusa Aranha, que pretendem introduzir no Horóscopo.

Já outras redes a Corça destroçara;

com suas patas de bronze estraçalhara,

fugindo inalcançada;

covas ocultas e cordas em alçapé

ela evitara, com malícia até,

correndo inabalada...

Porém na nova teia se enredou

e as quatro patas Hérakles lhe atou

levando-a a Euristeu

e à deusa Ártemis, movido por temor,

após sua Corça libertar, com breve ardor,

holocausto ofereceu!...

A Ártemis Diana assim se propiciou

e a Hérakles facilmente ela perdoou.

pois a culpa fora de Hera,

a deusa Juno venerada por Romanos

assim movida por ciúmes soberanos,

qual besta-fera!

E novamente, com malícia extrema,

a Euristeu inspirou mais uma pena,

que julgou ser impossível!...

O rei da Élida, Áugias, estrebaria

possuía imensa, na qual ele acolhia

seu gado, já quase intransponível...

Ao invés de se limpar, ele ordenava

erguer os tetos, quando o esterco acumulava,

sólida massa,

Cujo fedor o próprio ar envenenasse:

talvez a Hérakles esse odor matasse:

feia pirraça!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES VIII

Contra a tarefa rebelou-se o semideus:

"Não sou escravo dos caprichos seus!"

porém submeteu-se;

Chegado à Élida, porém, desacorçoou,

mas novamente Zeus a Hermes enviou:

conselhos desse!...

Então o herói abriu um vasto canal,

de dois rios desviando o seu caudal:

Alfeu e Paineu;

a muralha às correntes represou,

mas com golpes de clava as derrubou,

e o galpão inteiro encheu!

A força da água com cuidado dirigida

contra o esterco então foi conduzida,

em blocos o arrancando,

É bem verdade que abalou a cavalariça,

mas retirou o resultado da preguiça,

cinco décadas lavando!

Primeiro Áugias seu rebanho retirou;

por sorte, vaca alguma se afogou,

contudo o cheiro

o ar empestou de sua cidade inteira,

pois boa parte da enxurrada derradeira

cobriu todo o terreiro!

Aos poucos, retornaram os rios ao curso,

todo o esterco carregando no percurso,

real fertilizante,

que pelas margens, tal qual um novo Nilo,

de uma semente fez nascer um quilo:

bênção gigante!...

A seu colega aviso Áugias enviou;

com grande pompa Euristeu o visitou

e convenceu-se

de que a tarefa fora inteira realizada;

a deusa Hera, outra vez desapontada,

mais ofendeu-se!...

E arrepanhando as dobras de seu manto,

transportou até as florestas de Erimanto

um terrível Javali!...

Devia Hérakles outra fera assim caçar,

todavia abstendo-se de a matar,

o animal em breve achando ali.

E o Javali, ao vê-lo, se escapou,

por mais enorme, ao herói não enfrentou,

quiçá por medo,

por indolência sem querer luta travar,

mas o pôde Hérakles finalmente capturar,

sem mais segredo.

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES IX

Nele montado, levou-o até Euristeu;

como um churrasco o rei o recebeu,

mandando-o abater,

mas das amarras ele se libertou,

da capital as ruas assolou,

todos postos a tremer!...

Euristeu escondeu-se num barril,

acometido do terror mais vil

e o Javali na praça

fruta e legumes se pôs a devorar,

grave prejuízo chegando a assim causar

dos pobres a desgraça!

Mais uma vez foi Hérakles chamado

e novamente o Javali foi derrotado:

virou churrasco!...

Porém do rei o prestígio foi ferido

e a deusa Hera soltou grande gemido,

de puro asco!...

Mandou Euristeu a seguir o enviar

ao Lago Estínfale, para dali expulsar

as Aves horrorosas;

tinham de bronze suas garras e suas asas;

em altos picos faziam ali suas casas,

famintas, perniciosas,

que devoravam as carnes dos rebanhos

e agricultores que ali faziam seus amanhos,

ferozes canibais!...

Quando as asas sacudiam, as suas penas,

iguais que adagas, embora mais pequenas,

soltavam-se, fatais!...

Com precisão suas vítimas atingiam

e com vagar, quais abutres, as comiam

e iam aumentando!

Mesmo envolto em sua pele invulnerável,

percebeu Hérakles ser quase irrealizável

um trabalho assim nefando!...

De que modo tais picos escalar,

enquanto as Aves o viriam atacar?...

Missão secreta

desta vez Zeus a Minerva designou:

Pallas-Athena, que de noite o visitou,

trazendo uma corneta!...

Assim o herói até o lago se achegou

e o instrumento com vigor soprou:

forte estridor!...

Os pássaros de Estínfale, assustados,

alçaram vôo, então desalojados,

com guinchos de pavor!

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES X

Então Hérakles as alvejou, uma por uma,

e o veneno da Hidra, que as consuma,

em suas pontas se achava;

e mesmo alguma, só ferida de raspão,

estrebuchava, logo vindo ao chão

e não mais se levantava!...

Então o herói, seguro da vitória,

aos poucos completou a missão inglória,

subindo aos ninhos,

em que, sem pressa, cada ovo esmagou

e nem sequer uma cria ali deixou,

matando os passarinhos...

(De suas tarefas foi a menos ecológica!...)

Outra versão existe, mitológica,

que eram as Hárpias, na verdade,

que com o som da corneta revoaram

e para os picos de origem retornaram,

em tal necessidade!...

Claro que Hérakles não as poderia matar;

servas de Nêmesis, funções a realizar,

quando enviadas...

Mas para o norte então se retiraram,

não mais os arcádicos rebanhos perturbaram:

feras aladas!...

Ora, um Minos, um certo rei de Creta,

promessa fez a Netuno, certa feita,

de um grande sacrifício;

e um Touro branco, da força mais terrível,

foi preparado... mas achou ser impossível

causar-lhe um malefício...

Este mito se relaciona, certamente

ao Minotauro, que Teseu, valente,

matou no Labirinto;

a ilha de Creta era prestigiosa

por seus rebanhos de carne deliciosa:

coincidência talvez pinto.

Usava o Minos o seu belo Touro

como forma de beneficiar o seu tesouro:

rebanho belo!

Porém Posêidon, sua promessa não cumprida,

o Touro libertou de sua guarida,

veraz flagelo!...

Atacava os pastores e a seguir matava;

cada outro touro que por ali se achava!

Minos em vão

muitas rezes sacrificou de seu rebanho,

porém o estrago continuou, tamanho,

desesperando, então.

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XI

Foi a Micenas, solicitando a Euristeu

que o aceitasse qual problema seu

e a Hérakles o atribuísse;

Foram trocados, assim, ricos presentes,

as condições dessa caçada assentes,

que Hérakles cumprisse!...

E lá se foi, satisfeito, o semideus:

seria o mais fácil dos trabalhos seus,

pois o Touro dominou,

por força bruta, igual que mais gostava

e já nas costas a besta carregava,

que ao Minos entregou!...

Porém o rei, pensando agradaria

a Posêidon, a quem muito temia,

deu-lhe certa liberdade

e o animal, estando atarantado,

foi para a praia do mar sendo levado,

como ato de piedade...

Tocaram muitas trompas e tambores

os sacerdotes de Posêidon servidores,

até a beira-mar!

Mas o animal na maré se libertou

e até ao Istmo de Corinto então nadou,

pensando se escapar!...

E enveredou então por Maratona,

planície de que Atenas era a dona,

comendo seus trigais!

Mas como touro novamente foi caçado

e a Posêidon, enfim, sacrificado;

esta uma história a mais!...

Já o rei da Trácia, um certo Diomedes,

criava quatro éguas e seus hóspedes,

depois de embriagados,

os dava àquelas, como ímpia refeição,

acostumadas a comer carne que estão

de escravos e criados!...

Chamou Hérakles a alguns de seus amigos

e à Trácia foram, a enfrentar perigos,

ao longo da viagem;

ficava ao norte da Grécia, nos confins,

montanhas ásperas, duros seus afins,

pastores de coragem!...

Mas Diomedes por todos era odiado;

por montanheses foi Hérakles guiado

até a capital,

que conquistou, sem maior dificuldade,

venceu Diomedes com facilidade,

destinando-o a fim igual.

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XII

Para suas éguas o rei serviu de refeição,

sem ser, contudo, embriagado então,

terrível seu terror!

E ao ver as quatro feras satisfeitas,

com pesados grilhões foram sujeitas,

arrastadas sem temor.

Hérakles apresentou-as a Euristeu

e foram soltas, por mandado seu,

nas faldas de montanha,

em que lobos e ursos habitavam

que já as quatro, prontamente, devoravam,

maior sendo sua sanha!...

Já sem ter monstros para o enviar,

Euristeu conseguiu imaginar

mais uma armadilha

e o enviou para distantes zonas,

em que moravam as ferozes Amazonas:

difícil a partilha!...

Mandou Euristeu que lhe trouxesse o cinturão

carregado de jóias da rainha, para então

oferecê-lo a Hera,

vendo que a deusa se encontrava desgostosa,

pois fracassava a sua vingança tenebrosa,

após tão longa espera...

De novo Hérakles reuniu os seus amigos,

para enfrentar do Mar de Mármara os perigos,

chegando à atual Turquia,

da qual a Frígia ficava no nordeste...

Que trouxe o cinto não existe quem conteste,

só a forma em que o faria.

Dizem alguns que à Hipólita venceu

em combate singular e o cinto recebeu

como um tipo de resgate;

já dizem outros que o combate foi parelho

e que Hérakles trocou o cinto por espelho,

após esse combate.

Dizem também que os dois se apaixonaram,

que muito tempo juntos ali quedaram

e que Hipólita concebeu,

tendo uma filha de força singular,

Pentesileia, que Aquiles iria matar

na luta em que a venceu.

Mas esta lenda já se refere a Tróia

e o certo é que tal cinto, rica jóia,

Hérakles conseguiu;

Existe ainda um relato mais sereno,

que ela casou, ao invés disso, com Tereno,

um amigo que o seguiu.

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XIII

Depois que Hérakles lhe entregou o cinturão

Euristeu ergueu um templo e o consagrou

à deusa Hera,

a qual de novo aconselhou ao doador

nova tarefa, de que seria o executor,

para Hérakles severa!...,

Nesse entretempo, cada vez mais Euristeu,

que ao herói tantas tarefas concedeu,

já o temia demais!

Hérakles já não as recebia com paciência,

mas reclamava, com máxima veemência

de suas ordens imorais!

Então mandou-o às terras do Ocidente;

quando mais longe estivesse, realmente,

o rei mais se aliviava!

Assim ordenou-lhe a tropa ir buscar

do Rei Geryon, que teria de enfrentar,

se a tarefa completava!

Contudo Hérakles não queria essa missão!

"Roubar-lhe o gado? Mas não sou ladrão!"

Furioso estava!...

Mas Euristeu, com astúcia, o convenceu:

"O rebanho é só a prova que o venceu,

não que o roubava!..."

"Esse Geryon é um gigante fabuloso:

tem três cabeças, seis braços, poderoso

e ainda seis pernas!...

Vencê-lo irá aumentar o seu prestígio!"

E finalmente o enviou, com grande alívio,

a plagas bem externas!

Geryon morava em certa ilha perdida

no Mar Oceano, vastidão desconhecida,

bem no alto-mar!

Que do Mediterrâneo então era separado

por altos montes, assim sendo evitado,

Netuno a desafiar!...

Primeiro Hérakles quase rebelou-se;

depois, pensando bem, acomodou-se

com a idéia de cruzar

o Mar Oceano, até a terra do Ocidente,

recém chegado de um país do Oriente,

aventuras a enfrentar!...

Mas seus amigos estavam engajados,

em suas próprias tarefas ocupados

e ajuda não dariam;

Ele exigiu que Euristeu então formasse

uma frota e muito bem a aparelhasse,

para as ondas que achariam!

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XIV

Bem cara sairia esta aventura,

mas Euristeu aceitou esta amargura,

pois do herói se livraria!

E assim forte trirreme se aprestou,

bando de escravos ali se acorrentou

que então a remaria!...

Por vários meses Hérakles vagou

por sobre as ondas e perigos enfrentou:

morreram marinheiros...

Enfim chegaram a uma rocha intransponível,

que o Mar Oceano tornava inacessível,

nos dias derradeiros...

Mas com sua clava poderosa o herói abriu

uma passagem, pela qual o mar fluiu

e o carregou de volta

até quase a Sicília!... Porém ele retornou,

e de "Colunas de Hércules" então se batizou

a passagem tão revolta!...

Muitos séculos e milênios se passaram;

um dia os Mouros por ali atravessaram

e chamamos Gibraltar,

ou "Djeb El-Tarik", por seu forte comandante,

que aos Cristãos então levou por diante,

a Espanha a conquistar!...

Mas foi Hérakles que abriu essa passagem,

ao Mar Oceano enfrentando, com coragem

e em Erítia enfim chegou.

a "Ilha Vermelha", que era o seu destino;

mas seu piloto, por maior seu tino,

não pôde ali aportar...

Assim desceram até a pequena ilhota

chamada Gades, bem próxima sua rota,

baixando um escaler

e alguns remaram, conduzido o herói,

que junto a Erítia ainda obrigado foi

pelo mar a acometer!

Somente a nado chegou até a praia,

toda formada por recifes a sua raia

e ninguém o acompanhou.

Mas ali Hérakles avistou bela mulher,

que por paixão ou capricho que a requer

um acesso lhe mostrou.

E quando Hérakles lhe quis agradecer,

beijos e abraços por agrado lhe fazer,

soltou uma gargalhada!...

E dentre as ondas do mar se levantou

e com seu corpo a Hérakles assombrou,

por sua forma inesperada.

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XV

Trazia tentáculos a partir de sua cintura!

"Quer-me abraçar, terrena criatura?

então me abrace agora!...

Sou Équidna, filha de Callirói e Crisaor,

meus tentáculos lhe causariam grande ardor:

melhor que vá embora!..."

"Sei que pretende enfrentar o meu irmão,

um governante de feroz reputação:

desejo boa sorte!...

Com ele boa amizade hoje cultivo,

mas é um tirano, gigante muito altivo

e causará a sua morte!..."

"Eu fico aqui de guarda e os atrevidos

posso matar e tais homens atingidos

serão o meu repasto!

Mas a você eu darei hoje passagem,

que meu irmão o enfrente com coragem,

a defender seu pasto!..."

"Mas primeiro a Orthos achará,

um cão de duas cabeças, que decerto o matará,

açulado por pastor,

Eurytion, meu primo... Também tem

duas cabeças... E Menelos irá também

do rebanho ser um protetor..."

Assim Hérakles subiu, bem prevenido,

pela passagem a que fora conduzido

por Équidna traiçoeira.

que com o irmão, de fato, não se dava,

porque seu filho, Orthos, escravizava,

igual fera prisioneira!...

Este era o guarda da única passagem

que de Erítia defendia a pastagem,

mas dúvidas não tinha

De que Hérakles ao galgar, pereceria

e ainda afundar a sua trirreme pretendia,

junto a Gades bem vizinha!...

Tão logo Hérakles conseguiu galgar

a passagem, feio cão veio a rosnar,

e a seguir, latindo,

em duplo tom, um grave e outro agudo...

Do chão tomando enferrujado escudo,

foi Hérakles seguindo...

E facilmente as duas cabeças esmagou;

Orthos, o cão, depressa derrotou,

mas já avisara seu pastor...

E veio Eurytion, também com duas cabeças,

quatro lanças com as mãos lançando às pressas,

sem ser de dano causador...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XVI

A pele do Leão continuava impenetrável;

o velho escudo ainda era utilizável

e ao gigante ele enfrentou;

Eurytion tinha o dobro de sua altura,

porém Hérakles, com malícia pura,

as duas pernas lhe alvejou...

Com duas setas bem envenenadas,

pelo sangue da Hidra aparelhadas

e Eurytion ali baqueou...

Então Hérakles facilmente o executou:

suas duas cabeças com dois golpes esmagou

e nem ao menos se cansou!...

Porém Menelos, que do rebanho era guardião

tinha seis pernas, mas apenas uma mão

e sem olhos, era cego!...

Mas foi às pressas avisar o seu senhor

e logo chega Geryon, em esplendor,

cujo poder não nego!...

Pois lutaram durante a tarde inteira,

até que Hérakles sufocou a derradeira

de suas três cabeças!...

Ele ao herói nos fortes braços agarrou,

as flechas Hérakles contra ele não lançou,

no ar erguido às pressas!...

Durante horas, como estátuas parecendo,

nenhum dos dois esse embate ia vencendo,

até que Hérakles puxou

sua túnica feita com a pele do Leão

e as três cabeças cobriu com força, então,

até que as sufocou!...

E quando o monstro, com três vezes sua altura,

finalmente tombou, com grande agrura,

pulou Hérakles no chão!

Já que fôra para o alto carregado,

evitando por Geryon ser esmagado,

de Zeus na proteção!

Porém o gado procurou, inutilmente:

Menelos fôra, bem furtivamente,

avisar mais um gigante,

chamado Ketros, que o gado arrebanhou

e para uma caverna o transportou,

em seu ardil confiante!...

Pois fez as rezes caminhar de costas,

suas pegadas ao contrário postas,

para a Hérakles iludir...

Mas logo o herói percebeu a armadilha

e ao inverso seguiu a longa trilha,

até tudo descobrir...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XVII

O pobre Ketros era apenas um gigante:

tinha seis metros e mais nada interessante,

seus membros bem normais,

Foi bem fácil para Hérakles o matar

e o gado da caverna transportar,

em marchas naturais...

Mas então lhe surgiu veraz problema:

como levar para o barco uma centena

de vacas e de bois?

Então Menelos saiu do esconderijo

e auxílio ofereceu ao herói rijo...

Construíram então os dois

Uma balsa de grandes dimensões,

que ao mar baixaram com vastas precauções

e as rezes, uma a uma,

com cordas grossas também foram baixadas

e sobre a balsa então localizadas,

que para o mar se apruma!...

Porém Équidna então reapareceu:

"Herói maldito, vejo que venceu:

por que mataste o cão?

Não poderias tê-lo só amarrado,

suas cabeças ser precisar ter esmagado

Por que essa vil paixão?"

"A seu irmão hoje também matei

e aos demais gigantes trucidei,

qual foi a diferença?"

"É que Orthos era meu filho, ser malvado!

Por meus tentáculos serás agora sufocado,

não existe quem me vença!"

Então saltou sobre o herói, tentacular:

com seus apêndices o buscou envenenar,

mas Menelos se interpôs

e foi a ele que o veneno derrubou

e com sua clava, Hérakles o salvou.

dessa dor a que se expôs.

De Geryon Menelos fora escravo,

assim morrendo com o final de um bravo,

de Hérakles nos braços.

Para a balsa o herói o carregou

e até a trirreme depois o transportou,

após muitos percalços.

Mas a Équidna, de fato, não matou.

Horas depois do forte golpe despertou,

ansiando por vingança;

dizem também ser mãe da Hidra e do Leão,

mãe igualmente sendo de um Dragão

mas só de uma criança.

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XVIII

Foi o gigante Kites, que algum poeta vai

dizer dos Citas e dos Sármatas ser o pai,

os nômades rivais.

que as terras assolavam dos Helenos,

homens apenas, de fato, até pequenos,

mas inimigos figadais!...

De tal Dragão falaremos igualmente;

somente a Équidna a morte deu, ingente,

uma outra criatura,

Argos Panoites, o monstro de cem olhos,

quando a encontrou adormecida nos escolhos

da morte a dar-lhe a agrura!...

À mãe dos monstros foi algures comparada,

a Lilith, em trechos do Talmude mencionada,

escrito por Judeus,

mas de origem babilônia ou da Caldeia,

incluída na adâmica epopeia (*)

pelos ciúmes seus...

(*) Lilith teria sido a primeira mulher de Adão, também identificada com a Serpente..

Mas quando Hérakles a Micenas retornou

só uma parte dessas rezes carregou:

muitas morreram,

durante a longa travessia desse mar;

quase um milagre que pudesse transportar,

as que não pereceram!...

Nesse entrementes, Euristeu conceberia

um novo plano que a Hérakles indicaria,

como um roubo novamente!

Devia ir das Hespérides ao jardim,

maçãs de ouro a lhes furtar assim,

o mais régio presente!

Que com a deusa Hera de novo o agraciara,

já que a luta com os gigantes lhe falhara

e de novo o repreendia!...

Mas quando Hérakles foi informado do destino

enfureceu-se, já quase em desatino,

pois de novo ao Ocidente ele partia!

"Mas por que não me mandou realizar

essa tarefa quando me forçou a roubar

de Geryon os bois?

Quer que eu parta outra vez ao Ocidente,

logo após esta viagem deprimente,

por que não juntou os dois?"

"De fato," disse Euristeu, melifluamente,

"esse seu décimo trabalho, realmente,

não foi a meu gosto completado...

Só me trouxe pequena parte do rebanho:

são vacas magras, de normal tamanho,

não o rebanho que tinha idealizado..."

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XIX

Porém, ao ver que o herói se enfurecia,

falou depressa: "Sei que nunca mentiria

e a própria Hera já me confirmou

a morte dos gigantes dessa ilha

e reconheço que nessa salgada trilha,

bastante gado decerto se afogou!..."

"Mas desta vez muito simples é o trabalho

e facilmente poder-me-á "quebrar o galho",

trazendo as frutas belas...

Uma dúzia de maçãs quero somente --

é só pedir... Se for bem conveniente,

conquistará as donzelas..."

"Foi a deusa quem mandou! E veja bem:

seu undécimo trabalho irá cumprir também,

sem grande sacrifício..."

Um novo barco Euristeu logo arranjou

e logo Hérakles os mares enfrentou,

cumprindo o seu ofício...

Porém Équidna ainda ansiava por vingança;

quando a notícia a sua mente alcança,

enviou o Dragão

para as Hespérides como seu presente,

que seu jardim guardaria permanente,

em plena proteção!...

É que este monstro jamais adormecia

e certamente fogo e enxofre ainda cuspia,

a Hérakles torrando!...i

Mas o herói de nada suspeitava

e pela costa da Etiópia navegava,

na cabine descansando...

Era na Espanha que ficava esse jardim

e quando em Társis ele aportou, enfim,

falaram no Dragão,

que das Hespérides o jardim guardava

e ao derredor os campos assolava,

sua fome em vastidão!

Mas é claro que, de novo, o herói venceu,

desta vez com a ajuda de Nereu,

que aprisionou nos braços.

Tal deus do oceano era como camaleão,

variadas formas assumindo entáo:

múltiplos traços!...

Mesmo mutável, por capricho ou simpatia,

para ajudá-lo, afinal se convencia

e foi até o jardim:

tomou a forma de Hérakles, depressa;

quando o Dragão para atacar se apressa,

mudou de forma assim!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XX

Aparecia logo nesta e noutra parte;

até o Dragão de cuspir fogo se farte,

pois transmutou-se em água!

E tanto fez, que o fogo se esgotou;

só então o Hérakles real se apresentou,

do monstro para a mágoa!...

Matou o Dragão e dispensou Nereu,

quando na entrada do jardim já percebeu

as Quatro Irmãs.

"Vai-nos matar também, homem brutal?"

Envergonhado por já ter feito tanto mal,

por razões vãs,

diante das Quatro Hérakles ajoelhou

e humildemente recompensa suplicou,

sendo atendido...

Desse episódio comentam alguns poetas

que com as Hespérides relações teve secretas,

tal qual marido...

Após um prazo, recebeu as frutas

e para a Hélade retornou, sem muitas lutas,

vindo da Espanha,

Dizem alguns que esse real tesouro

não seriam de fato frutas de ouro

que ali apanha...

Porém laranjas, até então desconhecidas,

que pela Hélade foram distribuídas

e ali crescem ainda...

Outras versões dizem que Atlas foi buscar,

deixando Hérakles dos céus o peso suportar.

sofrendo dor infinda...

Ou que uma dúzia Atlas recebeu,

porém metade, guloso, ele comeu,

enquanto o herói sofria...

Pai das Hespérides, só sua carga retomou,

quando o céu claramente vacilou

que o herói aguentar não mais podia!...

Ora, ocorreu que Hades ou Plutão

a Hera Juno foi queixar-se, então,

já que o gado era seu

que então Hérakles de Geryon furtara,

que, responsável pelo gado que criara.

lutou e morreu!...

E desse modo, em sua perfídia, Hera

concebeu a tarefa com que espera

as doze completar...

E a Euristeu então apareceu

e o novo plano em detalhes descreveu:

tarefa de arrepiar!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XXI

Que fosse de Hades furtar o cão peludo,

terrível Cérbero, outro monstro cabeçudo,

guardando seu portão!

Mais um ser de três cabeças, igualmente,

característica aqui assaz frequente:

pobre imaginação!...

Sem que ofender eu queira ou desagrado

causar a Hesíodo e outros poetas do passado.

Longe de mim!...

Mas é que a conta das cabeças sempre aumenta;

certa preguiça em minha mão se assenta,

perto do fim!...

Dizia o ditado: Facilis descensus Averno --

"é muito fácil descer até o Inferno,"

difícil é sair!...

O cão Cérbero fora posto ali a guardar

esse portão para ninguém dali escapar:

impossível de fugir!...

E quando Hérakles dele se aproximou,

com baba e fúria o cão então rosnou,

fera ameaça!...

Mas falou, ao semideus pedir entrada:

"Entrar um vivo é tolice demasiada,

só alma passa!..."

"Mas eu preciso conversar com seu patrão!"

"Pois entrar, pode... Mas sair de novo, então,

por certo impedirei!...

Entrou Hérakles no Hades, temeroso,

não do cão, mas desse mundo tenebroso:

Será que eu sairei?

Mas na descida, surpreso, deparou

com Yolau, o amigo que matou,

para poupar-lhe a dor!

"Tal qual lhe prometi," a sombra lhe falou,

"hoje o irei ajudar!..." E assim o acompanhou

até o trono do Senhor

do reino imenso das almas falecidas,

em condições diversas recolhidas,

por seu merecimento.

Umas no Tártaro a receber castigo,

as boas no Elêusis a encontrar abrigo,

outras apenas no esquecimento...

Alimentado pelo Asfódelo florido,

quem pelo bem não fora recebido,

nem praticara o mal,

vagando assim, primitivo purgatório,

mas sem sofrer castigo mais inglório

no mundo perenal!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XXII

Por isso afirmam que Jesus desceu,

na Anastásis, quando o Hades percorreu,

gentil resgate

de quantos lhe aceitaram a mensagem,

para dos Céus povoarem a paisagem:

que o Credo acate!...

Mas esta lenda se passou na pré-história,

quando outros deuses tinham maior glória

e o mundo dominaram...

E então Yolau conduziu o seu amigo,

sem sofrer aflição ou achar perigo,

nos pontos que cruzaram.

E finalmente alcançaram a mansão

de que Hades dominava esta região,

junto à sua esposa,

doce Perséfone, de Ceres gentil filha,

cada seis meses do sol seguindo a trilha,

da primavera a rosa...

Falou Hérakles com o deus em humildade,

narrando a seu tio, de detalhe em saciedade

os seus trabalhos onze,

mas Hades o apostrofou, com ironia:

"Roubar minhas vacas não lhe bastaria,

ó herói de bronze...?"

"Senhor e tio, que era seu gado eu não sabia!"

"Hera, porém, mui certamente, conhecia,

aquela pretensiosa!...

Meu cão, agora, ainda pretende me roubar?"

"Não, meu senhor, por empréstimo tomar

sua fera tão furiosa!..."

"Trazer-lhe o cão ileso eu lhe prometo,

minha palavra e fé lhe comprometo,

meu tio onipotente!"

"Muitos súditos você já me forneceu,

porém conversa eu terei com Euristeu,

esse insolente!"

"Quando passar pela barca de Caronte,

pois muito em breve irá cruzar a ponte,

Hera o abandonará!...

Ora, pois bem!... Yolau dará o recado,

mas do portão ficará encarregado...

Sei que retornará..."

"Mas veja bem: não lhe arranque um só cabelo!

Quero meu Cérbero conservando todo o pelo,

sem um só fio lhe faltar!

Caso contrário, sobrinho meu ou não,

você é mortal e há de voltar, então,

no Tártaro a ficar!..."

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XXIII

Agradecendo, tornou Hérakles ao portão;

quis-lhe Cérbero impedir a saída, então,

mas Yolau falou...

"Bem, se for essa a vontade do Senhor,

esse herói eu seguirei, sem mais temor,

já que Hades me ordenou!

Assim Cérbero a Hérakles acompanhou,

que sem coleira ou corrente o transportou,

até ao palácio de Micenas.

Todos fugiam dessa infernal presença;

mostrou Euristeu a covardia mais densa:

"Retorne-o apenas!...”

"Declaro que o estou oficialmente dispensando!

A nenhum outro trabalho ainda o mandando,

cumpriu todo o seu castigo!..."

E Euristeu lhe jurou, em seu temor,

perante trêmulas testemunhas ao redor...

"Mas leve o cão consigo!..."

Assim Hérakles foi ao Hades novamente.

sem Cérbero cometer ato inclemente,

durante seu retorno...

Assim a Hades fielmente o devolveu,

sem ter ferido qualquer pelo seu,

que usasse como adorno...

Então Perséfone chamou-o, gentilmente:

"Sei bem porque, assim traiçoeiramente,

sua tia o perseguiu!...

Mas de seu crime encontra-se perdoado,

por Hera sendo de fato só instigado,

sem culpa ela o puniu!..."

"E como prova, agora lhe apresento,

as sombras de seus filhos, um portento

bem raro concedido!

Foram nos Campos Elíseos encontrados,

suas almas puras, não foram castigados

por Hades, meu marido!

Muitas lágrimas o herói nesse instante derramou,

quando as sombras de seus filhos contemplou:

grande carinho!...

"Mas agora, vocês vão se separar,

que ao mundo claro tu deves retornar,

em teu caminho!..."

Assim dos filhos o herói se despediu,

o seu perdão totalmente conseguiu,

mas quem sabe voltaria?

E o próprio Cérbero conduziu-o até a saída,

ali cumprindo com Yolau a despedida,

que o cão apenas assistia!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XXIV

Eventualmente, ele de novo se casou

com Dejanira, a quem bastante amou,

mas que era ciumenta

e vendo a forma com que outras o olhavam,

suas incertezas mais ainda se acendravam,

a ele sempre atenta!

Havia um Centauro cuja índole gentil

diferia dos demais, gente bem vil,

por Quíron designado,

que era de Hérakles amigo e companheiro,

mas em combate com Pholos, o guerreiro

suas setas havia lançado.

Por acidente, uma a Quíron atingiu,

sendo imortal, apenas o feriu:

terríveis dores!...

Foi Hérakles a Zeus, arrependido,

pedindo fosse seu amigo socorrido

dos horríveis estertores!

Porém Zeus declarou só haver um jeito:

se desistisse de seu imortal direito,

para o Hades ir descer;

E deste modo, Hérakles o convenceu

e Quíron nos seus braços faleceu,

sem as dores mais sofrer...

Mas em sua espera, o Centauro, revoltado,

por Dejanira em seu lar sendo tratado,

porém muito ressentido,

ao escutar-lhe as palavras de ciúme,

foi tomado pela infâmia do azedume.

a ela um frasco concedido,

que de fato mau veneno só continha,

porém Quíron iludiu a pobrezinha:

"Este é um filtro de amor!

Borrife-o nas roupas desse seu marido,

que será sempre fiel, lançado ao olvido

qualquer rosto sedutor!

Existem muitas versões do acontecido;

teria Nessos tal veneno fornecido,

um Centauro diferente,

a quem a coxa tivera Hérakles arranhado

por acidente e com uma flecha envenenado,

morrendo, finalmente.

Mas Dejanira um manto assim teceu,

púrpura e rubro, que ao marido ofereceu,

depois de o borrifar...

Quando Hérakles o vestiu, viu-se ferido

pelas gotas do veneno ali contido,

até se incinerar!...

OS DOZE TRABALHOS DE HÉRCULES XXV

Em desespero, também ela se matou:

dizem alguns que na pira se lançou,

ao lado do marido.

Segundo outros, teria se enforcado

ou o coração com adaga transpassado.

pelo crime cometido!...

Outro poeta diz que Hérakles a pira,

para da dor poder furtar-se à ira,

o próprio herói ergueu,

para nela lançar-se, finalmente,

e que em tal chama, assim mais inclemente,

finalmente pereceu!...

E que enquanto se sentia consumido

pensou podia, afinal, ver-se reunido

com os filhos que perdera...

Suprema a dor, superou-a, finalmente,

a Perséfone suplicando ser clemente,

como antes já lhe fora...

E de seu trono o deus Hades, sorridente,

admirado de sua ação valente,

a seu irmão chamou,

Júpiter Zeus, que tomasse a decisão

sobre seu filho -- e o resultado, então

o deus dos Céus julgou!...

E quando Zeus viu a pira que se erguia,

em que o corpo de seu filho queimaria,

um relâmpago lançou

que a consumiu num instante de esplendor,

sem que Hérakles suportasse mais ardor,

cinza apenas lhe restou!...

Contudo, o deus sua alma resgatou

e para o Olimpo de imediato a transportou.

no mais breve relance.

E no seu reino o transformou num imortal,

a própria Hera comovendo-se, afinal,

por causa de tal lance.

Como desculpa e recompensa, lhe ofertou

sua filha Hebe, com quem ele casou,

himeneu no reino santo!...

E ali se encontra, com néctar e ambrosia,

na eternidade que com ela gozaria,

sem verter pranto!

Assim Hérakles não retornou ao Hades,

mas se de Sófocles as peças hoje invades,

verás que Dejanira

foi também por Perséfone perdoada

e nos Campos Elíseos abençoada;

dos enteados mira

as sombras puras, como a mãe real,

incapazes de fazerem qualquer mal

e em danças gira!...

IRONIA CAPILAR - 30 AGO 2017

Tempo houve em que eu tinha mais cabelos.

Cheguei mesmo a deixar a cabeleira

crescer até meus ombros por inteira:

Jesus Cristo interpretei em meus desvelos...

Não que sumissem! Posso ainda tê-los,

porém muito mais ralos... A bobeira

dessas loções de mim sequer se abeira:

pouco me importa recobrar tais pelos...

Não trago calva ainda. Tenho meus bonés,

que uso desde os tempos de criança,

um costume realmente mais francês,

que me protegem contra os cafunés

que não desejo mesmo! E sem poupança,

lavo a cabeça quinze dias por mês!...

IRONIA CAPILAR II

De qualquer modo, há meio século me cresce

barba no rosto e o bigode cultivei;

nunca crescer demais ambos deixei:

somente até meu gogó a barba desce...

É bem verdade que por força de uma prece

Jesus Cristo na cruz representei

por sete ou oito vezes, porem não aceitei

que minhas palmas algum cravo transpassase!

(Isso é que fazem os crentes Filipinos!)

Cravaram pregos no meio de meus dedos

e como os pulsos amarraram bem,

nem sequer protestaram os vivaldinos,

pois de longe não viram tais segredos,

nem o mercúrio ao invés de sangue vêem!

IRONIA CAPILAR III

Naqueles tempos, a minha cabeleira

chegava aos ombros, muito bem penteada,

mas por efeito de xampus foi estragada...

É bem verdade que só houve a caideira

após os meus cinqüenta anos, bem traiçoeira,

que até então pensei seria conservada;

meu primo-irmão já não tinha quase nada

aos seus dezoito anos! Foi bastante mais ligeira

a sua falha capilar. Mas se a verdade for contada,

meu pai e meus avós tinham careca

e os de minha mãe, no final, ficaram ralos!

E mesmo os de minha avó, pobre coitada!

De seus cabelos, metade levou a breca,

sem lhe servirem sequer a cobrir "galos"!

REGIMES – 31 AGO 2017

Nunca me queixo de minha corpulência.

Isso faz parte de mim. Ora se engorde,

ou se emagreço, a depender do que se morde,

mesmo do ar respirado em impaciência!

Pouco me importa, contemplo com leniência

as ditas variações que o tempo aborde;

regime é coisa de que minha índole discorde,

em minha vida sedentária de impotência!

Trabalho sem cessar... E pouco tempo

para exercício encontro. Doze horas,

mesmo quatorze ou dezesseis em cada dia,

se não me ocorre qualquer contratempo;

portanto, no labor dessas desoras,

emagrecer eu por certo deveria!...

REGIMES II

Eu caminhava com frequência. Mas parei

há uns dez anos, desde que deixei

de dar aulas e a seguir me aposentei:

quatro quilômetros desde a faculdade!

Eu descia até em casa, na verdade,

mas de repente, sem mais haver necessidade

sem ser, de fato, um escravo da vaidade,

somente em meu pecê eu trabalhei!

Até que um dia, minha esposa bela,

com gentileza, me fez um ultimato:

"Vais mastigar menos comida agora!"

"Não é possível sequer ver uma costela!

De emagrecer precisas, isto é fato

e um bom regime te aplico, sem demora!"

REGIMES III

Na realidade, como só para viver:

foi meu estômago que ficou guloso!

Tanto alimento, por certo, era gostoso,

mas na verdade, não tinha esse prazer

desses que vivem tão só para comer

e assim me submeti, destemeroso;

o resultado foi um tanto vagaroso,

mas a banha vi aos poucos se perder!

Só que um detalhe não havia pressentido:

primeiro queima-se a massa muscular

e só depois vem o panículo adiposo!

Deste modo, fui primeiro acometido

por sarcopenia e, quase sem notar,

perdi os músculos de que era tão vaidoso!

REGIMES IV

Não percebi quando meus braços afinaram,

porque ali permanecia ainda a gordura!

Exercícios não fazia, em minha tontura:

só no teclado meus dedos martelaram!

E quando mala levantar um dia tentaram

meus pobres braços, com surpresa dura,

mal conseguiram e, nessa hora escura,

os braços de minha filha me ajudaram!

Dou-lhe um conselho, portanto, meu amigo:

se conservar quiser musculatura,

primeiro evite de fazer regime!...

Pois nesse evento o que corre mais perigo

é a massa muscular!... E a sua gordura

irá voltar tão logo o braço afine!...

REPRESSÃO – 1º SET 2017

Nem todos pensamentos são escuros:

alguns se encontram plenos de alegria,

nessas lembranças em que o sonho se assumia,

em que poemas grafavam sobre os muros.

Nem todos dias se revelaram duros

assaltos contra quanto eu mais queria:

existem dias leves, que a agonia

banem depressa, inconsequentes, puros...

Porém ao ver que são hospitaleiros,

não os aproveito para minha diversão:

são nesses dias em que mais trabalho,

enquanto os duros dias derradeiros

ainda transponho no sono da ilusão

e para o esforço totalmente falho!...

REPRESSÃO II

Maus pensamentos costumam vir de fora!

Se por acaso me encontro em depressão,

os meus neurônios com preguiça estão

e nada criam na merencória hora!...

Mas chega um sonho alheio e triste chora!

Pede-me cama e algum naco de pão!

Sei bem traiçoeira ser tal aparição

e normalmente a açularia embora!

Mas se estou triste, fraco ou indolente,

preguiça tendo para fechar a porta,

o pensamento penetra, sorrateiro

e quando dentro em mim se faz presente,

minha força e energia fácil corta

e vem dormir em meu próprio travesseiro!

REPRESSÃO III

Como é difícil repelir este inquilino!

Abre um processo, contrata advogado,

sem em despejo oficial ser enquadrado,

do bom humor se torna um assassino!

No campanário da mente toco um sino,

a ensurdecer tal pensamento malfadado;

só assim expulso o infeliz deste meu fado

e minha cabeça lavo, esfrego e afino!

Mas o bandido se esconde na caveira

e fica embaraçando meus cabelos,

pelos ouvidos ainda busca me emprenhar!

E ao menor pretexto já se abeira:

não pode esmola, porém força seus zelos,

até que eu possa novamente o expulsar!

REPRESSÃO IV

"Emprenhar pelos ouvidos" é um ditado

bastante difundido e bem corrente!

Porém tal nexo sequer pertence à gente

e é preciso ser depressa descartado!

Ficando o tal pensamento abandonado

vira caspa nos cabelos, bem frequente

e com xampu anticaspa e detergente

ao ralo do banheiro é então forçado!

Mas que coisa mais chata! Em vez de ir,

o desgranido pensamento malicioso

se enfia nos meus pés, por entre os dedos!

E vai na toalha ou na meia se imiscuir,

tal qual bicho de pé, sempre teimoso,

vira micose ou nos calos faz enredos!

ROUBO DE AMOR – 2 SET 2017

SEI BEM O QUE FUNCIONA, QUANDO AMOR

NÃO MAIS EXISTE E A GENTE APENAS FINGE,

SE A INDIFERENÇA MANSA NOS ATINGE

OU MESMO QUANDO CRESCE ALGUM RANCOR

A QUE NÃO DEMOS CAUSA NEM ARDOR,

MAS MESMO ASSIM VINCHA DE FOGO CINGE

À NOSSA TESTA E O CORAÇÃO NOS PUNGE

COM DESDÉM INSUPORTÁVEL DE PENDOR.

ENTÃO SE INVESTE MAIS EM DEMONSTRAR,

POR NÃO SE DESEJAR SEPARAÇÃO,

ENQUANTO A MÁGOA A GENTE ENGOLE EM SECO

E LOGO O OPOSTO SE VÊ MANIFESTAR

TALVEZ SURPRESA POR ESSA REAÇÃO

E EM TAL TERNURA, POR AMOR, EU PECO!

ROUBO DE AMOR II

QUANDO A MULHER CONTRA NÓS FOI INSTIGADA

NEM SEMPRE A GENTE O SEU MOTIVO ENTENDE

E ALGUMA DOR AO CORAÇÃO SE PRENDE

E A UMA PERGUNTA, DIZ: "NÃO TENHO NADA!"

E DESSE AMUO DIFICILMENTE É RETIRADA

UMA RESPOSTA, CUJO PREÇO CARO VENDE!

SE A GENTE CHAMA, NÃO ESCUTAR PRETENDE;

E QUE FAZER COM TAL ESPOSA OU NAMORADA?

SE POR ACASO LHE TRAZEMOS UNS BOMBONS,

ELA PROTESTA: "NÃO GOSTO DESTA MARCA!"

E ENTÃO VAI-SE COMPRAR BUQUÊ DE FLORES

QUE SÓ RECEBE NOS MAIS AMARGOS TONS:

"É UMA COROA QUE TROUXE E QUE ME ABARCA

O MEU CAIXÃO, APÓS MEUS ESTERTORES!"

ROUBO DE AMOR III

"ROUBAR UM BEIJO" É DITADO MUITO ANTIGO.

AO INVÉS DISSO, EU JÁ BUSQUEI ROUBAR AMOR

E SEU PEITO FUI ABRIR COM MEU CALOR:

SEU CORAÇÃO COM MINHAS UNHAS FIZ AMIGO!

PARA FORA EU JÁ O PUXEI, MAS SEM PERIGO,

ALI MEU NOME ESCREVENDO COM FERVOR;

DEPOIS DE NOVO O INSERI EM VASTO ARDOR,

SEGURO AGORA PARA MIM ESSE JAZIGO!

MELHOR ME BATE O CORAÇÃO ASSIM ROUBADO,

NO QUAL MEU NOME DEIXEI FUNDO GRAVADO

E SE QUALQUER OUTRO NOME ALI ENCONTREI,

EM MINHA MALÍCIA DE AMOR O FUI TIRANDO

E NA RUA, POR JANELA, O FUI JOGANDO,

POIS TODO O AMOR QUE HAVIA ALI ROUBEI!

MENESTREL – 3 SET 2017

No mais secreto de meu coração

Tenho um banco de mármore, minha amiga

E um alaúde, para dedilhar cantiga,

Caso desejes escutar a minha canção.

Sua chave já conservas em tua mão;

Não precisas ter receio do jazigo:

Não contém mortos - só te acharás comigo,

Por ti esperando com trepidação!

E te convido a sentares de meu lado,

Nesse banco esculpido e trabalhado

Por artesãos da melhor marmoraria;

E quando entrares, ainda tímida e hesitante,

Meu alaúde te saudará, vibrante,

Tua voz suave a completar minha alegria.

Menestrel 2

Quero que uses vestes bem compridas,

Tecidas de cetim e fios de seda,

Teus pés descalços pela grama leda:

Não há rosetas para causar feridas!

Lírios do campo em pétalas fendidas,

Trevos de quatro em sorte apressurada;

No meu jardim nunca serás desconsolada;

Minhas notas voam e no chão ficam perdidas!

Mas a seguir, no solo reverdecem

E se enraízam, notas são de flores,

Crescem gavinhas, caramanchão de amores

E novas flores em teus cabelos descem,

Sempre adubadas pelos teus rubores.

Sem que os olores de voejar nos cessem!

Menestrel 3

Ali te encaro, apenas sorridente,

O teu lugar a indicar com um meneio;

Junto de mim - vem e senta sem receio:

Sequer meus dedos estenderei, silente,

Já ocupados a extrair o som plangente

Deste instrumento, no colo de permeio;

Porém de ti aguardo um som alheio,

Que entoe para mim um canto ardente.

E se quiseres... podes estender

Teus dedos em carícia de minha face,

Que saberei recebê-los como um beijo,

Meu coração a ansiar por te acolher,

Perto de mim, sem que sequer te abrace,

Só a melodia a te implorar o meu desejo!