A Papoula que amava o Bem-me-quer
A Papoula que amava o Bem-me-quer
Amélia Luz
A Papoula era a flor mais delicada do jardim. O Cravo tinha por ela imensa paixão. Recatada, tímida, encantava pelo seu olhar inocente. A primavera naquele ano chegou mais cedo. Apareceu no jardim um broto de Trevo que começou a tomar espaço para o lado da Papoula.
Quietinha, a Papoula nada dizia e nem para ele se pronunciava. Vivia suspirando pelos cantos por causa de decerto do Malmequer que havia florido perto dela na primavera passada. Ninguém se conformava com aquela estranha paixão. Até que a Rainha Rosa, experiente Rainha das Flores, saiu do seu trono para orientar a mocinha sonhadora.
- Olha menina Papoula, tenho visto o seu jeito ultimamente e não estou gostando nada disto... Você precisa se valorizar mais. Olhe que bons partidos você tem a corteja-la! Não fique sonhando com a estrela mais alta. Sabe bem que não irá alcança-la, rastejando nesse canteiro!
- Perdoe-me Majestade! Não consigo me esquecer do formoso Malmequer que naquele dia tomou meu coração. Nada aconteceu, somente esse grande sentimento que me estrangula por dentro.
- Mas no Livro das Flores que rege o nosso jardim você não pode continuar a esperar por esse tal de Malmequer que é mesmo um malmequer nunca aparecendo para lhe dar a atenção que merece. Vou conversar com Sua majestade o Rei Girassol e ver o que podemos decidir sobre o seu comportamento.
Os dias se passavam. Os pássaros, a convite do Malmequer, resolveram fazer uma serenata para a formosa Papoula. Noite de lua cheia, as flores exalavam seu perfume debaixo de suave orvalho... O rouxinol entoava seu gorjeio e a Papoula suspirava pelo seu amado distante, até que todos adormeceram ao som de uma romântica canção. Uma estranha paz invadiu o jardim. Elegante, o Malmequer apareceu de repente ao lado da formosa Papoula. Foi grande a surpresa e o amor que os envolveu. Nos braços do Malmequer a Papoula passou a noite e na manhã seguinte ao despontar do sol, um novo brotinho havia surgido entre o pé de Papoula e o pé de Malmequer. Nos rastros do vento da madrugada um milagre da natureza aconteceu: era um pequeno brotinho de Bem-me-quer, fruto do grande amor que uniu os dois amantes, para sempre.
Abençoado pelo Rei Girassol e a Rainha Rosa o pequeno Bem- me-quer cresceu ao lado das outras flores, obediente e aplicado aos conselhos dos pais. A Madrinha Orquídea e o Padrinho Antúrio davam-lhes os conselhos necessários para que ele crescesse dentro das regras dos bons costumes do Código das Flores. E assim ele cresceu sendo feliz ao lado de tantos amigos. Era um grande contador de histórias. Onde estivesse sempre tinha um caso a contar, engraçado ou triste, mas de muita sabedoria. Até que uma enxada malvada cavou-lhe forte no pé e o retirou numa sacola plástica, cheia de terra adubada. Foi para a prateleira de uma floricultura. Passava seus dias ali, preso e empoeirado, lembrando-se das alegrias vividas no jardim. Lembrava-se dos rastros do vento do alvorecer, da brisa suave e o seu delicado coração doía de saudades...
Certo dia, uma rica senhora passou e o viu ali, tão triste e desbotado, resolvendo comprá-lo. Ao chegar a casa entregou-o ao jardineiro que o plantou no mais belo canteiro da mansão. No novo lar fez amizades com as outras flores contando suas histórias fantásticas. Dizia que o vento lhe soprava muitas histórias e que não podia silenciá-las. Sua missão era a de contá-las para todos. Ele era mesmo um grande contador de histórias que aprendera nos rastros do vento das madrugadas!