O sapo já lava os pés
Pé Frio era um sapo pequenino, que nunca entrava na lagoa, porque sentia muito frio nos pés.
Ele vivia chateado, porque seus amiguinhos brincavam na lagoa e ele só os olhava.
- Pé Frio, vem cá nadar com a gente!
- Não, obrigado. Estou bem aqui – respondia Pé Frio, com uma voz triste.
Um dia, ele teve uma ideia bacana. Foi correndo até a cozinha, onde seu pai preparava uma sopa de mosquinhas, e pediu:
- Pai, você pode fazer, por favor, um par de botas pra mim?
- Botas, filho!? Nós somos sapos. Não usamos sapato!
Pé Frio, insistente e um pouco envergonhado, cochichou:
- Pai, sabe aquele meu probleminha?
- Qual problema?
- O do pé.
- Ah, sim, o do pé! – disse o pai com seu voreizão de sapo grande.
- Pai, fala baixo. Ninguém sabe disso. Eu quero brincar com meus amigos na lagoa. E o único jeito é deixar meus pés bem escondidinhos. Então, um par de botas seria perfeito!
No outro dia, tcharam!!! As botas já estavam prontas! Foram feitas com palha de milho, que o Senhor Pai do Pé Frio encontrara em uma fazenda próxima.
- Pai, obrigado. Ficaram bem legais! – disse o sapinho, com uma lagrimazinha escorrendo de tanta felicidade.
E pela primeira vez em toda sua vida de sapo, Pé Frio entrou na lagoa. Os outros sapinhos ficaram surpresos e felizes.
Todos os dias, lá estava o Pé Frio: na lagoa, brincando, e sempre de botas. Só tinha um probleminha: as botas eram um pouco pesadas para Pé Frio. Assim, ele se movimentava lentamente na água.
- Filho, você não vai tirar mais essas botas? – perguntou a Senhora Mãe do Pé do Frio.
- Ah, mãe. Eu não posso.
- E por que não?
- É... Bem... É... Tá bom, eu confesso. Se eu tirar as botas, terei de lavar os pés.
- Com certeza, você vai ter de lavar esses pés, que já devem estar com cheiro horrível! – afirmou o pai, apoiando o esforço da mãe de fazer com que o filho tirasse as botas e lavasse os pés.
Pé Frio começou a chorar:
- Eu tenho medo de água. Aliás, meus pés têm medo de água.
O Senhor Pai e a Senhora Mãe do Pé Frio não insistiram, mas disseram que voltariam àquela conversa.
No dia seguinte, Pé Frio e seus amigos brincavam na lagoa, como de costume.
De repente... UMA JIBOIA.
Você sabe que qualquer cobra é o pesadelo de qualquer sapo? É que as cobras gostam tanto de sapos quanto você gosta de chocolate, sorvete ou pizza.
Quando a jiboia apareceu, foi uma gritaria pra todo lado. Era um “coach” daqui, um “coach” de lá. Eram “coach”, “coach”, “coach” e correria, muita correria. Aliás, muita “pularia”, sapos pulando para todos os lugares, numa fuga desesperada da cobra.
Pé Frio, no entanto, não conseguia sair da lagoa, por causa do peso das botas.
E a jiboia foi chegando e a jiboia foi chegando.
E Pé Frio desesperado e Pé Frio desesperado.
- O que eu faço? O que eu faço? – gritou, sem conseguir sair do lugar.
- Vem Pé Frio – gritavam seus amigos.
E a jiboia foi chegando e a jiboia foi chegando.
E Pé Frio desesperado e Pé Frio desesperado.
Pé Frio tomou coragem e fez o que jamais imaginava que faria. Respirou fundo, fechou os olhos e tirou as botas para conseguir fugir da jiboia.
Já do lado de fora, notou que a cobra fugia rapidamente.
Todos comemoram. E até fizeram uma musiquinha para o Pé Frio:
“O sapo não lava os pés. Não lava, porque não quer...”
É, essa música mesmo que você está pensando.
Mas você deve estar se perguntando: “Por que a cobra fugiu?”
Quando Pé Frio tirou as botas, o chulé foi tão forte, tão forte, tão forte, que a jiboia gritou em “coebrês”: “Que horror! Que cheiro horrível!”
A jiboia não aguentou tanto mau cheiro e foi embora. Nunca mais voltou. E avisou às suas amigas cobras que naquela lagoa tinha um fedor horrível, o pior fedor do mundo inteiro, talvez de todo universo.
Assim, os sapos viveram tranquilos, sem cobras para perturbá-los (e devorá-los). E Pé Frio agora é outra pessoa, ou melhor, outro sapo. Notou que seus pés não eram medrosos de verdade. Era só coisa de sua cabeça, ou melhor, de seus pés. Passou a lavar os pés todos os dias. Também compôs uma música:
O sapo já lava os pés.
Lava pra não ter chulé.
Ele mora lá na lagoa e lava os pés pra não ter chulé.
Pés sem chulééééééééé.