A nuvem menina, que se condensara na fria alvorada, abriu os olhos de água e espreguiçou-se em respingos de alegria, fazendo brilhar arcos íris cada vez que um raio de sol nascente lhe tocava.
Arremessou a capa branca de algodão e debruçou-se curiosa, lá do alto.
Viu o chão cinzento e negro, até onde a vista alcançava.
Boiava num azul límpido e fundo.
Achou estranho o contraste entre a alegria lá no alto e a tristeza que avistara ao longe.
Um menino muito loiro espreitava no horizonte, sacudindo a cabeleira fulgente, e ria, ria… a desafiá-la para brincar.
Mas de cada vez que se aproximava, a nuvenzinha ia ficando mais pequena.
Lembrou-se da escuridão que vira e sentiu muita pena.
Chegou-se mais perto do chão, onde galhos moribundos lhe estendiam os braços, talos amarelos em clareiras na calvície tostada, espinhos…
O resto era um reticulado de frestas, feridas abertas, pedras calcinadas.
Um ou outro bicho lazarento farejava atento, lambendo gotas de orvalho, as costelas ressaltando, os nós da espinha quase rompendo o dorso.
Os mil olhinhos de água sentiram-se comovidos, zangados com o lindo menino loiro, que se tornara uma brasa imensa, afogueando tudo.
Cada vez mais pequena e mais próxima, a nuvenzinha viu sementinhas à espera, que acordaram nela o impulso imperioso da chuva.
Diminuindo descia, imbuída de tristeza, ao passo que se evaporava no ar quente que a cercava.
O que restava do seu coração, uma gota pequenina, desprendeu-se e caiu…
Ainda escutou o riso alto do sol, não mais um menino, mas um sopro angustiante, que a dissipou antes que lograsse humedecer um círculo de poeira de poeira no solo dorido.