Minhas mães
As mães existem e estão por todos os lados. Luíza tinha o prazer de tê-las em dose dupla. Embora na escola de Luíza a maioria de seus amigos tivessem um pai e uma mãe, ela não se importava, afinal, não via problema nenhum nisso. Inclusive na sua sala tinha o Pedro, que tinha só uma mãe. Igual a Patrícia, mas com a Patrícia ela não conversava muito porque ela era um ano mais velha, e estava no quarto ano. Tinha também a Janaína, que na verdade só tinha os avós - e por esse motivo, sempre que precisavam fazer a tarefa na casa de algum amigo, ela era a escolhida: sempre tinha bolo de fubá quentinho.
Outro dia um menino do sexto ano veio falar com Luíza:
- Ouvi dizer que você tem duas mães - e ria.
- Tenho sim, e você?
- Um pai e uma mãe, é claro. Estranho isso.
- Eu concordo, é estranho pensar que você tem um pai e uma mãe - e saiu pois o sinal acabava de bater.
Luíza já tinha enfrentado casos como esse mais vezes. A última vez fazia pouco mais de um ano, quando Luíza chegou chorando em casa. Sua mãe Carol logo perguntou o que estava acontecendo, e Luíza só pôde responder com uma pergunta:
- Você e a mamãe são normais?
- Somos sim, filha. Por que essa pergunta?
- É que umas meninas lá da escola falaram que vocês não são - e enxugando as lágrimas continuou - mas vocês não parecem ETs, e nem nada disso.
- Vem cá, filha - disse Carol, enquanto a abraçava - isso talvez ainda vá acontecer algumas vezes, é porque muita gente ainda não entende que a mamãe e eu podemos cuidar de você. Muita gente acha que isso é muito difícil e por isso o trabalho tem que ser dividido entre um homem e uma mulher - Luíza a interrompeu:
- Por isso alguns amigos meus tem pai e mãe?
- Isso, amor. Mas você sabe bem que a mamãe e eu podemos cuidar de você.
- E cuidam mesmo.
E com o tempo perguntas pararam de ser feitas, e todos entendiam essa loucura que é ter uma família.
Pouco tempo depois, quando a professora de Português perguntou aos alunos o que era o amor, Luíza anotou em um papel:
Minhas mães.