A coruja viajante
A coruja viajante
Dentro, muito dentro da floresta viviam as corujas. E toda noite elas acordavam, fosse noite estrelada, fosse noite de completa escuridão, ah, em noites de luar elas agitavam as asas e voavam acordando a todos os animais.
Mas as noites chegavam ao fim. E nessa noite, era já quase madrugada quando...
Vruckt! Passou de repente uma coruja branca num agitado ruflar de asas.
Uma coruja velha perguntou:
_ Aonde vais, querida? (disse preocupada por uma coruja querer andar quase em horas de o sol nascer).
_ Vou viajar e conhecer o mundo, disse a coruja colocando a mala no chão. E sentou em cima dela muito calma.
A floresta se calou por medo do que poderia acontecer com essa mudança de hábitos das corujas. Imagine se outros animais resolvessem também viajar? Ai, ai! A floresta ficaria diferente. E agora, quem iria piar nos galhos da velha árvore de pau-brasil? Meu Deus, que desastre! Que desastre!
Lá para o nascente, os gaviões começaram a erguer as poderosas asas para o voo matinal em que fiscalizavam tudo, inclusive os animais da floresta.
Mas a coruja mesmo sabendo que seria perseguida pelo gavião, resolveu partir.
E viajou ainda na madrugada para ganhar tempo.
Vruckt -vruckt! Faziam suas asas no silêncio da manhã que ia quase nascendo.
Quando percebeu estava numa cidade pequena, mas as torres da igreja eram alta e isso agradou à coruja.
_ É para lá que vou, pensou a coruja e arrastou sua mala num voo deslizante céu abaixo.
Naquele instante, o padre bateu o sino chamando os fiéis para a oração matinal: blém-blém-blém, blém-blém! Ela ouviu cinco badaladas.
_Que badalar alto de sinos!_ Resmungou a coruja, que desistiu de fixar moradia na torre da igreja.
Mas não desistiu da viagem, resolveu voar mais um pouco antes de o sol nascer completamente.
Nisso, chegou numa fazenda com o cantar dos galos. “Cocorocó”, gritava um galo de enormes esporões e crista vermelha bem erguida no alto de um portão.
_ Uau, minha santa mãezinha! Esse bicho deve passar o dia fazendo barulho e como vou dormir? Falou para si a coruja já cansada de voar com sua mala.
Mas por que iria desistir? Arrumou a mala debaixo das asas e continuou viagem.
Finalmente, quase o sol despontando por trás das árvores, a coruja avistou um fazendeiro subindo a porteira do curral com um balde nas mãos.
_ Mooom! , mugiam as vacas.
A coruja gostou daqueles animais tão gordos e grandes e com um som estranhamente de quem não se importa com o homem mexendo em suas tetas para tirar leite.
Olhou ainda do alto e viu uma mulher pela janela da cozinha. Vinha um cheiro de alimento tão bom e se ouviu:
_ O café está quentinho! Venha, José, que está na mesa.
A coruja baixou e pousou numa madeira da cerca. Olhou de lado, virando seu pescoço e esperou para ver quem era o José.
_ Meu pai do céu!
Thuckt-thuckt! Thuckt-thuckt! Fazia o trenzinho que um menino pilotava. “Atenção, Seu maquinista, bota fogo na fornalha!”, a coruja ouviu o menino gritar na brincadeira do trenzinho de plástico.
A coruja nem quis saber de mais nada. Pegou sua mala e resolveu voltar o mais rápido para casa.
Quando chegou, não falou coisa alguma. Não contou do sino da igreja, nem do cocorocó do galo e muito menos que ficara apavorada com um menino brincando de trenzinho. Pois chegou num voo silencioso, colocou a mala num canto de um galho e fechou os olhos para descansar.
Nunca mais se ouviu dentro da floresta que a coruja quisesse viajar. E ninguém até hoje sabe por que a coruja viajou a não abriu a mala. Eu só descobri, acreditem se quiser, porque sonho com os animais da mata brasileira todas as noites. Parece mentira, mas é possível acreditar.
Flipt-flipt, flopt, flopt! que a história terminou!